sexta-feira, 24 de julho de 2015

A eloquência distinta de Carbono, novo álbum de Lenine


Experimentos químicos de Lenine
Lenine é um tipo raro de cantor que conseguiu sair da atmosfera popular para adentrar, definitivamente, no âmbito da intelectualidade e a prova maior disso são suas músicas, cada vez mais rebuscadas e refinadas, não deixando margem para que a população sem cérebro possa compartilhar o que é belo e universalmente para poucos. Seu último trabalho, Chão (2011) foi uma experiência causada entre o efeito da solidão do cantor e a fase de aceitação do público, que estranhou de início o novo formato de se fazer música do cantor e compositor pernambucano, mas que aos poucos essa magia e esse encanto tomaram partido alto e maior dentro do universo leniniano. Quase no mesmo caminho que o álbum anterior, Carbono (2015 / Universal Music / 29,99) é um disco atemporal, fugindo de modismos e tropicalismos regionais que o consagraram e sendo ele mesmo: Lenine, um cantor pernambucano que tenta encontrar a cada verso uma explicação para o inexplicável, um ato, um hiato, uma sonoridade diferente e ampla, um significado para suas canções e para o desejo de se fazer canções. Carbono nasceu dessa necessidade conjunta de exemplificações: uma corrente entre as músicas para tentar decifrar os anseios da química e o elo entre Chão, com suas sonoridades ambivalentes e subsequentes da eloquência distinta. Há lirismo temperado com loucura e um certo desespero de Lenine na preocupação geral sobre o ambiente e a Terra, tópicos contestados em músicas que ministram água, carbono, pó, terra entre outros argumentos da natureza. Lenine está mais denso, mais calmo e até mesmo mais confortável para fazer de Carbono seu porto seguro de ilusões maniqueístas e está em um momento em que sua música pede passagem para o que realmente pede a música popular brasileira num todo: a qualidade musical. O cantor vem há um certo tempo se mostrando presente no lendário sistema de qualificação profissional, lançando discos mais distantes da plateia assimétrica de caráter duvidoso para figurar entre o intelecto e a formação de massa cerebral. Em Carbono percebe-se o instinto do saber voluntário do cantor, atestado em canções que vão da sofisticação ao regional sem precisar ser caricato ou descer um patamar de popular. O disco tem uma limpeza sonora incrível e o erro de Lenine, talvez, tenha sido esse: já que o cantor queria experimentar o lado minimalista dos ruídos em Chão, ele poderia usufruir para que esse novo trabalho tivesse sons que realmente atendem ao título. Há um distanciamento e uma proximidade muito larga entre um projeto e outro, mas Carbono consegue ser mais poético, mais autoral, mais visível e mais compreendido que os discos introspectivos do cantor lançados outrora. Mesmo sendo um disco particular, monossilábico (o álbum cai por vezes numa tristeza profunda), anti-tropicalista e pós MPB, Lenine nos mostra um álbum recheado de perguntas sobre o mundo da engenharia química, tentando nos transportar para o mundo daqui há alguns anos. Sua música, nesse quesito, pode explicar muitas coisas.

 

 

Carbono (2015) / Lenine
Nota 8
Marcelo Teixeira

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