sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Os sinais de Ney Matogrosso


 
Ney em boa fase
Ney Matogrosso consegue agradar à gregos e troianos, literalmente. É um cantor que não parou no tempo, não canta músicas para ficar na memória de um subconsciente qualquer, não canta músicas intelectualizadas, como faz hoje Chico Buarque ou João Bosco e entra na onda de Caetano Veloso, Djavan e Gilberto Gil, que fazem um som mais moderninho para a idade que tem. Ney Matogrosso virou pop, cult, cool. E essa onda de modismos a qual adentrou fez muito bem a sua carreira marcada por músicas fantásticas e egocêntricas e ao mesmo tempo se transformam num cartão postal para a modernidade e, quem sabe, para a posteridade. Ney Matogrosso lançou no final do ano passado o sensacional Atento aos Sinais (2013 / 28,99 / Som Livre) título que saiu da canção Oração, de Dani Black, um dos compositores mais procurados da atualidade e que traz uma nova roupagem ao mundo de Ney, como as parafernalhas e vestimentas que todos esperavam. Desde Inclassificáveis (2008), Ney não vinha se vestindo a carater e deixou a sua voz falar mais alto do que seus passos e danças. Com Atento aos Sinais volta ao ar o velho Ney Matogrosso, o pop, o cult, o cool. Ney Matogrosso é um dos artistas mais marcantes dentro da MPB e uma das figuras mais aclamadas pela crítica especializada. Assim, talvez, pode ser definido o cantor, dono de uma carreira marcada pela irreverência e pela ousadia em suas performances e que lançou no ano passado um disco que marca seus 40 anos de carreira. O CD tem interpretação singular de Ney para compositores novos e consagrados, como Paulinho da Viola, Itamar Assumpção, Criolo, Vitor Ramil entre outros. Mesclando canções em uma criteriosa seleção, o repertório inclui músicas como Roendo as Unhas, de Paulinho da Viola, duas de Itamar e Oração, de Dani Black, música que inspirou o título do álbum. Atento aos Sinais é um disco intimista. Com músicas de alto astral e com pitadas de politicagem, o disco vem recheado de nuances, músicas conturbadas e com um acento mais politcamente correto. Ney volta a adotar o estilo descobridor de talentos, mas veio flertar com compositores de outras estirpes musicais, como Criolo, de quem gravou Freguês da Meia-Noite, passando por Rafael Rocha em Não Consigo e tendo o seu maior talento como prova maior de que os novos são talentosos, como o caso de Dani Black. Mas em quase todo disco de Ney já podemos esperar um pouco de Itamar Assumpção, Vitor Ramil, Alzíra Espíndola e Pedro Luís e aqui não foi diferente. Embora tenha sido um erro fatal regravar Noite Torta e Isso Não Vai Ficar Assim (ambas de Itamar) e ter escolhido uma música menos calorosa de Pedro Luís, o disco ainda assim é um dos melhores que fecharam o ano de 2013. Noite Torta e Isso Não Vai Ficar Assim foram gravadas anteriormente por Zélia Duncan em seu disco do ano passado, em que homenageia o grande Itamar Assumpção, morto em 2003 em decorrência de um câncer, na qual o próprio Ney faz uma bela participação na segunda música citada. Em seu próprio disco, Ney (re)transforma a música, dando o ar de sua graça, mas o que acontece é um festival de canção repetida. Porém, seria melhor ter regravado Fico Louco, que só fora regrada por Virginia Rosa em seu disco de estreia e trata-se de uma música atual. Já Incêndio relembra um tempo perdido de Pedro Luís no grupo A Parede e regravar está música talvez não tenha sido um achado e tanto para o cancioneiro de Ney, já que as músicas de Pedro são sempre sensacionais (vale lembrar Miséria no Japão ou Fraterno, ambas gravadas por Ney em discos anteriores e que foram as sensações do momento). Abrindo com Rua da Passagem, um protesto de Arnaldo Antunes e Lenine, a música se tornou um sucesso nas redes sociais e veio a calhar sobre a falta de educação das pessoas nas ruas e em ambientes sociais, o que veio a calhar bem na fase de protesto do disco. Ousadia é pouco perto da sensual Beijos de Ímã, da família musical Espíndola, que nos remete às músicas de gueixa com um sotaque que só o Ney consegue fazer. Há também a profusão de palavras em Tupi Fusão, que nos remete a música Inclassificáveis e a engraçada Samba do BlackBerry. Ney conseguiu fechar o ano passado com o pé direito, digno de poucos artistas com a sua magnitude. E ainda tem tempo para ser humano, homem e sensato em não se sentir estrela.
 

Atento aos Sinais (2013) / Ney Matogrosso
Nota 8
Marcelo Teixeira

Nenhum comentário: