quarta-feira, 31 de outubro de 2012

O futuro de Wanessa


A cantora pop Wanessa
A cantora Wanessa (sem o sobrenome famoso) está começando a cair no meu conceito. Sou uma pessoa exigente musicalmente falando e, em todos os aspectos, não gosto de música teen, nem norte-americana, dando vazão e preferencia à música inteiramente brasileira, ora com pitadas europeias ou de língua castelhana (como faz Marina de La Riva) e quando há a junção das línguas estrangeiras, como fazem as cantoras Bebel Gilberto, Thaís Gullín e Mallu Magalhães. Alguns cantores de excelente gabarito, como Maria Gadú e Lenine, interagem em uma canção ou outra em seus discos com outros idiomas, o que não fica chato, nem muito menos caricato. Mas dedicar sua carreira inteiramente à um estilo que não é o tradicional para poder cair definitivamente nas graças de uma galera nada exigente, que quer apenas dançar, pular e se divertir, sem se interessar pela mensagem da canção, é fazer rir da desgraça alheia e estar no patamar mais elevado para enfim, poder dizer que se tornou uma cantora rica de fãs, rica de personalidade, rica de atitudes e rica de muita burrice.

Assim a cantora Wanessa, que já foi criticada aqui no Mais Cultura! como umas das piores cantoras do Brasil, conseguiu cair no meu conceito: estive verificando sua nova trajetória há quase três meses e confesso que me orgulho em ver que ela saiu da barra da aba da cantora perdida Sandy, para viver o seu mundo, imitando, agora, cantoras de um país que adora eleger as louras ao topo das melhores do mundo, como Adele, Lady Gaga, Madona, Britney Spears. Para tanto, Wanessa tingiu os cabelos de louro, imagino eu que para ser confundida com uma delas futuramente. Sair da aba de Sandy para ser praticamente igual às americanas, é sofrer para não padecer e isso está tirando o meu sono, literalmente. Wanessa não precisava ir tão longe para se igualar às cantoras de um país que por aqui fazem enorme sucesso. Bastava virar a esquina que logo encontrava o seu caminho.

Mas Wanessa foi mais longe: seu idioma agora passa do português ao inglês como num piscar de olhos e sua trupe aumentou (ouvi dizer que já passam de trezentos mil dançarinos no palco para fazerem a volta dela ao show bizz) e sua roupa, seus colares, seu cabelo também mudaram. Se igualar a cantora Sandy não dera muitos frutos, se igualar às americanas, dará? Retirar o famoso sobrenome e dançar ao estilo de Madona a fará mais famosa internacionalmente, com toda a certeza cabível de sustentação de artigos como este, mas dizer que Wanessa será uma das maiores cobiças de cantoras nacionais que deram certo lá fora, isso será impossível. Nem Ivete Sangalo conseguiu este feito.

Que saudades eu tenho de Carmen Miranda, que colocou os EUA, o Brasil e Cuba em suas mãos! Mas deixo um recado à Wanessa: não tente imitar as americanas. Tente imitar a si mesma, assim, a esquina que você poderia entrar, estará totalmente iluminada. Ou não.

 

O futuro de Wanessa

Marcelo Teixeira

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Sétimo pior cantor do Brasil: Belo


Belo, o 7° pior cantor
Que o cantor Belo não canta nada, disso todo o mundo sabe. Chega a ser ridículo sua música ser considerada uma das melhores (como andam dizendo alguns fanáticos por pagode) e sua presença ser constante nos programas de rádio e TV. Belo é o tipo de cantor que não acrescenta em absolutamente nada na cultura das pessoas e chega a ser engraçado ver seus passinhos de marionete perante uma multidão de fãs enlouquecidos por sua pessoa. Belo é o que há de pior tanto na música popular quanto no pagode. Embora haja uma resistência do cantor perante as exigências da música popular hoje em dia (principalmente no pagode, em que essa exigência é ainda maior), Belo segue seu caminho cantando músicas que falam de amor, sentimentos, carinhos e mulheres. Talvez seja por isso que ainda permanece na estrada resistindo ao tempo com altos e baixos. Mais baixos do que altos.

A exigência do mundo do pagode requer muito mais do que Belo anda cantando hoje em dia. Vejam casos como o de Thiaguinho, que acertou em cheio na qualidade musical e visual (mesmo que a alegria esteja imperando mais do que a ousadia a qual ele insiste em cantar), de Péricles, que anda cantando com verdade, com garra e determinação e de casos menos esfuziantes, como os de Alexandre Pires, que ora acerta, ora erra em seus caminhos. Cantores do mesmo estilo, como Vavá , Rodriguinho e Leandro Lehart, que erraram feio ao largarem seus respectivos grupos (Cara Metade, Os Travessos e Art Popular) ao seguirem carreira solo.

Chegando ao sétimo lugar na lista dos piores cantores do Brasil, Belo agora figura ao lado de estrelinhas como Paula Fernandes, Perla, Joelma, Mc Catra, Latino e Wanessa (que tirou o Camargo depois que se consolidou na música pop/teen). Integrar nesta lista requer uma qualificação exemplar: ter em seus atributos a alcunha de só fabricar lixos comerciais, não obter de faturamento cultural e, o mais agravante, ter algum requisito que não agrade a maioria da população exigente por boa musicalidade.

No caso de Belo, sua voz fanha e seus s com pronuncias presas me irritam de tal forma, que fica engraçado vê-lo cantar. Belo é a caricatura bestial do que sempre existiu na seara pagodeira e assim eu o vejo sempre: um misto de cantor fajuto com uma quantidade de cantor empobrecido musicalmente. Com roupas cafonas, sua música denota aquilo que já refletiu sua vida pessoal. Com tantos altos e baixos em sua carreira, Belo é o diminutivo que reflete a vida de milhares de pessoas que o acompanham: com mais baixos do que altos musicalmente falando.

 

Sétimo Pior Cantor: Belo

Marcelo Teixeira

 

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

O retorno de Baby do Brasil


 

Baby e o filho, Pedro: a volta
Baby* sempre foi do Brasil, mesmo quando assinava Consuelo. Apesar de ter trocado o nome artístico em meados dos anos 90, a vida inteira misturou toda sorte de ritmos em seu caldeirão, prevalecendo sempre o sabor tropical, bem brasileiro. Não é por acaso que ela é a nossa única cantora brasileira que fez sucesso cantando chorinho depois da fase áurea da rainha do gênero, Ademilde Fonseca e, também uma das raras a cantar samba de um jeito furioso e esfuziante como outra de suas referências, Elza Soares. E Baby também sempre fora polêmica. Ora com a barriga de fora, ora cantando praticamente como se estivesse recebendo um santo qualquer, Baby reproduziu no Brasil a espécie de uma das cantoras mais populares e descoladas dos anos 1970.

Quando Baby e Pepeu Gomes (seu então marido na época) alcançaram o topo das paradas de sucesso, foram participar imediatamente do Festival da Música em Montreux [1980, Suíça], onde cada um gravou seu primeiro disco ao vivo. Vale ressaltar que naquela época, somente os verdadeiros e bons cantores da MPB ou de movimentos ricos de imaginação e criação, eram convidados a participar do Festival da Suíça. Também participaram do Rock In Rio [1985, Rio de Janeiro], onde Baby estava grávida do seu filho caçula. Foi um choque para a população ver Baby cantando com a barriga de fora, já que isso, na época, era uma coisa fora do normal. Baby também aparece coberta de metais entortados por Thomaz Green Morton. 

Depois de um tempo afastada da mídia e dos palcos e sem lançar praticamente nenhum disco, Baby troca o Consuelo pelo do Brasil e se torna evangélica (o que, para mim, é a mais pura identidade desprovida de consolidação artística). Encontrou-se única e detentora de seus direitos através da igreja a qual pertencia e a partir deste momento, uma nova transformação acontece na vida da cantora. Retornou aos palcos na década de 90, já casada com o produtor Nando Chagas. O casamento durou 8 anos. Baby finalmente assume o nome artístico Baby do Brasil. Grava um especial com os Novos Baianos [Infinito Circular], em 1997. Também lança um livro chamado Peregrina ... Meu Caminho no Caminho, onde conta a sua passagem pelo caminho de Santiago de Compostela [Espanha].

A verdadeira responsável pela volta de Baby aos palcos foi da cantora Gal Costa, que, em conversa com Pedro, filho guitarrista de Baby, propôs a ele a ideia de dirigir a mãe em comemoração aos seus 60 anos de carreira, a qual ficou denominado Baby Sucessos. Talvez seja um choque para todos, mais uma vez vinda de uma das cantoras mais loucas da MPB: com uma carreira marcada por polêmicas e por altos e baixos, igrejas evangélicas, filhas pastoras, maridos calados, filhos numerosos, musicalidade boa, troca de nomes, cabelos coloridos, viagens, livros e a comemoração de seus 60 anos. É esperar para ver.

 

O retorno de Baby do Brasil

Marcelo Teixeira

*artigo idealizado por Diogo Silva, escrito por Marcelo Teixeira.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

O ostracismo de Vanusa


A cantora Vanusa
Símbolo de beleza e de excelente capacidade vocal, a cantora Vanusa sempre foi motivo de polêmica e cantoria. Loira, linda, exuberante e símbolo sexual de uma geração, pertenceu a Jovem Guarda, movimento musical que ajudou a afundar a Bossa Nova e a complicar a novata Tropicália. Todas queriam ser como a cantora Vanusa, com todos os seus adjetivos, seus trejeitos, seu corte de cabelo, sua pele branca como nuvem, seus lábios vermelhos, sua vivacidade. Se os Estados Unidos da América tinham sua Marilyn Monroe, nós tínhamos a nossa loira Vanusa. Casada com o grande cantor e compositor Antônio Marcos, Vanusa vivenciou todo o processo de luta do cantor contra o álcool e contra a depressão que ele passara. Vivenciou os altos e baixos de sua carreira brilhante, confidenciou letras de músicas que se tornariam sucesso e foi apaixonada por um dos músicos mais brilhantes que o Brasil já tivera e perdera.

Vanusa Flores é mais conhecida apenas como Vanusa. Gravou alguns sucessos como Manhãs de Setembro (uma alusão ao mês de seu nascimento), Mudanças, Paralelas entre outras. Fora sempre explosiva no falar, era polêmica nas entrevistas, mas mantinha uma doçura ao cantar que afastavam todos os adjetivos ruins à sua pessoa. Conheceu o ostracismo de perto e teve filhos não tão talentos assim. Durante muito tempo não cantou nada e não lançou discos, vivendo apenas de sucessos antigos e muitos programas não a chamavam mais para cantar. Passou a viver apenas de lembranças musicais de um tempo sem volta.

Recentemente, Vanusa foi parar nas redes sociais pelo fato de ter cantado o Hino Nacional errado, de torto a direito. Estava bêbada e acusou o efeito dos medicamentos contra a depressão para o feito. Todo mundo sabe que medicamentos para depressão não causam tonturas excessivas como aconteceram com ela, a não ser que seja tomado em grandes quantidades, como o frasco todo! Vanusa, a linda mulher loura que todas gostariam de ser e de estar perto, com o exuberante batom vermelho e com pele de nuvem, estava fadada ao fracasso e a única chance de dar a volta por cima (como fizera Elza Soares um dia),foi derrotada pelo inimigo que levou seu grande amor: o álcool.

Um amigo do Mais Cultura!, Edson Guedes, me contatou esses dias para noticiar-me de que Vanusa estava fazendo um show bem perto de sua residência, em Santo André, e a viu de uma maneira irreconhecível: bêbada, suja e maltrapilha. Assustou-se ao deparar com uma mulher com marcas no rosto, poros dilatados e que se mantinha firme para tentar ficar em pé. Vanusa estava na região para cantar na noite da terceira idade e o que se vira foi um festival de horror vindo da musa da Jovem Guarda.

Uma pena que o Brasil tenha que registrar momentos tão esdrúxulos como os de Vanusa, que disse a quase duas semanas que pretende parar de cantar e ficar reclusa no apartamento em que vive ou no interior de São Paulo. Espero que sua música seja mais forte que seu pesadelo. E esperemos, profundamente, que ela dê a volta por cima.

 

O ostracismo de Vanusa

Marcelo Teixeira

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Os caipiras adestrados Munhoz e Mariano


Que a música neo-sertaneja está deixando a desejar, disso todo mundo já sabe. Estamos passando por uma nova transformação no mercado fonográfico destinado ao estilo das botas e dos rodeios, que está me envergonhando a cada dia que passa. Depois de meteoros como Luan Santana, do inseto Gustavo Lima, do simpático (mas agora esquecido) Michel Teló (isso para ficarmos nos unitários no palco), a música sertaneja ganha mais uma dupla de caipiras abestados que mais se parecem com dois desequilibrados músicos que estão no palco apenas para demonstrar as babaquices que ambos fazem em casa. Um estilo de vou fazer sucesso e pronto. Munhoz e Mariano é a nova sensação do pedaço e sua música, a estupida e sem graça Camaro Amarelo, está tocando sem parar nas rádios de todo o país, deixando a mulherada louca e os homens fazendo coreografias iguais às dos marmanjos.

A meu ver, a dupla não canta absolutamente nada e estão ali no palco mais para mostrarem os dotes físicos (em várias fotos que o Mais Cultura! verificou nos sites de busca e nos vídeos destinados na rede mais famosa do mundo), a dupla aparece ora de sunga, ora sem camisa e, para complicar a situação, aparecem no palco apenas de sunga branca.  Chega a ser estupidamente grosseiro da minha parte, mas aceitar este tipo de aberração no cenário musical, é deixar que a música sertaneja siga rumos desconcertantes daqui há um futuro próximo. A dupla de caipiras adestrados Munhoz e Mariano comprova, em gênero, número e grau o quão imbecis da fabrica de sucesso eles são e o quão desqualificados artisticamente se mantêm.

Munhoz e Mariano é a aberração que pensei que nunca chegasse ao ponto de ser comentado aqui no blog, mas os seus trejeitos e suas atitudes são tão caretas e antiéticas que sou obrigado a resenha-los aqui. Vê-los cantar é a maior vergonha existente na face da Terra e confesso que fiquei de boca aberta ao vê-los pela primeira vez em um programa de televisão aberta fazendo coreografias eróticas denotativas de mau caratismo profundo e negligenciado. Eles são desengonçados, pueris e espalhafatosos e tudo isso demonstra o quanto a nossa música regional, que um dia fora motivo de orgulho para tantos, hoje está fadado a estilos medíocres como Munhoz e Mariano.

Com estilos como os de Munhoz e Mariano, a música sertaneja só vem confirmar apenas uma coisa: que o estilo está um verdadeiro lixo musical.

Lamentável.

 

Os caipiras adestrados Munhoz e Mariano

Nota 0

Marcelo Teixeira

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Para Caymmi


Dorival Caymmi costumava dizer que seu sonho era que suas músicas caíssem na boca do povo de tal forma que, no futuro, ninguém mais soubesse quem as havia composto ou de onde surgiram, como uma Ciranda cirandinha. Não é um status fácil de ser alcançado. O impressionante é que Caymmi viveu para ver algumas de suas músicas chegarem a esse ponto, embora elas só venham a cair oficialmente em domínio público em 2078. Milhares de pessoas acham que canções como O que é que a baiana tem?, João Valentão, Maracangalha, Peguei um Ita no Norte, Samba da minha terra (Quem não gosta de samba / Bom sujeito não é / É ruim da cabeça / Ou doente do pé) e Retirantes (aquele lerê-lerê que foi tema da novela Escrava Isaura) sempre estiveram por aí, sem autor conhecido. Algum dia, o mesmo deverá acontecer a Doralice, A lenda do Abaeté, É doce morrer no mar, Modinha de Gabriela, Rosa morena, Saudade da Bahia, Saudade de Itapoã, Só louco, Você já foi à Bahia? e outras maravilhas que ele nos deixou. Foram apenas 113 músicas, pouco para uma carreira tão longa, mas é uma obra que ajudou a construir a cultura e a identidade de um povo. A identidade do povo baiano.

Pouco antes de morrer, os três filhos ilustres do grande baiano resolveram homenagear o pai com um dos discos mais sublimes feito por um trio familiar. Coisa rara e inédita em dar certo, Nana, Dori e Danilo fizeram das tripas coração e conseguiram fazer um disco com inúmeros sucessos do pai cantados pelo mesmo e por artistas consagrados na música popular brasileira. O disco tem um brilho peculiar com afinidade única entre os três irmãos e a cada faixa parece que nos mostra o que a Bahia de fato tem, a riqueza de um Estado, a demonstração de afeto, o sol, calor, mulheres decididas e homens fortes e valentes.

Se um dia Dorival pensou em ser tão popular a ponto de não reconhecer suas próprias canções ou as fazendo cair num gosto popular diferenciado, talvez ele tenha quase acertado em algumas boas músicas, mas confesso que ainda será difícil de aceitarmos a questão. A Bahia de Dorival Caymmi é única. Assim como Dorival Caymmi é único.

 

Para Caymmi / Nanã, Dori e Danilo

Nota 10

Marcelo Teixeira

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Marítimo, de Adriana Calcanhotto


 

Capa de Marítimo, de 1998
A teoria musical de qualidade é o trinômio de ias: melodia, harmonia e poesia. Tem artista que vai aquém e esquece sorrateiramente algum dos elementos. Outros sobrecarregam uns em desfavor de outros e assim se faz a música brasileira: sem fórmula certa, mas que de alguma forma dá certo. Não sei como enquadrar Adriana Calcanhotto nesse parâmetro: sequer sei se há parâmetro. Sua obra é tão vasta e polivalente que não se consegue situar em qualquer categoria estreita ou pré-determinada. Arrisco dizer que seu trabalho é como a sexualidade de qualquer pessoa: desnecessita de rótulos ou denominações. Estudar sua carreira é constatar que ela é pop, cult, juvenil, adulta, poética, alegre, melancólica, eletrônica, voz-e-violão... um jogo infinito de paradoxos reinventados a cada fase. Não é de se estranhar que obtem fãs de extremidades igualmente opostas: dos humildes aos mais elitizados, todos se deleitam ao seu sabor.

Por excelência uma das mais admiradas cantoras dentro da MPB, Adriana consegue exprimir seus sentimentos através de sua musicalidade límpida e espontânea e talvez seja dai o seu vigoroso sucesso (com muitos acertos e poucos erros na longa estrada). Tem pano demais pra manga e muito do que se discorre sobre essa poetisa do Rio Grande do Sul, mas com genialidade de descrever com propriedade a cena carioca (onde morou) e a capacidade de usar e abusar de sua visão sobre o que há a seu redor - sejam as pessoas (cariocas são bonitos...cariocas são ousados), sejam abstrações (não sei bem onde larguei o leão que sempre cavalguei), ou homenagens ousadas (vamos comer Caetano...comê-lo cru).

Navegar a marítima trajetória de Adriana é ter uma aula completa de literatura. É perceber as influências diretas (Caetano Veloso, Lupicínio Rodrigues, Augusto de Campos, Gerture Stein, dentre tantos outros), condensadas em melodias deliciosas e letras que te traduzem e possuem uma atmosfera rítmica que te dão a sensação de viajar.

Homossexual assumida, Adriana Calcanhoto é companheira da cineasta Suzana de Moraes, filha do poeta e compositor Vinícius de Moraes. A relação de ambas já durava há décadas, e em 2010, diversos meios de comunicação, tanto brasileiros como portugueses, noticiaram sua oficialização.

Em 1998, começa a inacabada trilogia com temática mar, com o genial Marítimo. O nome remete à faixa que canta com Dorival Caymmi, Quem Vem Pra Beira do Mar, mas o disco tem muito mais! Adriana flerta com eletrônica e samplers bem modernos, e um filão de letras muito bem trabalhadas. Destaque para o sucesso Vambora e a versão remixada de uma música de seu álbum anterior, Cariocas.

Talvez seja o disco mais alegre de Adriana de todos os tempos. Sua voz brilha com a poesia de suas letras e sua mensagem se torna única. A bela homenagem ao grande Hélio Oiticica a possibilitou a renovar sua afetiva relação com as letras harmoniosas capaz de nos enfeitiçar ao primeiro som. Adriana acertou em cheio em trazer um disco dedicado ao mar, com ondas vindo à pessoas que até então não tinham afeto ao seu trabalho por completo. Um grande disco, desses que precisam estar sempre a disposição da vista de pessoas que carecem de um verdadeiro álbum brasileiro, feito por músicos de verdade.

 

Marítimo / Adriana Calcanhotto

Nota 10

Marcelo Teixeira

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

A macumba de Rita Ribeiro


A boa música de Rita Ribeiro
A música de Rita Ribeiro incomoda, pois reafirma a posição de manter viva a liberdade de culto e de expressão musical, trazendo uma novidade bem mais agradável e valiosa. Ao romper o mês de São Jorge, ouvi um disco bastante interessante! Acredito que a maioria das pessoas não ouvem um repertório, um CD direito. Talvez as pessoas fiquem restritas pela música de trabalho, mas, com toda a certeza, o projeto fonográfico de Rita Ribeiro em Tecnomacumba lhe convida a ouvir o resto. A maranhense que antes já havia gravado preciosidades como Pérola aos povos de 1999, em que lança a música de Zeca Baleiro Muzak, trouxe um arcabouço rico e bastante condizente com o nome: tecnomacumba. Ela acaba de criar, atrevidamente, um gênero, talvez um estilo. Sabendo que muitos já macumbaram, entre eles, Caetano, Gil, Bethânia e tantos outros, Rita relê algumas raridades e recria novas roupagens, fora as novidades que são um show a parte. A concepção de criação remete-se ao jeito mais faceiro e mais gostoso, que é o lado mais dançante.

Impossível pensar diferente, já que a palavra macumba significa festa e que algumas músicas são chamamentos litúrgicos da umbanda e do candomblé. Ao pensar em festa, num ritmo mais tocante e que se aproxima dos toques de percussão, as músicas ganham uma roupagem mais moderna, arrojada e inesperada: o tecno. Ao começar a ouvir, a impressão é que se pôr alto, aquele vizinho acostumado em colocar bem alto louvores cristãos de pura apelação de cantores como Regis Danese, grupos como Toque no Altar e da linda (mas insuportável) Aline Barros irá se assustar já na primeira música. Hoje, parece que se você colocar bem alto as músicas de Rita Ribeiro você pode ser condenado a uma censura de seu vizinho, achando-o incomodado.

E Todavia é! A música de Rita Ribeiro incomoda, pois reafirma a posição de manter viva a liberdade de culto e de expressão musical, trazendo uma novidade bem mais agradável e valiosa. No repertório, ainda temos uma música que era desconhecida e que ao inovar, carimba um formato único e imprescindível. Domingo 23 é de Jorge Ben Jor, e faz parte do disco Ben de 1972 que inclui, também, o grande sucesso Taj Mahal. Sendo assim, o que era velho, foi possível se transformar em novo, uma verdadeira alquimia que trouxe outras músicas para uma batida diferente, entre elas Iansã de Caetano Veloso e Gilberto Gil, Oração ao Tempo de Caetano Veloso, Coisa da Antiga de Wilson Moreira e Ney Lopes, Rainha do Mar de Dorival Caymmi, Tambor de Crioula de Junior e Oberdan Oliveira.

Além de criações próprias, como Saudação (colagens de pontos e cantos para orixás e guias espirituais) como abertura do CD, Jurema e Canto de Oxalá. E, também, temos outras novidades como a música lindíssima E d’Oxum de Gerônimo e Vevé Calazans, já interpretada por Davi Moraes e Maria Bethânia. Sem dúvida, uma surpresa e, bem se bobear, capaz de virar uma verdadeiro clássico… ah, não, já é!

 

Technomacumba / Rita Ribeiro

Nota 10

Marcelo Teixeira

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

O fim de Zezé di Camargo?


Seria o fim do sertanejo?
Para um cantor, seja lá seu estilo ou sua qualidade musical, perder a voz ou chegar ao ostracismo de tentar cantar e não conseguir é um martírio que poucos querem passar um dia na vida. Chegar a berrar ao microfone, segurar com voz embargada e não conseguir atingir notas que um dia alcançou, é fraquejar diante sua própria profissão. O ofício de cantar de verdade é para poucos e não para amadores, como vem acontecendo recentemente no Brasil e isso está virando uma febre incontrolável, que está sendo uma benção divina alguns cantores perderem suas vozes ou estar dando adeus à profissão. E temos três casos de cantores que estão lutando para manterem vivas suas vozes horrendas e distorcidas e manterem acesas o tal brilho apagado por anos a fio musicando sabe-se lá o que: Marina Lima, que já nem consegue falar, grande compositora, péssima cantora. Leonardo, mais conhecido como o irmão de Leandro, fazendo deles os irmãos de sucesso na música caipira brasileira e Zezé de Camargo, mais conhecido como o pai da Wanessa Camargo e basta. Três vozes que não farão diferença caso se calem.

Zezé di Camargo me chama a atenção neste artigo de hoje, porque o vi cantar no programa Altas Horas, de Serginho Groissman e sua voz estava fadada ao silêncio e a caricatura de um homem pequeno fazendo tamanho esforço para exprimir sua voz. Como eu disse, cantar é um ofício para poucos e o tempo vai dando sinais de que nossa voz é um desses ofícios naturais de graves e agudos que podemos perder gradativamente ou simplesmente mantê-la intacta com exercícios de fonoaudiologia. Perdemos a elasticidade da pele, morrem-se células, aparecem rugas, cabelos brancos tornam-se mais visíveis, mas tudo isso não é o que acontece com um dos maiores ícones da música sertaneja. Zezé está ficando mudo.

E o que isso significa? Que teremos paz em nossos ouvidos, que a música popular agradecerá muito por este feito e seremos agraciados por uma perda reparável. Zezé de Camargo e o irmão metido a chique brega, Luciano, não gravam um verdadeiro disco de sucessos há anos e este processo não se torna natural para eles, que venceram barreiras e obstáculos cantando É o Amor e No Dia em Que Saí de Casa. Pelas estatísticas que eles mantiveram até hoje, a dupla mereceria maior destaque musical, tendo ao seu lado os melhores profissionais da mídia e tendo um sucesso atrás do outro. Mas com novos irmãos na parada, caso do sensacional Vitor e Léo, e de duplas diversas que explodiram no cenário musical, o espaço para Zezé de Camargo e Luciano diminuiu drasticamente. Não é de se estranhar que Leonardo recentemente disse que vai parar de cantar e no dia em que isso acontecer, o Mais Cultura! irá fazer agradecer durante uma semana.

A conversa de que Zezé estaria perdendo a voz se estende desde 2008 e até alguns amigos, como o cantor Bruno, da dupla com Marrone, já confirmou isso. Lembro que houve muita comoção na época, mas vendo hoje a gravidade do problema, posso não afirmar, mas em poucos anos, Zezé suspende a chuteira e a música, para alguns, estará melhor, para outros, estará órfã.

 

Marcelo Teixeira

O fim de Zezé di Camargo

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

A injustiça contra Oswaldo Montenegro




O cantor Oswaldo Montenegro
Sempre* achei uma enorme injustiça o que fazem com Oswaldo Montenegro. Confundiram a inteligência e genialidade do compositor brasiliense, radicado há três décadas no Rio de Janeiro, com chatice. Oswaldo é um dos cantores e compositores mais ricos musicalmente e é  tem um papo ótimo, além de ser um cara super elegante e educadíssimo. Oswaldo gravou um belo CD em 2010, o excelente Canções de Amor e passei a prestar mais atenção nele depois das dicas de meu amigo de longa data, Alexandre Casseano. A carreira macróbia pode até ter o obrigado a revisitar velhos sucessos, cujo Montenegro o fez, mas com lucidez e beleza ímpares.

Em Canções de Amor, as canções aparecem cruas e nuas na essência, tocadas apenas ao violão e algumas poucas flautas de Madalena Salles. E, talvez, esse seja o único ponto passível de crítica, o fato de ter tão poucas flautas de Madá. O disco reúne 12 faixas, sendo duas delas nunca gravadas por Oswaldo e as outras regravações de canções lançadas ao longo de três décadas de carreira.

Além de Oswaldo e Madá, o álbum traz uma pequena participação de Zélia Duncan dividindo os vocais com o menestrel em uma das mais belas músicas já lançadas por Oswaldo Montenegro: Sempre Não é Todo Dia, do musical Aldeia dos Ventos, de 1985. A bela composição de Oswaldo e Mongol dispensa a colaboração que, no final das contas, acabou tirando a suavidade própria da música.

Para o repertório de Canções de Amor, Oswaldo Montenegro escolheu regravar músicas que não são tão populares para aqueles que não acompanham sua carreira, como Se Puder, Sem Medo, belíssima canção que parece conter uma despedida e a esperança de um retorno. As palavras das músicas nesse disco parecem ganhar uma força maior do que em outras gravações justamente pelo formato como são apresentadas, de modo tão intimista. Além disso, Oswaldo interpreta as músicas em tons mais baixos, criando todo um clima quase confessional.

Quem conhece a delicadeza das poesias de Oswaldo Montenegro sabe o quanto são belas quando unidas às harmonias de seu violão e da flauta de Madalena Salles. Por isso, esse é um ótimo trabalho de releituras suaves e emocionadas do cancioneiro e do artista.

 

Canções de Amor / Oswaldo Montenegro

Nota 10

Marcelo Teixeira

 

*quando ouço as músicas A Lista e Bandolins, penso no meu amigo Alexandre Casseano e é para ele quem dedico o artigo de hoje.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Furação Elis


Furacão de emoção
Por inúmeras* vezes foi difícil acreditar que naquela manhã de janeiro de 1982 o Brasil tenha amanhecido sem a sua maior interprete, estrela de uma luz incessante e de uma quase unanimidade, no auge de uma carreira batalhada com unhas e dentes; Elis Regina, além de ser a maior cantora que o Brasil já havia produzido, era também uma guerrilheira de si mesma. Uma doce guerrilheira. Com a extinção de um programa de grande sucesso em 1967, Elis deu asas à sua carreira. Apresentou-se na América Latina e na Europa, lapidou ainda mais (se é que isso era possível) a sua forma de cantar e interpretar. Ganhou em suavidade, não perdeu a força e ainda presenteou gente como Chico Buarque de Holanda, Milton Nascimento, Gonzaguinha, Ivan Lins (que sonhava com algumas de suas criações já com a voz da Estrela), Belchior, João Bosco, entre outros. Através de suas interpretações que eternizou cada obra e alçou de vez no cenário nacional, cada um dos citados compositores – por sua vez, todos se encontravam no auge da criatividade. Mais madura Elis viajou o Brasil e o mundo cantando e encantando. Da imponência à simplicidade, traçava-se um só caminho, uma linha uníssona entre a genialidade e a mulher forte, apelidada pela imprensa e amigos de Furacão e Pimentinha, Elis Regina começava a escrever perpetuamente, seu nome na história da música mundial.

A grande voz do Brasil trazia uma bagagem de influências de outras grandes cantoras, também brasileiras, mas construiu um legado único e incomparável, sagrado e intransponível. Espetáculos fantásticos como Falso Brilhante e O Trem Azul, ficaram gravados na memória de quem os viveu e os assistiu. Seu namoro e quase casamento com o Clube da Esquina foi um marco histórico na música brasileira. Milton Nascimento, que foi um dos maiores amigos e admiradores da cantora, a conheceu no Rio, no Beco das Garrafas. Neste festival, Milton eternizaria os seus primeiros passos da sua Travessia pelo universo da Mãe Música até se transformar no word music man da atualidade. Elis, ao gravar Canção do Sal de Milton e Ronaldo Bastos com sucesso incontestável, abriu espaço para uma parceria que durou uma década esplendida, num grande ápice de uma explosão criativa jamais visto na MPB.

Conviveu com as gravações do Clube da Esquina, de Milton e Lô Borges (guri prodigioso de 18 anos, na época). Elis dividiu o palco com Milton em várias capitais e em várias oportunidades, deixou-nos de presente a sua voz, numa de suas maiores interpretações, ao lado do próprio Bituca. Cantou como se fosse pela última vez O que foi feito de Vera do álbum Clube da Esquina n°2, fazendo tremer as estruturas dos estúdios da EMI. Na primeira apresentação no festival de Montreux na Suíça, onde há até hoje uma noite só para artistas brasileiros (atualmente, com o pior que se produz aqui), fez da introdução de seu show uma sequência maravilhosa com Ponta de Areia, Fé cega, faca amolada e Maria Maria, que na voz da baixinha, deslumbrou o Brasil.

Gravou Beto Guedes, Lô Borges, Nelson Ângelo, Luiz Guedes e Thomas Roth e lançou para o Brasil a célebre frase: Se Deus quisesse nos falar, nos falaria pela voz de Milton Nascimento. Elis gravou o Clube da Esquina com carinho, amizade e admiração, marcando para sempre a vida daqueles jovens mineiros de talento e criatividade fenomenais.

Elis fez o Brasil cantar por quase vinte anos. Sua carreira esbarrou algumas vezes com o triste desfecho político do país. Foi vigiada de perto pela Ditadura Militar e não raro, eram vistos carros estranhos rondando as imediações de sua residência. Em entrevistas, as quais ainda tenho reproduções de muitas bem guardadas, declarava sua insatisfação com o sistema e dizia-se sem muita esperança no futuro, tanto político, quanto cultural de nossa gente.

Elis Regina de Carvalho Costa, nascida em 17 de março de 1945, reescreveu a história da música brasileira e enalteceu a nossa cultura pelo planeta afora. Naquela triste manhã chuvosa de 19 de janeiro de 1982, eu tinha menos de um ano e não sabia o que acontecia. Elis morreu no seu apartamento em São Paulo, por intoxicação. Anos depois, quando eu tinha meus 10 anos, quando ouvi O Bêbado e a Equilibrista pela primeira vez e um arrepio me invadiu o corpo, pois nunca tinha ouvido uma voz tão espetacular e sensacional. Minha mãe me olhou com olhos grandes quando a indaguei quem cantava aquela maravilhosa música. Eis que ela me responde Elis Regina e meu amor por ela começava ali.

Antes que os mais conservadores venham gritar pelos motivos da morte de Elis, me ponho à frente, alegando que o sistema sempre destruiu os seus ídolos prematuramente, talvez sem esperar que ídolos mortos prematuramente, costumam ser elevados ao máximo de seu status e cultivados com devoção. Janis, Hendrix, Morrinson, todos destruídos pela Máquina do Estado, mas todos estão eternizados.

Como dizia, o Brasil continua órfão de uma cultura popular mais sólida, mais abrangente e mais BRASILEIRA por excelência, deixando o biscoito fino para grupos alternativos e, às vezes, nem isso. Elis Regina é exemplo de que, levar a cultura e a motivação para viver a vários pólos de nossa sociedade, não é uma tarefa tão complicada e assim, como ela mesma dizia: Precisávamos aqui no Brasil de um pouco mais de boa vontade. Elis era magistral. A grande cantora, a quem os fãs não se esquecem e carpem até hoje sua perda, disse em seu disco derradeiro: AGORA EU SOU UMA ESTRELA!

Alguém duvida?

 

A imortal Elis

Marcelo Teixeira

 
*artigo escrito em homenagem ao meu grande amigo carioca Jaime Santana, fã número 1 de Elis Regina.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

A revolução musical de Clube da Esquina


O terceiro álbum: ótimo
O Clube da Esquina foi uma verdadeira revolução na música popular brasileira. Era década de 60, a ditadura militar e a repressão por estas terras contrastavam com os movimentos hippie e beat que surgiam ou alcançavam o auge nos EUA da época. A Bossa Nova já não era tão novidade assim, a Tropicália acabava de dar as caras e um tal de iê-iê-iê começava a estourar com um certo Roberto Carlos e sua trupe de mulheres com saias curtas e homens com cabelos a la Elvis Presley. Nessa época, nesse meio, um jovem de Três Pontas foi para a capital mineira morar na Avenida Amazonas. Milton Nascimento já fazia parte de uma banda, a “W’s Boys” onde fazia parceria com Wagner Tiso. Em Belo Horizonte, Milton conheceu os irmãos Borges. Doze ao todo. O menor deles, o Salomão, ou Lô, como chamava os amigos, entraria para a história assim como aquela esquina da Rua Paraisópolis com a Rua Divinópolis, lá no bairro Santa Tereza.

 A formação principal do Clube da Esquina (que nunca chegou a ser um clube, nem mesmo foi considerado um movimento na época), foi composta por nomes como Wagner Tiso, Fernando Brant, Nivaldo Ornelas, Paulo Braga, Toninho Horta, Márcio Borges e, claro, o Milton. Talvez o maior nome do Clube, Milton Nascimento tornou-se o líder absoluto do movimento, sendo considerado até hoje um ícone da agitação mineira. Um tempo depois se juntariam ao Clube, Flávio Venturini, Beto Guedes, Celso Adolfo e o Lô.

O primeiro disco do grupo denominado Clube da Esquina foi lançado em 1972 e incluiu sucessos como O Trem Azul, Nada Será Como Antes e Tudo o que Você Poderia Ser. Seis anos depois, em 1978, Milton e sua turma lançariam o Clube da Esquina 2. Logo, cada membro do Clube estaria gravando suas próprias músicas, fazendo seu próprio trabalho. Mas a influência do grupo, que abdicava do amor para falar de política e outros temas sociais em suas letras, permaneceu e tornou o Clube da Esquina um dos mais importantes movimentos musicais brasileiros depois da Tropicália e eu ainda acho que foi, musicalmente, muito mais importante que a Tropicália).

No ano de 1971, a rapaziada do Clube Mineiro já havia composto um número de canções que pretendiam lançar num álbum duplo, coisa rara nestes tempos.  A Tropicália já havia sido devorada pelos predadores do período jurássico ditatorial, mas o talento inquestionável dos letristas deste projeto épico trataria de dizimar quaisquer que fossem esses contextos censurais. Com letras de teor político existencial e profundeza intrínsecos (observa-se uma forte influência sartreana nas letras de Márcio Borges e Fernando Brant) e harmonias divinamente elaboradas, o álbum duplo Clube da Esquina seria gravado no Rio de Janeiro em estúdio preparado exclusivamente para os cavaleiros da revolução musical daquela década de incertezas. Mar Azul, praia próxima à Piratininga, no belíssimo litoral niteroiense, seria o cenário da casa em que se deu vida e sonoridade com sensíveis requintes de sofisticação a esta obra-prima da música universal.

 

Clube da Esquina / Milton Nascimento e Lô Borges

Nota 10

Marcelo Teixeira

 

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Os Ilustres da MPB


Os ilustres da MPB
Se foi uma era de ouro ou não, o leitor ilustre responderá, talvez com mais propriedade do que o blogueiro que humildemente interage por estas linhas. Mas ninguém há de negar que a história da Música Popular Contemporânea está registrada nesta foto histórica em duas gerações de notáveis interpretes, compositores e instrumentistas. Claro, apenas aquele sábio entendedor da boa música, a melhor música do mundo, saberá que o artigo de hoje é uma das mais belas homenagens aos retratados na foto acima. O ano: 1965. A foto foi tirada na casa de Vinícius de Moraes, há 47 anos e não há muitos detalhes sobre o que ocorria neste evento; provavelmente essa galerinha estelar estaria reunida mesmo para fins etílicos. Este registro rodou pela internet em Power Point e acabou nos arquivos do blog; ontem, revirando algumas pastas antigas, achei esta preciosidade e resolvi publicar. Não sei quem fotografou este momento, deixo para o visitante pesquisar e aguçar sua curiosidade; porém, listo aqui as pessoas que ali estão:

 

Lenita Procynska

Edu Lobo

Tom Jobim

Torquato Neto

Caetano Veloso

José Carlos Capinan

Sidney Miller

Elmir Deodato

Olivia Hime

Helena Gastal

Paulinho da Viola

Luis Eça

João Araujo

Dori Caymmi

Chico Buarque

Francis Hime

Nelson Mota

Vinicius de Morais

Dircinha Batista

Luiz Bonfá

Tuca

Braguinha

Jandira Negrão de Lima

 

Depois veio a ditadura e grande parte destes fantásticos artistas criaram seus maiores clássicos. Vieram a abertura democrática, as eleições diretas, o rock nacional, o Plano Cruzado, O fusca do Topete, a era Collor, o PT dos grandes lameiros político-sociais e institucionais... Alguns destes gênios morreram, outros se calaram, muitos se venderam ao Global Sistem of the living dead, A Grande Máquina de Mortos Vivos. Vieram a lambada, o axé, o pagode, o funk, o Bolsa Dendê e o resto ... Bem, o resto você já sabe.

 

Os Ilustres

Marcelo Teixeira

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Aonde está a ousadia de Thiaguinho?


 

Existe hoje um grande artefato em volta do pagodeiro Thiaguinho, que recentemente se desligou do grupo de pagode Exaltasamba, desfazendo um dos mais importantes grupos do movimento desde o início da era pogodista e o último dos moicanos sobreviventes da chacina musical que persistiu em durar, por mais de vinte anos de estrada. Se bem que na última arquitetura do grupo, as músicas e até mesmo o carisma dos pagodeiros estavam em alta e eu mesmo cantarolava algumas de suas canções, mas esses entusiasmos eram motivados por Péricles e o novato Thiaguinho, que viria abrilhantar o grupo. Evidentemente que a visão de Thiguinho seria futuramente abandonar o barco e seguir em carreira solo, como fizeram inúmeros cantores da área (não só de pagode, como do rock, do axé e até de grupos importantes, como a Paula Lima, que saiu do maravilhoso Funk Como Le Gusta e hoje quase não se ouve falar sobre a banda).

Mas me chama a atenção alguns aspectos da volta por cima de Thiaguinho (sim, volta por cima porque muitos acharam que ele não iria se dar bem na carreira solo) e em sua musicalidade também. Que Thiago é uma revelação musical, disso não se pode discordar, mas o que quero ressaltar neste artigo não é a brilhante carreira que ele fizera quando estava preso e algemado ao grupo, mas sim agora, com o disco Ousadia & Alegria, lançado agora em 2012.

O título do disco não poderia ser a melhor resposta para aqueles que lhe torceram o nariz, torceram contra e ainda estão falando mal do artista, mas não vejo por este lado esta tal ousadia que o cantor insiste em mostrar. Aliás, não consigo enxergar aonde está a ousadia de Thiaguinho ao lançar este disco e nas linhas abaixo eu tentarei explicar que pode ter muita alegria, puro entusiasmo, muita adrenalina, mas pouca ou nada ousadia. Alegria, sim. Ousadia, não!

 

O nosso lema é ousadia e alegria

 A nossa cara é pagode todo dia

 Cheio de estilo na pressão eu vou com tudo

 Só espalhando ousadia pelo mundo

Lê lêlê lêlê lêlê

Ousadia para vencer

 Lê lêlê lêlê lêlê

 Alegria para viver

Trecho de Ousadia e Alegria, de Thiaguinho

 

A primeira ousadia (e talvez a única retratada no disco) de Thiaguinho, tenha sido a sua saída do grupo Exaltasamba. Mais nada. Nenhuma outra ousadia mais ousada (num trocadilho perfeito para este momento), foi mais eloquente e mais soberano para um artista que ainda pode crescer com seu talento e sua espontaneidade. Ousadia esta que pode também lhe custar muito caro, pois o primeiro álbum é um verdadeiro sinônimo de festa pelas vendagens e pela receptividade do publico, mas isso poderá não acontecer com o próximo disco.

Talvez a segunda ousadia de Thiaguinho seja mostrar logo de cara um disco totalmente ao vivo, geralmente destinado à grandes cantores que depois de um certo tempo de estrada lançam discos com plateias gigantes e com aberturas novas. Thiago já ousou ao lançar no mercado fonográfico um disco ao vivo e com músicas inéditas, feito raro a um artista que inicia sua carreira solo.

Mas o disco em si é um grude! Algumas faixas deveriam ser extintas e outras merecem até mesmo um pequeno troféu pela letra e pelo passaporte do artista. Thiaguinho tenta se esforçar para cantar bem em algumas faixas, mas o que acontece é um festival de horror ao ver seu lábio superior fazendo malabarismos igualmente quando Caetano Veloso canta. Chamar o jogador Neymar para cantar talvez seja a pior parte do disco.

Thiaguinho foi esperto ao lançar seu disco solo. Para obter um ótimo resultado e altas vendagens e não ver seu publico indo pousar noutro lugar, a estratégia foi abusar (ou ousar). Chamou os maiores artistas, como Gilberto Gil e Ivete Sangalo, convidou Luísa Possi, cantora que consegue exprimir um certo carisma entre os adolescentes e amantes da nova MPB, convidou Alexandre Pires, que tem um certo nome e respeito no mercado internacional e se veste ora como um moleque travesso, ora como um novo expoente da música negra, ora como um emergente do capitalismo que conseguiu ingressar, ora como um suburbano, de poucas palavras e muitos gestos.

 
O disco ainda conta com uma gigantesca trupe de músicos e com um coral de dar inveja a qualquer concerto: são eles, por muitas vezes, os responsáveis pelo apoio que Thiaguinho precisa e acho que será muito improvável que um dia eles venham a se desvencilhar. Tudo isso prova que Thiaguinho ainda não está preparado para seguir uma carreira solo, tendo de enfrentar as dificuldades que todo grande artista sofre ao se desligar de um grupo de puro sucesso. Thiago não sobreviveria acaso lançasse um disco de estúdio, sem convidados extraordinários e sem orquestra e jogador de futebol. Thiago não teria suporte emocional para entrar em um palco sozinho. E tudo foi pensado para que ele se sentisse como um integrante de qualquer grupo de pagode às suas costas e ele ainda fosse o líder.

Observando o disco atentamente e assistindo ao DVD do mesmo, pude constatar que Thiaguinho ainda precisa calejar muito para conseguir almejar o verdadeiro estrelato e conseguir uma nota digna de seu próprio sucesso. Ainda o sinto como um integrante do mesmo grupo de pagode que o adotou e não o sinto preparado, pronto, ágil, esperto, capaz de seguir carreira solo sem um corpo de coral, sem um convidado especial, sem uma grande estrela para estar ao seu lado. Thiaguinho ainda precisa ousar mais, porque alegria ele tem de sobra.

Por enquanto, a ousadia de Thiaguinho não vingou. A alegria, sim.

 

Faixas

1- Leite Condensado

2- Buquê De Flores

3- Ousadia & Alegria Part. Esp.: Neymar

4- Lero Lero - Part. Espec. Alexandre Pires

5- Desencana

6 - Puxando

7- Sou O Cara Pra Você

8- Até Ver Você (Hahaha)

9- Muleke Conquista

10- O Poder Do Pretinho - Part Espec. Ivete Sangalo

11- Antes De Dizer Adeus

12 - Simples Desejo - Part Espec. Gilberto Gil

13- Ainda Bem

14- Vai, Novinha

15- Deixa Eu Te Fazer Feliz

16- Eu Quero É Ser Feliz

17- Tomara

18- Motel

19- Robin Hood Da Paixão

20- Eternamente Feliz

21- Deixa Pra Mim

 

Ousadia & Alegria / Thiaguinho

Nota 5

Marcelo Teixeira