quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

No Braseiro, o primeiro disco de Roberta Sá


Ela encanta, emociona, equilibra o tempo, ri, chora e é sensível. Roberta Sá é uma das poucas cantoras brasileiras que consegue dosar todas as emoções possíveis em um trabalho. É prazeroso ouvir e ver Roberta Sá. Sua voz é maravilha, suas músicas são uma primazia excepcional e sua qualidade é única. E quando Roberta lançou seu primeiro disco, foi uma explosão de entusiasmo e uma certa dosagem de que algo estava mudando na nova MPB. Roberta trouxe brilho, renovou o samba, renovou a bossa nova, renovou a música popular brasileira. Nascida a 19 de dezembro de 1980 em Natal, Rio Grande do Norte, Roberta entrou para o programa Fama, exibido pela Tv Globo, mostrando seus dons artísticos. Não ganhou o programa, mas foi alçada ao sucesso (coisa rara para quem sai desses programinhas chatos) e conseguiu, no primeiro disco, ser considerada a melhor cantora do ano.


Braseiro (2004, MP,B / Universal, 27,99) é definido com uma palavra: maravilhoso. E simplesmente o é porque a voz de Roberta não é cansativa, não é enjoativa e não é, acima de tudo, chata, anasalada nem fanha. Ela canta com a alma, emoção e virtudes. O que parecia ser sensacionalismo, logo se transformou em artigo de luxo para os colecionadores de MPB: Braseiro é um disco raro de uma cantora novata.
Conta com a participação de medalhões da MPB, como Ney Matogrosso na estonteante Lavoura, música da sambista Tereza Cristina. Um clima intimista, duas vozes marcantes, dois temperamentos diferentes e duas sentenças: ao lado de Ney, Roberta não se sente pequena. Assim como acontece com o MPB4, que cantam a melhor música do disco, Cicatrizes, um samba rasgado e dolorido de Paulo Cesar Pinheiro: vozes se entrelaçam, duetos sensatos e harmonia perfeita. O grande inspirador de Roberta não poderia estar de fora e ela regravou com maestria a música Pelas Tabelas, de Chico Buarque, sem esboçar medos. Escolheu uma música difícil de cantar do repertório de Chico, ainda mais por ser uma música que outrora ficou conhecida como música de protesto e um tanto esquecida, nos dias de hoje, pela grande maioria. Puxou do fundo do baú a deliciosa Eu Sambo Mesmo, de Janet de Almeida, que abre o disco com esse samba maravilhoso.


No Braseiro, música que leva o título do disco, aparecem Pedro Luís e A Parede, uma canção que leva pro lado político, onde o narrador reclama de tudo quase, dos tempos idos e dos tempos atuais, da banalidade do ser humano e de como alguns personagens musicais poderiam ser de fato humanizados e essa canção trouxe muitos problemas a Roberta. Ao final da música, ela fez uma bela homenagem à Clara Nunes (falecida precocemente em 1983) e entoou a música de maior sucesso da sambista, O Canto das Três Raças como pano de fundo. O marido e viúvo Paulo Cesar Pinheiro, pediu para que retirassem do mercado o disco de Roberta, alegando que não foi pedido nenhuma autorização para que cantassem a música de Clara. O disco foi remasterizado, a canção em homenagem foi retirada e nas outras versões quando canta, Roberta faz outros timbres e formas de hiatos para fechar a melodia.
Casa Pré-Fabricada é gostosa de ouvir, mas torna-se cansativa quando ouvida em excesso. Marcelo Camelo, o autor, viu sua carreira destrinchar ao compor esta canção: além de Roberta, Maria Rita também a gravou para o seu disco Segundo, também com o mesmo sucesso. Além do próprio Los Hermanos gravarem com retumbante sucesso no disco Bloco do Eu Sozinho.


O disco não deixa dúvidas de que Roberta Sá veio para ficar: canto livre, canto em harmonia, Roberta é uma cantora rara e de excelente qualidade. Ela não grita nas canções, canta em linha reta e hoje é cercada por cantores carimbados, como Chico Buarque, Zeca Pagodinho e Paulinho da Viola.
Um disco que recomendo de olhos bem fechados, mas com ouvidos muito bem atentos.
Com vocês, o Braseiro de Roberta Sá.
Dez Estrelas.
Marcelo Teixeira.

Nenhum comentário: