quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Para Caymmi


Dorival Caymmi costumava dizer que seu sonho era que suas músicas caíssem na boca do povo de tal forma que, no futuro, ninguém mais soubesse quem as havia composto ou de onde surgiram, como uma Ciranda cirandinha. Não é um status fácil de ser alcançado. O impressionante é que Caymmi viveu para ver algumas de suas músicas chegarem a esse ponto, embora elas só venham a cair oficialmente em domínio público em 2078. Milhares de pessoas acham que canções como O que é que a baiana tem?, João Valentão, Maracangalha, Peguei um Ita no Norte, Samba da minha terra (Quem não gosta de samba / Bom sujeito não é / É ruim da cabeça / Ou doente do pé) e Retirantes (aquele lerê-lerê que foi tema da novela Escrava Isaura) sempre estiveram por aí, sem autor conhecido. Algum dia, o mesmo deverá acontecer a Doralice, A lenda do Abaeté, É doce morrer no mar, Modinha de Gabriela, Rosa morena, Saudade da Bahia, Saudade de Itapoã, Só louco, Você já foi à Bahia? e outras maravilhas que ele nos deixou. Foram apenas 113 músicas, pouco para uma carreira tão longa, mas é uma obra que ajudou a construir a cultura e a identidade de um povo. A identidade do povo baiano.

Pouco antes de morrer, os três filhos ilustres do grande baiano resolveram homenagear o pai com um dos discos mais sublimes feito por um trio familiar. Coisa rara e inédita em dar certo, Nana, Dori e Danilo fizeram das tripas coração e conseguiram fazer um disco com inúmeros sucessos do pai cantados pelo mesmo e por artistas consagrados na música popular brasileira. O disco tem um brilho peculiar com afinidade única entre os três irmãos e a cada faixa parece que nos mostra o que a Bahia de fato tem, a riqueza de um Estado, a demonstração de afeto, o sol, calor, mulheres decididas e homens fortes e valentes.

Se um dia Dorival pensou em ser tão popular a ponto de não reconhecer suas próprias canções ou as fazendo cair num gosto popular diferenciado, talvez ele tenha quase acertado em algumas boas músicas, mas confesso que ainda será difícil de aceitarmos a questão. A Bahia de Dorival Caymmi é única. Assim como Dorival Caymmi é único.

 

Para Caymmi / Nanã, Dori e Danilo

Nota 10

Marcelo Teixeira

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