segunda-feira, 30 de maio de 2016

O ecletismo baiano de Vania Abreu


Vania: antiaxé
Longe dos holofotes que tantas cantoras buscam e distanciando-se das grandes vozes poderosas que conseguem alcançar notas quase impossíveis, Vania Abreu consegue ser dona de uma particularidade única: ser a detentora de maior de um universo musical rico em qualidade e sonoridade. Todos os discos de sua carreira contém sucessos de compositores consagrados e que está na boca do povo, porém, as pessoas muitas vezes não associam a música à cantora. Vania é magistral em tudo o que faz e seu sumiço da grande mídia faz com que seu talento respingue nas classes denominadas cultas por um grupo seleto que preza pela boa música. Seio da Bahia (1999 / 27,99) nasceu de um sonho antigo da cantora, que queria trazer para a juventude a lembrança de que as cantoras da década de 1930 não tinham um estilo único, cantando aquilo que queriam e não se limitando a extravagâncias musicais. Nesse disco, Vania comprova seu lado eclético, distanciando sua imagem com o axé da Bahia que nasceu do Carnaval que tanto gosta e da irmã, Daniela Mercury. Seio da Bahia, o terceiro álbum de Vania, comprova toda a sua sensibilidade artística, visceral e cultural de sua alma lírica musical. O disco tem um lado político a começar pelo título e talvez seja um recado direto e certeiro de Vania contra a cultura do axé que tanto disseminou pelos quatro cantos do país e se alastrou pelo mundo: sua irmã, Daniela, ajudou a difundir a música baiana num vapor de 360 graus, enquanto Vania dispara contra o ventilador e tenta mostrar que o seio da Bahia é justamente o oposto, sendo um dilatador refrigerado dentro de um pantaleão vulcânico. É preciso ouvir Seio da Bahia como se estivéssemos na Bahia, sentir a mistura contempôranea dos fatos, resistir ou tentar resistir aos blocos carnavalescos e aspirar todo o sabor formal que a verdadeira Bahia nos traz. Ouvindo esse disco temos a nítida sensação de que Vania complementa a obra de Dorival Caymmi, que sublinha com as canções de Assis Valente e passeia na pele transcedental de Caetano e Gil numa atmosfera mais densa, mais calma, mais serena de ter a baianidade em nossa pele híbrida.

 

O ecletismo baiano de Vania Abreu
Nota 10
Marcelo Teixeira

domingo, 22 de maio de 2016

Adeus, Cauby!


Cauby: eterno
A maior voz do Brasil se calou! Fecham-se as cortinas, cessam-se as palmas, entristecem as mulheres, choram os homens. As gargantas eclodem naquela vontade desesperada de chorar. Feliz daquele que pôde conhecer a obra fenomenal de Cauby Peixoto. Feliz daquele que pôde ouvi-lo cantar suas maiores canções. Feliz daquele que soube que foi feliz por vê-lo apenas falar. Cauby era mais que um cantor, era maior que sua própria vida, maior que sua própria personalidade. Era culto, refinado, ímpar. Era Cauby. O Cauby da Conceição, o Cauby da Ângela, o Cauby da Maria. Mas era também o Cauby do José, do Pedro e do Severino. Era o nosso Cauby. O Cauby que para algumas pessoas desse século puderam respeitar,admirar e ouvir. A juventude digital deu ao cantor toda a sua glória, todo o seu glamour, todo o seu prestígio. Cauby era admirado por todos e mesmo não sendo um cantor que vendesse milhares de discos nas últimas décadas, era reconhecido como o cantor das melhores vozes deste país. Morreu Cauby. O último cantor do Brasil que era romântico, fiel às suas origens, disciplinado com seus músicos, respeitado pelas crianças, adorado pelas avós, inquieto com suas fãs e com a juventude por querer mostrar-lhes e ensinar-lhes aquilo que viveram décadas atrás. Cauby Peixoto era o último grande cantor dos teatros de revista, dos palcos com gliter, dos ternos coloridos, das perucas diversas. Morreu Cauby, mas não sua essência. Seu brilho continuará e sua voz não se calará porque Cauby é eterno. E ele há de estar nos olhando lá de cima dizendo cantei, cantei, nem sei como eu cantava assim...

 

Simplesmente Cauby!
Por Marcelo Teixeira

sábado, 7 de maio de 2016

Rita Ribeiro e o último disco tradicional de sua carreira


 

Rita Ribeiro: um bom disco
Rita Ribeiro lançou Comigo em 2001 e foi um disco muito bem recebido pela crítica popular, mas não pela crítica jornalística. O álbum é bom e de fato não chega a ser um divisor de águas na carreira de Rita, que agora assina como Beneditto, mas já deixava claro que a cantora precisava se afastar um pouco do cancioneiro de Zeca Baleiro e Chico César (tanto que ela gravou uma bela música de Vander Lee, Românticos, que virou referência em sua carreira e ofuscou músicas de compositores consagrados como Baleiro, César e Jorge Ben). Sendo o último disco antes da virada retórica e triunfal na vida da cantora para o misticismo e a religiosidade crescente em seu cárater pessoal, Comigo não deixou marcas profundas na carreira de Rita, mas alçou a musicalidade da cantora para um público que ainda não a conhecia, fazendo com que ela se tornasse uma referência ainda maior no Brasil. É bem verdade que Rita já vinha sendo conhecida pelas músicas compostas pelos amigos Zeca Baleiro e Chico César e isso estava fazendo com que a cada CD lançado fosse esperado ao menos três canções de cada, mas a grata surpresa foi ter a música Românticos como sendo o carro chefe deste trabalho. A música foi composta pelo mineiro Vander Lee, que estava iniciando na seara musical, mas que já vinha com uma música que muitas pessoas já tinham se identificado, Esperando Aviões. Comigo não é um disco em que temos que parar para ouvir com uma profundidade enorme, mas não podemos tirar todo o mérito deste álbum. Rita estava inspirada nos vocais, nas melodias, mas não estava inspirada por completa na arte visual, pois a capa e o encarte são horríveis. Tirando esse percalço, o disco tem um carisma profundo de brasilidade espontânea e a voz de Rita está impecável.

 

Comigo (2001) / Rita Ribeiro
Nota 7
Marcelo Teixeira