sexta-feira, 27 de setembro de 2013

O tempo de Anitta está se acabando


Show de horrores
Anitta é uma cantora popular que canta músicas que o povão gosta de ouvir: mulher poderosa, popozuda, sensual, que trai o marido, que sempre está por cima da carne alheia, mas o que Anitta não sabe é que ela é um fantoche da música popular brasileira e sua música é tão pobre e fraca que dá pena vê-la cantar e dançar e retorcer toda para parecer sensual. Anitta surgiu cavalgando no meteóro de Luan Santanna, caiu no palco da música popular, diz que é tímida, que foi pobre, que ama Sandy, idolatra Naldo, mas é fraca ao ponto de ser uma mulher infâme ao ponto de ser infâme. Anitta (2013 / Warner / 24,99) não acrescenta em nada na nossa rica cultura e a prova maior disso é seu disco de estreia, intitulado Anitta, com dois T para que ninguém possa esquecer ou confundir com as futuras anittas no mercado. O fato é que Anitta tem percentual para a burrice: ouvi seu disquinho e pude constatar que o disco é todo parecido, com uma música se igualando a outra. Resultado: Anitta consegue não apenas ser infâme, mas capacitada de pouca inteligência para conseguir não cantar músicas diferentes da tal Show das Poderosas, que consegue ser um estrondoso sucesso Brasil a fora. Pudera, a música gruda feito chiclete em nossos ouvidos e a toda hora temos que dizer prepara.

Não estou aqui destilando venenos na coitada da Anitta e me perdoeem os leitores que estão acostumados a lerem artigos mais piedosos, mas Anitta consegue carregar todos os adjetivos possíveis à sua pessoa. Mas o que me chama a atenção nela é a sua capacidade de ser uma pessoa diferente dentro da MPB: ela consegue usar suas artimanhas para conseguir se privar de ser o que ela é. Além de infâme, o disco é fraco, fraco, fraco. Fraco, aliás, igual seu grupo seleto de amigos cantores, que conseguem fazer do povo brasileiro um seleiro de cabeças ocas.

Anitta é a aberração cantante que surgiu nos últimos anos. Sua voz, assim como seu disco inteiro, é cansativo, deprimente, sofrido. Mas depois de tanto apreciar, estudar, tentar dialogar com amigos sobre sua pessoa (e música), cheguei a conclusão de que Anitta é a junção de tudo de ruim que assola a música popular brasileira alguns anos. Dentro da Anitta existe um pouco de Sandy, Wanessa Camargo, Joelma, Paula Fernandes, Perlla, Kelly Key e isso apenas para ficar nas porcarias musicais.

Anitta talvez não esteja preparada para encarar o ostracismo em sua carreira. Se a cantora voltar com um disco novo com as mesmas propostas que este primeiro, certamente será encaminhada para o limbo das cantoras sem futuro incerto que existem por ai. Seu disco de estreia é chato e serve apenas para embalar funks melódicos e festas amaldiçoadas. Embora seja dançante, a maioria das músicas e danças de Anitta nos levam a sensação de que Show das Poderosas não tem um fim especifico. Oremos para que isso aconteça logo e que deixemos de ouvir e ver a presença tão onipresente de uma pessoa caricata e pueril. Seja como for, o tempo de Anitta está se acabando. Será que ela está preparada?

 

O tempo de Anitta está se acabando / Anitta

Nota 1

Marcelo Teixeira

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

A preciosidade de Embalar (2013), de Ná Ozzetti


Um dos melhores de 2013
Sempre há uma expectativa da minha parte para os lançamentos futuros da cantora e compositora Ná Ozzetti. Assim que lança um disco novo na praça, não dando tempo nem desse respirar, já anseio pelo próximo trabalho e fico aguardando frenetica e ansiosamente pelo outro. Ná é uma das poucas cantoras que conseguem fazer isso comigo. Mal lançou Meu Quintal no final de 2011, a cantora vêm com carga total com Embalar, disco que faz uma reviravolta em sua carreira, com participações especiais e dividindo letras com cantoras mais novas. Embalar, antes de mais nada, é um disco de profusões de palavras, característica mais que assídua da cantora e que demonstra uma clareza vocal exuberante. A impressão que passa é que Embalar é uma sequencia magistral de Estopim, lançado em  1999, a começar pela capa, aonde mostra em ambas, Ná dançando balé clássico. As letras de Embalar também nos remetem à Estopim, tanto pela maneira de galgar as palavras quanto pelo estilo musical, que se difere de Meu Quintal. Ná é uma das principais vozes femininas do Brasil e disso não há o que discutir e Embalar comprova, nitidamente, o quanto sua presença é marcante dentro da Música Popular Brasileira. Mantendo um estilo cativo de manter-se inerte em seu mundo, a cantora lança discos sensacionais, não repetitivos, com qualidade, supremacia e, sobretudo, musicalidade. O que Ná talvez não saiba é que a sua música, para poucos, como bem disse na canção Pérolas aos Poucos (José Miguel Wisnik) no CD Voz e Piano (2005) é rica para alguns e misteriosa para outros.

Poucos conhecem Ná Ozzetti. Mas todos deveriam ter a obrigação de conhecer o seu trabalho. Lançando seu décimo álbum, Ná Ozzetti é respeitada por críticos e músicos pela sua voz, pelo seu canto, pela sua música. Ná Ozzetti é a voz principal da Vanguarda Paulista, que teve como padrinho o inesquecível Itamar Assumpção e foi através deste excepcional cantor que tive o prazer de conhecer o trabalho de Ná (e, por consequencia, de Virginia Rosa, Susana Salles, Vânia Bastos). Embalar (2013 / Circus / 24,99) foi produzido pela própria cantora em parceria com o irmão Dante Ozzetti e os amigos Mário Manga, Sérgio Reze e Zé Alexandre Carvalho e já está à disposição nas melhores redes para vendas.

Com 11 faixas, o CD está recheado de participações especiais, como a amiga Mônica Salmaso na faixa Minha Voz e Juçara Marçal em Musa da Música, num trava-língua irresistível. Marcelo Preto divide os vocais com a cantora em Olhos de Camões. A polêmica sobre o lesbianismo surge em Lizete, numa engraçada forma de rimar e Nem Oi é uma parceria entrosada entre Dante Ozzetti e o mineiro Makely Ka.

Surpresa agradável foi a composição entre Ná e Tulipa Ruiz, que fecha o disco com a mambembe Pra Começo de Conversa. Surpresa mais que agradável, tendo em vista que as parcerias, letras, melodias, ritmos e tudo o que completa neste sensacional disco, faz parte agora do cancioneiro da MPB por um todo. Ná é sempre Ná e seu novo disco é um dos favoritos a entrar para a categoria de melhor do ano. Sem papas, choros e velas, o disco é um presente aos fãs da cantora e chega em um bom momento, enquanto só se falam de Rock in Rio, divas americanas, conversas de Anittas e papagaiadas de Ivetes.

Salve, salve dona Ná!


Embalar / Ná Ozzetti
Nota 10
Marcelo Teixeira

 

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

As histórias de Paulo Cesar Pinheiro em livro


Histórias sem fim
Hoje o Mais Cultura Brasileira será diferente, experimental, divertido e universal. Diferente porque não falarei de música por completo, mas sim de leitura embalado por músicas. Livros tão bem escritos remetem à músicas muito bem compostas. E Paulo César Pinheiro tem uma vasta carreira musical que não compromete a ninguém e muito menos inveja à ninguém. Paulo César Pinheiro é música para os olhos. Não, não irei falar de nenhum show de Paulo César Pinheiro, nem de nenhum lançamento em disco. Vou contar um pouco da experiência que tive ao terminar de ler neste fim de semana o livro Histórias das minhas canções - Paulo Cesar Pinheiro. Cantado por mestres e divas da MPB, Paulo César Pinheiro foi marido de Clara Nunes, uma das maiores cantoras do Brasil, teve uma amizade verdadeira com Elis Regina, o mito brasileiro, foi cantado por Maria Bethânia, Joyce Moreno, Nana Caymmi e segue embalando novos cantores com suas preciosidades. Não é fácil ser Paulo César Pinheiro quando Paulo César Pinheiro é Paulo César Pinheiro: cantor, compositor, homem, carioca, letrista, poeta, solitário.

O formato de Histórias das minhas canções começou com Chico Buarque, numa espécie de biografia de suas canções, e revelando curiosidades e a verdadeira história das composições do artista. No entanto, este primeiro livro foi escrito com Wagner Homem, amigo próximo de Chico.  Já o de Paulo César Pinheiro tem um toque adicional de veracidade e intimidade, que é ser contado pelo próprio compositor e poeta. Poeta este que já tem mais de mil músicas e outras dezenas de parcerias, além de livros e álbuns. Poeta que hoje é reconhecido como um dos maiores compositores de samba e da música brasileira de todos os tempos.

Fã confesso de Guimarães Rosa, Paulo César Pinheiro era querido por Elis Regina por sua poesia na linguagem simples e quase popular, mas com uma profundidade estrondosa. Foi parceiro de Baden Powell, Mauro Duarte, João Nogueira, Lenine, Tom Jobim, Wilson das Neves, e hoje é parceiro dos filhos e outros jovens talentos, atravessando gerações.

O livro nos revela, através do coração do escritor, sua intimidade e sua forma de pensar as coisas com uma leveza e nos misticismos de suas crenças. Revela momentos seus, como a morte de sua mulher Clara Nunes, e porque resolveu compor uma música póstuma em sua homenagem.  Este que foi admirado por Carlos Drummond de Andrade, dividiu o parceiro Baden Powel com Vinícius de Moraes, tinha um poema seu num quadro na casa de Dorival Caymmi e outras divertidas hstórias, nos revela a cada folha algo novo, e nos mostra a magnitude de sua obra.

Paulo Cesar Pinhero é a voz das tradições do samba, do samba generoso que divide, agrega e que arrebata os corações de quem sabe sambar. Bom samba a todos!

Leitura indispensável!
 

Livro: História das minhas canções

Autor: Paulo Cesar Pinheiro

Edirora: Leya

Preço: em média 45,00

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Falso Brilhante (1976): disco impecável de Elis Regina


 

Elis em momento sublime
Falso Brilhante é um dos discos mais emblemáticos da carreira de Elis Regina e foi um álbum que marcou uma época através de seus trejeitos, nuances, formas e equilibrio, que até hoje é muito comentado e lembrado por fãs que tem cada passo da cantora na mente. Praticamente nenhum outro cantor ousou em cantar as músicas imortalizadas por Elis, exceto Como Nossos Pais, que vez por outra uma cantora aqui ou outra ali se esquiva na interpretação e tentam se igualar à Pimentinha, num erro tosco e grosseiro. Elis se transforma em um dos melhores e maiores discos de sua lavra e Falso Brilhante fez a efervescência musical e teatral nos anos de 1976. Como não vivi a época deste espetáculo (eu viria a nascer alguns anos mais tarde), Falso Brilhante é um relato deixado por quem viveu intensamente naquele ano e é um registro de uma parte do repertório da bem-sucedida turnê de mesmo nome, na qual Elis se apresentou durante meses no Teatro Brigadeiro, em São Paulo, lotando a casa com cerca de 1000 lugares todos os dias.  Os relatos sobre o show a qual tive contato são impressionantes e, para escrever este artigo, me fartei de inúmeros materiais audiovisuais e conversas com pessoas que pararam suas vidas para ficarem horas na fila do ingresso ou simplesmente perderem seus respectivos trabalhos.

Vale ressaltar que a turnê de Falso Brilhante só chegou a um fim antes do previsto, porque Elis ficou impossibilitada fisicamente para continuar com o espetáculo, só para se ter uma ideia da intensidade do show. E pela primeira vez nesses anos todos de Mais Cultura!, eu me prezo sobre os dízeres de terceiros para me aventurar numa áerea em que pouco atuo: o de entrevistar pessoas anônimas sobre determinado espetáculo. Confesso que curti muito conversar com essas pessoas e saber mais sobre os anos de chumbo e cujo a censura ainda ministrava algo no país. Estar com essas pessoas aumentava ainda mais a minha voracidade em poder escrever sobre um dos discos mais importantes da música popular brasileira.

Falso Brilhante tem 10 faixas, todas gravadas em estúdio e que abarcam inúmeros estilos. Uma novidade e tanta à MPB e até mesmo a musicalidade de Elis, é que o disco vinha com uma forte influência do rock, com presença marcante da percurssão e das guitarras e além disso, o disco serviu para Elis mostrar aos críticos que era mais que uma cantora, era uma intérprete de verdade. Acreditando ou não em sua música, Elis foi acusada de ser manipuladora, fria e sem emoção a partir do álbum Elis, de 1973 (no qual está a linda É Com Esse Que eu Vou) e isso se deve ao fato de que, naquele período, a cantora ser obcecada em melhorar seu registro vocal e atingir a perfeição de sua voz. Isso fez com que ela fosse duramente criticada em todos os sentidos, mas, depois que ela amadureceu artisticamente, fez com que fôssemos presenteados com sua grande voz em um grande disco, como este de 1976.

Abrindo o disco com o maior sucesso até hoje cantado, Como Nossos Pais, que mistura rock e MPB num lirismo profano e em plena ditadura militar, a música falava da falta de esperança na juventude acomodada  que queria mudar o mundo, mas ficava no mesmo conforto de seus lares observando os aflitos de longe. A música passa a ser um soco no estômago de muita gente que queria ficar parada no tempo, a espera de um milagre qualquer. A música foi um adendo para que Belchior, o compositor, virasse estrela de primeira grandeza e, sem querer, Elis gravaria Velha Roupa Colorida, uma extensão da primeira, mas sem a carga depressiva e autoritária que ela carregava.

Fascinação é o clássico do disco, ainda que não destoe de arranjos modernos demais. Esta música também é muito conhecida, tanto pelo seu puro mito cristalino quanto pela interpretação emocionada que ganhou. Jardins de Infância, da dupla João Bosco e Aldir Blanc, é uma ótima letra, com excelente ritmo e que aqui também é magistralmente interpretada. Quero, de Thomas Roth, representa a porção folk de todo o disco, logo quebrada com a praticamente flamenca Gracias a la Vida, que é entoada em seguida.

E surge O Cavaleiro e os Moinhos, da dupla Bosco/Aldir, uma canção introspectiva, que marca ainda mais a dramaticidade de Elis. Para encerrar com chave de ouro, não havia coisa melhor do que ter Chico Buarque e sua Tatuagem (em companhia de Ruy Guerra), com uma letra romântica, suave, tenra, doce, generosa. Todo grande disco tem que ter, por obrigação, uma canção de Chico e aqui não foi diferente.

Falso Brilhante foi o maior sucesso da cantora em vida (e até hoje comentado). Assim como o show é considerado revolucionário, transgressor e antológico, sempre constando nas listas dos melhores, Elis não tinha a certeza de que estava entrando, definitivamente, para o rol das grandes divas brasileiras (mesmo cantando, às vezes, músicas que não a representaram em algumas fases de sua vida). Imparcialidade de lado (eu mesmo já critiquei severamente Elis em artigos nada pomposos), Falso Brilhante é o melhor disco brasileiro de todos os tempos, igualando com O Canto das Três Raças, de Clara Nunes, lançado também em 1976, ou Álibi, lançado por Maria Bethânia em 1978.

Se na época foi um tapa de luva na cara de quem se recusava a acreditar na espontaneidade de sua intérprete, hoje é a mais marcante lembrança dela e daquela geração que, através de sua arte, driblou a censura, a ditadura, os moralismos e os coronéis para expressar seus sentimentos com uma forma verdadeira. Elis nos faz crer na música, na sua música e no Brasil mais justo, onde a habilidade de mostrar-se nua e crua é a mesma habilidade de cantar com vestes de palhaço como se fossêmos palhaços. Músicas com respostas bem diversas e subjetivas, mas que cabem perfeitamente aqui, já que Falso Brilhante é um trabalho que foi símbolo de uma geração, de uma carreira, de uma vida, de uma diva, de Elis Regina.

 


Falso Brilhante / Elis Regina
Nota 10
Marcelo Teixeira

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

O senso (in)comum de Rodrigo Pitta em disco elitizado


Rodrigo: pouca voz em CD elitizado
Mesmo sendo um dos cantores e compositores da nova geração com um certo respeito no mundo da produção cinematografica e teatral, Rodrigo Pitta não me agrada como cantor. Suas letras são ótimas, com excelentes tiradas sobre o mundo moderno e sobre a cidade cinza que é São Paulo, mas sua voz não me agrada em nada. Ao menos suas canções estão no patamar de serem as melhores dos últimos tempos e as mesmas canções poderiam ser cantadas por cantores de qualquer estirpe dentro do melhor da MPB. Menos por Rodrigo Pitta, seu idealizador.  Disco de estreia do artista, Rodrigo lança Estados Alterados em um clima de mistério e sofisticação de elite. Sim, a música de Pitta não é para qualquer classe social e não é qualquer um que pode chegar e dizer que gosta de seu trabalho, até mesmo porque Rodrigo Pitta transpassa o ar de intelectual demais num país em que os jovens são mais ligados em estilos mais popularescos, como Anitta, Naldo ou qualquer outra aquisição menos comportamental. Mas o disco de estreia de Pitta é mediano, para ficarmos apenas no mediano. Estados Alterados foi gravado no Rio de Janeiro e masterizado no outro lado do mundo, no Japão e tem toda a cara de São Paulo por um único motivo: ser cinza demais. Produzido por Arto Lindsay, o disco exibe como tema capital a melodia Sambas Alterados, incluída na novela atual global, Amor à Vida e não por acaso, a faixa ganhou um eficiente clipe gravado na Ponte Estaiada, na zona sul de São Paulo, e traz intervenção de Racionais MCs, recitando a letra de Sampa, de Caetano Veloso.

O trabalho é definido por Rodrigo Pitta como diversas químicas que o levam a estados alterados e o amor é uma delas, assim como a dor. No disco há também músicas para dançar, temas do candomblé, drogas e suas alterações de consciência e senso de realidade. E a própria vida urbana com seus variados estados de ser, estar, permanecer e ficar. Assim como a melancolia urbana às vezes é árida, às vezes suave e melódica no seu interior, Pitta traduz uma felicidade ímpar num trabalho que teve dois anos de gestação, entre março de 2011 e março de 2013. O disco, repito, não é ruim, mas a voz de Rodrigo Pitta, por vezes, cansa, enjoa e nos faz forçar os dedos para desligar o som para que não possamos ouvir sua música devido a sua voz ser chata. Tirando isso, o disco tem um senso comum equilibrado, gostoso de ver, de pegar, de comentar. Apenas.

Da tristeza romântica de Blue Tuesday, a única música em inglês, ao mix de house e rock de Caos, o disco tem uma pitada brasileira nordestina em Água Tudo e Eletroquímico, assim como a saborosa Estados Alterados. Bad Trip e Minha Cabeça, Meu Avião são como sintomas de saudades sobre as viagens de Pitta e sobre desiluções amorosas do mesmo.

Estados Alterados é para a classe média e para o ouvinte mais ligado na música chique e bem elaborada. Não para qualquer um.



Rodrigo Pitta / Estados Alterados
Nota 4
Marcelo Teixeira

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

O lado asco de Naldo: a sua música!


Naldo: totalmente oco
Nós tínhamos um excelente repertório no início de carreira”. A frase poderia ter saído da boca de um Caetano, um Chico, um Milton, um Gil ou um Djavan ou, até mesmo de uma Ná Ozzeti, Tiê, Tulipa Ruiz, Rita Lee, Maria Rita, mas não. Saiu da boca de um cantor fajuto que saiu da pobreza cantando marombas sem pé nem cabeça e embalando cabeças ocas e sem futuro. A frase é de Naldo agora Benny, porque talvez ele ache melhor ter um sobrenome americanizado. A frase dita por Naldo foi proferida no programa do apresentador Roberto Justus e quando dita, soltei uma risada iâmbica, assustadoramente igual ao da usurpadora Paola Bracho. Se Naldo tinha um excelente repertório no início de carreira, então o que ele canta hoje são louvores dignos de uma plateia repleto de ignorantes marginalizados que estão ali para ouvir e ver um cantor com mais músculos que inteligência musical. Naldo é um desses cantores que merecem ir para a latrina e ao darmos várias descargas, temos que ter a certeza de que ele não voltará a nos perturbar. Perturbação é com ele mesmo, por sinal. Ultimamente, o cantor tem participado de programas de auditorio e fazendo ar de garoto propaganda de vários patrocinadores com sua musiquinha horrenda e sem intelectualidade alguma.

Desejo vida curta ao Naldo pelo simples fato de que sua própria vida musical é digna de panfletagem mórbida. Naldo é a personificação da pior espécie de músico, o que consegue atrair para si um número gritante de loucas e alucinadas e ainda por cima consegue ser o centro das atenções até mesmo quando o assunto não é música, uma área que ele, definitivamente, não conhece. Lançando seu mais recente disquinho, Na Veia, Naldo emplacou apenas um sucesso, mas está mais conhecido como o garoto da dúvida entre wisk ou água de coco. Pra ele tanto faz.

A frase faz parte de uma pergunta de Justus sobre o início da carreira musical do cantor, que fazia dupla com o irmão, assassinado à tiros e que Naldo evitou tocar no assunto. Formavam um grupo de rap carioca e o tal disco fora lançado no inicio dos anos 2000. Nesse mesmo ano, quem estourava de norte ao sul do país era a diva baiana Daniela Mercury, que estava ao seu lado no programa e que mal conversaram. Deboche de si mesmo, Naldo é o pior cantor surgido nos últimos anos. Até mesmo um cantor sertanejo recém chegado ao mundo fonográfico seria melhor que ele. Venhamos e convenhamos, mas Naldo já deu o que tinha que dar.

 

O lado asco de Naldo: a sua música!

Marcelo Teixeira

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

A palavra de Chico Buarque



A nova fase de Chico em 1995

Uma Palavra (1995 / BMG / 22,99) é o 29° disco da carreira de Chico Buarque e é um paradoxo fascinante do ponto de vista crítico de um artista completo. Entre as quinze faias não figura sequer uma única composição inédita, mas o disco em si parece ser inédito, principalmente por novos adeptos ao mundo buarqueano. Todas as músicas, no entanto, compartilham ao menos três unanimidades sequenciais de beleza, sofisticação e intelectualidade. A primeira unanimidade visivel é que as quinze faixas integraram o repertório do show Paratodos, que rodou o Brasil entre 1993 e 1994. A segunda unanimidade é que nenhuma delas figura no álbum com esse mesmo nome que Chico lançaria dois anos antes, no caso, 1993. A terceira unanimidade e, de longe, o mais importante, é que em comum, Chico trouxe ao disco Uma Palavra todas as composições de maior relevância uma interpretação e releitura novas, idealizando assim, uma nova roupagem para músicas como Rosa (1979), Samba e Amor (1969) ou Pelas Tabelas (1984).

Canções tão diversas e distantes entre si no tempo, como Valsa Brasileira (1988) e Amor Barato (1981) tiveram estruturas rítmicas praticamente reinventadas e o resultado foi um disco marcante para o seu lançamento (1995), em que a obra de Chico Buarque explora novas e ricas fronteiras no território da musicalidade. Uma Palavra foi também o primeiro disco de Chico lançado no formato CD.

O disquinho, na verdade, é um discão. Capa bem caprichada, mostrando um Chico ao mesmo tempo novo e entrando na terceira idade, mistuando-se entre uma foto antiga, faziam toda a diferença. Sua faixa de abertura, Estação Derradeira, fora gravada originalmente no disco Francisco, de 1987. Morro Dois Irmãos, a seguinte, se alia à primeira e formam hinos agridoces ao Rio de Janeiro, em cujas letras se misturam entre o fascínio e as mazelas da cidade.

Este clima mais denso é quebrado na sequencia pela doçura da valsa-choro Ela é Dançarina, que fora gravada para o disco Almanaque (1981). Ofuscada na gravação original por obras-primas como As Vitrines ou O Meu Guri, a música desta vez explodiu. Ela narra o divertido relacionamento de um casal que mal se encontra diante da natureza de suas ocupações. Samba e Amor é a canção gravada no esquecido disco Chico Buarque de Hollanda 4, de 1969 e que ficou famosa na interpretação malemolente de Caetano Veloso. A Rosa, música que lhe fora encomendada pelo astro italiano Sergio Endrigo e Joana Francesa, composta em 1973 para um filme de Cacá Diegues, em cuja letras Chico faz incríveis jogos poéticos bilíngues, faz com que o disco soe mais atual.

O Futebol é um samba-homenagem aos craques Pelé e Mané Garrincha, Didi, Pagão e Canhoteiro, ídolos confessos de Chico. As canções finais do disco são marcos consideráveis e de maior relevância da carreira magistral de Chico. A assanhada e aquecida Pelas Tabelas tornou-se involuntariamente o hino da campanha pelas Diretas Já. Eu Te Amo é uma das mais belas parcerias entre Chico e Tom Jobim, praticamente dispensa comentários. Valsa Brasileira fora composta pelo amigo de longa data Edu Lobo e transformou-se em uma pérola clássica da MPB.
 
O deboche suave do samba Amor Barato, o balanço pessoal altamente poético contido nos versos de Vida e, por fim, a faixa-título são de uma beleza retumbante. Embora um tanto hermética, Vida ainda é uma tocante homenagem de Chico à matéria-prima de seu trabalho. Mesmo atravessando boa atuação da crítica e de fãs (que triplicaram desde o lançamento de Paratodos, em 1993), Chico resolveu ficar enclausurado no segundo semestre de 1995, escrevendo entre a ponte áerea Rio/Paris seu segundo romance, Benjamim.

Antes de aventurar-se pelas ideias de um cinquentão que revê sua vida sendo fuzilada, Chico Buarque nos presenteou com um belo disco, com clássicos de sua carreira, nos brindando, mais uma vez, com sua intelectualidade perversa, ácida e, ao mesmo tempo, impressionante.

 
Uma Palavra / Chico Buarque
Nota 10
Marcelo Teixeira


quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Clarice Lispector por Simone Guimarães


Clarice: ótimo
Milton Nascimento a definiu como selvagem e é através desta selvageria que Simone Guimarães abraça seu último disco, intitulado Clarice, numa justa homenagem à escritora ucraniana naturalizada brasileira, trazendo para a fonografia brasileira um registro audacioso e grandioso. Clarice é um dos mais belos discos brasileiros produzidos nos últimos anos e toda essa beleza e dramaticidade pode ser conferida através do som de uma das mais espetaculares cantoras surgidas nos últimos tempos. Seu nome é Simone Guimarães, a qual o Mais Cultura! teve o prazer de entrevistar este ano. Sempre tive vontade de escrever sobre livros e música e o universo particular de Clarice Lispector (1920 / 1977) invade a alma da musicista e toca fundo no coração de quem ouve Clarice (2013 / Café & Pupunha / 24,99), um dos mais belos discos de Simone Guimarães e praticamente selecionado ao posto de melhor CD do ano. Invadir a alma literária de um escritor renomado e transformar sua melancolia, sua vivência, seu carisma, seu mau humor, sua discrepância, sua circuncisão, sua solitude e sua maestria em música é algo realmente dificil, transgressor e um pouco rebelde. A selvagem Simone Guimarães entra em conluio a obra intimista e solitária de Clarice Lispector e nos brinda com canções altamente sofisticadas, com um lirismo profundo e sentimental, com convidados luxuosos que nos faz crer que a música e a literatura ainda possam andar juntas, lado a lado, num enrolar de mãos. Simone traz todo o louvor de categoria refinada e lustrosa e coloca em xeque-mate todo o seu sentimento pela escritora, através de músicas sublinhadas pelo equatorial senso comum que seus livros representam. Ao ouvir canções como Clarice e Como a Vida, o ouvinte mais atento já estará familiarizado com todo o resto do disco. E para o leitor mais assíduo de Clarice, este encontrará diversas nuances na musicalidade de Simone para com o tratamento da obra da escritora.

Com convidados mais que especiais, Clarice conta com um ninho de poesias e pilhas de versos diversos cantarolados em um misto de carinho e sentimentos. Toda a melaconlia bucólica e sofrida por Clarice ao longo de sua vida estão espalhadas em músicas como Sem Mais Tristeza ou Como a Vida. A claridade com que as músicas são disparadas a ouvidos solenes fazem com que o ouvinte mais atento agarre o disco por completo, tamanha a sua identificação com a obra da escritora. Prevalece também os duetos, sensacionais, a qual Simone nos presenteia. Está aqui as irmãs de Chico Buarque, Miúcha, mãe de Bebel Gilberto e Ana de Hollanda, assim como os filhos de Dorival Caymmi, Danilo e Tom Jobim, Paulo.

 

Basta olhar nos teus olhos, Clarice

Olhar que ninguém vê

Como são claros, os teus olhos Clarice!

Claros de convencer

Tão evidentes, manifestos, inequívocos

Claros, Clarice... mas distinto o seu caminho!

Saudades de você

Só pra encontrar o seu mundo Clarice

Procurei escrever

(Trecho de Clarice, letra e música de Simone Guimarães)

 

Dando um show de interpretação à parte, a cantora Ilessi canta com a alma a canção Rastros no Asfalto, composição que, álias, é de seu pai, o compositor Gonzaga da Silva. A música é sublime e o dueto de Ilessi com Simone é de arrepiar. Uma mistura de evidência e saudade é transpirada em Estrela do Mar, com a capacidade vocal de Danilo sagrando-se sobre a voz de Simone, entrelaçando e destoando toda a emoção sentimental e floral aquecida e coloquial sobre Yemanjá, estrelas e caminhos desertos.

O otimismo e a afetuosidade foram os pontos fundamentais para a elaboração deste trabalho tão genial e primoroso a qual Simone Guimarães adentrou de cabeça para projetar o universo de uma das mulheres mais influentes do País. Mostrar seus sentimentos, seus medos, anseios, círculos de amizades e repulsa pelo novo através de uma folha em branco e repassar tudo isso para a música não é uma das tarefas mais fáceis. Mas Simone conseguiu fazer um trabalho vigoroso, digno de merecimento de aplausos efusivos e contagiantes. Muito criativa, Simone possui um charme especial para com a música que entra em seus poros e sua sinceridade permite que mesmo diante das mais difícieis situações, encontra um lado positivo e entusiasma a todos a sua volta.

Simone soube aproveitar cada música com requintes intelectuais para fazer um excelente trabalho. Clarice nos mostra interiormente, mesmo que em planos distantes, o quanto nossas vidas não nos pertence e essa dimensão é transportada em melodias ricas de detalhes e vozes em uníssono carregadas de emoção. O desejo íntimo da alma, como reaginos, pensamos e somos, nossas esperanças, nossos sonhos, nossos ideais, nossas motivações, nossas forças resgatadas. Por vezes, a voz de Miúcha nos remete a pensar que Clarice Lispector está presente, em nossa frente, em nossa visão rente e humana. E isso é válido, pleno e sereno, pois Clarice nos faz crer que a alma é pertencente a este mundo, ao mundo em que vivemos.

Músicos de altíssima categoria, como Novelli e Leonel Laterza fazem um diferencial e tanto para o disco, em canções carregadas no alto valor afetuoso. Em Janaina, Meu Canto de Guerra, temos a certeza de que o além existe e as vozes de Novelli e Simone tornam a se misturar, entregando-se aos prazeres do místico. André Mehamari é um dos músicos mais competentes da atualidade e faz uma justa participação com seu piano em faixas como Clarice e Vi. Tem também Guilherme Arantes (Muito Diferente) e Leandro Braga no arranjo e piano em Como a Vida, Passarinhada, Rastros no Asfalto e Beija-flor Colibri.

Com um ar de Clube da Esquina, Simone recria com classe a música Vera Cruz, de Milton Nascimento e Márcio Borges e as vozes secundárias fazem toda a diferença, dando a dimensão da voz da cantora: selvagem, distinta, intrépida.

A realidade de Clarice Lispector transpassa para Simone Guimarães na mais pura e inquieta transição. Talvez seja um recado da cantora para a posteridade ou, quem sabe, para a modernidade conhecer a obra dessa grande escritora. Mas precisamos ouvir Clarice para termos a plena certeza de que a música popular brasileira como um todo, está a salva de intrépidos cavaleiros urbanos contrariados com a própria imagem surrealista. Precisamos abraçar Clarice para que tenhamos a nítida certeza de que a música popular brasileira está capacitada de vozes como a de Simone Guimarães, que é uma cantora excepcional, assim como seu mais recente disco.

 

Clarice Lispector por Simone Guimarães

Nota 10

Marcelo Teixeira