quinta-feira, 28 de março de 2013

A musicalidade de Gero Camilo


Retrato de Gero
Sou fã confesso do trabalho do ator, diretor, escritor e cantor Gero Camilo. Quem ouve Vai Desabar tem vontade de sair pulando e cantando junto o refrão que tem tino para obedecer a regra de que toda música boa lava a alma: (...) desabar água/Pra lavar o que tem que limpar/pra lavar o que tem/vai desabar água/e é pro nosso bem. A última canção do primeiro álbum que Gero Camilo lançou, fisga de primeira e dá a impressão de que já virou hit. O debut no meio musical do reconhecido ator dilapida inspiração em mensagens que falam sobre o amor, a modernidade, a arte e a cidade. E ainda agrega ótimas parcerias, como Ceumar, Celso Sim, Tata Fernandes, Simone Sou e Lirinha, entre muitos outros.

O álbum Canções de Invento é obra de uma fábula que começou a ser construída há pelo menos nove anos, quando Gero lançou o livro de contos e peças curtas Macaúba da Terra em 2002, escrito durante o curso da Escola de Arte Dramática, da Universidade de São Paulo, que frequentou entre 1994 e 1998. Do livro surgiu a ideia de montar um espetáculo dois anos depois, que batizou de Canto de Cozinha e contou com a participação dos músicos e amigos Ceumar, Kléber Albuquerque, Rubi e Tata Fernandes. Ali já experimentavam muitas das canções hoje contempladas nesse primeiro registro musical do ator, que vai do rock ao samba e tem também letras de companheiros de EAD, como Marat Descartes e Gustavo Machado. A confluência de gêneros é um grande alimento para o artista contemporâneo, que em vez de tentar se enquadrar, pode ampliar o seu espaço de atuação e afinar o seu discurso poético.

Vale a pena conferir esta faceta cantor de Gero Camilo.

 

Canções de Invento – Gero Camilo

Nota 10

Marcelo Teixeira

quarta-feira, 27 de março de 2013

A cultura chucra de pessoas fúteis


Mundinho fútil
Em meios a tantas imbecilidades, criancices, macacadas, pessoas fúteis e chucras, a qual sou obrigado a conviver, por vezes sou obrigado a escutar (e com certa incoerência), que a música popular brasileira é um lixo, cantada por medalhões de outras épocas e que lutam ferozmente para conseguirem se manter ainda no chamado mundo da MPB. Cabeças assim só servem mesmo para pensar que o mundo um dia vai se acabar ou que Chico Buarque é argentino e pessoas com este nicho cultural sabem quem é a cantora top do momento de seu mundinho estereotipado chamado mundo fútil, mas não sabem (ou nunca souberam) quem foi e o que representa Antônio Carlos Jobim e de qual origem nasceu a Tropicália. Pessoas com semblantes distorcidos e tez mal iluminadas por almas penadas e suburbanas que mal sabem soletrar seus nomes ou concluir uma frase, apenas lutam para que suas divas do momento fútil nunca sejam esquecidas ou meramente apagadas do mundinho a qual pertencem. Chega a ser irrisório ver pessoas com suas roupas de grife blazê, refrigeradas e com precinhos bacanas que cabem no orçamento, chafurdarem em naufrágios quando o assunto é música de verdade.

De que adianta tanta pose dessa gente mal informada culturalmente, se quando sentam para conversar seriamente sobre algo realmente culto, não sabem responder?

Estive recentemente em uma batalha, aonde eu era o criticado e o restante da plateia eram as vítimas. Vítimas banais, vítimas fulas, vítimas da vitamina ácida a qual impera a lei do mundinho fútil com suas bandinhas horrorosas e desengonçadas e errôneas e com seus estilos cafonas e estranhos. Conversei com pessoas idiotas que não sabiam o que era bossa nova ou quem foi Nara Leão. E o mais engraçado é que conversei com pessoas adultas.

Ou seriam crianças imaturas?

Enquanto criticaram o novo álbum de Caetano Veloso, enquanto defendem que a cantora banal e sem voz é a melhor do Brasil, enquanto ouço Chico Buarque e enquanto você ouve suas músicas banais em seu celular importado, eu cresço culturalmente, não passando vergonha em mesas importantes com pessoas cultas e admiráveis, enquanto você, meu caro camarada sem intelecto, viverá sempre a mercê das ondas de paisagens.

Mundinho fútil

Marcelo Teixeira

terça-feira, 26 de março de 2013

Na cadência de Gerlane Lops


Gerlane Lops, ótima voz
Quinze anos de estrada e sendo comemorados com maestria ao lado de um publico fiel e escudeiro e com a pincelada magistral de Elba Ramalho, não é para muitos cantores que estão tentando um lugarzinho ao sol. Mas Gerlane Lops conseguiu tamanha façanha, ao lançar um DVD e um CD com clássicos da música popular brasileira, embalando sucessos de velhos cantores bons da antiga e com suingue, sabedoria e um bom rebolado. Além de proporcionar canções de sua autoria, a cantora Gerlane Lops comemora seus 15 anos de carreira com DVD e presta homenagem aos grandes mestres do samba clássico, como Paulinho da Viola, Chico Buarque, dona Ivone Lara e Clara Nunes, além de reunir músicas de compositores pernambucanos. A cantora e percussionista Gerlane Lops, com passagem musical no Conservatório Pernambucano de Música e Licenciatura pela Universidade Federal de Pernambuco, conta em seu currículo com expressivas experiências. No Festival Canta Nordeste de 1996, da Rede Globo, obteve 1º lugar na eliminatória pernambucana e 3º na classificação geral com a música Tempo de Varanda, revelando-se como grande intérprete. Ganhou também o Prêmio de Melhor Arranjo para a música Minha Cara, em 1998 e 2000 e Prêmio de Melhor Intérprete com a música Alma de Poeta, ambos no Festival UNICANTO de Música.

Pernambucana, Gerlane Lops está lançando seu primeiro DVD, Da Branca, com o qual celebra 15 anos de uma carreira consolidada no Nordeste e iniciada em 1996, quando defendeu Tempo de Varanda (gravada por ela) no festival Canta Nordeste, da TV Globo. Gravado no Teatro Guararapes, Recife, Da Branca traz participações especiais de Elba Ramalho em uma faixa bônus, do sanfoneiro Cezzinha e de Gustavo Travassos. Através das 19 faixas, Gerlane não somente apresenta canções autorais como, sobretudo, confirma sua devoção ao samba ao recriar clássicos de ícones como Cartola e Chico Buarque.

Alguns compositores pernambucanos não poderiam ficar de fora desta celebração, caso de Lula Queiroga e Erasto Vasconcelos, autores de Piaba de Ouro,; Isaías do Cavaco (Ingrastidão) e, é claro, o mestre do frevo Capiba, de quem Gerlane escolheu A Mesma Rosa Amarela, primeiro samba composto por ele. O espetáculo tem direção cênica de André Brasileiro, cenografista de Marcondes Lima, direção musical de Bráulio Araújo e direção geral da própria Gerlane Lops.

O espetáculo já passou pelo Rio de Janeiro, onde foi apresentado em duas casas de shows (uma delas a recém-inaugurada Miranda Brasil), e por importantes teatros do Recife, como os de Santa Isabel, Luis Mendonça (Parque Dona Lindu) e Guararapes, onde foi gravado e exibido para todo o Nordeste como especial de fim de ano da Globo, em 31 de dezembro de 2010. Em janeiro foi visto por mais de 100 países através da Globo Internacional.

Nascida em Olinda, Pernambuco, a cantora, compositora e percussionista foi revelada, em 1996, no Festival Canta Nordeste, apresentado e promovido pela TV Globo. Ao longo de sua trajetória, consolidou seu nome no carnaval pernambucano. Participou do Galo da Madrugada, onde, em 2012, comandou, por exemplo, o trio da Ambev, ao dividir o palco de shows na cidade com nomes como Martinho da Vila. Participou do DVD com o Quinteto Violado homenageando Luiz Gonzaga e de CDs como Ecos do São Francisco, que reuniu grandes nomes da nossa música.

Gerlane Lops é uma raridade no meio musical, porque seu timbre é maravilhosamente encantador. Seu estilo musical, mesclando sons e atabaques, fazem dela uma cantora diferenciada dentro do próprio Nordeste e deixam a aura de Gerlane ainda mais poderosa. A cadência de Gerlane Lops agrada, emociona e pulveriza o ambiente por onde ela passa.

 

Na Cadência de Gerlane Lops
Nota 10

Marcelo Teixeira

 

 

segunda-feira, 25 de março de 2013

Entrevista com Simone Guimarães - Primeira Parte


Sensacional artista
É sempre uma grande satisfação conversar ou trocar algumas palavras com a espetacular Simone Guimarães: além de grande cantora e compositora, com discos bem caprichados, duetos com ícones da MPB, como Maria Bethânia e Milton Nascimento, Simone é, também, uma intelectual que pensa e muito nos segmentos do Brasil e na luta a favor da nossa cultura. Nascida em Santa Rosa de Viterbo, interior de São Paulo, hoje a cantora faz parte da efervescência que Brasília produz, estando ao lado de cantoras como Márcia Tauil, Sandra Duailibe, Roberto Menescal, Miúcha e outros, levando muita música de qualidade para os quatro cantos do país. Nesta primeira parte da entrevista, Simone Guimarães nos brinda com sua inteligência e sapiência em ver as coisas mais simples se transformarem em algo valioso. O Mais Cultura! (ou o Espaço Azul, como ela mesma apadrinhou o blog), tem o enorme prazer estar sendo condecorado com suas ricas frases de efeito moral.

 

Marcelo Teixeira - Seus discos são considerados, em alguns departamentos e lojas de CDs, como sendo uma cantora regional. Você tem medo de ser rotulada como tal?

Simone Guimarães - Não tenho medo de nada na arte, Marcelo. A arte é dinâmica, mutável, migrante, (eu migrei) a arte é memória, momento, tempo, movimento... Não devemos ter posturas rígidas e frias com ela, ela se apresenta numa ruptura e é de onde vem sua seiva e sangues, do conflito, dos contrastes, dos sentimentos em ebulição, da compreensão inconsciente, do vácuo sendo animado pela anti-matéria na consciência do vazio.

A música é invisível aos olhos, mas não ao coração. Coloquem os nomes que quiser nos meus trabalhos. Os codinomes são sempre o que se compreende do outro. Numa estante de disco, é alguma espécie de organização. Não posso ter medo, apenas discordar.

Sou de uma região interiorana de São Paulo e, portanto trago o canto da minha aldeia.

Se alguém tiver que vender um Chocolate especial, terá que lhe dar um nome especial. Acredito ser sim esse chocolate regional, porém já me misturei um pouco com o sabor das grandes cidades. Não que isso seja imperativo pra mim, aliás, eu gostaria de ter tido uma vida pacata e mais simples, mas meu caminho na arte me fez migrar.

Acredito que mundo e as pessoas deveriam ser apresentadas numa abordagem rica: dialética, semiótica, linguística, literária, poética, filosófica, histórica, humanista, e não de forma a se prender em notas de perfume quando o mais importante é a essência.

Eu comecei minha carreira fonográfica na Televisão fazendo trilhas para documentários, juntamente com Paulo Jobim, filho do Tom e uma orquestra inteira tocava um de meus temas, sendo regida pelo maestro Benito Juarez, com arranjos de Paulinho. Era regional?, Não.

Meu primeiro CD, o Piracema é um disco temático, assim como o segundo Cirandeiro: tem uma ocupação com temas voltados para a natureza, cenários bucólicos, mas a música apresenta gêneros diversos, como sambas, Shots, temas instrumentais, modas, etc. Por último, para responder a sua pergunta diria que as pessoas que me rotulam dessa forma ainda não tiveram a oportunidade de conhecer meu trabalho por inteiro. Não tenho preconceito com gêneros brasileiros. Toco-os todos indistintamente.

MT - Você cantou com grandes nomes da MPB, como Milton Nascimento, Maria Bethânia, Renato Braz, Leila Pinheiro, Ivan Lins. Tem algum cantor ou cantora que desejaria dividir um dueto?

SG - Gostaria de cantar com Sting . Sou fã desde que ouvi Russians no inicio da minha profissão de ouvinte. Ele é o máximo!

 

MT - Seu último CD, Chão de Aquarela, foi lançado agora em 2012 tendo apenas canções de sua autoria com Cristina Saraiva. Foi proposital fazer um disco somente pelas duas?

SG - Apenas reunimos as músicas que Cristina compôs comigo por um desejo de marcar essa parceria . A Cris é dona do Selo Tie music ,que me lançou no mercado fonográfico em 1997 e uma parceira das melhores que tenho. Somos amigas há trinta anos e isso ,creio, foi o fator decisivo para juntarmos nossas modas e cantigas regionais, que tanto amamos. Adoramos o pé de uma fogueira e um violåo!

MT - Sua música, por mais rica e de uma brasilidade completa, não chega a uma classe social mais popular. Por que isso acontece?

SG - No Brasil a indústria fonográfica não trabalha a favor da arte, mas sim do lucro, com exceções como Biscoito Fino, Lua Music, CID , Dubas, Tie music, Dabliu, Rob digital e outros tantos selos legais que fazem a nossa musica sobreviver e crescer lá fora.

O povo é massificado pelas avalanches tecno-pops do descartável da época.

Vivemos num país muito novo e sem igualdade social. O capitalismo é selvagem e poderia não ser: Se mirar , por exemplo nos capitalismos da Austrália, da Suíssa, da Noruega, talvez, mas a mentalidade dos empresários, em sua maioria, é colonialista e assim acontece na musica. Exportamos commodities e matérias primas. Acredito que se tivéssemos mais peito nessa questão do enfrentamento com as multinacionais que vem brincar com suas porcarias aqui dentro a musica se resolveria.

A presidenta Dilma está resolvendo o problema da miséria extrema. Musica também deveria ser um alimento pra todos.

Quanto mais variado o prato, mais saudável a nação!

Dá–se um produto de má qualidade ao seu povo quando não se tem interesse que esse povo consuma o substancial, o necessário para o seu crescimento, o melhor para o seu raciocínio,o mais caro para o seu coração de homem, no sentido de ser mais elaborado, morar melhor dentro de si mesmo.

Trabalho sem me preocupar com isso, querido Marcelo, mas gostaria de ser consumida pelas populações mais pobres: acho que eles iriam gostar da minha musica e de mim. Eu sou pobre- pobre- pobre- de –marré –marre-de- si. Tenho a certeza de que saberia me comunicar com meu povo.

MT - Em que você se inspira para compor?

SG - No amor , na beleza, na natureza. Também me inspiro indo ao cinema e vendo um documentário como A caverna dos sonhos esquecidos de Herzog. Assistir ao respeito com que nossa ancestralidade é tratada nesse filme me fez mais forte, como ler Nietzsche, Freud, Márcio Paschoal, ouvir Milton cantar ou Maria Rita.

MT - O que você acha da música produzida no Brasil hoje em dia?

SG - Eu tenho acesso a todo tipo de musica e o Brasil continua sendo o Melhor produtor nessa área! Amo a nossa musica. Quero que o brasileiro conheça a fundo seus artistas e um dia chegaremos lá.

Tanta coisa já mudou e ainda podemos mudar pra melhor, muito. Esse é o meu sonho. Ver o Brasil colher o que planta com seu trabalho e expulsar a corja de políticos corruptos do poder e deixar para quem sabe administrar, para quem tem idéias humanistas, a favor do coletivo. Na França, por exemplo tem um deputado Brasileiro no parlamento. Foi escolhido por seu mérito e por sua formação na área administrativa. Acredito que a democracia deveria ser mais explanadora nessa área, alertando os eleitores a votar em pessoas qualificadas para os cargos, de outra maneira continuaremos a eleger homo fóbicos e racistas.

 
A entrevista com a cantora e compositora Simone Guimarães continua na próxima semana, com mais revelações sobre a sua música e seus projetos.
 
Entrevista com Simone Guimarães - Primeira Parte
Marcelo Teixeira

 

sexta-feira, 22 de março de 2013

A praga dos padres cantores


Fé ou motivação ao dinheiro?
Há quase uma década (ou mais um pouco ainda), a onda dos padres cantores virou uma febre nacional. Padres de todos os estilos e gostos com suas musiquinhas chinfrins e sem fundamentos. Alguns até dizem que estão levando a palavra de Deus para os lares, outros dizem que não enriquecem com tanto dinheiro. A bem da verdade, essa onda de padres cantores é uma das farsas mais nefastas do mundo. Não conheço, ou não que eu tenha conhecimento, de algum país aonde padres com batinas ou calças jeans, subam aos palcos da vida e cantem em louvor às pessoas. No Brasil, isso é algo contagioso e alguns padres dizem que é religioso. Pode até ser que seja, mas ao meu ver, está havendo uma desreligiosidade terrível e temível quanto a esta onda gigantesca de padres cantores, que endossam a nossa vida com essa tal palavra religiosa.

Recentemente, o cantor Belo (?) resolveu pagar todos os seus pecados cantando ao lado do padre Marcelo Rossi, que não é tão santo assim, a ponto de divulgar coisas absurdas antes de usar a velha batina. Ver os dois cantando emocionados, lagrimas escorrendo por suas faces, multidões apreensivos entoando o tal hino, é de se pensar que os padres ainda tem algo a acrescentar em carreiras miseráveis. Belo é um miserável da música. O padre Marcelo Rossi é um miserável da igreja.

Existe tantos padres cantantes e saltitantes por ai, que virou um festival de batinas e me surpreendo que não haja, ainda, um feriado nacional para homenageá-los. Particularmente, não tenho absolutamente nada contra esses padres, mas está ficando uma tremenda chatice ter que ligar a TV, ir a um sarau, ir a uma loja determinada a vender música e nos deparar com hinos, louvores, preguices e nojos a parte, que tive a ideia de escrever este artigo.

Para mim, padres nasceram com o segmento de celebrar missas, honrar casamentos e unir os povos, porém, estou desconfiando de que alguns padres se escondem atrás da batina surrada para esconder de vez suas preferencias sexuais. Estive observando a atitude de vários padres antes mesmo de escrever e resenhar este artigo. Alguns são mera e excessivamente femininas, que chegam ao ponto de sorrirem igual a Gabriela de Jorge Amado. Existem padres que nem parecem padres. O tal Fábio de Melo mais se preocupa com a aparência. O tal Juarez mais parece uma criança procurando a chupeta que perdeu. A Aline Barros... bom, acho que encerro por aqui.

 

Os padres cantores

Marcelo Teixeira

quinta-feira, 21 de março de 2013

Luto - Emílio Santiago


 
Até logo, Emilio
Não tenho palavras para descrever a morte inesperada do cantor Emílio Santiago. As palavras me fogem, evaporam e simplesmente esqueço de que o silêncio, neste momento, é propício. Trago comigo neste artigo toda a amargura que um ser humano pode transmitir em palavras para o seu leitor, mas não tenho condições de expressar nada, senão o choro incontrolável que derramo nas teclas do meu computador. Valendo-se lembrar que os grandes artistas jamais morrem e Emílio Santiago não morreu. Infelizmente, ele partiu antes que eu pudesse publicar um artigo sobre seu último disco, cujo estava previsto para o dia 3 de abril, antes da minha viagem à João Pessoa. Emílio Santiago partiu, mas deixou trinta discos maravilhosamente deliciosos e que jamais irá silenciar o seu sorriso, nem o seu gostoso cantar.

Adeus, não.

Até logo.

 

Luto – Emílio Santiago

Marcelo Teixeira

quarta-feira, 20 de março de 2013

O ótimo disco de Anélis Assumpção


A filha do grande Itamar
Anélis Assumpção - que responsa - é filha do inesquecível Itamar Assumpção, o homem que revirou de ponta cabeça a MPB na virada dos anos 70 para os 80. Mas não é que esse DNA todo, nesse caso, só ajudou? Pai e filha tem muita coisa em comum: a poesia concreta/urbana/urgente; a mensagem desafiadora; os arranjos desconstruídos, entre o jazz, o pop e a MPB tradicional. Somam-se a essas atávicas semelhanças, a sua privilegiada vocação vocálica, o dub impassível, a suavidade insuspeita e o distanciamento natural da sua atualidade, que a mantém imune a rótulos absurdos que lançavam maldição às gerações passadas. Da sua geração, só faltava ela lançar disco solo ( as suas ex-companheiras de Dona Zica, Andréia Dias e Iara Rennó já debutaram).

Não falta mais: seu CD/LP Sou Suspeita, Estou Sujeita, Não Sou Santa, está entre os melhores lançamentos a qual posso comentar. A demora em lançar o disco tem justificativas fortes: a compositora maturou suas canções enquanto produzia a antologia definitiva da obra de seu pai, Caixa Preta ( com todos os discos de carreira + dois inéditos). E o destino fez mais. Itamar havia prometido produzir o primeiro disco da filha mais velha, se em contrapartida ela o ajudasse a botar toda a sua discografia em dia. E mesmo com seu falecimento em 2003, tudo aconteceu como prometido: com o dinheiro da Caixa Preta, que o Mais Cultura! fez questão de resenhar em artigo, Anélis conseguiu bancar as gravações e a produção de seu disco - de uma maneira ou de outra, o pai cumpriu seu trato também. E a faixa de abertura é de quem? ele, Itamar Assumpção, claro. Abrindo clareira pra filha, que lança um disco a altura.

 

Sou Suspeita, Estou Sujeita, Não Sou Santa / Anélis Assumpção

Nota 10

Marcelo Teixeira

terça-feira, 19 de março de 2013

Amor Canalha, de Karla Sabah


O bem vindo disco de Karla
Antes de ler este artigo, eu aconselharia ouvir o CD Amor Canalha, de Karla Sabah, para que você vá se familiarizando com as frases abaixo. O disco é de uma perfeição única, capaz de traduzir todo o sentimentalismo aflorado que a cantora tenta transpassar e deixar derramar cada sensação de prazer emaranhado de suas entranhas. A começar pela capa, que traz a cantora em tons fortes de maquiagem e batom e serve de inspiração para muitas das faixas do maravilhoso álbum. Através de lugares-comuns, podemos ter a nítida certeza de que Karla Sabah acertou ao lançar um disco como Amor Canalha em pleno século 21, pois é um disco feminino, mas com traços masculinos e com reitoria e disciplina lideradas por uma voz pomposa e madura.

Para começo de conversa: este é um álbum musical feito de mulher para mulheres, destas que sentem saudades; apaixonam-se sem pensar nas consequências de uma entrega total, fazem cenas de ciúmes, debocham, discutem; amam sem juízo ou preconceitos e ainda mostram alta competência no mercado de trabalho pra homem nenhum por defeito! Conceitualmente, o feminismo politizado do século passado foi reciclado para atender às demandas sentimentais do terceiro milênio, na via da independência econômica e das capacidades da Inteligência Emocional Feminina, mais ou menos como foi conceitualmente trabalhado no bem sucedido seriado Sex in the City. A ideia feminista que perpassa toda a concepção do novo álbum de Karla Sahah fala de tristeza sem curtir fossa e de alegria sem histeria, algo que está sendo chamado de elegância emocional.

 

Vou dar um tempo é a solução pra mim

Não quebrou a cara

Não vou mais me entregar a esse amor canalha

(Trecho de Amor Canalha, de Karla Sabah)

 

Neste quarto trabalho solo, além do indiscutível amadurecimento profissional na colocação da voz, Karla assume todas as responsabilidades da produção executiva; desenha o conceito artístico e seleciona um repertório montado como quem edita, capítulo a capítulo, um livro de poesias (habilidade que já lhe rendeu prêmio de prestígio da ABL e lhe deu segurança para assinar algumas letras como Amor Canalha, Click No Meu Link e Já É, entre outras).

...é: Karla sabe que é chegado o tempo das musas responderem às serenatas de seus cantores e amantes (tanto que é neles que ela vai buscar versos e, sem afeminá-los, dar-lhes uma nova potência na voz feminina, a mesma que a Grécia antiga nunca permitiu, em cena, nas suas clássicas tragédias) e olha que essas novas mulheres não têm papas na língua nem deixam de ser dengosas e sedutoras. Mais do que em tempo integral, essa nova mulher que a artista busca no meio em que vive e dentro de si mesma, é uma mulher em tempo real.

Contando com o indiscutível talento do Black Rio, William Magalhães, produtor musical deste AMOR CANALHA (com o qual já trabalhara antes, no álbum drum'n bossa CD e DVD, lançados na América do Sul, Ásia e Europa com ótimas críticas), sem abusar do conceito pós-moderno que sustenta a ideia de globalização, Karla, neste processo realizado, sem dúvida, executou seu melhor trabalho de nível internacional.

Atentem para o sofisticado ambient-mood criado para embalar e dar unidade a todas canções selecionadas. Percebam como o balanço pop dos arranjos multimidiados dão ao samba uma sutileza que só encontra par no melhor da Soul Music, com um suingue intimista que faz o funk aprender os carinhos que a Bossa Nova inventou para conquistar o mundo.

Com essa cama sonora de delicadezas precisas, ficou tranquilo atualizar desde os antigos sambas (Não Me Quebro À Toa, Minha e Mulher Que Não Dá Samba) ao pop rock do Ultraje (Volta Comigo e Zoraide), o Yê-Yê-Yê da Jovem Guarda e o Tropicalismo de Caetano e Torquato Neto (Pra Ser Só Minha Mulher, Baby e Mamãe Coragem).

 ...tudo isso, com um humor que lhe é peculiar na essência de sua personalidade, é o que Karla pretende realizar em seus próximos shows, baseado neste álbum interessantíssimo; onde, junto com um set musical minimalista (bem ao estilo com que William Magalhães imprimiu ao álbum), ainda poderão estar em cena o melhor da poesia contemporânea, na voz de mulheres que tratam a poesia como ela sempre quis ser tratada e poetas que tratam suas musas com a delicadeza de quem as considera, lindas, deliciosas e insuperáveis, show performance, com os vídeos (só ela já dirigiu 15 DVDs de grandes artistas, tem mais de 20 filmes em 16mm e 35mm, participando de festivais nacionais e internacionais), performances e muito mais. Um show de verdade, cheio de humor e criatividade.

 ... de uma coisa, quem escutar este disco ou assistir a este show (que um DVD certamente registrará), terá absoluta certeza: a mulher que ela veste, com o homem, não compete; mas o leva a perceber que, nesta mesa de bilhar, ela agora é a branca: não é mais a bola 7!

 

Texto enviado e escrito por Tavinho Paes para o Mais Cultura!

Texto inicial: Marcelo Teixeira

Amor Canalha, de Karla Sabah

Nota 10

Marcelo Teixeira

segunda-feira, 18 de março de 2013

Elis 68 Anos


Elis - 68 anos
Ontem, dia 17 de Março, se viva estivesse, Elis Regina estaria completando 68 anos de idade. Homenagens póstumas fluíram o Brasil e rompeu barreiras para uma homenagem singela, simples, categórica e retumbante. Afinal, o país e o mundo ainda não se acostumaram com a sua morte, aos 36 anos de idade, no início da década de 1980 e quando fala-se na idade de nascimento de uma artista, geralmente o barulho é menos impactante, mais florescente e que nos remete a lembrança momentos da carreira da artista ou músicas que nos tocam mais profundamente. Elis estaria completando 68 anos com a habilidade de uma senhora sem papas na língua, com a mesma integridade dos anos dourados e com a mesma doçura e braveza com a qual marcaram sua estadia em vida.

Lembro que quando ouvi Elis pela primeira vez, eu estava brincando no quintal de minha antiga casa com minhas irmãs caçulas e de repente soou uma voz forte, cantando versos que eu não conseguia captar, tamanha a força dramática a qual a voz impostava. Eu tinha 8 anos de idade, meu pai já estava falecido há 3 anos e eu já tinha noção de quem era Clara Nunes, o que era a Jovem Guarda. Perguntei à minha mãe, dona Maria Geralda Teixeira, qual o nome daquela música e ela disse: O Bêbado e A Equilibrista.

Com o tempo, aprendi tudo (ou quase) sobre uma das maiores cantoras do Brasil, que hoje completaria 68 anos e que me deu a liberdade de ser um crítico ferrenho e até a contestar a sua musicalidade e, de quebra, homenageá-la no momento certo.

 

Elis 68 Anos

Marcelo Teixeira

sexta-feira, 15 de março de 2013

Respirar, de Patrícia Marx


O belo disco de Patrícia
Leve e relax como o ato de respirar - por isso mesmo, cai bem o título - é este disco de Patrícia Marx, ex-cantora infantil, ex-musa teen da bossa nova e ex-militante dance (frustrada). A moça agora adere ao crescente número de novos artistas que buscar esticar os horizontes da MPB via eletrônica. Se pensarmos menos na proposta e mais no conteúdo concreto do álbum (música pop agradável e cool, descontando as expectativas alheias e as pretensões), fica mais fácil de gostar da nova face de Patrícia. É bom notar que a moça não empaca na macumba pra turista e um surpreendente trabalho de pesquisa musical, demonstrando um amplo escopo de influências - que vão da bossa nova ao samba-jazz, tudo se encontrando em suas composições. Com este bem-vindo molho dando base às canções (e aí também cabem elogios à voz de Patrícia, que agora sabe tanto cantar quanto ficar nas ditas intervenções vocais), a produção moderninha de Bruno E. soa oportuna e inteligente. O que há de melhor em Respirar é a nítida noção de que Patrícia investe primeiro em sua música, e depois no possível verniz eletrônico-modernizador.

Patrícia Marx lançou o disco Respirar, pela Trama em 2001 e até hoje, passados mais de dez anos, o álbum permanece maravilhoso de se ouvir e parece que foi produzido ontem. O álbum traz a tona a faceta eletrônica de Patrícia. Além disso, a cantora aparece pela primeira vez como compositora (apenas uma das 12 faixas não leva assinatura sua, o que dá ao disco o status de autoral) e também como produtora - função dividida com Bruno (produtor-marido), e também a participação dos produtores ingleses 4hero, considerados como um dos mais influentes produtores da música eletrônica européia. A participação do grupo marca o segundo capítulo da história de uma associação iniciada há cinco anos, quando Patrícia foi convidada para ir a Londres cantar no disco deles - o Creating Patterns.

Dito isso, a galera que aplaudiu as incursões feitas por Patife e Marky no reino da braziltronica terá tudo para gostar e muito do disco. A sonoridade básica é o tal do broken beat, versão ainda mais atmosférica e melódica do trip hop popularizado por Tricky e Portishead. Aos mais colonizados, o grande petisco de Respirar são as duas faixas produzidas pelo duo inglês 4Hero, atuais papas do drum'n'bass. E realmente Dona Música (que ganha em suingue pela presença de Wilson Simoninha) e Submerso estão entre os melhores achados do disco - não apenas pelos crispados sons sampleados pelo 4Hero, mas também pelas melodias envolventes, a um passo da sensualidade.

Tiros mais certeiros ainda dados pela Patrícia melodista estão em Recomeçar e Desamor. Quando chega a hora de fechar o disco com ...E o Meu Amor Vi Passar (bossa nova envenenada por João Parayhba, do Trio Mocotó), e sua delicada, charmosa levada, já não há mais dúvidas sobre o talento de Patrícia. Ou sobre sua capacidade de sedução. Respirar demonstra o quanto Patrícia Marx cresceu. E apareceu.

 

Respirar / Patrícia Marx

Nota 10

Marcelo Teixeira

quinta-feira, 14 de março de 2013

O novo CD de Luiz Gayotto


Proponhomix: ousado e diferente
Luiz Gayotto é compositor, cantor, violonista e percussionista, com três CDs solo lançados. Fez parte do grupo Barbatuques e é idealizador do projeto Catarse, que anualmente agrega músicos e artistas em geral para uma catarse coletiva. Catarinense radicado em São Paulo, Luiz Gayotto, apresenta seu novo CD Proponhomix (2011 / Tratore / 24,99) produzido por Estevan Sinkovitz e Alfredo Bello. Proponhomix é o CD mais autoral de Gayotto no quesito sonoridade, afinal ele é o principal instrumentista, seja no violão, percussão corporal e/ou instrumental, teclados ou vocais. Completamente diferente de seus discos anteriores, este CD é uma nova proposta que resulta da relação do artista com outras artes (cinema, teatro) e projetos artísticos. Neste novo traballho, Gayotto foi fundo na sua pesquisa que alia à canção, os elementos da percussão corporal e instrumental, a voz como um instrumento (melódico e harmônico), e as possibilidades de edição da música eletrônica. O orgânico/acústico processado pelo eletrônico. O CD conta com participações especiais do compositor e pianista Marcelo Jeneci e do produtor Ricardo Prado.

Luiz Gayotto foge do apelo comercial com disco dedicado à criação e improviso, com conteúdo efervescente. Por vezes, parece que estou ouvindo as sonoridades de Hermeto Pascoal e em outra ocasião, parece que estou num espetáculo de danças. O disco inspira e é inquietante. Faz falta ter um cantor e compositor da estirpe de Gayotto pela sua capacidade de nos instigar, nos surpreender e nos inquietar. Ainda assim, o fôlego de Proponhomix é arrebatador e provocante.

 

Proponhomix / Luiz Gayotto

Nota 10

Marcelo Teixeira

quarta-feira, 13 de março de 2013

Antônio Nóbrega - de Pernambuco para o mundo



Antônio Nóbrega
Considerado um dos grandes artistas nordestinos, o pernambucano Antônio Nóbrega perambula pelos quatro cantos do mundo divulgando a cultura nordestina, a alegria do povo pernambucano e as sabedorias que somente ele, Antônio Nóbrega, conseguem fazer com tamanha criatividade. Sua carreira artística teve início na Orquestra de Câmara da Paraíba, onde atuou no final dos anos 1960. No mesmo período, atuou na Orquestra Sinfônica do Recife e deu concertos como solista em sua cidade natal. Por essa época, recebeu do escritor Ariano Suassuna o convite para tomar parte do Quinteto Armorial, como compositor e instrumentista. Com o Quinteto Armorial, atuou no Brasil e no exterior e gravou quatro discos. Nesse período, teve intenso contato com artistas populares do Nordeste, o que o levou a aprimorar seus conhecimentos sobre as formas de expressão da cultura popular, em especial a dança e a música.

Ganhador de diversos prêmios, Antônio produziu em 1997, o espetáculo Madeira que cupim não rói, que é o nome de uma consagrada marcha-rancho do compositor pernambucano Capiba. No espetáculo e nas músicas do CD, procurou fortalecer a herança musical ibero-mediterrânea e afro-indígena, com a utilização de instrumentos musicais brasileiros quase em desuso, como o urucungo, elo perdido entre o berimbau e a rebeca e o marimbau, uma espécie de berimbau de latas tocado com o auxílio de um pedaço de vidro e uma baqueta. É prestada uma homenagem ao esquecido compositor pernambucano de frevos e polcas Lourival Oliveira, o Louro amigo. São divididas com Wilson Freire, a autoria de 11 das 20 músicas do disco.

No mesmo ano, recebeu o Prêmio Multicultural Estadão como Criador Participante na Cultura Brasileira, o Prêmio Ministério da Cultura Cultura Popular, o Prêmio O Globo por Melhor Show do Ano e recebeu a indicação para o Prêmio Sharp como melhor show e melhor arranjador. Apresentou, ainda, Aula espetáculo/Sol a pino.

Em 1998, foi convidado, pelo Departamento Cultural do Itamarati e pela Comissão Nacional dos 500 anos do Brasil, a excursionar em Portugal e outros países com um espetáculo especialmente criado para os festejos luso-brasileiros, chegando a exibir-se na Expo de Lisboa com muito sucesso. Em 1999, lançou o espetáculo e o CD Pernambuco Falando Para o Mundo, que era o nome de um programa de rádio da cidade do Recife. Neste trabalho, apresenta uma viagem pela diversidade da música pernambucana, através de seus principais compositores, seja os clássicos, como Capiba, seja os desconhecidos, como Felinho e Luís de França. Em 2000, o ator-músico apresentou o show no Rio de Janeiro, com cenários e figurinos inspirados nas ruas do Recife e Olinda, assinados pelo artista plástico Dantas Suassuna, filho de Ariano Suassuna. Apresentou-se acompanhado por uma autêntica orquestra de frevo, a Banda Pernambuco, com 14 integrantes. Seu trabalho realiza um resgate das fontes brasileiras, uma viagem pelo folclore, especialmente o nordestino, revitalizando gêneros como frevo, coco, maracatu, caboclinho, ciranda, cavalo-marinho e as marchas de bloco. Em 2001 apresentou uma aula-show, no Teatro da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, durante o VII Encontro Nacional de Pesquisadores da MPB. No mesmo ano, apresentou no Teatro Carlos Gomes no Rio de Janeiro o espetáculo O marco do meio-dia, apresentado também em São Paulo e Brasília.

Admirado e aplaudido por ilustres da música, do teatro e das artes em geral, Antônio Nóbrega é o grande homenageado de hoje no Mais Cultura! pela sua representatividade cultural e pessoal.

Salve, Antônio Nóbrega!

 

Antônio Nobrega – De Pernambuco para o Mundo

Por Marcelo Teixeira

terça-feira, 12 de março de 2013

Aos mortos de Santa Maria: que música tocar?


Luto eterno
O Mais Cultura! e, assim como todo o mundo, está de luto pelas mortes por asfixia na boate Kiss, em Santa Maria, Rio Grande do Sul, em Janeiro de 2013. É difícil e, sobretudo, complicado recomeçar a vida sabendo que nunca mais nada será como antes. A notícia pegou a todos de surpresa, pois muitos estavam ali para se divertirem, curtirem a balada, os amigos. Muitos jovens com futuros promissores. Futuros pensadores do País. A presidenta Dilma Rousseff lamentou e até chorou seus mortos. O clima é de descontentamento geral até hoje. Passados vários dias, o estado ainda não conseguiu reverter o clima de tristeza e comoção e as mortes que vieram subsequentemente. Eu que gostaria muito de poder conhecer o Sul no próximo ano, estou arrasado com tamanha voracidade que um crime desta natureza tenha acometido a tantos rostos jovens, bonitos, saudáveis.

Que música tocar? Qual o sentido de ouvir uma bela canção para homenageá-los?  Qual o tom, a melodia, o ritmo a prestar uma justa homenagem àqueles mortos, feridos, parentes e pessoas da região? Estamos ainda de luto. Luto por respostas, luto pelos mortos, luto pelo Estado. Luto por Santa Maria.

Choraremos eternamente sobre as lentes nos computadores e nas lembranças vividas e desumanas. Rostos que o mundo não conheceu, mas que choraram juntos. Música, nesta hora, não há. Não temos uma canção qualquer para designar cada ser morto, cada ser queimado, cada ser ferido. Que a música vaga, inerente e sem sentido nos deixe vagar pelo nosso cérebro, a ponto de nos levar a lugares distantes, longes e calmos. Precisamos ouvir o silêncio neste momento e em todos os momentos quando pensarmos nos mortos de Santa Maria. O silêncio que talvez nos acalantará. O silêncio que talvez nos fará voltarmos à nossa realidade de seguir em frente. O silêncio.

Silêncio!

 

Qual música tocar para os mortos de Santa Maria?

Marcelo Teixeira

segunda-feira, 11 de março de 2013

O sorriso de Bruna Caram


O belo sorriso de Bruna Caram
Quando lançou Feriado Pessoal, Bruna Caram se firmava como uma das mais importantes e celebres cantoras da chamada Nova MPB, composta especialmente por cantoras jovens, bonitas e com talentos memoráveis. Feriado Pessoal vinha embalado por sucessos inquestionáveis de Guilherme Arantes e JC Costa Netto e por composições próprias que davam todo o brilho e diferença de seu trabalho e que estava a frente do mega sucesso disco anterior, Essa Menina, seu álbum de estreia a qual alcançou absoluto sucesso de público e crítica. O novo trabalho tem bons momentos em composições alheias e já pode ser considerado um marco na brilhante carreira de Bruna. Um bom exemplo é a graciosa Especialmente Criativa, de Mallu Magahães. Das músicas que levam a sua assinatura, Pode Se Animar (parceria com Pedro Luís) é bastante agradável (aquela música que vale um repeat).

Abrindo com Bem-vindo, uma graciosidade imensa, a música é um convite pra ouvir Bruna Caram do começo ao fim, de coração aberto. Síntese do disco com todo seu frescor, coragem, alegria e independência, Bem-vindo tem uma responsabilidade imensa perante todo o disco, pois é ele quem traz a essência do álbum, misturado com a bela voz da cantora. Não Perca o Final é uma pérola do mestre Zé Rodrix felizmente encontrada e abocanhada por Bruna, praticamente esquecida no cancioneiro do cantor e compositor falecido há pouco. Sabedoria bem-humorada, se torna uma canção irresistível.

Esfera é um retrato do desejo genuíno de que o mundo possa realmente ser melhor. Com a consciência de que a mudança começa dentro de cada um de nós. Minha Teimosia, Uma Arma Pra Te Conquistar até parece uma provocação, mas é mais uma das delicias de Jorge Ben Jor que Bruna alçou deliciosamente. Uma das mais deliciosas frases já usadas pra iniciar uma canção, a música reflete um momento único na carreira da jovem cantora. Quentura do início ao fim!

 

Ter que voltar

Ter que lamentar

Mas deixar levar

Me entender um pouco mais

Me entregar

A cada sonho, cada esquina, cada olhar

Quem sabe um dia a gente possa olhar pra trás

E se orgulhar

Da marca que hoje eu trago

 

(Trecho de Bem-Vindo, de Paulo Novaes)

 

Flor do Medo é a canção sobre o momento específico entre a sedução que instiga o amor e o beijo que o inaugura. Obra prima de Djavan, a música tem tudo para ser a mais tocada nas rádios que adoram MPB. Apaixonante assim. Assim como já fizeram em discos de cantores carimbados e respeitados dentro da MPB, como Ney Matogrosso, Zélia Duncan, Roberta Sá, Pedro Luís agora engata uma bem elaborada trama de enredos com a sensacional Pode se Animar, que trata de perdas e danos, de ganhos e recebimentos do amor. E se o amor que você perdeu pudesse voltar pra você? Canção-feitiçaria de Bruna com Pedro Luís traz seu amor de volta em até 5 audições.

Amanhecendo é uma música cíclica sobre um amor que precisa, mas não consegue terminar. A mais dolorosa do disco, com direito a lágrimas e lencinhos e que tem como arrebatadora a voz singela de Bruna, que adentra em nossos poros com uma desenvoltura tremenda. Divertida, engraçadinha, romântica e espetacularmente divina, Especialmente Criativa é alegre, irônica, clown, crítica, divertida, sincera. Canção-presente da Mallu Magalhães que fala sobre ser artista na vida real.

Ponto alto do disco, Segredo é uma das canções mais executadas do cancioneiro de Dalva de Oliveira, cantada por medalhões da MPB e que teve a mais sublime interpretação na voz do filho de Dalva com Herivelto Martins, o saudoso Pery Ribeiro, que nos deixou há pouco tempo. Canção do repertório da Rainha da Voz, como era chamada, Bruna aprendeu esta canção ouvindo com seus avós. E aqui ela canta brilhantemente com a excepcional cantora Marina de La Riva em um dueto de arrepiar.

Purinho é um frevo safado livremente inspirado nas folias dos carnavais do Recife e que foi composto pela foliã Bruna Caram. Atrás do bloco o mundo gira sem parar. Encerrando o disco com Peito Aberto a maior declaração de amor do disco. Vale a pena ressaltar que o produtor se emocionou no segundo take e não a deixou gravar mais. Portanto, a voz não foi editada e a performance é real.

Um dos mais brilhantes discos da MPB com a categoria de uma estrela chamada Bruna Caram.

 

Será Bem Vindo Qualquer Sorriso / Bruna Caram

Nota 10

Marcelo Teixeira