terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Os dez melhores lançamentos de 2014


Os melhores CDs de 2014
De Alberto Salgado à Mônica Salmaso, passando por Ceumar e Criolo, o ano de 2014 foi um dos anos mais promissores para o mercado fonográfico: muitos lançamentos e muitas surpresas. Obviamente que nem tudo é flores e teve muitos CDs desprezíveis, mas na sua maioria, o ano foi de muitas novidades e, sobretudo, de muita qualidade musical. Sem ter uma posição para cada lançamento, o Mais Cultura Brasileira e, de quebra, o crítico que vos escreve, passou o decorrer do ano ouvindo muita música, muitas vozes, muitos CDs, garimpando aqui e ali nas lojas do ramo e muita coisa passou longe do meu crivo, pois não mereciam nem espaço numa linha em branco. Não foi muito difícil selecionar os dez melhores discos deste ano, mas houve algumas dúvidas, normais até então, para poder classificá-las de mediano. Mas depois de tudo acertado, eis que chego a conclusão dos melhores discos mais bem produzidos em 2014, de janeiro a dezembro e o leitor pode conferir agora. Lançando o ótimo Além do Quintal, Alberto Salgado é a revelação masculina de 2014 no Mais Cultura Brasileira!, assim como Tito Marcelo, cantor recifense residente em Brasília, uma das gratas e boas surpresas  no cenário musical. Alberto é um sopro natural de calmaria em meio à fúria de sons tão distantes que assolam nossos ouvidos e que tem identidade própria ao desencandear um filandeiro de obras-primas deste álbum encantador. Trezes faixas embalam Além do Quintal, sendo todas de sua autoria ou em conluio com outros parceiros. Mas sua assinatura é pessoal e intransferível e essa mágica é que faz toda a diferença no disco. Alberto experimenta tons sambísticos neste disco, o que o deixa muito bem à vontade para cantar e compor melodias saborosas, com uma leveza pop sobre canções de amor. Majestoso do começo ao fim, Silencia é um dos melhores discos da carreira de Ceumar, que volta mais brasileira que nunca mesmo estando radicada na Holanda. A definição de Silencia, talvez, seja a voz ímpar da cantora: impossível não se encantar com a doçura de sua voz, tão rica, tão saudável e tão acalentadora. Há força no seu canto e no seu campo musical e por esses motivos, Ceumar, mineira que és, procura demonstrar o quão verdadeiro é seu canto. Silencia promove o silêncio, a voz do sereno, a palavra mais doce que por vezes necessitamos. Juçara Marçal nos brinda com um disco sensacional. Sedutor, Encarnado demonstra toda a verve artística de uma grande cantora, em tempos que não estão para paz. O disco é forte, audacioso e a cantora ousou, inovou e surpreendeu em trabalhar em algo tão sério, tão visceral. Para a explicação desses temas, a cantora se infiltrou em matizes díspares do clássico para a sua rica interpretação. O samba pede passagem mais uma vez e Maria Rita consegue se desvencilhar da imagem da mãe, Elis Regina, para fazer um dos discos mais bonitos de sua carreira e de quebra, um dos mais belos deste ano de 2014. Maria Rita canta divinamente todas as faixas de Coração a Batucar sem atropelar palavras, sem deixar a peteca cair, sendo uma grata surpresa até mesmo para mim, que retruco quando o assunto é o universo particular da cantora. Dani Calazans é uma das melhores cantoras surgidas nos últimos anos dentro da MPB e sua voz é um afago tão tocante quanto certeira, tão imensa quanto duradoura, tão atual quanto sensível. Dani Calazans é uma cantora completa, reveladora, simples e determinada. Hard Bolero é um disco que não pode ser passado em branco: você precisa ouvir! Ouvir com atenção, com vontade, com garra, porque esses adjetivos são transpassados por Dani Calazans em todas as faixas do álbum. Com ênfase nas mazelas do Brasil, como na irresistível Classificados, passando por sua feminilidade com a música Salto Agulha, Dani dá um toque diferenciado na manjada Non, je ne regrette rien, que fecha o disco com chave de ouro. O rap nunca esteve tão representado com a imagem e a música racional de Criolo, um dos melhores e mais dignos artistas brasileiros de todos os tempos. Há muito caos e ecos na vibrante e tocante música que ele produz: tudo em Convoque Seu Buda é agressivo e é sereno ao mesmo tempo. A eloquência nos versos de Criolo é seu forte caminho para que a sua música seja sempre um apelo de sonoridade e respeitabilidade dentro da música e dentro daquilo que produz, porque tudo o que sai da boca do cantor é a prova ácida daquilo que viveu ou vivenciou alguém vivendo. Tito Marcelo é um desses cantores que nasceram para encantar: sensível, carismático, letrista, poeta, brasileiro. Nascido em Recife, Tito mora em Brasília e é da capital federal que surge mais um cantor de primeira grandeza na música popular brasileira. Pra Ficar no Sol é um disco interessante, irresistível, caprichado, moderno e com uma capa incrível. Aqui está todo o universo magnífico de Tito Marcelo, que se baseou nas estruturas do amor e na brejeirice das levadas infantis para compor boa parte do álbum. Corpo de Baile é um punhado de canções da dupla Guinga e Paulo César Pinheiro e mesmo sendo um disco de releituras, as músicas dão um novo frescor na delicada e sútil voz de Mônica Salmaso. Nesse disco houve um paralelo de divisor de águas na carreira de Mônica, por se tratar de um disco produzido com requintes de rica musicalidade e que no frescor de sua alma de cantora, expôs todo o seu sentimento para com as canções ali cantadas. Grata surpresa foi quando Mallu Magalhães se juntou a Marcelo Camelo e ao guitarrista e baterista Fred para formarem o Banda pro Mar , com músicas deliciosas e de altíssima qualidade musical. Em quase tudo aqui podemos lembrar o som de Marcelo Camelo no Los Hermanos (caso de Cidade Nova ou Hey Nana) ou de Mallu nos tempos de início de carreira, como na saborosa e divertida Muitos Chocolates ou Mais Ninguém. Por falar em Mais Ninguém, a canção é uma das melhores composições de Mallu, por mostrar que a cantora realmente amadureceu Zizi Possi mostra todo o seu encanto ao dar vida a Tudo se Transformou, que se transformou, sem querer, em um disco sensível, aberto, curioso e com direção certeira na carreira Zizi em que revisita a obra dos amigos, pinça com dignidade uma música de cada e o lança em disco. Mas o que se vê aqui é um disco novo e sensato e que acaba com o jejum da cantora, merecidamente. E assim se completa a lista de 2014: com qualidade e muita música, boa, os melhores lançamentos são sempre os melhores. E que venha 2015!

 

 

Os melhores lançamentos de 2014
Marcelo Teixeira

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

O rei não é rei no país do samba


Roberto Carlos é rei?
Entre brigas na justiça com as leis sobre biografias não autorizadas e músicas do passado que são proibidas de serem regravadas, Roberto Carlos vai passando sua coroa (que nunca teve e que nunca mereceu) para frente, deixando talvez guardada em um local de difícil acesso ou até mesmo escondida. No país do futebol,  do samba e das mulatas, não se pode ter um rei e Roberto Carlos fora apelidado assim devido ao grande sucesso na Jovem Guarda. Mentor da época, o cantor e compositor Roberto Carlos reinava absoluto nas paradas de sucesso, cantando aquilo que o público, feminino na sua maioria, queria ouvir. Roberto dividia os holofotes com outros reis que eram tão bons quanto ele na sua época, como Paulo Sérgio, Antônio Marcos e Taiguara. Mas fora Roberto quem sobreviveu a todos os obstáculos e vendavais que vieram após o fim da Jovem Guarda, o início da Bossa Nova, o surgimento da Tropicália, o Samba, o Rock... Roberto Carlos conseguiu uma proeza e tanto para a sua velhice musical: se manter entre os melhores e maiores cantores brasileiros de todos os tempos. Mas há muitas cinzas no mundo artístico de Roberto Carlos: como uma cólera, o cantor sempre teve obsessões pela imagem e por sua vida retratada em livros. Não deixa praticamente ninguém cantar suas músicas sem sua devida autorização e exige ouvir antes de todos para ver se ficou realmente boa. Ficando de fora os TOCs que o cercam, o chamado dito popular rei não é rei em um país regido por pajés: Roberto Carlos está muito abaixo da cultura intelectual de Chico Buarque, Caetano Veloso ou até mesmo Milton Nascimento, artistas estes capazes de levar coroas sem serem reis.  É notória que a música dos anos 1970 e 1980 que Roberto produzia fazia muito mais barulho que as músicas lançadas nos anos 2000 e mesmo com essa distância de tempo, é impossível dizer que Roberto é o maior cantor do Brasil: ele continua muito abaixo de qualquer cantor racional deste país. Roberto produziu muita coisa bacana para a cultura brasileira, músicas românticas de qualidade nada duvidosa, mas essas músicas não chegam a ser de qualidade superior, não trazem intelectualidade alguma para o nosso dia a dia e não transmitem nada senão serem apenas músicas românticas. As cinzas musicais de Roberto são apenas cinzas cristalizadas no breu mais distante produzida para que a massa o alimentasse de qualquer forma e jeito, traduzindo o que há de melhor de sua capacidade mental: o de fazer música romântica sem ser apelativa, mas meramente comercial. Não duvido da capacidade intelectual de Roberto em se fazer crer que é o maior cantor do Brasil, assim como não questiono suas músicas, que são, de todo modo, caricaturas de rostos normais aqui e ali, mas o que quero dizer é que o rei Roberto Carlos não merece esse título que lhe designaram, pura e simplesmente porque no país do futebol, do samba, das mulatas, das coroas e das ninfetas, quem reina absoluto são os pajés, que mesmo com seus cocares de pena, ainda assim perdem sua majestade.

O rei não é rei no país do samba
Marcelo Teixeira

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

A música e a religião de Rita Beneditto em Encanto (2014)



Rita: música e religião
Depois de lançar o emblemático Tecnomacumba e se ver rodeada de problemas religiosos por causa de sua música, a cantora maranhense Rita Beneditto volta após oito anos deste lançamento para enfim colocar voz no delicioso Encanto, que é uma sequencia do primeiro. Lançado pela Manaxica Produções em parceira com a Biscoito Fino, o novo disco comemora os vinte e cinco anos de carreira de Rita. Encanto (2014 / 24,99 / Manaxica – Biscoito Fino) é o primeiro disco de Rita após a mudança de nome de Ribeiro para Beneditto. A regravação em tom roqueiro de sucesso de Roberto Carlos impulsiona o disco, onde Rita apresenta músicas inéditas entre ousadas releituras de canções de compositores como Djavan, Gilberto Gil e Jorge Ben Jor. Em uma viagem às fronteiras do Brasil, Rita canta Babalu, um dos grandes sucessos da compositora cubana Margarita Lecuona, imortalizada na voz de Ângela Maria. Na matriz africana descende De Mina, música de Josias Sobrinho gravada com a guitarra de Roberto Frejat. E, como a fé a música nunca tiveram fronteiras, Encanto aporta ao fim do terreiro do samba com O que e dela é meu, samba bamba carioca de Arlindo Cruz feito especialmente para Rita. É o fecho simbólico de Encanto, disco que não deixa dúvidas de que, em qualquer terreiro ou lugar, a religião de Rita Beneditto é a música.

 

Encanto / Rita Beneditto
Nota 10
Marcelo Teixeira

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

A Caixa Azul de Djavan


A Caixa Azul do Djavan
Beirando os 40 anos de carreira com mais altos do que baixos, o cantor e compositor Djavan sempre gostou mais de pensar e olhar para o atual momento e se deliciar com o futuro ao invés de parar no tempo. Com tantos trabalhos admirados e obras incríveis nesses longos anos, não havia tempo para voltar no tempo e se dedicar inteiramente à obra do passado, muito menos mensurar o tempo com a distância percorrida. Foi pensando nesse tempo e nessa distância de anos anteriores que nasceu um projeto audacioso e que os fãs do cantor alagoano agora podem respirar mais aliviados: surgiu a caixinha azul do Djavan. Aqui estão reunidas praticamente todo o acervo do cantor, que sempre se manteve flexível entre o erudito e o jazz, mas sempre focado na boa e velha MPB. São 20 álbuns remasterizados, incluindo aqui o primeiro disco, A Voz, O Violão, A Música de Djavan, lançado originalmente em 1976 e até Ária, de 2010, um dos pontos altos de sua carreira, por unir os velhos aos novos fãs.  Por toda a sua incalculável obra, nasceu um projeto reuniu 18 álbuns de carreira e dois discos extras – raridades, com músicas que entraram em projetos especiais, e outro com canções que gravou em inglês e espanhol, lançadas exclusivamente no exterior e até então inéditas por aqui. Todos eles com os áudios originais remasterizados, vale lembrar. Rua dos Amores, lançado em 2012, ficou de fora por ser seu mais recente álbum – que originou CD e DVD ao vivo, lançado este ano. Foi um trabalho criterioso: o Box traz ainda encarte com fotos, capas, informações gerais dos discos, letras de músicas e uma pequena introdução escrita pelo próprio Djavan pincelando histórias da própria trajetória. Aos 65 anos, o cantor reativou lembranças e emoções adormecidas e a partir de uma ordem cronológica de músicas e sons, decidiu garantir o Natal de muita gente mais feliz. Vale a pena conhecer a Caixa Azul de Djavan e saborear cada faixa deste grandioso artista nordestino, culto e brasileiro.

 

Caixa Djavan / Djavan
Nota 10
Marcelo Teixeira

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Quando o Malta vai acabar?


Malta: o inferno está neles
Depois de Sambô, que não tem luz própria e não significa absolutamente nada na música popular brasileira, outra banda medíocre surge através desses programas de quinta categoria para alçar ainda mais o nível despretensioso do mercado fonográfico e fazendo com que a massa encefálica das pessoas ocas fiquem cada vez mais cinzenta. Lançando Supernova (2014 / Som Livre / 24,99), o grupo Malta ganhou maior destaque depois de ser eleito como favoritos em um programa dominical, abocanhando o tão imaginado primeiro lugar.  Mas já adianto que o grupo, liderado por um roqueiro dos tempos modernos, não chegará muito longe. As músicas do Malta não empolgam conforme sua propaganda e a voz do líder é tão cansativa e emblemática, que nem um xarope expectorante serviria para afrouxar suas cordas vocais. Se o rock brasileiro for denominado nos tempos modernos pelo grupo Malta, então está tudo errado nas diretrizes da música: o grupo não alçará voos longos e não ultrapassará mais a marca registrada em números como no primeiro lançamento. Não há nada de original aqui: desde as letras melosas e sem combinação com a atmosfera do grupo, o vocalista tenta impor uma categoria extra para o seu desempenho como cantor romântico, deixando evidente que seu limite vocal não chega a altos graves. Até onde chegará o grupo Malta, então? Tudo o que é produzido às pressas e com o desdém habitual das grandes gravadoras, acaba sendo uma grande frustração futura e o que foi produzido para ser eterno acaba morrendo logo na primeira leva de novas vozes. O público de hoje está mais exigente e o grupo Malta terá que provar do próprio veneno para se manterem vivos e autênticos a cada investida na música. E a pergunta que me faço neste exato momento é: quando o Malta vai acabar?

 
Quando o Malta vai acabar?
Marcelo Teixeira