quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Dolores Duran: o amor, a dor e a música



Dolores Duran nasceu como Adiléia Silva da Rocha, (Rio de Janeiro, 7 de junho de 1930 — Rio de Janeiro, 24 de outubro de 1959) e foi uma cantora e compositora brasileira. Nasceu numa vila na Rua do Propósito, no Centro do Rio, onde morou por alguns anos. Teve uma infância pobre e não conheceu o pai. Se mudou para um cortiço no bairro da Piedade, subúrbio carioca, com a mãe, o padrasto e as irmãs Denise, Solange e Leila. Desde criança gostava de cantar e sonhava em ser cantora famosa. Aos 8 anos de idade contrai a febre reumática, que quase a levou a morte, e que deixou como sequela um sopro cardíaco gravíssimo. Por pouco ela não resiste, para desespero de sua mãe.

Aos doze anos de idade, influenciada pelos amigos, resolve, com a permissão da mãe, se inscrever num concurso de cantores, mas ela tinha dúvidas se iria se sair bem. Surpreendentemente, ela cantou muito bem, como uma profissional e conquistou o primeiro prêmio no programa Calouros em Desfile, de Ary Barroso. As apresentações no programa tornaram-se frequentes, fixando-a na carreira artística.

Quando Adiléia tinha 12 anos, teve que abandonar os estudos, parando no ensino primário, para ajudar a mãe com despesas de casa. Arranja um emprego e passa a trabalhar como atriz nas rádios Cruzeiro do Sul, nos programas da Tupi e no teatro, além de cantar em programas de tevê, mas todos esses empregos eram temporários, o que não ganrantia dinheiro certo.

Adiléia tenta terminar os estudos, ingressando no ginásio, pagando uma escola, mas como o dinheiro era pouco e as mensalidades da escola estavam atrasadas, ela é expulsa do colégio. Como ela tinha que se dedicar muito a música e ao teatro, ela decide de vez parar de estudar. Sua mãe não gosta desta atitude e mesmo após brigas, a mãe, a contra gosto, tenta aceitar a vocação de cantora da filha, já que a mãe dizia que artistas também estudavam e que a fama acaba um dia. Adiléia tinha uma personalidade muito forte e não levava desaforos para casa, respondia a quem quer que fosse, sabia se defender bem.

No final dos anos 40, ela conhece um casal rico e influente: Lauro e Heloísa Paes de Andrade, que já a tinham ouvido cantar. Eles passam a ajudá-la a se tornar realmente uma cantora e a levam em diversos lugares chiques e reconhecidos, frequentado por famosos. Lauro passa a chamá-la de Dolores Duran, por ser um nome fino na época. Esse nome é espanhol e dramático que significa Dores. Ele é muito forte e traz uma carga de dor e sofrimento intenso, e o sobrenome Duran, que quer dizer durante, sempre, intensifica ainda mais, como se não tivesse fim essa dor.

Sem nunca ter estudado línguas, aprendeu sozinha a cantar em inglês, francês, italiano, espanhol e até em esperanto. Ella Fitzgerald durante sua passagem pelo Rio de Janeiro, nos anos 1950, foi à boate Baccarat especialmente para ouvir Dolores e entusiasmou-se com a interpretação de Dolores para My Funny Valentine - a melhor que já ouvira, declarou Fitzgerald.



O jornalista Antônio Maria foi um dos melhores amigos da cantora, e escrevia publicações sobre ela.

Suas músicas se tornaram estrondoso sucesso. Eram dramáticas, belas e românticas, e expressavam os sentimentos mais puros de um coração. Prova disso é que Antônio Maria publicou: "Dolores Duran falou de sentimentos como ninguém, em todas as línguas. Seu idioma era o amor!"

Cantava em diversas boates no Rio. Sua fama se espalhou e foi contratada pela Rádio Nacional, que na época só escolhia os melhores cantores. Era a rádio mais disputada. Ela jamais estudou canto e música, sua voz não precisava de correção através de aulas. Parecia mesmo que ela nasceu para cantar. Nessa época seu padrasto morre e sua família enfrenta grandes dificuldades. Passou a cantar músicas internacionais no programa Pescando Estrelas, onde só havia cantoras jovens e conceituadas. Lá ela conhece e se torna melhor amiga da cantora da Rádio Guanabara e da Rádio Nacional, Julie Joy.

Namorou por 6 meses Billy Blanco, de quem também gravou músicas, já que ele escrevia letras. Nessa época compôs junto com Tom Jobim o samba O negócio é amar, que fez grande sucesso. Nara Leão interpretou a canção. Nesse período já estava famosa, distribuía autógrafos pela rua, onde ia a entrevistavam e tiravam fotos suas. Gostava de futebol e frequentava o Maracanã, onde assistiu a Copa de 1950. Também ia muito nas praias e cinemas.

A década de 1950 se iniciou marcante para Dolores, que passou a cantar nas sofisticadas boates do Hotel Glória. Em 1951, conhece um músico do Acre, tocador de acordeão, chamado João Donato. Eles se encontravam em frente ao Hotel Glória todas as noites. Dolores, João e Julie eram grandes amigos, sempre saíam juntos e passeavam, também com outros colegas. Só não se casaram devido à oposição da família do rapaz e do preconceito da sociedade. Donato tinha 17 anos, enquanto Dolores tinha 21 e uma mulher mais velha não era bem vista com um homem mais novo. Ela lutou muito para tê-lo ao seu lado, mas ele preferiu ouvir sua família. O namoro chegou ao fim quando Donato foi morar no México. Donato e Dolores não aguentavam mais brigas e cobranças de suas famílias. Isso a fez sofrer, mas ela superou e seu sucesso na música aumentou.

A estreia de Dolores em disco foi em 1952, chamado Músicas para o Carnaval, gravando dois sambas para o Carnaval do ano seguinte: Que bom será (Alice Chaves, Salvador Miceli e Paulo Márquez) e Já não interessa (Domício Costa e Roberto Faissal). Em 1953, gravou Outono (Billy Blanco), e Lama (Paulo Marquez e Alice Chaves). Dois anos depois, vieram as músicas Canção da volta (Antônio Maria e Ismael Neto), Bom querer bem (Fernando Lobo), Praça Mauá (Billy Blanco) e Carioca (Antônio Maria e Ismael Neto).

Muitas vezes, nas madrugadas, ela criava suas letras na mesa dos bares, bebendo e fumando, ouvindo músicas de bolero, salsa e samba. Inspirava-se em seus casos amorosos e na sua vida em geral, suas alegrias, tristezas, dores, anseios e mágoas, para compor suas inesquecíveis letras. Em 1955 foi vítima de um infarto, tendo passado trinta dias internada no hospital Miguel Couto. Dolores resolveu não seguir as restrições que os médicos lhe determinaram, agravando os problemas cardíacos que trazia desde a infância, problemas que só se agravaram com o tempo, pois abusava do cigarro (fumava mais de três carteiras por dia) e da bebida, principalmente a vodca e o uísque. Com isso, a depressão passou a marcar sua vida. Mesmo famosa e amada por milhares de fãs se sentia triste, um vazio lhe tomava conta e com isso, buscava refúgio na bebida e no cigarro.

Nesse mesmo ano, conheceu o cantor e compositor Macedo Neto, de quem gravou diversos sambas. Os dois se conheceram nos estúdios da gravadora Copacabana e rapidamente foram morar juntos. Antes de se casarem no papel, porém, Dolores engravidou dele e passou por uma gravidez tubária (gravidez de alto risco que acarreta esterilidade materna e perda do feto), interrompendo seu sonho de ser mãe, o que arruinou sua vida e a levou a piora do vício em cigarro e bebidas.

Disco recente em sua homenagem: perfeito
Um fato que a marcou foi que após ter perdido seu filho, ter entrado em depressão e resolvido se casar oficialmente com Macedo, ele proibiu de sua mãe comparecer ao casamento deles, por a mãe dela ser negra, fato que a deixou perplexa e enfurecida. A única que foi ao seu casamento foi a irmã Denise, pois sua mãe e suas outras irmãs não conseguiram ir tamanha ofença. Dolores só se casou para não se sentir tão só, pois nunca perdoou o marido por não ter deixado sua mãe ir ao seu casório.

Em 1958, após muitas discussões e brigas violentas, desquitou-se de Macedo Neto e passou meses na Europa cantando e se apresentando com seu conjunto musical, fazendo muito sucesso. Lá encontrou e viveu novos e intensos amores.

Em 1956, fez sucesso com a música Filha de Chico Brito, composta por Chico Anysio. No ano seguinte, um jovem compositor apresentou a Dolores uma composição dele e de Vinícius de Moraes. Tratava-se de Antônio Carlos Jobim em início da carreira. Em três minutos, Dolores pegou um lápis e compôs a letra da música Por Causa de Você. Vinícius ficou encantado com a letra e gentilmente cedeu o espaço a Dolores. Foi revelado, a partir daí, o talento de Dolores para a composição e grandes sucessos, como Estrada do Sol, Ideias Erradas, Minha Toada e A Noite do Meu Bem, entre outros.

Cantou no Uruguai, na União Soviética e na China, na companhia de músicos brasileiros, mas por desentendimento dela com o grupo, Dolores muda de planos e realiza seu grande sonho, viajando da China sozinha para Paris. Ficou um bom tempo passeando e conhecendo as maravilhas da cidade-luz, a bela e encantadora Paris.

De volta ao Brasil algum tempo depois, pegou para criar uma recém-nascida, pobre e negra, a quem deu nome de Maria Fernanda da Rocha Macedo, que foi registrada por Macedo Neto, mesmo estando ele separado de Dolores e a menina não ter com ele qualquer parentesco. A mãe biológica de Maria Fernanda era viúva e havia falecido após o parto, pois não aguentou a emoção de ter perdido o marido, padrasto da menina, que foi uma das vítimas da pior tragédia em trens suburbanos do Rio de Janeiro. A bebê iria ficar com a empregada de Dolores, amiga da mãe da criança, mas por ela ser muito pobre, acabou entregando a neném para Dolores, que se encantou perdidamente pela criança e deu todo amor e carinho possíveis. Passeava com a menina e lhe deu tudo de bom que o dinheiro e o amor podiam proporcionar.



A partir daí, durante os dois últimos anos de vida, compôs algumas das mais marcantes músicas da MPB, como Castigo e Olha o Tempo Passando, entre tantas outras.

Na madrugada de 23 de outubro de 1959, depois de um show na boate Little Club, a cantora saiu com seu último namorado, chamado Nonato Pinheiro e com seus amigos para uma festa no Clube da Aeronáutica. Ao sair da festa, resolveram fechar a noite bebendo e ouvindo músicas no Kit Club. A cantora chegou em casa às sete da manhã do dia 24. Brincou e beijou muito a filha, já com 3 anos, na banheira. Em seguida, passou os últimos cuidados à empregada Rita: "Não me acorde. Estou cansada. Vou dormir até morrer", disse brincando. No quarto, sofreu um infarto fulminante - que, à época, foi associado a uma dose excessiva de barbitúricos, cigarros e álcool. A morte prematura de Dolores Duran, aos 29 anos, interrompeu uma trajetória vivida intensamente. A amiga Marisa Gata Mansa levou os últimos versos de Dolores para Ribamar musicá-los. Carlos Lyra fez o mesmo sobre os versos inéditos. O ex-marido criou a filha adotiva deles.

Dolores Duran foi um grande expoente, como cantora e compositora, do gênero samba-canção, surgido na década de 1930. Além dela, destacam-se nesse gênero Maysa Matarazzo, Nora Ney, Dalva de Oliveira e Ângela Maria. O gênero samba-canção, pode ser comparado ao bolero pela exaltação do amor-romântico ou pelo sofrimento por um amor não realizado. O samba-canção antecedeu o movimento da bossa nova, surgido ao final da década de 1950. Mas este último, um amálgama do jazz norte-americano com o samba do Rio de Janeiro, representou um refinamento e uma maior leveza nas melodias e interpretações, que substituíram o drama pessoal e as melodias melancólicas.



Referências



1.↑ A grafia original de seu nome era Adiléia Silva da Rocha.

 2.↑ Dicionário Cravo Albim da Música Popular Brasileira.Dolores Duran (Adiléia Silva da Rocha)

 3.↑ Dolores Duran no IMDb

 4.↑ Uol Educação. Biografia: Dolores Duran (Adiléia Silva da Rocha).



Marcelo Teixeira

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Bibi Ferreira - A Dama dos Musicais Brasileiros



Bibi Ferreira, pseudônimo de Abigail Izquierdo Ferreira nasceu em Salvador no dia 10 de junho de 1922 e é uma atriz, cantora, diretora e compositora brasileira. Filha do grande e inesquecível ator Procópio Ferreira e da bailarina espanhola Aída Izquierdo, sua data de nascimento é um mistério e motivos de risos pela cantora: nem Bibi sabe ao certo o dia em que nasceu. A mãe dizia que ela nascera em 1º de junho; o pai falava que a data era 4 de junho mas, sua certidão de nascimento traz a data de 10 de junho. Fez sua estreia teatral aos 24 dias de vida, na peça Manhãs de Sol, de autoria de Oduvaldo Vianna, substituindo uma boneca que desaparecera pouco antes do início do espetáculo. Logo após os pais se separaram e Bibi passou a viver com a mãe, que foi trabalhar na Companhia Velasco, uma companhia de teatro de revista espanhola. Seu primeiro idioma, até os quatro anos, foi o espanhol. O idioma português e o grande amor pela ópera ela viria a aprender com o pai.

De volta ao Brasil, tornou-se a atriz mirim mais festejada do Rio de Janeiro. Entrou para o Corpo de Baile do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, onde permaneceu por longo tempo, até estrear na companhia do pai. Aos nove anos teve negada a matrícula no Colégio Sion, em Laranjeiras, por ser filha de um ator de teatro. Completou o curso secundário no Colégio Anglo Americano e aperfeiçoou os estudos de balé em Buenos Aires, no Teatro Colón.

Sua estreia profissional nos palcos aconteceu em 1941, quando interpretou Mirandolina, na peça La locandiera. Em 1944, montou sua própria companhia teatral, reunindo alguns dos nomes mais importantes do teatro brasileiro, como Cacilda Becker, Maria Della Costa e a diretora Henriette Morineau. Pouco mais tarde, foi para Portugal, onde dirigiu peças durante quatro anos, com grande sucesso.

Na década de 1960, vieram os sucessos dos musicais, como Minha Querida Dama (My Fair Lady), estrelado por Bibi e Paulo Autran. Nessa época atuou também em musicais de teatro e televisão. Em 1960, iniciou a apresentação na TV Excelsior de São Paulo, de Brasil 60 (61, 62, 63, etc, conforme o ano), um programa ao vivo, que durante dois anos levou à televisão os maiores nomes do teatro.

Bibi Ferreira participou, atuando ou dirigindo, de alguns dos grandes espetáculos teatrais e musicais montados no Brasil. Em 1970, dirigiu Brasileiro, Profissão: Esperança, de Paulo Pontes (foi numa das versões desse espetáculo que pela primeira vez dirigiu a cantora Maria Bethânia, na outra versão dirigiu Clara Nunes); em 1972, atuou em O Homem de La Mancha ao lado de Paulo Autran, com tradução de Paulo Pontes e Flávio Rangel, além das versões de Chico Buarque e Ruy Guerra para as canções; em 1975, participou de Gota d'Água, de Chico Buarque e Paulo Pontes; em 1976, dirigiu Walmor Chagas, Marília Pêra, Marco Nanini e 50 artistas em Deus Lhe Pague, de Joracy Camargo.

Na década de 1980, dirigiu de textos comerciais a peças de dramaturgia sofisticada, de musicais de grande porte a dramas intimistas. Em 1980, dirigiu Toalhas Quentes, de Marc Camoletti; em 1981, Um Rubi no Umbigo, de Ferreira Gullar, e Calúnia, de Lillian Hellman. No mesmo ano, com sua produção e direção, estreou O Melhor dos Pecados, de Sérgio Viotti, promovendo a volta aos palcos de Dulcina de Moraes, após vinte anos de ausência. Em 1983 voltou aos palcos com Piaf, a Vida de uma Estrela da Canção, espetáculo de grande sucesso de público e crítica. Por sua atuação recebeu os prêmios Mambembe e Molière, em 1984 e, no ano seguinte, da Associação dos Produtores de Espetáculos Teatrais do Estado de São Paulo (APETESP) e Governador do Estado. O espetáculo, que fez muitas viagens, permaneceu seis anos em cartaz e, em quatro anos, atingiu um milhão de espectadores, incluindo uma temporada em Portugal, com atores portugueses no elenco.

Dirigiu ainda inúmeros programas de televisão e shows de artistas da música popular brasileira, como Maria Bethânia e Clara Nunes nos anos 70 e 80.

Nos anos 90, Bibi Ferreira reviveu seus maiores sucessos, remontando Brasileiro, Profissão: Esperança e fazendo um espetáculo em que cantava canções e contava histórias de Piaf. Em Bibi in Concert, comemorou 50 anos de carreira e, depois de anos de temporada, fez o Bibi in Concert 2. Em 1996 recebeu o Prêmio Sharp de Teatro. Encenou Roque Santeiro, de Dias Gomes, em versão musical. Em 1999, dirigiu pela primeira vez uma ópera, Carmen de Georges Bizet.

No ano de 2001, Bibi estreia no Rio de Janeiro o espetáculo Bibi Vive Amália, no qual contava e cantava a vida da grande fadista portuguesa Amália Rodrigues. No ano de 2003 foi homenageada pela escola de samba carioca Viradouro. Ainda em 2003 dirigiu Antônio Fagundes em Sete Minutos. Em 2004, lançou CD e DVD do show Bibi Canta Piaf, em que a artista interpretava a cantora francesa Edith Piaf. Em outubro de 2005, Bibi Ferreira estreou o show Bibi in Concert III - Pop, em São Paulo.

Em 2007 Bibi voltou ao teatro de prosa em Às favas com os escrúpulos, de autoria de Juca de Oliveira e dirigida por Jô Soares.

Em 2009, em pleno Ano da França no Brasil, voltou ao palco do Maison de France para uma curtíssima temporada de Bibi canta e conta Piaf, do alto dos 87 anos, quando cantou Piaf e La Marseillaise, além do Chant des partisans.

Sem sombra de qualquer dúvida, Bibi Ferreira é nossa estrela maior dos palcos brasileiros e europeus, cantando, cantando e cantando. Sua voz pesada transforma-se em angelical em questão de segundos e nos revela uma artista multimídia, na qual nos apaixonamos apenas pelo olhar. Hoje o Mais Cultura! promove uma justa homenagem à uma das atrizes e cantoras que mais prestaram homenagens aos musicais e valorizando a Música Popular Brasileira.



Marcelo Teixeira.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

A Segunda Pele de Roberta Sá

Roberta Sá é uma das poucas cantoras neste mundo contemporâneo e moderno e informatizado demais que consegue ser uma das melhores interpretes de sua geração. Sua voz é doce, saudável, bela e cada vez que a ouvimos cantar, mais queremos ouvi-la. Roberta saiu desses programas ditos descobridores de talento, perdeu a colocação, saiu antes do programa ir ao fim, mas foi direto para a gravadora testar a sorte grande. Lançou discos importantes para a nova MPB e, diga-se de passagem, um disco melhor que o outro. Roberta Sá simplesmente é o que há de melhor na música popular brasileira de todos os tempos, inclusive o moderno. E ter uma cantora deste porte sendo homenageada pelo Mais Cultura! desta semana significa não apenas o reconhecimento de uma excelente cantora, como a receptividade do grande público para com ela por onde ela passa.

Segunda Pele (2011 - 2012 / Universal Music – MP,B Discos / 27,99) é mais um delicioso disco de Roberta Sá, desses que a gente precisa ficar horas, dias, semanas, meses, anos escutando cada faixa, degustando cada palavra, sentindo o frescor e o aroma de tudo que nele nos transmite. O disco é perfeito, claro, objetivo e nos deixa enfeitiçado, carinhosamente satisfeito e com a sensação de que Roberta Sá fez uma compilação de músicas propositadamente para angariar o bom resultado para um excelente disco. Capa, fotos, resolução, produção, tudo se encaixa neste quarto disco de estúdio da cantora, que se firma cada vez mais como uma das principais líderes do canto feminino atual.

O disco é um dos mais ousados da carreira de Roberta, pontuado por climas e nuances distintos de Braseiro (2005) e de Quando o Canto é Reza (2010), uma justa homenagem a Roque Ferreira. A atmosfera que Roberta criou também limitou canções de protesto de Pedro Luís ou suas próprias canções, dando um ar menos intimista e deixando outros compositores abrilhantarem sua magistral carreira, ministrando juntamente com compilações raras e esquecidas e trazendo o frexo, o axé, o samba, a MPB e a bossa nova como há muito não se via por bandas de cá.

Abrindo o disco com Lua, Roberta exprime o que há dentro de si com tamanha voracidade e garra, com o grupo A Parede por todo o canto, exprimindo ali um certo contorno entre voz e arranjos. O resultado é tão satisfatório e esmagatório, que Roberta tem voz dura, energética e determinada. Segunda Pele é a segunda faixa e passa da voracidade a calmaria que a canção exige: uma doçura de música, a faixa foi escolhida para ser título de sua obra recente. Pudera: a música é perfeita para ser ouvida e cantarolada em qualquer momento, sob qualquer aspecto. Bem a Sós é uma canção divertida, rápida e absorta de qualquer sentimento, embora a canção seja um sambinha ligeiro e com a intenção de revelar o amor a uma pessoa extremamente tímida. Enquanto que O Nego e Eu é um samba rasgado, um pagode de roda e muito festeira, que mostra a adversidade rítmica e judiciosa que somente João Cavalcanti consegue exprimir.

Altos e Baixos é uma música longa, às vezes soa cansativa, mas a mensagem que Lula Queiroga e Gustavo Ruiz querem transmitir é boa e criteriosa. Esta canção nos remete, em partes, à música Belo Estranho Dia de Amanhã, do segundo álbum da cantora, Que Belo Estranho Dia Pra Se Ter Alegria (2007), cujo mais parece uma continuação, tamanha a aproximação entre harmonia e mensagem. Você Não Poderia Surgir Agora é mais uma de Dudu Falcão, especialista em levar emoção às pessoas, muitas delas cantadas por Lenine e que aqui não faz diferente. 

Jorge Drexler, depois de cantar com Maria Gadú, Tiê, Maria Rita, solta a voz neste disco em uma canção própria e de uma beleza descomunal. O que até então estava brasileiro demais, Roberta resolveu importar sua rica brasilidade para terras de língua espanhola. Mas o resultado não saiu de todo ruim, porque Roberta canta bem seja em língua brasileira, seja em espanhol. Pavilhão de Espelhos, a música de trabalho, é linda, exótica e perfeita. Do mestre Lula Queiroga, grande amigo da cantora e que já lhe deu canções belas e de cunho nacional (só neste disco têm duas faixas suas), a música já é um sucesso e seu clipe já foi acessado inúmeras vezes na rede social.

No Bolso é a única canção do disco assinado por marido / esposa, no caso Pedro Luís, do sensacional grupo A Parede, com Roberta Sá e a única também que Roberta assina, tendo em vista que a cantora é uma compositora excelente e de qualidade, tendo suas músicas já gravadas por Mariana Aydar e que conseguiu êxito ainda mais reconhecido. Deixa Sangrar, de Caetano Veloso é divertido, um sambinha de carnaval que nos remete aos velhos tempos de uma saudade enorme extraída pelo tempo, aonde o carnaval era apenas um divertimento a parte. Deixa Sangrar foi uma canção já gravada por Gal Costa no ano de 1970 em seu álbum LeGal, de enorme sucesso e que virou show homônimo depois, com retumbante sucesso também.

A Brincadeira é composição de Moreno Veloso, filho de Caetano, cujo se transforma na melhor faixa do disco, sendo uma espécie de brincadeira infantil, brincadeira amorosa, brincadeira de duas pessoas que querem se divertir e se amar, onde a música de roda, de cantiga, os uniu e os deixaram felizes. E para encerrar, Arrebol, que significa alvorada, do grande mestre Wilson Moreira: para ser sincero, esta música não deveria ter um fim e a voz de Roberta poderia nunca se calar. Música esta de uma tristeza e de uma alegria embutida cujo a bela voz da cantora se faz presente e nos deixa a pergunta: existe outra cantora atual com o mesmo talento de Roberta Sá?

O novo disco da cantora saiu com um pequeno atraso e o que era para sair em Janeiro, acabou saindo em meados de fevereiro e o encarte do disco diz que o disco foi lançado originalmente em 2011, sendo que na verdade, o próprio site da cantora e segmentos indicaram que o disco sairia em Janeiro de 2012. Seja como for, valeu a espera, afinal, o novo disco de Roberta Sá é uma obra prima: literalmente.



Segunda Pele

*********Nove Estrelas



Marcelo Teixeira






sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Joelma - a terceira pior cantora do Brasil

De tempos em tempos surge no Brasil e no cenário musical, aquela cantora ou cantor que só nos trás desgosto ou vergonha alheia pelo seu trabalho para representar o país. Isso não acontece somente no Brasil, mas sim em diversos países ao redor da Terra e muitos desses cantores considerados bregas não são produtos de exportação e muitos não aparecem na mídia devido seu grau de insanidade artística. Isso acomete ao brasileiro um chamado inesperado, porque sempre tivemos cantores bregas ou que passam por seriíssimos agravamentos vergonhosos. Os cantores bregas sempre foram bregas e nunca deixaram que isso acometesse uma irregularidade em seus currículos. Pudera. Os tempos eram outros e o investimento neste segmento era caro, alto para os padrões do que era chamado de brega. Havia o orgulho de ser brega. Havia a necessidade de ser brega. As pessoas não tinham vergonha em dizer seus ídolos preferidos e muitos deles eram bregas.

Hoje essa breguice passou a se chamar cafonice e muitos cantores bregas passaram a ser chamados de lixo comercial, o que eu chamo e considero de quilo de lixo brasileiro, produto sem exportação e sem a necessidade de ser altamente reconhecido. Os tempos mudaram, o brega mudou, o cafona deixou de ser algo impopular e dos horizontes de bandas musicais, tivemos acesso direto ao camarote VIP da televisão e o passaporte carimbado de artistas sem noção, artistas sem reconhecimento algum e artistas indesejosos.

Neste meio surgiram cantoras e bandas de forró ou sertanejos ou duplas de cantores que são um verdadeiro vexame e que não compensa citar todos aqui porque seria uma injustiça com aqueles que eu possivelmente esqueceria. Uns cantam bem, outros representam muito bem seu estado natal, mas muitos passaram do cenário nacional generalizado para o canal aberto das aberrações. E para começar, cito a cantora Joelma, da banda Calypso, como exemplo de como ser considerada uma das piores cantoras do Brasil.

Joelma não canta, Joelma grita. Joelma não dança, Joelma pula. Joelma não é uma cantora, Joelma é uma cigarra oxigenada do porão do sertão que apareceu para ser queimada em praça publica. Joelma é o esgoto que precisamos para transportarmos nossa sujeira musical. Uma cantora que mereceria ter todos os seus discos queimados. Suas danças são horripilantes e seu grau de conhecimento musical e artístico é nulo, praticamente zero. Joelma é a pertencente numero três da série de cantoras que estragam, denigram, hostilizam, mascaram e apedreja um Brasil doente e vitiligoso culturalmente.

Os critérios para ser considerada uma das piores cantoras do Brasil são tão simplórios, que basta olharmos Joelma ou sua banda. Uma cantora sem fundamentos, sem estilos, sem cruzamentos direto com a cultura, sem valor. Berra mais do que canta, pula mais do que dança e mais parece um ventríloquo do que uma mulher. Infelizmente temos que lidar com este tipo de personalidade na mídia, na TV aberta, nas capas de revistas de fofoca ou até mesmo nas redes sociais. Essa lama de má conduta artística não terá um fim, porque se mata uma Joelma hoje, nasce uma Joelma amanhã e para isso renasce a mesma Joelma que outrora estava morta e enterrada e assim caminha a humanidade.

Deixemos o brega no passado e nos concentremos nas aberrações da cafonice protagonizada por Joelma e truque limitada: o verdadeiro lixo brasileiro.



Marcelo Teixeira

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

O samba de Aline Calixto

Do universo do samba cadenciado e influenciado por Clara Nunes, Alcione e Leci Brandão, nasceram cantoras com qualidade e disposição para mostrar que samba também é coisa de mulher. Há tempos não se via cantoras realmente com potencial no samba, no samba de roda ou no partido alto e este segmento está sendo novamente preenchido por cantoras como Fabiana Cozza, Tereza Cristina e Aline Calixto, cantoras estas que conseguem dar um banho de qualidade musical. E hoje o Mais Cultura! veio para mostrar o talento reconhecido por Aline Calixto.

A cantora mineira é mais conhecida no Rio de Janeiro, onde é apontada com muito entusiasmo por sua bela voz e por seu estilo, brilho único e capaz de nos enfeitiçar a primeira audição. Realmente muito bonita, Aline Calixto prefere não comentar sobre beleza, mas sim demonstrar que entende de samba no pé e que sua única qualidade é cantar. Afilhada de Zeca Pagodinho, a cantora se mostra surpresa com a repercussão de seu segundo trabalho, Flor Morena e por captar ainda mais fãs por onde passa.

O disco de Aline Calixto realmente é uma obra prima gerada da combinação entre samba e pagode de mesa, dos tempos de Dona Ivone Lara, Clementina de Jesus ou Jovelina Perola Negra. Sua voz energiza o disco e o que se tem neste álbum é a compilação de um trabalho gostoso de ouvir, delicado e sensato. Aline acertou quando o intuito era agradar ou simplesmente mostrar o samba de verdade. O título do disco veio de Zeca Pagodinho e é uma música tão agradável, que fica impossível não sambarmos. De Martinho da Vila veio a faixa que abre o disco, Gemada Carioca, praticamente uma autobiografia da cantora, mostrando de onde vem sua origem, numa bem elaborada composição.

Flor Morena (2011 / Warner Music / 24,99) compõe catorze faixas e só de bambas do samba. De Martinho da Vila a Zeca Pagodinho, passando por Moacyr Luz e Paulinho da Viola, indo até Mauro Diniz e concluindo com Edil Pacheco e Paulo Cesar Pinheiro, o disco promete e diz a que veio. Aline também é compositora e das boas e isso é provado na bela canção Conversa Fiada, que trata o falso amor como motim de uma separação. O disco de Aline é composto pela desenvoltura do pagode de mesa, pelo samba sincopado, pelo partido alto e pelo bom samba que estava meio escondido e só absorto graças a Fabiana Cozza atualmente.

Engraçado, espontâneo e que trata das mazelas do amor são retratado de uma forma autentica por Aline Calixto. Na canção de Paulinho da Viola, Coração Vulgar, está provado que o amor e a desilusão são provas cabais de que no samba defendido por Cartola e Candeia ainda são suficientes para se criar notas sambísticas. A canção é uma das mais belas do disco e Aline derrama toda sua versatilidade para o samba rasgado, assim como na faixa mais cômica do álbum, Blá Blá Blá, que fica difícil ficarmos só ouvindo.

O prazer em ter Aline Calixto no cenário da música popular brasileira e do samba não se remete a apenas obter um excelente disco, com composições de qualidade e com uma desenvoltura inteligente. Não basta somente ouvir Aline Calixto, temos que absorver Aline Calixto, ver Aline Calixto, adorar Aline Calixto. E, acima de tudo, idolatrar uma das melhores sambistas dos últimos tempos.



Flor Morena

*********Nove Estrelas

Marcelo Teixeira

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Marina de La Riva - a mistura entre Brasil e Cuba na MPB



Marina de La Riva é uma cantora brasileira, filha de uma mineira com um cubano. Desta mistura entre Brasil e Cuba nasceu uma das cantoras mais promissoras de todos os tempos e de um novo ritmo e estilo na música popular brasileira. Esta combinação resultou em um maravilhoso disco e alçou Marina ao topo das novas cantoras brasileiras ao patamar único de dividir espaço com grandes nomes da nossa música. Pudera: Marina de La Riva canta muito bem, é afinada e tem músicas tão harmoniosas, saudáveis e cabíveis de um senso comum que fica impossível não levar em conta seu talento e carisma.

Marina de La Riva (2007 / Universal Music / 38,99) é o primeiro disco de sua carreira, que leva seu próprio nome. Neste álbum tem diversos estilos como a rumba, a marcha-frevo, o samba, a habanera, a conga, o baião, o afoxé e o cool jazz latino, fazendo uma miscelânea entre a música brasileira com a música cubana. O resultado é tão satisfatório, tão belo e gracioso, que fica difícil não dizer o contrário. Marina canta bem e seu primeiro álbum tem uma capa e contracapa perfeitas, com descrições importantes e com fotos marcantes e sensíveis.

Homenagens a Luiz Gonzaga na música Adeus, Maria Fulô, a Carmen Miranda e a Dona Ivone Lara dão a dimensão da grandeza deste disco de estreia. Marina mostra que não está, definitivamente, para brincadeiras e que fazer músicas de verdade são o motim para demonstrar isso. Lançar um disco é a coisa mais complicada, ainda mais quando não se tem um padrinho ou alguém que possa divulgar o disco, mas Marina teve a sorte de escolher um bom repertório, mostrar a nós, brasileiros, a verdadeira música cubana em canções que expressam todo o sentimento cubano em letras que falam de carinho, amor e esperança. Marina de La Riva pinçou do passado músicas que já estão batidas, cansadas e regradas a exaustão por diversos cantores da MPB e as renovou, deu novo som e brilho e misturou com canções que são muito populares por aqui, como as de Cuba.

A grande surpresa deste disco é o cantor e compositor Chico Buarque, que adora participar de discos de cantoras desconhecidas ou de fazer duetos com as mesmas. Isso aconteceu com Roberta Sá, Thaís Gullín, Fernanda Porto e a sobrinha Bebel Gilberto e no passado ajudou Zizi Possi e Elba Ramalho a se encontrarem na MPB. Chico participa da canção Ojos Malignos em um dueto pra lá de sensacional. Ter a honra e a satisfação de ter um cantor à altura de Chico Buarque não é mérito para qualquer um e Marina soube aproveitar o cantor em uma música linda, charmosa e romântica.

Marina de La Riva Ao Vivo Em São Paulo (2010 / Universal Music / 32,99) veio como uma segunda consagração para a cantora. Casa extremamente lotada, fãs entusiasmados e uma banda afinadíssima, Marina de La Riva soltou a bela voz em canções já consagradas e conhecidas do primeiro disco e as juntou com canções que fizeram um charme a parte neste álbum ao vivo, como Adivinha o Quê?, de Lulu Santos e Bloco do Prazer, que fez a alegria de Gal Costa nos anos 80 e que Monique Kessous a regravou recentemente e a fez ficar famosa com sua bela regravação mais pausada.

Marina de La Riva é uma cantora brasileira com sangue cubano, que consegue nos passar a atmosfera de um país que tenta deixar a imagem de conservadorismo selvagem e de um regime fechado marcado por guerras interiores e massacres sangrentos. No meio disso surge triunfal uma das cantoras que luta contra este regime, que luta por melhorias, que luta pelo fim do exílio de seu pai naquele país e que segue cantando brilhantemente sem rancor ou mágoas e sem um pingo de arrependimentos.



Marina de La Riva

********Oito Estrelas

Marina de La Riva Ao Vivo Em São Paulo

*******Sete Estrelas



Marcelo Teixeira


segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Joyce, a brasileira que o Brasil não conhece

Sem dúvida alguma, Joyce é uma cantora muito pouco falada, comentada, ouvida, assistida e interpretada aqui no Brasil. Somente quem conhece ou entende de música popular brasileira sabe do que estou falando. Joyce é uma dessas cantoras que são tão afinadas, tão coerentes e importantes que muitos preferem ouvir, cantar e devorar cantoras aquém de sua personalidade. É difícil descrever o talento desta cantora. No Japão e nos Estados Unidos, Joyce é apontada nas ruas, celebrada nos shows, comentada nos restaurantes e seus discos são consumidos diariamente. Aqui no Brasil é preciso criar uma pagina de blog para que as pessoas possam reconhecer seu talento e trabalho.

Em 1963, participou pela primeira vez de uma gravação em estúdio, no disco "Sambacana", de Pacífico Mascarenhas, convidada por Roberto Menescal. A partir daí, gravou alguns jingles e começou a compor. Em 1967, classificou sua canção "Me disseram" no II Festival Internacional da Canção (RJ). No ano seguinte, lançou seu primeiro LP, "Joyce", com texto de apresentação assinado por Vinicius de Moraes na contracapa. Em 1969, gravou seu segundo disco, o LP "Encontro marcado". Entre 1970 e 1971, fez parte, juntamente com Nélson Ângelo, Novelli, Toninho Horta e Naná Vasconcelos, do grupo vocal e instrumental A Tribo, chegando a gravar algumas faixas no disco "Posições", lançado pela Odeon. Em 1973, gravou, com Nélson Ângelo, o LP "Nélson Ângelo e Joyce", único registro profissional da cantora no período compreendido entre 1971 e 1975, quando se dedicou exclusivamente às filhas Clara e Ana, nascidas em 1971 e 1972, respectivamente.

Retomou a carreira em 1975, substituindo o violonista Toquinho, ao lado de Vinicius de Moraes em turnê pela América Latina. Com o sucesso das apresentações, foi convidada, em seguida, para participar dos shows do poeta pela Europa, já com Toquinho de volta ao grupo. As apresentações geraram, na Itália, a gravação do LP "Passarinho urbano", produzido por Sérgio Bardotti para a etiqueta Fonit-Cetra em 1976. Nesse disco, a cantora interpretou músicas de compositores brasileiros que naquele momento estavam tendo sua obra censurada pela ditadura militar, como Chico Buarque, Milton Nascimento, Caetano Veloso, Maurício Tapajós e o próprio Vinicius de Moraes. O disco teve lançamento discreto no mercado brasileiro no ano seguinte.

Em 1977, apresentou-se em temporada de seis meses em Nova York, gravando mais um LP internacional, "Natureza", em parceria com Maurício Maestro. O disco, com produção e arranjos do maestro alemão Claus Ogerman e participação de músicos da área do jazz, como Michael Brecker, não chegou a ser comercializado. A partir do ano seguinte, começou a ter suas músicas gravadas por outros intérpretes como Milton Nascimento, Elis Regina, Maria Bethânia, Boca Livre, Nana Caymmi, Quarteto em Cy, Joanna, Fafá de Belém e Ney Matogrosso, entre outros. Em 1980, participou do Festival de Música Popular Brasileira da TV Globo, classificando "Clareana" , canção de ninar escrita em Roma, em 1976, para suas filhas, e que já sugeria a caçula Mariana (que só nasceria três anos depois) no verso "... Clara, Ana e quem mais chegar..." . Nesse mesmo ano, gravou o disco "Feminina", com destaque para a canção título, e "Clareana", sucesso de vendagem e responsável pela primeira grande exposição da cantora na mídia.

Ainda na década de 1980, lançou os LPs "Água e luz" (1981), "Tardes cariocas" (1984), "Saudade do futuro" (1985), "Wilson Batista: o samba foi sua glória" (1986), "Tom Jobim: anos 60" (1987), uma homenagem, com Gilson Peranzzetta, aos 60 anos de vida do compositor, que escreveu o texto de contracapa, "Negro demais no coração" (1988), um tributo a Vinicius de Moraes, e "Joyce ao vivo" (1989). Lançou, em 1990, o LP "Music inside" e, no ano seguinte, o LP "Language of love". Em 1993, realizou em The Fridge (Londres, Inglaterra), para um público de 2.000 pessoas, o primeiro show de um artista brasileiro no circuito acid-jazz.
No ano seguinte, a EMI-Odeon lançou o CD "Revendo amigos", songbook de seus sucessos na interpretação de outros cantores. Ainda na década de 1990, gravou os discos "Delírios de Orfeu" (1994), "Live at Mojo Club" (1995), "Sem você" (1995), uma parceria com Toninho Horta em segunda homenagem a Tom Jobim, "Ilha Brasil" (1996). Em 1997, publicou o livro "Fotografei você na minha rolleyflex", uma coletânea de crônicas e histórias da música popular brasileira. Entre 1998 e 2000, atuou como cronista semanal do jornal "O Dia", e lançou os discos "Astronauta" (1998), um tributo a Elis Regina, e "Hard bossa" (1999).  Criou e apresentou, durante o ano de 1999, o programa "Cantos do Rio" (TV Educativa), dedicado a mostrar o Rio de Janeiro e seus músicos. Divulgando a música brasileira em seguidas turnês internacionais, ministrou workshops, em 2000, no Rytmisk Konservatorium de Copenhagen (Dinamarca) e em Soweto (África do Sul). Ainda nesse ano, seu CD "Astronauta" foi indicado para o Grammy Latino, na categoria Melhor Disco de MPB. Também em 2000, gravou o disco "Tudo bonito", que contou com a participação de João Donato.

Nascida Joyce Silveira Palhano de Jesus, teve seu nome alterado para Joyce Silveira Moreno, no dia 5 de maio de 2001, em função do registro civil de seu casamento com o baterista Tutty Moreno. Nesse mesmo ano, lançou o CD "Gafieira moderna", contendo suas canções "Samba da Silvia" (Elza Soares), "Risco" (c/ Léa Freire), "Quatro elementos" (Paulo César Pinheiro), "Forças d’alma", "Na casa do Villa", "Pega leve", "The band on the wall", "Bota de sete léguas", "Diz que eu também fui por aí" e "Azul Bahia". Fez show de lançamento do disco na Sala Baden Powell (RJ), acompanhada pelos músicos Rodolfo Stroeter (baixo), Tutty Moreno (bateria), Nailor Proveta (clarineta) e Teco Cardoso (sopros). Em 2002, voltou a apresentar o programa "Cantos do Rio", transmitido pela Band-Rio, e apresentou-se no Japão e na Europa.

No ano seguinte, lançou o CD "Banda Maluca", contendo suas canções "Os medos" e "Cartomante", ambas com Rodolfo Stroeter), "A Banda Maluca", "Chuvisco", "Na paz", "Samba do Joyce", "For hall", "Mal em Paris", "Pause, Bitte" e "Tufão", além de "L’étang" (Paul Misraki), "Galope" (Rodolfo Stroeter) e "A hard day’s night" (Lennon e McCartney). Lançou, em 2005, o DVD "Joyce & Banda Maluca - Ao vivo". Em 2006, lançou, com Dori Caymmi, o CD "Rio-Bahia", contendo suas canções "Daqui" (c/ Rodolfo Stroeter), "E era Copacabana" (c/ Carlos Lyra), "Rancho da noite" (c/ Paulo César Pinheiro), "Demorô" e a faixa-título, além de "Mercador de siri", "Flor da Bahia", "Jogo de cintura" e "Saudade do Rio", todas de Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro, "Fora de hora" (Dori Caymmi e Chico Buarque), "The colors of joy" (Dori Caymmi e Tracy Mann), "Saudade da Bahia" (Dorival Caymmi), "Joãozinho boa pinta" (Geraldo Jacques e Haroldo Barbosa) e "Pra que chorar" (Baden Powell e Vinicius de Moraes). O disco, gravado no ano anterior em São Paulo, para os mercados inglês e japonês, foi lançado no Brasil numa parceria entre a Biscoito Fino e o selo Pau-Brasil. Ainda em 2006, a dupla fez show de lançamento do CD no Teatro Rival (RJ), acompanhada por Tutty Moreno (bateria), Rodolfo Stroeter (baixo) e Marcos Nimrichter (piano e acordeom).

Em 2008, participou do espetáculo "Bossa nova 50 anos", realizado na Praia de Ipanema, no Rio de Janeiro. Também no elenco, Carlos Lyra, Roberto Menescal, Oscar Castro Neves, Wanda Sá, Leila Pinheiro, Emílio Santiago, Zimbo Trio, Leny Andrade, Maria Rita, Fernanda Takai, João Donato, Marcos Valle e Patrícia Alvi, Bossacucanova e Cris Delanno. O show, em comemoração aos 50 anos da bossa nova, e também celebrando o aniversário da cidade do Rio de Janeiro, teve concepção e direção de Solange Kafuri, direção musical de Roberto Menescal e Oscar Castro Neves, pesquisa e textos de Heloisa Tapajós, e apresentação de Miele e Thalma de Freitas.

Hoje o Mais Cultura! homenageou uma das maiores e melhores interpretes da nossa música e uma das mães da Bossa Nova: Joyce Moreno ou simplesmente Joyce.



Marcelo Teixeira

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Alexandre Pires: de pagodeiro a fútil.

O pagodeiro Alexandre Pires
Depois de pagodear com o Só Pra Contrariar e fazer o país inteiro matar baratas e ver aquele bigodinho ridículo com aquele cabelinho de lado, depois de tentar a carreira solo com pagodinhos românticos melados e sem açúcar, depois de tentar uma carreira internacional sem sucesso e depois de amargar com o lado latino brega pagodeiro, Alexandre Pires tenta uma volta triunfal para o cenário musical, mas outra vez ficará a mercê das tentativas. Hoje Alexandre Pires não vinga mais, não é mais aquele artista empolgante ou que satisfaz plateias inalteradas com seu gingado ou com sua voz. Alexandre Pires canta bem, tem timbre, é esforçado, mas infelizmente seu estilo pouco importa ou pouco acrescenta para a cultura brasileira hoje em dia. Depois de amargar um pequeno ostracismo generalizado, voltou romântico, porém esnobe, orgulhoso e febril e isso não foi nada benéfico a sua carreira, pelo contrário: foi a pior volta possível que um cantor poderia obter. Primeiro porque Alexandre Pires tentou ser um galã da música contemporânea, rótulo este que ele nunca obterá e segundo porque Alexandre Pires já deu o que tinha que dar na música pagodeira ou romântica ou seja lá o que for que ele queira representar.
Somos obrigados a compartilhar a vergonha alheia a qual Alexandre Pires está fadado a fazer: uma dancinha escrota, imbecil, inútil e sem graça com um monte de macacos fantasiados dançando ao seu redor, com mulheres seminuas por todos os lados e com uma coreografia insana, incapaz de ser reproduzida aqui. Alexandre Pires canta, dança, movimenta os macacos dançantes e sorri desde o começo até o final da canção como se ele mesmo estivesse gostando da palhaçada a qual está interpretando. A vergonha está tão nitidamente incoerente, que o próprio cantor se sente envergonhado quando termina a canção. Mãos para cima, corpo para o lado, gestos obscenos, macacos dançantes, Alexandre Pires com boina e camiseta regata estilo verão, sorrindo, enfadonho, para uma câmera sem ação.
Fica difícil imaginar o porquê Alexandre Pires resolver fazer essa canção, mas em sua própria explicação, o cantor diz que foi como uma brincadeira: compôs a canção e juntamente com amigos resolveu fazer uma zoação e o resultado é tão chulo, intolerante, incapaz, chucro, que fica a pergunta no ar: merecemos isso? Um país com tantos cantores inúteis e burros, com tantos parangolés e joelmas e chimbinhas e pagodeiros e cantores sem estilo, com tantos artistas esdrúxulos e não merecedores de aplausos, por que Alexandre Pires, com um histórico razoável de um patamar errôneo, nos aparece e nos apresenta uma dança sem graça e sem fundamentos?
Que a carreira do ex-pagodeiro está fadada ao esquecimento, disso todo mundo sabe, mas tentar uma volta à mídia fazendo um apelo comercial tão apelativo e antissocial é demarcar o próprio território para o falecimento geral de suas atividades. Que Alexandre Pires possa conhecer de perto o verdadeiro significado da palavra mico para que tenha a nítida certeza da burrada que fez com sua própria carreira. E ao invés de macacos dançantes, o que ele deveria homenagear eram galinhas voadoras iguais as que ele tem ao seu lado atualmente.

Marcelo Teixeira.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

A discreta Juliana Amaral em dois discos excelentes

O primeiro disco, de 2002, ótimo
Não é fácil cantar as músicas de Juliana Amaral: sua voz tem um timbre fino, apurado e na maior parte das vezes, cantar com ela dá aquela sensação de cansaço, exaustão. Talvez seja por isso mesmo que Juliana Amaral tenha um misto de querer mais e ousadia. Seus dois discos, Águas Daqui (2002) e Juliana Samba (2007) são de uma profundeza melancólicas misturadas com canções que nos fazem pensar sobre o amanhã, sobre a política, sobre o rumo da natureza perdida, sobre o amor. Juliana Amaral não é uma cantora qualquer, mas acima de tudo, eleva seu dom maior a criticar as mazelas de uma vida cotidiana, de um amor reprimido, da estupidez do ser humano, das Minas Gerais perdida numa estação qualquer do ano. Ouvir Juliana Amaral é ter a nítida sensação de bem estar, de afeto, de capricho, de solitude, de paixão.
Recomendo Juliana Amaral e seus dois belos discos pelo simples fato dela ser uma das expoentes da nova MPB que fazem sucesso sem incomodar  próximo, sem interferir na vida alheia e sem fazer rodeios. Ela simplesmente canta e canta tão maravilhosamente bem que fica impossível dizermos o contrário. Lembremos sempre de sua voz com uma mistura de qualidade e sabedoria e pensemos em suas músicas como um leitor lembra de um grande livro ou um jornalista de uma grande reportagem.
O segundo disco, de 2007, sambas perfeitos
Suas músicas são a prova de que a qualidade da música popular brasileira é a melhor possível e que estamos diante uma artista completa, difícil de ser cantada, mas fácil de ser compreendida. Sua emoção nos transmite a certeza de que a teatralidade musical ainda está viva, mesmo que esquecida nos dias de hoje por músicos que estão na mídia. Sua vivência em nos mostrar músicas da mais alta qualidade, da mais alta competência e do mais alto patamar está em seus discos, tão profundamente merecedores de aplausos quanto de prêmios.
Juliana Amaral não é uma cantora conhecida do grande público, suas músicas não tocam nas rádios, seu nome não é associado aos grandes nomes nem carimba seus shows em grandes eventos, mas vale ressaltar que Juliana Amaral lançou dois discos importantíssimos para a música popular brasileira e que merece toda a nossa atenção. Seu crivo maior é ser cantora e seu impulso artístico nos leva a certeza de que a MPB está salva de jenipapos do mundo globalizado de homens de ternos que manipulam o serviço daqueles que realmente podem nos mostrar algo realmente útil e satisfatório.
O aspecto vital do intimismo de Juliana Amaral está justamente na recriação de clássicos da MPB para a modernidade. Recriar o universo de uma canção e a recontar de uma forma sua, unilateral e ulterior é um fascínio e uma singularidade que poucos conseguem e Juliana consegue dar conta e brilho destes critérios com tamanha desenvoltura, que muitas vezes soa a intenção de música nova.
Prestem muito atenção neste nome e corram para obter seus discos, pois futuramente eles serão raros e artigos de luxo na sua coleção: JULIANA AMARAL.

Marcelo Teixeira