sábado, 26 de novembro de 2016

Entrevista com Virgínia Rosa


Virgínia Rosa: a entrevistada
Não é fácil ser Virgínia Rosa¹: além de dar vida à papéis importantes tanto na TV como no teatro, a cantora conseguiu uma brecha em sua agenda para receber o Mais Cultura Brasileira e nos brindar com sua simpatia e cordialidade para nos falar sobre sua história musical e seus planos futuros. Seus trabalhos são expressivos e marcantes, como a Dora, a mãe protetora da personagem de Camilia Pitanga na novela Babilônia – 2015; uma das mulheres retratadas em música na peça Palavra de Mulher – 2011 até o momento; faz uma bela homenagem à Carmen Miranda no musical Na Batucada da Vida – 2009 até o momento e Dona Zica em Cartola, O Mundo é um Moinho – 2016. Cantou Monsueto com brilhantismo total, dividiu vocal com inúmeros artistas conceituados e hoje reina absoluta com uma carreira sólida que conquistou aos poucos. De Itamar Assumpção passando por Cartola e Clara Nunes,  a cantora nos conta suas preferências, suas inspirações e sua paixão musical. Elogiada por dez entre dez estrelas do nosso cenário artístico, Virgínia é uma artista humilde, que tem sempre o sorriso largo no rosto e que nos cativa com seu canto, seu olhar e sua voz poderosa, impactante e emocionante. Nestes cinco anos de escrita homérica sobre a música nacional, tenho o prazer e a felicidade de poder entrevistar uma das cantoras que estava namorando para este momento desde 2012.

¹foto de Gal Oppido (acervo Virgínia Rosa)

 
Marcelo Teixeira - A sua relação com Itamar Assumpão era muito forte e vibrante e o próprio Itamar deixava a todos no palco inquietos com suas provocações musicais. O que você herdou de Itamar e o que você mais guarda de lembrança dele?

Virgínia Rosa - Tenho uma lembrança muito boa e instigante. Itamar foi um artista genial e extremamente exigente que às vezes era até difícil conviver, mas que me passou essa inquietação boa que nos deixava na corda bamba e nos empurrava para frente a todo momento, não tinha acomodação. Tudo era novidade pra mim naquele tempo, a estética musical muito diferente  do que eu já tinha ouvido, as pessoas... Mas como papai em casa já me mostrava coisas novas como os Secos & Molhados, The Beatles e etc, essa curiosidade e abertura para o novo já começava no meu lar através  do Sr. João, quando recebi o convite para estar na Banda Isca de Polícia. Aceitei, mesmo não sabendo muito bem onde chegaria com esse novo som. Meu pai me disse: Vá, minha filha, quem sabe abrem umas portas para você? E eu fui!

MT -  Em Cartola – O Mundo é Um Moínho (2016), você interpretou  um ícone dos bastidores do samba e foi uma responsabilidade enorme,  que te trouxe o grande reconhecimento do público e da mídia. Como foi a sensação de poder ser Dona Zica no teatro?

VR - Foi um presente, um convite, uma oportunidade de mergulhar em um personagem que existiu e que traz em sua trajetória de vida toda a força de superação, ternura e amor ao ser humano, à vida! A construção da minha Dona Zica não existiria sem as indicações generosas de sua neta Nilcemar Nogueira, toda cumplicidade com Flavio Bauraqui e a confiança de Roberto Lage e Jô Santana que viram em mim essa possibilidade. No mais segui a minha intuição pedindo licença à Dona Zica e que ela me abençoasse.

MT – Você fez uma linda homenagem à Clara Nunes no disco Virginia Rosa Canta Clara (2015). De onde veio a inspiração para poder homenagear uma das maiores cantoras do Brasil?

VR - Ouvi Clara Nunes dentro do meu lar, minha mãe já cantarolava. Depois já cantora profissional, precisamente em 2004, participei de um show em homenagem aos ABC do samba, Alcione, Bete Carvalho e Clara Nunes juntamente com outras cantoras. Nesse show escolhi  6 canções do repertório da Clara, entre elas Canto das Três Raças e cantando essas músicas e especialmente o CANTO DAS TRÊS RAÇAS me comoveu muito e também percebi a emoção tomar conta da plateia. E essa emoção me levou a um lugar que eu nunca tinha estado antes que é o encontro com a nossa ancestralidade e essa sensação me levou à vontade de cantar mais Clara, conhecer mais o seu repertório e sobre ela. Daí comecei a fazer os shows por São Paulo e algumas outras cidades. Como era um show já pronto fui propor um circuito de shows pelo SESC e como resposta recebi um convite através do professor Danilo Miranda para gravar um CD sobre esse trabalho para minha surpresa.

 MT   Um disco?

VR - Canção do Amor Demais    (Elizeth Cardoso)

MT – Um cantor e uma cantora.

VR - Luiz Melodia e Concha Buika.

MT  Quais foram suas influências musicais?

VR – Muitas. Vou citar algumas cantoras que passearam por mim, entre elas: Clara Nunes, Elizeth Cardoso, Elis Regina, Edith Piaf, Clementina de Jesus, Maria Callas, Billie Holiday, Meredith Monk, Laurie Anderson, Marisa Monte, Cássia Eller, Amália Rodrigues, Madonna e assim vai... Quanto aos músicos, as influências foram Astor Piazzolla e Bill Evans.

MT – Vírginia Rosa por Vírginia Rosa.

VR - Uma pessoa em busca. Inquieta e calma ao mesmo tempo. E essa busca é algo que dê sentido a nossa existência tão efêmera e o que podemos fazer para valer o tempo que passamos nesse mundo. Busco isso no meu dia-a dia e através da minha arte. Essa sou seu.

MT – O que te inspira a cantar?

VR - Uma vontade enorme de fazer uma coisa bonita, no caso, cantar e ver a reação de prazer que isso me causa e também nas pessoas que me ouvem. A emoção sempre está nos meus shows e isso é transformador para mim e para a platéia.

MT – Televisão, teatro, música... o que podemos esperar de Virginia Rosa para 2017?

VR - Ainda não sei, mas estou aí, viva e atenta aos sinais e convites que possam vir (risos) Concreto: A temporada do musical Cartola no Rio de janeiro entre março, abril e maio e  devemos fazer algumas capitais também. Continuarei a fazer shows de lançamento do CD Virgínia Rosa Canta Clara pelos SESCs, os projetos especias também devem continuar, Palavra de Mulher, Na Batucada da Vida... E começarei a trabalhar o novo disco.

MT - Música é...?

VR - Um bálsamo para humanidade.


O Mais Cultura Brasileira e eu, ensaísta e crítico musical deste blog, assim como os inúmeros leitores, agradecemos à você, Virgínia, por este momento único. Muito obrigado e sucesso sempre!


Entrevista com Virgínia Rosa
Por Marcelo Teixeira

 

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Por que devemos ouvir Virgínia Rosa?

Virgínia Rosa: uma voz espetacular
A elegância, a sofisticação, a naturalidade de sua voz e o respeito para com seu público são marcas registradas da cantora e atriz Virgínia Rosa, que acabou de fazer uma das temporadas teatrais mais emocionante do ano ao interpretar Dona Zica em Cartola – O Mundo é um Moinho, no teatro Sérgio Cardoso, fora a sua magistral interpretação em Palavras de Mulher, ao lado de Lucinha Lins e Tânia Alves, que rodou o Brasil inteiro cantando as músicas de Chico Buarque. Os resquísitos básicos de uma grande diva da música são estes citados acima, mas para Virgínia é preciso muito mais adjetivos para poder contempletá-la. As nuances de sua voz assim como as possibilidades de perfeição que alcança com as notas lançadas dão o frescor de sua garra como cantora e nos levam ao delírio máximo de êxtase absoluto. Enquanto os elementos mais alienados da música popular brasileira usam de todos os meios possíveis para se promover e agir, a cantora segue por uma linha que beira a bonança e o triunfo por chegar em um momento sublime da carreira sem desprezar ninguém. Virgínia trabalhou com Itamar Assumpção, o louco maldito da música vanguarda dos anos 1980 e desse experimento surgiu uma mulher completa na cultura brasileira, sendo capaz de nos hipnotizar com seu carisma e nos brindar com sua categoria postural e brilhante.  Virgínia canta com emoção, com sentimento, alma e são essas energias que a fazem brilhar cada dia mais. A questão da música popular brasileira vir sofrendo uma dependência quimíca abstrata nos tempos atuais faz com que a qualidade musical seja cada vez mais banida de uma esfera de categoria que engloba a resolução de uma resposta imediata para a massa que necessita ouvir boas coisas, mas Virgínia impera absoluta neste campo e consegue transmitir seu recado sem a necessidade de se perder ou se expor de forma contrária. É preciso ouvir Virgínia Rosa porque ela representa a alma lírica da música popular, traduzindo sua fidelidade e comunicação com o povo brasileiro, pois quem a ouve entende perfeitamente sua química, seu encantamento, sua beleza e seu resultado gratificante. Ouçamos mais Virgínia Rosa pela astúcia de seu trabalho, pelo vigor de sua responsabilidade cultural, pelo seu talento descomunal e pela conservação de seu canto. Ouçamos Virgínia Rosa pela densidade de sua categoria exemplar, pela fibra que carrega, pela disposição de seu carinho. Ouçamos Virgínia Rosa e isso será um ato de respeito à nossa própria cultura.
 

Por que devemos ouvir Virgínia Rosa?
Por Marcelo Teixeira

sábado, 5 de novembro de 2016

Remonta desmonta Liniker e remonta o mesmo


Remonta: disco perfeitinho
Ainda catalisado pelo excelente disco Remonta (2016 / Independente / 29,99), Remonta é um desses discos que te pegam de surpresa no meio do ano e entra sem pedir licença em nossas vidas. Liniker é um cantor provocativo e o álbum veio coroar um processo feito entre ele, sua banda e seus fãs, que ganham um belo presente para degustação sem pressa para se chegar a um final.  A entrada de 25 segundos da primeira faixa já dá o recado: o ouvinte entrará em uma viagem musical completa, que será responsável por apresentar todas as influências de Liniker misturadas à liberdade de produção, sem rótulos. Remonta, a segunda música do disco, cumpre o seu propósito de dar nome ao álbum e resume muito bem tudo o que será mostrado a seguir. O início acapella é inacreditavelmente ilusionista e ganha sonoridade instrumental surpreendente. Prendedor de Varal, em parceria com Xênia França, é mais dançante e nos lembra os áureos tempos da música negra brasileira nos anos 90 e 2000. Tua, também com Tássia Reis, é o contraponto introspectivo da música anterior. Sem Nome, Mas Com Endereço nos transporta para a cultura do sertão; algo impensável, mas admirável. O resultado é poderoso, mesmo que a letra verse sobre alguém se encontrando, e encontrando o amor. Talvez a maior surpresa de todos seja Você Fez Merda, um bolero com lembranças escancaradas de Tim Maia: mais uma mistura espetacular pensada por Liniker e sua equipe. É um bolero moderno, com elementos sonoros eletrônicos que não interferem em nada na música, mas a complementa de forma primorosa. Você Fez Merda é a personificação do Liniker divertido. Quem já foi a um show do artista sabe bem o que é isso: o cantor é poderoso e sempre deixa clara a sua luta pela representatividade, falando sério com seu público. Mas existem muitos momentos de brincadeira, mais leves, e que deixam o Liniker visceral descansando um pouco. Esse vai e vem de emoções é uma das marcas registradas das apresentações do músico. Fechando o disco, temos Ralador de Pia, uma música em parceria com Assucena Assucena e Raquel Virgínia (ambas de As Bahias e a Cozinha Mineira), além da grandiosa Tulipa Ruiz. A canção é daquelas que a gente imagina os quatro cantando na sala de casa, em alguma reunião com amigos. Incrível! Imperdível! Sensacional!

 

Remonta (2016) / Liniker
Nota 10
Marcelo Teixeira

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Cinco anos de Mais Cultura Brasileira!


Cinco anos de MCB
Chegar ao seu quinto ano, neste mês de Novembro, sem um patrocínio, sem verbas e divulgando música por puro prazer é poder dizer que cheguei ao quinto ano fazendo aquilo que mais gosto: divulgar a cultura musical diversificada no Brasil. Criticar música não é uma tarefa fácil, exige compenetração, compromisso, determinação, horas e horas de audição de apenas uma música, saber separar o pessoal do profissional (muitas vezes um cantor não me agrada, mas sua música sim) e exige, acima de qualquer coisa, uma responsabilidade enorme diante inúmeros leitores. Nesses cinco anos recebi diversos emails de vários lugares do mundo de pessoas dando sugestões, pedindo críticas resenhadas, me agradecendo, me ofendendo, mas o que acho mais legal nisso tudo é a diversificação cultural que cada pessoa carrega dentro de si. Uma das coisas que mais aprendi com o Mais Cultura Brasileira e com a arte de criticar foi  saber respeitar o outro e esse lado humanizado de minha parte se deve e muito à Pedagogia (curso na qual escolhi para aprimorar meus conceitos éticos, cujo ainda estou aprimorando conhecimentos) e às pessoas que circundam minha vida me trazendo um pouco de sobriedade intelectual sobre o que pode ser melhorado aqui e ali. Completo cinco anos de blog com a mesma alegria do primeiro ano, do segundo, do terceiro e do quarto, em que cada ano era uma festa diferente: agora a festa pode ser compactuada formalmente, pois graças à você é que cheguei aqui, mudando meus conceitos sobre a teoria da crítica resenhada, utilizando palavras mais rebuscadas, buscando pelo novo, buscando novas formas de conhecer novos cantores, novos becos, novos guetos, novos ares. Escrever sobre música é um privilégio que não se resume apenas à ouvir sobre música: é preciso entender um pouco sobre ambas as coisas, sobre o universo particular e perpendicular do cantor ou da cantora, é ser humilde em solicitar uma entrevista e ser dinâmico em dizer não também. Nesses cinco anos de Mais Cultura Brasileira conheci cantores maravilhosos, pessoas maravilhosas e que se tornaram amigas. Mas quem me conhece sabe que não sou de badalação, de ficar indo aos shows diretamente, de estar na primeira fila VIP de cantor tal. Vou quando estou disposto e quando quero. O crítico de música não precisa, necessariamente, estar ali para ser visto. O crítico de música precisa estar atrás dos holofotes, por detrás das suas próprias palavras escritas, afinal, o mais importante em nosso trabalho é a divulgação do trabalho do outro e não necessariamente o nosso. O que fazemos é divulgar a cultura concomitantemente alheio ao serviço de bel-prazer. É um orgulho poder chegar à cinco anos de Mais Cultura Brasileira e orgulho maior ainda é estar sempre no meu mesmo devido lugar sem humilhar outros profissionais, sem deteriorar o trabalho do outro e sim, aprender com eles.

 
Cinco anos de Mais Cultura Brasileira
Por Marcelo Teixeira