segunda-feira, 30 de junho de 2014

As verdades de Marisa Monte


As verdades de Marisa
Marisa Monte soube aproveitar boa parte do repertório de Verdade, Uma Ilusão (2014 / EMI / 24,99 ) para atrair o grande público, trazer de volta os fãs dispersos, fazer nova turma de fãs e angariar novas aventuras. Marisa Monte não é mais aquela cantora de início de carreira que tenta ser a nova queridinha do momento: ela tem estrada, chão e personalidade. Mas no decorrer do tempo, a cantora perdeu fãs para outras cantoras em atividade mais recente e isso deve-se muito ao fato da cantora demorar para lançar discos: os fãs se dispersaram e Marisa Monte deixou de produzir discos maravilhosos como as do início de sua carreira brilhante. É evidente que O Que Você Quer Saber de Verdade (2011) e Infinito Particular (2006) foram discos lançados com pompa de grande estrela, mas sem o quilates de público e crítica, diferentemente de Universo ao Meu Redor (2006),  que foi recebido com críticas positivas e com muita aceitação no mercado fonográfico. Aqui Marisa Monte se reinventa da melhor maneira possível: o jeito de ser Marisa Monte. Assim como fizera com Barulhinho Bom (1996), a cantora trouxe para este novo lançamento canções que já cantou em outros álbuns, sem grandes pretensões e sem grandes alardes. Com interpretação magistral, a cantora não dispensa seu timbre com o fraco repertório do disco anterior e realça obras-primas solúveis de outros tempos.  Mas o que Marisa fez foi extraordinário: pincelou aqui e ali músicas de seu repertório em discos que cairam no esquecimento do grande público e as cantou de modo absoluto, nunca antes regravados por ela ou por outro cantor, exceto E.C.T, imortalizado na voz de Cássia Eller. Da cantora californiana radicada no México Julieta Venegas vem Ilusão, uma doce canção de amor que teve versão da própria Marisa com o ex-titã Arnaldo Antunes. Entre uma canção e outra de O Que Você quer Saber de Verdade, surgem as pérolas como Diariamente, do CD Mais (1991), De Mais Ninguém, do CD Cor de Rosa e Carvão (1994), eleito até hoje um dos melhores da cantora, Arrepio, do CD duplo Barulhinho Bom (1996) e as populares Gentileza e Não Vá Embora, do CD Memórias,  Crônicas e Declarações de Amor (2000). Ainda tem uma regravação em italiano de Sono Come tu mi vuoi e depois disso nada mais é legal de ouvir. O disco é morno e não chega a ser considerado um novo Barulhinho Bom, que tem formato mais animado e menos popular.  Mesmo sendo um disco completamente tíbio, a cantora já lidera com mais um feito: Verdade, Uma Ilusão já é disco de Ouro, coisa normal na carreira magistral de Marisa Monte. Talvez o único defeito seja escolher um repertório tão fraco e menos visceral para tentar prender a platéia. Poderia ousar mais, colocando músicas mais animadas, dançantes ou então fazendo roupagens novas porque até a respiração de Diariamente é igual a gravada originalmente em 1991, com as mesmas entradas e saliências. Assim como De Mais Ninguém, que mais se parece com uma canção de Paulinho da Viola, mas é uma grande música da cantora com Arnaldo Antunes que fala das dores do amor abandonado, tem a mesma melodia da anterior. Se Marisa Monte ousasse ainda mais no capricho de suas canções, na certa este seria o disco do ano. Mas por enquanto, a verdade aqui é apenas uma ilusão.

 


Verdade, uma Ilusão / Marisa Monte
Nota 8
Marcelo Teixeira

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Entrevista: Luiz Marques


Luiz: grande músico*
Luiz Marques nasceu em Patos de Minas, em Minas Gerais e é desde lugar mais barroco do Brasil que o cantor e compositor concede uma entrevista para o Mais Cultura Brasileira. Cantor dos mais experientes do mercado fonográfico atual, Luiz Marques carrega na bagagem quatro discos importantes para a MPB: O Giro da Roda de Fogo (2000), Sentimento em Cor (2005), o que leva seu próprio nome, Luiz Marques, lançado em 2009 e o mais recente, Mira Certa, lançado em 2012. Poeta nato, o cantor revela detalhes de sua carreira, visceral e única e nos ensina que viver musicalmente é um dos dons mais divinos que existe. Luiz Marques é um dos melhores cantores e compositores de seu tempo e este talento já é comprovado por sua carreira composta de muita música, brasilidade e carisma. Em suas palavras, teria qualquer profissão pensando na música e gostaria de ouvir uma música sua na voz de seu maior cantor, Milton Nascimento. Com vocês, Luiz Marques!


Marcelo Teixeira: Quem é o Luiz Marques?

Luiz Marques: Uma pessoa em busca de seu significado maior e melhor e que assim segue pretendendo ser útil ao universo através de seu ofício.

M.T. O que pensa ou em quem pensa enquanto compõe suas músicas?

L.M. Isso depende muito do momento, pois toda inspiração surge de maneira espontânea, de algo que ocorre no dia a dia ou nas observações mais amplas de fatos que atingem a nossa percepção e de alguma forma nos toca e move os sentimentos. Para se ver livre da angústia ou alegria criada, surge a urgente necessidade de entender melhor e exteriorizar esta emoção em forma de poesia e música.

M.T. Se você não fosse músico, seria...?

L.M. Carpinteiro , pintor ou médico. Todas as funções seriam exercidas pensando em ser músico.

M.T. Qual a maior voz do Brasil?

L.M. Milton Nascimento.

M.T. O lirismo poético assim como as críticas contra o sistema opressor caminham juntas em seus discos. Prefere compor sobre a poesia ou sobre as mazelas que assolam nosso país?

L.M. Os dois temas são instigantes e dão margem a um enorme material investigativo. Minha opção é sempre, a princípio, inconsciente, pois o que interiormente está incomodando mais e precisa sair é a escolha visceral que vai emergir na forma de uma canção.

M.T. Mira Certa ganhou projeção maior em sua carreira, demonstrando o quão valioso é o seu trabalho como artista. Pensa em fazer shows pelo Sudeste?

L.M. Estou realizando uma segunda turnê de divulgação do DVD Mira Certa e cidades do sudeste como São Paulo , Ouro Preto e Belo Horizonte estão no roteiro.

M.T. No disco Luiz Marques lançado em 2009, você homenageia Minas Gerais na música Ser Tão Cidade. De Minas saíram alguns dos melhores músicos brasileiros e você se inclui nesta lista. Minas é o seu porto seguro musical?

L.M. Sim com toda certeza! Tanto o interior, o vasto sertão, a geografia única com suas surpreendentes montanhas, como também a capital Belo Horizonte, onde resido já por vários anos,são fontes inesgotáveis de inspiração. E principalmente bebo do mistério que vive oculto na voz e no silêncio deste povo, na força do barroco que pulsa nas veias das pessoas e nas ruelas das cidades históricas, enfim nas Minas Gerais, estes profundos poços onde nós mineiros vamos buscar o ouro de nossa existência!

M.T. Cantor, compositor, arranjador e violonista. O que mais falta fazer em sua carreira?

L.M. Fazer chegar minha música a todos que possam e tenham interesse em ouvi-la. Penso que o exercício deste ofício, que não é muito bem compreendido pela sociedade em geral, requer de todos nós que somos persistentes e meio malucos sonhadores (como Dom Quixotes musicais) muita energia e abdicação para continuar, pois os obstáculos são muitos e já conhecidos, então os sonhos e a dedicação têm que ser altaneiros e bem maiores, para viabilizarmos a continuidade da carreira.

M.T. Gostaria de dividir os vocais com qual cantor ou cantora?

L.M. Com o Milton Nascimento, mas não dividir e sim ouvi-lo cantando uma composição minha. Por que? Por sua história musical e maravilhosa voz.

M.T. Você já escreveu músicas para festivais e peças de teatro. Pensa em retomar esse hábito?

L.M. São segmentos dos quais me afastei bastante, mas não descarto estas possibilidades, pois um convite neste sentido pode ser um catalisador de buscas imaginativas para retratar novas emoções.

M.T. A religiosidade é muito forte dentro de você, tanto que compôs em homenagem à Santa Terezinha. Essa fé faz com que a sua música soe como regional. Tem medo de rótulos ou não gosta de ser rotulado?

L.M. Não tenho restrições quanto a ser ou não rotulado. Penso que quando o artista se expõe está oferecendo a possibilidade de variada interpretação de sua obra, principalmente os autorais como é o meu caso.

M.T. De todas as suas músicas, qual você acha a melhor?

L.M. Aí você me pegou! È como escolher de qual filho você gosta mais rss. Muitas canções minhas me deram alegrias especiais, mas prefiro manter todas no mesmo patamar, para não haver ciúmes entre elas.

M.T. Recentemente, escrevi um artigo no qual dizia que você era um cantor a altura do Brasil. Se sente injustiçado às vezes por sua música não poder chegar mais longe?

L.M. Não, pois conhecendo o atual cenário da indústria fonográfica e suas mazelas, penso que a injustiça é feita ao povo brasileiro que, na maioria das vezes, é refém de uma péssima inclinação da mídia que impõe uma música rasa, comercial e sem sentido em seus amplos canais de alcance como tv´s e rádios. Uma lástima, pois estes veículos são( na maioria das vezes) concessões estatais e deveriam formar, informar e ampliar os horizontes culturais de toda uma nação, mas o que vemos é bem o contrário. Eu e tantos companheiros de estrada que por opção fizemos a escolha de realizar um trabalho mais profundo, de melhor qualidade musical e poética estamos na luta pela possibilidade de mostrar com mais evidência o resultado de nossos esforços. O que nos move é saber que quando esta opção é dada aos ouvintes a receptividade é excelente, então acho que estamos no caminho certo!

M.T. Música é arte e você o faz brilhantemente. Por que resolveu ser musico, Luiz?

L.M. Acho que todo artista, principalmente os músicos, têm um parafuso a menos ou a mais no cérebro! Pense bem, a música é algo intangível, não paupável e que você não pode ver! Toda vez que você toca uma canção ela sai de uma maneira diferente, não é como um quadro, livro ou escultura que tem um toque final definitivo. É das artes a mais instantânea e incerta! Toda vez que você está em ação, no palco, tudo pode acontecer desde uma belíssima interpretação e um excelente show ou então uma tragédia, como quando você está rouco, sem voz ou acontece um piripaque no sistema de som e ninguém ouve mais nada. Ainda bem que temos os CD´s e DVD´s que registram as nossas performances, mas é no dia a dia que realmente exercemos nossa arte. Então até hoje eu me faço esta pergunta: por que resolvi ser músico?

M.T. Fazer música é..

L.M. ... padecer no paraíso, vivendo intensamente o que a vida tem de melhor! Agradeço, de coração, seu convite e parabéns por continuar assim, enfatizando e divulgando a nossa música brasileira! Grande abraço Marcelo Teixeira!

Luiz, muito obrigado pela entrevista. Um super e enorme abraço. Marcelo.

*foto de Renata Samarco.


 

Entrevista com Luiz Marques
Marcelo Teixeira

terça-feira, 24 de junho de 2014

A falsa baiana: Claudia Leite


 

Senta lá, Claudia!
Sinto pena da Claudia Leite, agora denominada Claudia Milk, talvez para ficar internacionalmente conhecida. Senti vergonha alheia de ver Claudia Leite, Milk ou o que seja, dançando, pulando, erguendo os braços num grito de gol. Foi uma fatalidade total ver a falsa baiana vestida de azul cravada de diamantes, enquanto a nossa bandeira é verde e amarela. Graças a um erro da Fifa, a cantora foi selecionada para abrir a Copa do Mundo aqui no Brasil e fazer de sua imagem uma seda rasgada, deteriorada e senil. Claudia Leite, ops, Milk, estava apagada, mal iluminada e com uma roupa cafona que custou metade daquele estádio. Sem estilo, a cantora não teve sintonia com as músicas, com o estádio, com a cantora Jennifer Lopez, com os torcedores: sua maquilagem estava carregada e seus olhos estavam mortos. Mas há vários motivos do porque Claudia não poderia ser eleita a cantora para a abertura da Copa: ela não tem estilo, não tem carisma, nem empatia, muito menos simpatia. Seu semblante é de uma pessoa depressiva, de poucos amigos. Falsa baiana que é, a cantora carioca até canta, tenta demonstrar carisma, mas não passa de uma ilusão à toa. Centrada em cantar pérolas brasileiras, a cantora demonstrou que precisa estudar o repertório que não conhece ou não teve tempo de conhecer e que precisa ser mais brasileira para ocupar o espaço de uma verdadeira estrela. Mesmo assim, Claudia subiu e cantou, mesmo que para risos esfuziantes da platéia ou do telespectador do mundo inteiro. Com tantos nomes muito mais relevantes e intelectualizados no país, por que a Fifa chamou logo Claudia Leite, uma cantora que não tem aquele charme e nem aquela pureza de cantora baiana? Ivete Sangalo e Daniela Mercury estavam livres para aceitar o convite, assim como Maria Rita, Gal Costa ou Zizi Possi. Chico Buarque, Caetano Veloso, Milton Nascimento e Gilberto Gil estavam totalmente desocupados para ocupar o lugar daquele cantor que só agitava os braços. E por que chamar uma cantora do porte de Jennifer Lopez, se temos muito mais capacidade de ter ali uma cantora nossa? Se a Fifa não tem respostas, eu tenho: a Fifa não é brasileira e isso todos nós sabemos. Escolheu cantores, artistas, figurinistas, pessoas e crianças estrangeiras e demonstrou, a torto e a direito, que não conhecem o nosso país. No final de tudo, acho que a razão até esteja com Claudia, quando canta no trecho em português de We Are One: Não importa o resultado, vamos extravasar! Rainha do pior axé music de todos os tempos, a única coisa que resta aos brasileiros e a própria cantora é extravar e rezar para que o Brasil ganhe a Copa. Não importa para os amantes da MPB, o resultado final: o importante aqui é que a música produzida por Claudia Leite é da pior qualidade, mesmo ela ganhando dinheiro e muito dinheiro. Perante o vexame de ver Claudia Leite cantando no centro do mundo, tive a certeza de que estamos falidos musicalmente, ao menos naquele momento em que ela se requebrava. Pensei na luta de cantores que tentam um espaço para sobreviver e pensei na paz do mundo se não tivessemos uma Claudia Leite.

 

A falsa baiana / Claudia Leite
Marcelo Teixeira

quinta-feira, 19 de junho de 2014

O Brasil de Gog e o choro de Maria Rita

Gog: uma voz na multidão
Há uma certa emoção e um pouco de alívio ao ouvir o cantor de rap Gog, estrela entre as estrelas do mundo das rimas perfeitas, quando ele canta a música Brasil com P, canção que é totalmente cantada pela palavra P no seu início. Gog é um cantor da periferia, das massas pobres que pensam, dos proletáriados que acordam cedo para ganhar o pão de cada dia, das mulheres fortes, dos homens comuns. No Brasil sempre houve cantores políticos: Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Criolo, Seu Jorge, mas o mais político foi Gonzaguinha e vendo Gog cantar o que canta hoje, sinto que a música popular brasileira, sem rotulagem, se transforma em um Gonzaguinha dos gritos esbaforidos, do beijo na bandeira amarrada num saco plástico, no homem de olhar atento e arregalado que espera  a mulher passar para passar em seguida. Gog é um nome forte contra o governo nacional, contra as mazelas e cóleras que assombram Brasília, que luta a favor dos pobres e discrimina a elite denominada de grandeza secular que insiste em comandar o país. Um cantor verdadeiramente brasileiro, desses raros que encontramos no cenário nacional, dos poucos que dão a cara a bater e que não tem medo do que canta. Aliás, Gog canta, escreve, contesta, irrita, anima, estimula e cresce quando sua voz emerge nos palcos cantando justamente sobre os problemas sociais que estão aqui, ali, na esquina, nos bares, na vida pública e privada de todos nós. Gog nasceu em Brasília e seu nome de batismo é Genival Oliveira Gonçalves e desde os anos de 1990 tenta trilhar um caminho destinado à música. Conseguiu com grande mérito se tornar hoje um dos grandes nomes nacionais do rap, movimento que causa furor e constrangimento para a chamada classe burguesa. Mas Gog é muito mais do que uma abreviação: ele é a música em pessoa. Ao ouvirmos a música Brasil com P, temos a nítida sensação de que era disso que precisávamos para acordar e dizer que o Brasil é uma grande frustração e ao mesmo tempo uma grande nação. Mas há também, como contesta a canção, o homem trabalhador que acorda cedo e busca melhorar seu dia com muito esforço, mostrando que aqui e ali há peças fundamentais para o andamento do país. Contradizendo a história, Brasil com P tem dois elementos básicos representativos ontem, hoje, amanhã e sempre: o preto, pobre e periférico contra o político privilegiado  que recebe todas as honrarias e méritos que o preto e pobre deveria honrar. Se não fosse o bastante, Gog conseguiu transformar Brasil com P em uma obra-prima ao compor a música toda pela letra P, fazendo deste momento uma história comum e real de duas esferas humanas e irracionais. A canção por si só e na voz magistrosa, poderosa, firme e decidida de Gog já valeria por milhões e milhões de canções politizadas existentes no mundo, mas a participação definitiva, corajosa e rica de Maria Rita fazendo coro ao fundo, ganha um brilho a mais e faz com que Brasil com P seja uma música forte, certeira e um hino contra a magistração irregular do homem poderoso e viril. Maria Rita não canta, mas empresta sua voz para ser a mulher que chora num lamento fúnebre, arrancando arrepios e sensações adversas ao tentar balbuciar algo que está preso em sua garganta. Após a explosão de Gog, a música encerra e o sopro de Maria Rita se cala. Gog a abraça num acalanto. Brasil com P é isso: um peso na consciência de quem muito deve e um sopro de alívio de quem nada teme.
 
 

Brasil com P / Gog e Maria Rita
Nota 10
Marcelo Teixeira

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Tito Marcelo e sua leveza poética em Pra Ficar no Sol (2014)

O lançamento do ano
Tito Marcelo é um desses cantores que nasceram para encantar: sensível, carismático, letrista, poeta, brasileiro. Nascido em Recife, Tito mora em Brasília e é da capital federal que surge mais um cantor de primeira grandeza na música popular brasileira. Pra Ficar no Sol (2014 / Independente / 23,00) é um disco interessante, irresistível, caprichado, moderno e com uma capa incrível. Aqui está todo o universo magnífico de Tito Marcelo, que se baseou nas estruturas do amor e na brejeirice das levadas infantis para compor boa parte do álbum. Pra ficar no sol não é um disco qualquer: é um disco produzido por um homem capacitado de nos fazer crer que música de qualidade se faz com respeito e lealdade. Tito Marcelo usa toda a sua criatividade e intuição para fazer um dos discos mais belos do ano de 2014 e esta lista já está encabeçada por outros bambas da música nacional, mas Tito conseguiu entrar neste seleto grupo por todo o seu conjunto: Pra ficar no sol é uma obra-prima brasileira!  Álbum surpreendente, Tito Marcelo nos trás um dos CDs mais encantadores dos últimos anos e carrega na bagagem estrutura suficiente para ser considerado um cantor de grande porte atualmente. Compositor de todas as treze faixas, Tito é um cantor que propõe um código musical muito original para a cena brasileira, sem abrir mão de sua inquietude artística, que confere em uma ligeireza absolutamente natural. Ouvir Tito é ter a certeza de que não vivemos em um país bucólico e sua voz é um conjunto de vibrações positivas quanto inspiradoras. Não há dúvidas de que a música brasileira fica mais rica com este belo disco de Tito Marcelo, até mesmo porque ele é todo contrabalanceado entre estilos modernos e atuais sem perder a compostura. Alinhado do começo ao fim, o disco tem a obra-prima Rua Jaguaribe como sendo uma das melhores, mas não podemos nos basear apenas nesta faixa.   
Tito Marcelo e Gabriela Doti: belas vozes
sincronização entre a música de Tito e a atual situação musical do país: aqui todas as músicas fazem um contexto geral sobre o amor, a poesia, a coesão entre o belo e a infância perdida e entre o sonho e o amor. O cantor é rico em detalhes, como desfila na música Quando Nada é o que me Falta, linda canção romântica que Tito o canta com maestria, vontade, sabedoria e inspiração. Destaque também para a primorosa Adonde El Viento Vá, que tem a participação mais que especial da cantora e compositora Gabriela Doti, com sua voz sensual, doce, melódica e que complementa com o carisma vocal de Marcelo: ele fazendo coro em língua nacional e ela em língua espanhola. Essa junção de vozes entre o homem e a mulher, entre Tito e Gabriela, entre língua nacional e língua espanhola, entre faz toda a diferença no disco, que fecha com chave mestra, porque temos dois grandes momentos do álbum: a revelação Tito Marcelo (mesmo com outro CD já lançado na praça) e a poesia lasciva de Gabriela Doti, uma cantora peculiar, que fala a língua espanhola e inglesa com fluência e conhece a cultura brasileira como um todo e respira o mundo de Tito de perto. Respirar o disco de Tito Marcelo é ter a certeza de que estamos respirando o melhor da música brasileira produzida atualmente: uma música bilionária, consciente, plena, determinada. Dancem ao som de Tito Marcelo; pulem ao som de Tito Marcelo; beijem ao som de Tito Marcelo. Aposto que você vai se apaixonar por este disco simplesmente maravilhoso.

 

Site do cantor: www.titomarcelo.com

 

Pra Ficar no Sol / Tito Marcelo
Nota 10
Marcelo Teixeira

sexta-feira, 13 de junho de 2014

Os malabaristas de João Bosco (2002)


Ótimo disco de João Bosco
Se Elis Regina estivesse viva, na certa gravaria Malabaristas do Sinal Vermelho ou qualquer música deste CD feito por João Bosco em parceria com o filho Francisco. O clima relativamente calmo e suave, encadeado por baladinhas e bossas com cores de jazz não se parece com tons monocórdicos. Malabaristas do Sinal Vermelho (2002 / Sony Music / 22,00) é um clássico já no título do álbum. A capa vermelha nos dá a impressão certeira de que estamos diante um disco inquieto, intrigante e irresistível. E o é! João Bosco é um importante cantor da atmosfera brasileira e suas músicas foram cantadas por vários cantores de diversas gerações da MPB. Elis, considerada por muitos como a maior cantora de todos os tempos da música brasileira, foi a recordista em gravar canções do cantor e compositor e se viva estivesse, na certa cantaria com gosto e maestria qualquer música de Malabaristas. O disco nos fixa diretamente nos olhos e nos enquadra com um sorriso no canto da boca, como se João estivesse ao nosso lado, observando nossa cara de espanto e alegria conjuntas. Aqui temos um João sem disfarces nem adornos e seu estilo visceral para contar histórias está cada vez mais ácida. O conteúdo de Malabaristas do Sinal Vermelho é um livro aberto para quem quiser ler e suas músicas representam o que há de melhor na esfinge musical universal. Posto em evidência, João busca em sua música o homem delicado e sensível, moderno e jovial, adjetivos raros em tempos de velhice artistíca. João Bosco não tem pressa e o ritmo é calmo, ultrabalanceado com salsas e merengues, mineirices e carioquices e o resultado é simplesmente brilhante, divino, sensacional. O mestre João deu o recado e a carapuça serviu para quem quisesse. Há malabaristas espalhados por todos os cantos, como atesta o disco, não apenas nos semáfaros e esquinas, mas sim dentro de nossas casas, na casa do vizinho, no trabalho, na música. O eco de sua música nos deriva de qualquer suspeita momentânea: João capta os melhores ruídos e nos brinda com o melhor de sua música. Cada melodia tem um estilo monárquico de dizer algo, seja no campo amoroso, seja no campo político. Os malabaristas de João, assim como os escafandristas de Chico Buarque estão espalhados por todos os lados, por todos os campos, por todos os subníveis. Inclusive do seu.
 
 
 
Os Malabaristas do Sinal Vermelho / João Bosco
Nota 10
Marcelo Teixeira

segunda-feira, 9 de junho de 2014

O bolero brasileiro de Dani Calazans


O bolero de Dani Calazans
Dani Calazans é atriz, cantora, compositora, roqueira e defende com voz e categoria boa parte do cancioneiro da música popular brasileira ao lançar o CD Hard Bolero (2014 / Independente / 22,00), em que retrata toda a sua dramaticidade em um cabaré alemão. Dani é uma das melhores cantoras surgidas nos últimos anos dentro da MPB e sua voz é um afago tão tocante quanto certeira, tão imensa quanto duradoura, tão atual quanto sensível. Dani Calazans é uma cantora completa, reveladora, simples e determinada. Hard Bolero é um disco que não pode ser passado em branco: você precisa ouvir! Ouvir com atenção, com vontade, com garra, porque esses adjetivos são transpassados por Dani Calazans em todas as faixas do álbum. Com ênfase nas mazelas do Brasil, como na irresistível Classificados, passando por sua feminilidade com a música Salto Agulha, Dani dá um toque diferenciado na manjada Non, je ne regrette rien, que fecha o disco com chave de ouro. Antenada entre as artes cênicas e a música que dança em seu corpo, a cantora se inspira nos cabarés alemães para fazer um disco altamente brasileiro, sendo totalmente díspare daquilo que estamos acostumados a ouvir na música nacional. A grande sacada de Dani foi justamente essa: ser e fazer algo diferente. Hard Bolero é um disco de primeira grandeza e traz a cantora em um momento em que a música precisava de renovação: a voz, o estilo, a verdade de Dani Calazans surge em um momento ideal para a salvação da música brasileira. Com uma poesia rica em detalhes poéticos quanto observadora em idílios reveladores como a música Lagoa, a cantora passa a ser uma artista que admiro imensa e profundamente. Dani transmite a verdade e verdade significa música de primeira grandeza. Cada vez que ouço Dani Calazans, mais suas músicas me tocam, me atiçam, me deixam em plena felicidade. Hard Bolero é uma obra-prima a qual comunga a ideia de arte, musicalidade, teatralidade e poesia.  E é nesse meio todo que Dani Calazans, uma grande cantora, se firma como uma artista brasileira.

 

Hard Bolero / Dani Calazans
Nota 10
Marcelo Teixeira

quinta-feira, 5 de junho de 2014

O barulhinho bom de Marisa Monte


 

Marisa: barulhinho muito bom
O ano de 1996 foi de Marisa Monte. Barulhinho Bom (1996 / 29,99) causou tanto barulho, que foi obrigado a ser lacrado para não mostrar as fotos sensuais que o encarte trazia. Em países como os Estados Unidos, o disco teve que ser embalado em plástico preto, enquanto que aqui no Brasil, algumas lojas embalaram com plásticos rosas. Barulhinho Bom é um disco gravado ao vivo, duplo e com o melhor de Marisa Monte, mesclando músicas inéditas com o universo já particular da cantora, cantado em discos anteriores. Este é, sem sombra de dúvidas, um grande trabalho de Marisa e a complementação de Cor de rosa e carvão, seu disco anterior, foi gravado no Teatro  Guararapes, Recife e Carlos Gomes, no Rio de Janeiro.  É muito gratificante ouvir músicas inéditas como Panis et Circenses, De Noite na Cama, A Menina Dança e Give me Love na sua voz, que casam muito bem com sua voz e sua doutrina como cantora. Já nas canções de seus repertórios antigos, o álbum conta com Segue o Seco, Bem Leve e Xote das Meninas. Destaque para Arrepio, Maraçá e Magamalabares, que são sensacionais. Um disco indispensável na prateleira de qualquer pessoa que preza e respeita a música brasileira. Disco sublime, maravilhoso, simples, brasileiro e tem um barulhinho bom que somente Marisa Monte consegue nos transpassar. A intimidade de Marisa para com as músicas fez com que o público e a crítica especializada logo reconhecesse o extraordinário talento da cantora mais uma vez. Cantando melhor que o disco anterior, Marisa surpreendeu com este disco ao vivo cheio de magia e emoção.  Mais autêntica do que nunca, Marisa se sente leve e solta neste disco com ar de quero mais, em um clima contemporâneo e delicado. Bom de ouvir do começo ao fim, Barulhinho Bom reflete o que há de melhor no cancioneiro desta grande cantora ultra-moderna.  De Caetano Veloso, passando por Ed Motta e Paulinho da Viola e encontrando mais abaixo com os Novos Baianos, Barulhinho Bom é um disco que remete à qualidade artistica de uma das grandes intérpretes que o Brasil tem. Marisa Monte comprova todo o seu brilho matinal em um disco altamente qualificado, sem deixar cair na mesmicie que muitas cantoras de sua época cairam. Marisa Monte transforma um barulhinho bom em um barulhinho encantador.

 

Barulhinho Bom / Marisa Monte
Nota 10
Marcelo Teixeira

segunda-feira, 2 de junho de 2014

Alberto Salgado: sopro novo na MPB


 

Além do Quintal: obra-prima
Se o homem foi feito para cantar, este homem é Alberto Salgado: sua voz é um alento e uma salvação para a música popular brasileira, na qual impera na sua maior riqueza o núcleo formado por bela vozes femininas. A leveza de suas músicas, poéticas na sua maioria, e a voz firme e grave, contrapõe um alto peso na sua musicalidade: um ritmo cadenciado de sambas, uma mistura heterogêna de notas e um emaranhado sincopado de elementos que neutralizam nossa alma, a ponto de sairmos cantarolando e sambando ao seu som. Impossível não resistir aos encantamentos musicais de Alberto Salgado: ele nos arremata já na música que abre o disco Além do Quintal (22,00 / 2014), Pra Você Sambar. Alberto é um sopro natural de calmaria em meio à fúria de sons tão distantes que assolam nossos ouvidos e que tem identidade própria ao desencandear um filandeiro de obras-primas deste álbum encantador. Trezes faixas embalam Além do Quintal, sendo todas de sua autoria ou em conluio com outros parceiros. Mas sua assinatura é pessoal e intransferível e essa mágica é que faz toda a diferença no disco. Alberto experimenta tons sambísticos neste disco, o que o deixa muito bem à vontade para cantar e compor melodias saborosas, com uma leveza pop sobre canções de amor.  A maneira de expressar emoções de forma delicada e poética surge em praticamente todas as canções e demonstra toda a sensibilidade rara do cantor ao abordar músicas como Planta Collhe 4 ou na encantadora Marinheiro. Há um peso de responsabilidade aqui, porque Alberto Salgado não é qualquer cantor. Com voz delicada, mas puramente intensa, valendo-se de um timbre de beleza aguda, ele canta com apurada gentileza e sabedoria. Sua afinação vai às

Alberto: sopro novo na MPB atual
notas como a seta ao alvo. Ouvi-lo é como um elogio à compotência caracterizada dos cantores brasileiros no exercício de seu ofício. Dois grandes momentos de seu disco estão em Pele do Mar, onde há uma conjuntura de frases ritmadas e jogo de palavras cruzadas e Sambaião, por onde os versos cantados diversificam que tudo o que é cantado vira samba. Alberto Salgado é um consagrado cantor, que consegue energizar toda a plateia que o prestigia nos seus aplaudidos shows realizados em Brasília, na capital federal. A palavra cantada, na sua vez, é uma arma direta e certeira para aproximar as pessoas e transmitir seus glorificados pensamentos em prol do bem comum. Sendo assim, a música popular brasileira se rende ao cantor que nos fascina com um disco a altura de seu talento e que consegue nos dobrar de joelhos pedindo bis para que o show não termine. Alberto Salgado é um cantor legitimamente brasileiro, desses raros de ser encontrado e que precisamos ouvir, ouvir e ouvir para termos a certeza de que ele é nosso. Compositor, cantor, artista determinado no cenário nacional, Alberto canta com emoção e carinho e faz de seu quintal um convite ao seu samba de primeira grandeza.


 

Além do Quintal / Alberto Salgado
Nota 10
Marcelo Teixeira