sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Entrevista com Emília Monteiro


Emília: cantora do Amapá foi revelação de 2013
Entre um contratempo e outro, uma viagem à Macapá e shows ao lado de Dona Onete, Emília Monteiro reservou um tempinho para dar uma entrevista para fechar o Mais Cultura! com chave de ouro. A cantora amapaense, que foi considerada pelo blog como sendo a maior (e melhor) revelação do ano de 2013, é digna de uma elegância sofisticada, de uma cultura sem igual, de um carisma arrebatador, de uma meiguice profunda e de uma delicadeza incomum, que faz deste critico musical ficar ainda mais apaixonado por sua música. Dona de uma voz poderosa e detentora dos cantos amazônicos, Emília Monteiro nos revela sua musicalidade, desvendando segredos, revelações, novidades e mais suingues para o próximo ano e revela que ‘Cheia de Graça vale como benção de Nossa Senhora quanto à analogia com o bom humor e a irreverência’ e diz que ‘as maiores vozes do Brasil são Elis Regina e Clara Nunes’.


Marcelo Teixeira: Por que seu disco recebeu o saboroso título Cheia de Graça?

Emília Monteiro: Marcelo, esta é uma pergunta interessante, porque foi simplesmente o acaso... Ângela Brandão, uma excelente compositora mineira, radicada em Brasília, me mostrou a letra que levava o nome Cheia de Graça e eu além de amar a poesia e todo o significado daquela letra, identifiquei que Cheia de Graça tanto vale como bênção de Nossa Senhora, quanto também à analogia com o bom humor e a irreverência e nos dois casos achei pertinente colocar o nome no CD, assim ele já estaria abençoado e bem humorado ao mesmo tempo...

M.T: Hoje você é uma cantora reconhecida em todo o território nortista e aos poucos está desbravando o Brasil inteiro. Se sente realizada com este sucesso já no disco de estreia?
E.M: Me sinto feliz, percebendo que, por ter feito um disco que não se enquadra numa MPB dita tradicional, consegui ter os bons olhos de blogs especializados em música, assim como de críticos de música e principalmente do público... É claro que era algo que eu gostaria mesmo que acontecesse, mas me surpreendi por estar sendo dessa maneira... Ainda não me considero realizada porque o trabalho acabou de começar, mas estou muito satisfeita, principalmente por ser o primeiro Cd.
 
M.T: Dona Onete é uma figura tarimbada no Norte do País, uma cantora e compositora valorizada no Amapá  e de onde você extraiu algumas de suas canções para gravar Cheia de Graça, inclusive com participação dela. Conte-nos um pouco sobre a amizade de vocês.
E.M: Dona Onete é uma pessoa iluminada, uma força da natureza, uma entidade... A conheci pelo youtube e logo me apaixonei e entrei em contato com ela para gravar uma música, dizendo que estava apaixonada pelo Moreno Morenado dela e que queria gravar eu disse: ‘Dona Onete, eu quero este moreno pra mim!’ Ela riu e falou que esse moreno já tinha dona, que era ela, mas que faria um pra mim... E fez !!! Eu Quero Este Moreno Pra Mim foi uma música feita pra mim por ela... Ela nem me conhecia pessoalmente quando a fez, então a nossa empatia foi instantânea, desde o primeiro momento, quando nos conhecemos pessoalmente, na oportunidade da gravação da participação dela, era como se já a conhecesse de longa data, ela hoje é parte da família, todos nós a amamos. Quando fiz o lançamento do Cd no Clube do Choro dia 30 de julho ela estava lá comigo, me abençoando... É difícil descrever, eu sou super fã dela como artista e como ser humano, um verdadeiro presente da vida !

M.T: Quais foram suas influências musicais?
E.M: Foram várias, minha casa sempre foi uma casa musical, meu pai era cantor em Macapá e deixou de lado o sonho para fazer carreira no Banco do Brasil, ele sempre ouviu de tudo e fez questão de nos passar todas as suas influências musicais, então eu já nasci escutando música, jazz, MPB, Bossa, Jovem Guarda, Tropicalismo, Chorinho, mas principalmente as vozes femininas de cantoras que tocaram a minha alma como Elis Regina, Clara Nunes, Alcione, Zizi Possi, Elza Soares, Ângela Maria, Rita Lee, Fafá de Belém... todas fazem parte da minha formação musical. Nossos fins de semana sempre foram regados de boa comida e muita música, minha mãe sempre disse que casa sem música é uma casa triste, eu concordo com ela ! rsrsrs

M.T: Gostaria de dividir uma música com qual cantor ou cantora em um disco futuro?
E.M: Nossa, que difícil essa pergunta, mas adoraria cantar com todas essas que mencionei acima, algumas infelizmente já se foram, ter cantado com a Dona Onete já é uma realização de sonho, mas minha primeira ‘ídola’ foi a Rita Lee, porque aos 8 anos eu não escutava Balão Mágico, escutava Rita Lee, cantava sentindo Shangrilá como se fosse uma pessoa muito vivida...rsrsrs Quem sabe, né ? rsrsrs

M.T: Seu disco de estreia teve muitos sons do Norte, como carimbó, marabaixo e lundu. Aqui em São Paulo praticamente não se ouve esses sons, que é de uma riqueza profunda. Pensa em algum dia vir a fazer um show pelo Sudeste?
E.M: Claro!! Estamos com planos e projetos de em breve, provavelmente no próximo ano, levar esse som pra Rio, Sampa e Belo Horizonte, são os meus próximos planos, já que o lançamento do Cheia de Graça também já aconteceu em Macapá e já está agendada para o primeiro trimestre em Belém.

M.T: Você sonhava em ser cantora ou tinha outra profissão em mente?
E.M: Eu amava cantar, sozinha, pra amigos ou pra uma platéia grande... Mas não tinha maiores pretensões com a música, não havia pensado seriamente na música como fonte de sobrevivência, era um hobby que me realizava, mas eu acho que a arte não é opção na vida da gente, é missão mesmo. A minha consciência a respeito disso agora é diferente, o Cheia de Graça foi um divisor de águas na minha vida, não me vejo mais sem cantar, então, virou um sonho real.

M.T: Como foi o processo de criação do disco?
E.M: Foi uma delícia!! A idéia começou em 1998 quando gravei a canção Mal de Amor, que é um marabaixo lá em Macapá. A partir daí passei a incluí-la no meu repertório aqui em Brasília, com uma grande curiosidade e aceitação do público... Aí eu já sabia que se algum dia gravasse um CD, ele teria como missão trazer à tona ritmos amazônicos justamente porque as pessoas desconheciam e ainda desconhecem essa riqueza brasileira, fruto da nossa linda miscigenação de 3 raças, a branca, indígena e negra que nesse caso se traduz musicalmente, mas que vai muito além da cultura, passa pela religião, gastronomia, comportamento e sabedoria. Como filha amapaense, não posso deixar de me orgulhar disso tudo e de fazer a minha parte divulgando os compositores e esses ritmos maravilhosos.

M.T: De Ellen Oléria a Zeca Baleiro, passando por Dona Onete, Márcia Tauil, Simone Guimarães e Suely Mesquita, sem falar do experiente Celso Viáfora, completam um time de competentes compositores. Você deixou algum compositor  de fora deste disco?

E.M: Mas é claro!!! Vários!!! Compositores do Amapá, Pará, Brasília, Rondônia, Acre, Sampa e Rio estão na minha mira para o próximo trabalho. Me sinto muito privilegiada de ter podido contar com estes maravilhosos compositores no meu disco de estréia.

M.T: Emília, você foi eleita pelo Mais Cultura! como  cantora revelação este ano. Como se sente sabendo deste título?
E.M: Uau!!! Me sinto feliz e muito grata por estar recebendo esse título, mais feliz ainda porque esse título traz à reboque a certeza de que estou no caminho certo intuitivamente...

M.T: O ex-Titã Charles Gavin e  Zé Vaz, do blog Som do Norte, elogiaram assiduamente seu disco. Logo em seguida veio o blog Eu Ouvo com uma crítica apaixonante. O Mais Cultura! saiu na frente e, em abril deste ano (2012), fez um longo artigo sobre seu lançamento (o mais aguardado de todo o Norte / Nordeste), antes mesmo de estar no mercado fonográfico. Essas críticas em relação ao seu disco aumenta a responsabilidade para o próximo trabalho?
E.M: Com certeza! Tive também a alegria de ter o meu Cd resenhado poeticamente por Aquiles Reis (do MPB4), por Mauro Ferreira (do Blog Notas Musicais), o próprio Zeca Baleiro fez um comentário lindo sobre ele. Sei que a expectativa para um próximo trabalho é natural. O que eu posso dizer é que nesse primeiro trabalho, eu só gravei músicas que traduzem a minha verdade, tenho certeza de que é por isso que as pessoas que gostam é porque conseguiram identificar isso. Não será diferente num próximo trabalho, assim como diz Milton Nascimento em Certas Canções : Certas canções que ouço cabem tão dentro de mim, que perguntar carece: Como não fui eu que fiz?! Certa emoção me alcança Corta-me a alma sem dor Certas canções me chegam, Como se fosse o amor.

M.T: Sei que ainda é cedo, mas já está pensando em um novo disco?
E.M: Já estou sim, essa pesquisa de repertório nunca pára pra uma intérprete...

M.T: Na sua opinião, qual o critério para se fazer música no Brasil?
E.M: Eu não sei se eu diria critério, mas a característica principal de quem faz música no Brasil com certeza é a perseverança e a fé, porque ainda vivemos num país que não prioriza a cultura, infelizmente. O artista independente, que não conta com a mídia a seu favor é um herói por definição.

M.T: Qual a maior voz do Brasil na sua opinião?
E.M: Eu não conseguiria dizer uma única voz, mas Elis Regina e Clara Nunes são algumas das vozes que me fizeram querer cantar pra libertar a alma desde pequena.

M.T: Emília, se você se auto definir com uma música de seu disco, qual seria esta música e por que?
E.M: Esse é um disco essencialmente feminino, das 12 canções, 7 foram compostas por mulheres, então todas as músicas me traduzem com certeza, se é pra escolher uma, então eu escolho Cheia de Graça, porque foi por um momento pessoal de superação e mudança de paradigmas que eu decidi fazer o CD, e a canção fala do recomeço: ‘Limpei o pó das cortinas, pus alecrim na janela, vento que passar por ela vai mudar o horizonte... Varri o chão e a soleira, lavei com água de cheiro, passo que eu der aqui dentro vai ser de novo o primeiro... Se me fez chorar não tem de quê, é água que eu uso pra me benzer que eu sou Maria Cheia de Graça’!

Emília, gostaria de agradecer profundamente à você pela simpatia e pelo espaço dado ao Mais Cultura!, concebendo esta entrevista, fechando  com chave de ouro o ciclo de artigos para este ano de 2013.


Até 2014!!!


Entrevista com Emília Monteiro
Por Marcelo Teixeira

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

É melhor ser... Simone!


Um disco atrativo de Simone
Simone voltou e mais bela e confiante do que nunca. Assim a cantora sentencia seu novo disco, aos 63 anos de idade e em plena forma, lançando um disco apenas com músicas de cantoras brasileiras, dando uma reviravolta em sua carreira. É Melhor Ser (2013 / 26,99) tem um desfile de ícones brasileiras, como Angela Ro Ro, Rita Lee, Adriana Calcanhoto, Joyce, Fátima Guedes, Dona Ivone Lara, Marina Lima, Teresa Cristina, Joanna, Sueli Costa, Alzíra Espíndola.  As curvas femininas dão toda a diferença neste disco, que está redondo, como definiu a cantora em entrevistas recentes. O amor parece ser o fio condutor das 13 faixas, com suas calmarias e seus ventos uivantes que reinaram praticamente toda a carreira de Simone. É Melhor Ser é ousado e criativo, feminino e sedutor, capaz de nos envolver já nas primeiras notas do primeiro áudio e este momento sublime da cantora reflete de um modo geral dentro da MPB, que está repleto de cantoras novas, mas sem o brilho de Simone. O disco vem em um momento de transição na carreira da cantora, que vinha de um certo ostracismo, lançando discos atemporais e sem graça e sem o apoio da crítica especializada. Quem acompanha a carreira de Simone não estranhará seu lado autoral neste novo disco que, a propósito, recheia o disco com os privilégios femininos e suas pérolas predominantes do amor. Entre as que ainda não havia gravado destaca-se Mulher o Suficiente, de Alzíra Espíndola em parceria com Vera Lúcia Motta, Os Medos, de Joyce com Rodolfo Stroeter e Haicai, de Fátima Guedes. De Zélia Duncan surge Só se for, belo bolero que Simone também assina a co-autoria, Adriana Calcanhotto surge em Aquele plano para me esquecer e de Teresa Cristina temos Trégua suspensa. É Melhor Ser é um disco diferente na carreira de Simone por ser mais a cara de Simone e voltar aos tempos de estrelato total. Simone ainda continua na ativa, dando um show de interpretação e sendo considerada, ainda, um ícone da música popular brasileira. E para as cantoras novas que surgem a cada esquina sem um pingo de criatividade, aconselho a ouvir esse disco sensacional, com uma voz agradabilíssima e sem estrelismos.

 
É Melhor Ser / Simone
Nota 10
Marcelo Teixeira

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Os oásis de Maria Bethânia


 

Os oásis de Bethânia reunidos
O 50º álbum de Maria Bethânia, Oásis de Bethânia (2012 / Biscoito Fina / 35,00) vem com força total e com um tom de desabafo e fúria por parte da interprete de Cárcara, tamanha a voracidade com que as palavras são jogadas da boca da cantora. A prova maior disso é a regravação de Calúnia, do repertório de Dalva de Oliveira: a letra nervosa já avisa quisestes ofuscar minha fama, até jogar-me na lama só poruq eu vivo a brilhar; sim, mostras-te ser invejo, viraste até mentiroso, só para caluniar. Outro momento de desabafo é Carta de Amor, que, apesar do nome, é na verdade, um aviso dizendo Não mexe comigo, que eu não ando só. Em seguida, santos, entidades e até Jesus, entre muitos outros, são invocados em sua proteção, culminando no fim em um discurso em que afirma que esta pessoa que está tentando derrubá-la não passa de um nada. Maria Bethânia surge ainda mais forte neste disco, depois de lançar inúmeros discos igualmente fortes, com sua voz potente e cortante, mas neste mesmo disco há espaço para interpretações de cunho mais denso e emocional, que é especialidade de Bethânia, como a sensacional Casablanca, de Roque Ferreira e Vive, composta por Djavan. Com este novo trabalho, florido e forte Bethânia reafirma-se como intérprete maior deste Brasil. A sua presença e trabalho ainda é de grande relevância para a nossa música popular, queriam ou não. Oásis de Bethânia se aproxima da literatura, sem afastá-la da música e esse lirismo faz toda a diferença aqui.  O tal oásis de Maria Bethânia fica no sertão, com seu silêncio, seu céu limpo, gente digna e a proximidade de Deus. Com mais de 47 anos de carreira, a cantora lança um disco intimista, como uma capa e cores diversificadas em suas dez faixas e com um sabor de quero mais. O CD traz os seus preferidos Roque Ferreira e Paulo César Pinheiro, além de Jota Velloso (seu subrinho), Djavan (34 anos depois do estouro de Álibi) e dois clássicos: Calúnia, já citado acima e Lágrima, de Orlando Silva. O disco é um dos melhores lançamentos da cantora, que já não precisa mostrar a ninguém sobre sua carreira, trabalho ou algo. Basta fechar os olhos e ouvir os oásis de Bethânia.

 

Oásis de Bethânia / Maria Bethânia
Nota 10
Marcelo Teixeira

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

O Canto Sagrado de Fabiana Cozza


 

Justa homenagem a Clara Nunes
Se viva estivesse, Clara Nunes já estaria com 70 anos, cabelos menos volumosos, talvez mais escuros, pele mais enrugada e nos brindando com seu sorriso encantador. Clara Nunes partiu cedo e deixou um rastro de saudade que não foi preenchido até hoje, mais de trinta anos de sua morte. A lacuna que a cantora deixou jamais será completada e suas músicas jamais terão o mesmo brilho de sua primeira interprete. Clara Nunes não morreu: partiu desta para uma melhor e está viva, eternamente viva, nos nossos corações, mentes e poros. Muitas cantoras se espelharam na beleza no canto da grande Guerreira, assim como muitos cantores também o fizeram, mas negam este destino. Já se foi o tempo em que Roberto Ribeiro, Gonzaguinha, Martinho da Vila ou João Nogueira falavam abertamente que eram apaixonados pela amiga Clara Nunes e que fizeram um samba especialmente à ela. Hoje os cantores mais moderninhos que cantam samba, insistem em dizer ou citar nomes como Dona Yvone Lara, Beth Carvalho, Alcione, mas esquecem da grande dama do samba, a rainha do império, a mestiça cabocla que evoluiu o segmento e que culminou definitivamente o nosso samba aos países aonde jamais imaginiriam que um dia chegaria. Exceto o cantor e compositor Diogo Nogueira, que acaba de lançar um disco inteiramente dedicado às mulheres e que na contracapa fez uma homenagem as mulheres que lhe tornaram um homem completo. Lá tem o nome da Clara, vindo acompanhado das citadas acima e de Clementina de Jesus. Algumas boas cantoras – e outras nem tanto assim – também fizeram neste ano de 2013 homenagens póstumas a cantora, umas com maestria, outras por pura pretensão. Casos como o da cantora Mariene de Castro, que lançou um disco maravilhosamente competente e contemporâneo e que fez desta homenagem uma forma de agradecer ao seu próprio público por esta abertura, tendo em vista que Mariene é uma discípula de Clara. Carla Visi, a cantora baiana que vem do axé fresco e atemporal, resolveu entrar na onda da maré cheia de Clara Nunes para lançar um disco horrendo e feito às pressas, bem característico desta cantora. Com uma capa horripilante e insensível, Carla Visi acabou por completo com as músicas que Clara eternizou, convidando cantores (?) que nada tinham a ver com a obra da homenageada, fazendo disso um dos piores lançamentos do ano. Mas ainda a competência e sensiblidade de uma grande cantora como Fabiana Cozza, vem nos enriquecer com sua potente voz lantente, que adentra em nossos tímpanos sensíveis e oriundos e nos brinda com uma capa deslumbrante, com um festival de músicas maravilhosas e com categoria digna de uma grande estrela da música brasileira. Fabiana Cozza consegue, já na primeira faixa, nos emocionar, nos dirigindo ao cancioneira da cantora mineira, a ponto de nos apaixonar, de nos arrepiar, de nos enaltecer. Fabiana Cozza surge como quem nada quer, nos trazendo um disco magnifico, sentimental e alegre, festivo, bem ao estilo Clara Nunes de ser. Este momento é mágico, porque Fabiana Cozza também é uma adepta do estilo de viver que Clara adotou, fazendo de sua voz e de seu estar, um motivo maior para brindar os fãs e sua própria carreira. Canto Sagrado (2013 / 29,99) é um disco que vem acompado de um DVD e as melhores músicas de Clara estão aqui. Peço atenção para a versão de Fabiana para Portela na Avenida, que ficou sublime, encantadora, arrebatadora. Um fiel trabalho de uma grande artista representando uma diva da música popular brasileira para fechar o ano com chave de ouro. Fabiana soube, milimetricamente, utilizar seus artificios para nos brindar com um disco a altura de seu talento. Voz primorosa, harmonia ginasial, músicas de embelezamento mútuo faz deste disco um presente de luz, um presente divino, um presente saboroso. Que este belo trabalho não seja menosprezado e que muitos possam ouvir, apreciar, comentar, admirar, respirar o ambiente deixado por Clara, sendo agora transpassado por Fabiana Cozza. Um digno e fiel respaldo de Canto Sagrado faz deste trabalho a maior dentre as honrarias feitas para Clara, sem diminuir aqui o trabalho (fiel, sedutor, carimbado, festivo) de Mariene de Castro. Clara Nunes, no meio deste mundaréu de céu e brancas nuvens, está sentindo o povo aqui embaixo celebrando seus 70 anos de vida e ela nos agradece sorrindo, respirando o nosso ar. Viva ela está. No nosso coração e no coração de quem a homenageia diariamente. Viva Fabiana Cozza! Viva o Canto Sagrado de Clara Nunes!

 
Canto Sagrado / Fabiana Cozza
Nota 10
Marcelo Teixeira

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Gonzagão e Gonzaguinha juntos em disco memorável


 

Pai e filho unidos pela música
Um dos mais emblemáticos cantores de todos os tempos, Gonzaguinha foi um líder político, revolucionário, arquitetando brilhantemente suas canções conforme ia avançando o Brasil numa forma ainda mais emblemática e hostil. Lançado ainda em vinil em 1991, este disco traz belos momentos de Gonzagão e Gonzaguinha, pai e filho, dois dos mais importantes nomes da Música Brasileira. São ocasiões de sociedade que privilegiam composições de Gonzaguinha e a poderosa voz de Luiz Gonzaga, destacando alguns sucessos, e transparecendo uma combinação que teria rendido maiores contribuições à cultura brasileira se não fossem os conflitos que mantiveram pai e filho em caminhos de incompreensão e desafeto por muito tempo. A maior parte das canções é de leituras do pai sobre o trabalho do filho ainda entre 1970 e 1980. No repertório estão pérolas como A vida do viajante (Luiz Gonzaga/Hervê Clodovil), Mariana, Não vendo, nem troco e Eu e minha branca, compostas e interpretadas por Gonzaguinha e Gonzagão pela dupla; From United States of Piauí, Diz que vai virar, Pobreza por pobreza, Lembrança de primavera, Erva Rasteira e a belíssima Festa, compostas por Gonzaguinha, são interpretadas por Gonzagão; Pense n’eu, composta por Gonzaguinha, é interpretada pelos dois – uma das músicas mais belas da compilação; A triste partida (Patativa de Assaré) completa o disco com seu tom de reflexão social, tema bastante forte na obra de Gonzaguinha e na luta de Luiz Gonzaga pelo povo nordestino. Gonzagão & Gonzaguinha Juntos (1991 / Sony / 29,99) é uma coletânea recomendável para o fã de Gonzaguinha que busca conhecer seu lado menos obscuro, tendo em vista que estas canções, mesmo falando da realidade brasileira, são mais leves e ganham a espontaneidade de Gonzagão em interpretações singelas e verdadeiras. Os bustos sociais dos calvários fluminenses e do açoite sertanejo, respectivos berços de Gonzaguinha e Gonzagão, são porta-vozes destes dois importantes artistas que representam um país inteiro com uma música original. Juntos, abraçaram suas dores e seus conflitos, se reconciliaram e permitiram parcerias memoráveis que poderiam render mais frutos se a vida não os tivesse afastado tantas vezes.

 

 

Gonzagão & Gonzaguinha Juntos / Luiz Gonzaga e Gonzaguinha
Nota 10
Marcelo Teixeira

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Álibi (1978), de Maria Bethânia


Grande disco de Bethânia
Toda grande cantora merece um grande disco e com Maria Bethânia não poderia ser diferente. Primeiro disco de uma cantora brasileira a ultrapassar a marca de 1 milhão de exemplares vendidos, antes Clara Nunes chegou a atingir o número com dois discos, Álibi (1978 / RCA / 23,99) leva o nome de uma música composta por Djavan e incluída no repertório que fez menos sucesso que as outras interpretações da cantora, como O meu amor, de Chico Buarque, Ronda, de Paulo Vanzolini, Explode Coração, de Gonzaguinha, Negue, de Adelino Moreira e Enzo de Almeida Passos ou Sonho Meu, de dona Yvone Lara e Décio Carvalho, que tem parceria com a amiga Gal Costa. A selecção de músicas que garantiram o sucesso deste disco e a passagem definitiva de Bethânia como a maior estrela da música nacional veio com este álbum romântico, que tem a abertura de Diamante Verdadeiro, canção de Caetano Veloso, que mais tarde dara nome a outro disco da irmã e De todas as maneiras, do mestre Chico, e a canção que saúda o Rio de Janeiro, na bela A voz de uma pessoa vitoriosa (Caetano e Wally Salomão. O disco na verdade é uma pérola de achados musicais, contando ainda com a arrepiante Cálice, que tem veia política e crítica sobre a ditadura, composta por Gilberto Gil e Chico Buarque e Interior, da compositora Rosinha de Valença. Neste grande disco, o nome Maria Bethânia está impresso em branco, enquanto o vinil traz o encarte com o nome impresso em dourado vermelho. Vale a pena ter este disco em sua coletânea. Não por ser um disco que ultrapassou barreiras, nem por ser um disco repleto de compositores bons, mas por ser um disco histórico.

 

Álibi / Maria Bethânia
Nota 10
Marcelo Teixeira