sexta-feira, 28 de junho de 2013

Os trópicos e viagens musicais de Andréia Dias


A bela Andreia Dias
Terceira e mais recente obra em carreira solo da cantora e compositora paulistana Andreia Dias, o álbum Pelos Trópicos traz a proposta itinerante de passear por 10 diferentes capitais brasileiras um estímulo para romper com a mesmice. Imerso em um cenário de versos e sonorizações sempre agradáveis, o disco percorre as corredeiras do rock, desbrava os ritmos mais exóticos, até desaguar em um composto adocicado por diferentes temperos vindos dos mais remotos cantos do país. Do Rio de Janeiro ao Maranhão, passando por Pernambuco, Bahia, Ceará, Paraíba e Alagoas, o álbum absorve uma variedade cativante de ritmos, resultando em um projeto que acerta pela multiplicidade. Embora íntimo de uma grandiosa paleta de cores, sons e preferências instrumentais, é preciso notar que o disco jamais tende ao exagero ou se relaciona com apropriações sonoras que pareçam inexatas ao ouvinte. Por mais variados os percursos assumidos pela cantora durante a execução de todo o trabalho, cada uma das 12 composições que sustentam o disco se orientam dentro de uma formatação regular e de extrema proximidade, resultado visível na constante relação da artista (e seus distintos parceiros de gravação) em reviver o pop-rock típico da década de 1970 de forma renovada e ainda assim nostálgica. Uma viagem musical que absorve aspectos coesos da carreira de Rita Lee nos primeiros (e inventivos) anos da carreira solo, mas que acima de tudo deixa crescer a marca da própria Andreia.
 

Assumindo a relação com as referências tropicais logo no título, Pelos Trópicos rompe com os clichês que caracterizam o estilo (e aos poucos pervertem a música nacional) pela construção assinada por diferentes colaboradores. Enquanto Xuxu Beleza (em parceria com os cariocas da banda Do Amor) e Aquilo (dividida com o duo de Blues Rock The Baggios) reforçam a identidade rock da obra, o restante do trabalho deixa fluir de maneira imoderada uma apropriação maior dos ritmos nacionais e até com a MPB. Surgem assim acertos diretos com o brega paraense (em Beijin na Nuca, parceria com Felipe Cordeiro) e até conversas com os ritmos latinos, proposta bem incrementada no toque caliente de Feliz e mareado.
 

As viagens de Andreia
O mais curioso no passeio musical assumido por Andreia Dias é perceber que mesmo abraçando diferentes gêneros pelos mais distantes cantos do país, todas essas peças regionais se encaixam em um composto único. É como se a cantora amarrasse propostas musicalmente distintas de forma coesa, convertendo a possível multiplicidade de ritmos em um bloco sonoro de força constante. Dentro desse universo de referências diversas que se completam, a cantora e os parceiros de banda possibilitam o surgimento de pequenos passeios experimentais. É o caso da curtinha Corpo e Mente, que brinca com inexatos realces sonoros ou mesmo a faixa-título, canção que encerra o álbum e solidifica uma proposta ainda menos óbvia para o futuro da cantora.
 

De natureza envolvente, Pelos Trópicos encanta pela suavidade das melodias e principalmente por não lidar com as referências que assume de maneira redundante ou pouco inventiva. Ainda que o trabalho seja construído dentro de uma sequências de sons e vozes traduzidos de maneira simples, Andreia Dias trata de cada aspecto da obra dentro de uma formatação delicada e honesta, o que faz com que logo na faixa de abertura sejamos fisgados pela proposta acolhedora do trabalho. Doce e colorido à sua maneira, o disco é sem dúvida alguma o passeio mais delicioso e seguro pela atual fase da música brasileira.
 

 

Pelos Trópicos / Andreia Dias

Nota 10

Marcelo Teixeira
 

 

quinta-feira, 27 de junho de 2013

A elegância musical de Saulo Duarte


Paraense de boa música
Ainda bem que é difícil rotular as canções de Saulo Duarte e a Unidade: com arranjos e letras simples, o compositor nascido no Pará e radicado por aí, hoje morando em São Paulo, não se preocupa com classificações – preocupa-se com a sinceridade de sua expressão musical e poética e com a consistência de sua proposta, todas elas amplificadas e sintetizadas pela banda A Unidade. Com Klaus Sena, no baixo, João Leão, nos teclados e Beto Gibbs, na bateria, além do próprio Saulo, na voz e nas guitarras, a banda potencializa nos arranjos o universo subjetivo de Saulo Duarte, que, na maioria das vezes, compõe as canções no violão. É nas letras do compositor que está o núcleo de sua obra – em sua maioria, elas contêm fragmentos esparsos das experiências pessoais dele, em que as celebrações da vida e as desilusões amorosas se misturam à cidade e aos acontecimentos da ordem do dia. A sensibilidade do compositor o faz permeável a tudo que lhe acontece ao redor, como se ele fosse uma espécie de captador sensível das pessoas e do mundo.

Ele é paraense. Está aqui, ali e acolá. Talentoso, Saulo Duarte chegou para fazer a diferença. A sincronicidade fez com que ele encontrasse outros talentos de diversos cantos do Brasil e essa turma vem causando na noite paulistana, através do selo, coletivo, Cambuci Roots. Natural do Pará e cidadão do Cosmos, canta cheio de energia e sentimento. Suas letras são o retrato da atualidade, do cotidiano. O retrato de suas experiências, das suas roubadas, dos romances, descobertas e desventuras. Na guitarra, rasga os riffs e subverte a normalidade.

 O tipo de som não importa, o rótulo não existe, aliás, como se pudessem encoleirar a irreverência. Não dá. E por isso, Saulo utiliza o que for necessário para dar vida às suas letras. Rock, groove, funk, brega, carimbó, reggae, ska, romântico, blues e aquela psicodélica setentista. Para que essa efervescência funcione, estão presentes Beto Gibbs na bateria, Klaus Sena no baixo e João Leão nos teclados formando a banda A Unidade, além de Saulo na guitarra. Na música Amor de Piração pode-se ter uma idéia. A letra fala da busca, do amor, necessidades, utopias e o arranjo, vai do rock clássico, pitada de blues, pequena referência ao rock grunge de Seattle dos anos 90 e o teclado faz o diferencial em toda faixa.

Seu primeiro disco é uma delícia de som. Saulo Duarte e a Unidade têm um caminho longo pela frente. A estrada é dura e por isso, o sucesso é mais gostoso. Podem esperar, no Brasil inteiro ele irá tocar.

 

Saulo Duarte

Nota 10

Marcelo Teixeira

quarta-feira, 26 de junho de 2013

O melhor disco de Marisa Monte


As cores de Marisa Monte
Verde Anil Amarelo Cor de Rosa e Carvão (1994 / EMI / 29,99) tido como um dos melhores discos de todos os tempos e na carreira de Marisa e para mim o mais bem acabado, este disco marca algumas mudanças de Marisa Monte, tais como a primeira produção dela própria, na verdade uma co-produção com Arto Lindsay (que já produzira o anterior, Mais), além de reafirmar seu trabalho autoral e ao mesmo tempo ampliar o universo de seus colaboradores. Nos bons tempos do mercado musical físico (o virtual continua a toda!), o disco vendeu mais de um milhão de cópias. Dos medalhões da MPB, este é um disco pra ficar na história. Estranhamenteeu eu não conseguia escrever sobre este disco e, decido a resenhá-lo, ouvi com a mais pura atenção e decidamente, este é o melhor disco de Marisa, apesar da projeção internacional da artista. O disco inicia com Maria de verdade (Carlinhos Brown, parceiro cada vez mais presente na sua vida e obra), sutil, com voz e violão a princípio, depois permitindo a entrada da banda inteira, tornando a música até dançante, com um baixo de dar gosto. Belo início.

Na estrada (MM/Brown/Nando Reis, este também participando mais intensamente, se tornando namorado na época), mais uma quase acústica e cheia de vozes extras da própria cantora. Ao meu redor (Nando Reis) traz como diferencial um trompete sinuoso e a mesma atitude acústica. Saltitante, inpirador, acústico e ótimo. Segue o seco (Brown) deu origem a um vídeo lindíssimo, sem esquecer que é uma bela e forte canção. Berimbaus e vozes de Brown ao fundo, antecipando o que seriam os Tribalistas.

Uma música de Lou Reed, Pale blue eyes, traz um aceno à cena americana. Boa e surpreendente escolha. Em seguida, a belíssima versão de Dança da solidão (Paulinho da Viola), com o auxílio luxuoso de Gilberto Gil no violão e vocais de apoio, sensacional, um dos pontos altos do disco! De mais ninguém dialoga com o grupo Época de Ouro, do choro clássico carioca, mesmo a música sendo de Arnaldo Antunes e Marisa. Quase anacrônica, mas cabe no projeto abrangente do disco. Alta noite já havia sido gravada pelo autor, Arnaldo Antunes, mas aqui ganha uma versão linda, acredito que com o saudoso violonista Raphael Rabelo. Belíssimas cordas ao fundo.

O céu (Marisa Monte/Nando Reis) é mais alegre e quase balançada, você fica querendo dançar, seu corpo começa a querer sacudir, bem legal. Bem leve (MM e Arnaldo Antunes) é fiel ao seu nome, meio valsa, violãozinho discretíssimo e um pandeiro dando o ritmo, um jogo de palavras. Balança pema (Jorge Ben) traz o balanço de volta, com violão, guitarra com wah-wah e bateria, com várias vozes da Marisa. Enquanto isso (MM/ Nando Reis) traz mais vozes e uma narrativa bem legal (incluindo trechos em inglês by Laurie Anderson), além de belos violões.

Pra terminar com extrema classe, Marisa traz as pastoras da Velha Guarda da Portela pra fazer uns vocais lindos nessa canção que poderia ser um samba-enredo, se o carnaval de desfile suportasse sutilezas e cadenciamentos mais lentos. Esta melodia foi um balão de ensaio do disco no qual a Marisa produziria esta mesma Velha Guarda, Tudo azul, que aparecerá por aqui inevitavelmente (é um dos meus discos de samba preferidos, inclusive pelo recurso sempre oferecido nos discos de MM: as músicas vem com letra e cifras com acordes!).

Ouçam!

 

Verde Anil Amarelo Cor de Rosa e Carvão / Marisa Monte

Nota 10

terça-feira, 25 de junho de 2013

Mara Maravilha - a evangélica da música fingida



Mara: sofredora e falida
Ao longo de seus mais de 30 anos de carreira, Mara Maravilha já foi musa infantil, símbolo sexual e agora se aposentará como cantora evangélica. Eu digo que ela se aposentará, pois é o último degrau para as pessoas que pecaram no passado ou até se esquivaram por outros caminhos, foram esquecidos pela mídia e pelo público, perderam seus espaços, empregos e muito dinheiro para se tornar uma legítima seguidora de Deus. Ao certo, um Deus que não enxerga seus erros, mas que suas ovelhas fazem questão de criticar os outros. Agora, a morena que rivalizava com as loiras Xuxa e Angélica nos idos anos 80 diz que está em mais um momento de conversão. A música, definitivamente, agradece por Mara Maravilha estar longe dos holofotes.


Sempre acreditei que esses cantores de meia tigela, como Mara Maravilha, que tiveram uma carreira sólida e muito bem distinta de outras personalidades, quando se transformam em cantoras evangélicas, é porque querem ocultar alguma coisa. Mara sempre ocultou muita coisa de seu passado. E mesmo sendo uma musa infantil, foi impura com seus fãs, posando nua para uma revista de grande circulação, causando estranhamento e ridicularizando o mundo pueril. Mesmo deixando de ser uma cantora popular, ela segue à risca sua principal rival, se tornando evangélica. Para o trocadilho, ela ainda alcunha a Angélica.

Mara Maravilha é a filha do capeta lhe serve e sua música hoje é uma aberração divina. Senhora pecadora do próprio destino, Mara não atribuiu tanto assim para sua carreira a não ser o de ser apresentadora infantil. Musicalmente, é melhor cantar essas pregações inferiores, cujo seu deus está de costas. Ao ouvir Mara Maravilha, sinto um nojo, uma repulsa, um anseio de que a música gospel é justamente aquilo que eu já imaginava: uma porcaria. E Mara Maravilha só envergonha e empobrece esse estilo.

 
Dos tempos em que apresentava programas infantis, Mara só tem saudade de lidar com crianças, mas também, pudera: sua carreira apenas definhou se tornando uma ilustre entre a maioria dos cantores religiosos. Vale ressaltar que Mara Maravilha é uma criatura irracional, que canta arrastado e que não vale um real por sua música. Seja qualquer música que ela cante. Sendo uma cantora gospel, ela se sobressai uma excelente cantora baiana sem méritos algum, sem destino algum e, pior, sem brasilidade alguma.

Mara incumbe a uma casta de celebridades falidas que é das minhas favoritas: as madalenas arrependidas, tipo arcaico cujos espécimes caracterizam-se pelo grande empenho em negar, na segunda parte de suas vidas, tudo o que fizeram na primeira. Curioso que o arrependimento pelos desatinos passados só ocorra à celebridades deste tipo quando são atiradas na profunda cova do ostracismo. A pergunta que fica é se tal arrependimento lhes bateria à porta da consciência se tudo tivesse ocorrido conforme seus planos de dominação da bagaça. Pessoalmente, tenho convicção de que a resposta é um tremendo não.

De infrutífera apresentadora de programas infantis à pastora evangélica fracassada, fazendo entre esses dois pontos uma escala técnica na Playboy da era pré-Photoshop e da pré-depilação à brasileira, Mara dedicou os últimos 25 anos à construção de um codex de desconcertantes equívocos estratégicos e ideológicos – sua própria biografia.

Certa vez li uma entrevista onde gabava-se ter sido homenageada pela Academia Brasileira de Letras (eles estavam cegos) por apresentar o programa de televisão comercial mais didático de então, o longínquo ano de 1991. Ora, em primeiro lugar, ser homenageada pela ABL, a mesma que hoje patrocina os chás da tarde entre Paulo Coelho e José Sarney, devidamente fantasiados em seus fardões adquiridos do espólio do Xou da Xuxa, é muito mais uma cruz que uma graça.

Depois, contextualizando o evento e avaliando os programas semelhantes da época, entende-se que até um programa onde crianças sofriam xingamentos e puxões de cabelo dados por uma bruxa loira e rabugenta enquadrava-se na categoria didático. Desta forma, não há do que vangloriar-se. Presa a um patológico arrependimento fingido, último recurso dos que afundam nas areias movediças da própria incompetência, a ex – fique claro – apresentadora parece só conseguir emitir opiniões que depõem contra sua capacidade de dar um passo adiante e oferecer, afinal, algum conteúdo que se aproveite.
 
Mas não o dá porque esse passo além das cercanias de suas limitadas habilidades seria a mais franca de todas as suas declarações públicas, a assunção de uma verdade que já é cristalina e evidente: a de que nada tem a oferecer além de um moralismo calcado numa retórica pseudo-religiosa vazia que apenas ridiculariza e vulgariza a sua própria prática de fé. E que ninguém diga que este humilde coveiro não se compadece da dor e do arrependimento alheio. Ora, se possuo ao menos uma virtude, essa é a da compaixão, entretanto, existe diferença entre ser franco e ser tolo. Esse hábito de pontuar cada frase com as palavras Deus e Jesus, nessa visão de quem já viu muito cadeieiro velho pecar com a Bíblia embaixo do braço, é sintoma claro de culpa e não de reverência.

Por essas e por outras trapalhadas fora renegada até pela denominação religiosa que a acolhia. Ressentida, chutada de lado a outro, refugia-se agora em declarações de que é um ser singular por não pertencer a uma religião, mas a Deus. E sua música gospel, fica aonde? Enfiada no cutuvelos alheios.

Regravou de Roupa Nova a Alexandre Pires, foi indicada ao prêmio Grammy Latino de música gospel, Mara é um lixo que precisa ser esquecido e riscado da memória popular brasileira. Mais uma vez temos que aturar essa aberração que reluta para estar nas mídias. Aberração é termos que aguentar sua voz, sua fisionomia de maçã mau comida e seus trejeitos de moça púdica. Aberração é sabermos que Jesus aceitou Mara Maravilha, mas Mara Maravilha não aceitou verdadeiramente Jesus.

Neste momento, eu enterro Mara Maravilha além de sete palmos de terra!

Mara Maravilha – a evangélica da música fingida
Marcelo Teixeira

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Fascinação é o melhor álbum de coletâneas de Elis - e só!


O melhor de Elis está aqui
Elis Regina ainda é considerada por alguns critícos medonhos como a maior cantora do Brasil, mas seus discos, na maior parte deles, não são tudo isso. Elis era histriônica e ficou mais conhecida não por sua música, mas sim por suas frases de efeito moral e constrangedor e pelo fato de ter lançado compositores ávidos por música boa e de qualidade e que estavam em um momento propício para isso. Seu álbum mais completo com relação as coletâneas lançadas após a sua morte é duplo Fascinação, lançado originalmente em 1988. Depois deste álbum, muitos outros vieram, com capas horrendas e músicas ditas inéditas, o que não é verdade. Em Fascinação (1988 / EMI / 25,99) temos praticamente tudo aquilo que Elis cantou em discos pouco caprichados ou sem acabamento algum e que reforçam, aqui, o melhor da cantora.

 Há vários momentos e fases na vida da Pimentinha, mas que nem sempre seus discos ajudavam, mas Elis fez discos que valeram muito a pena, como Elis (1973), Elis, Essa Mulher (1979), Falso Brilhante (1976) ou o antológico Elis & Tom, gravado em 1974, que foi um marco na carreira de Tom Jobim juntamente com a marrenta Elis Regina e um disco que não pode faltar na sua prateleira.

Fascinação é a melhor coletânea de Elis e isso fica evidente pelos trabalhos respectivos que vieram à tona: fracos, feios e oprimidos. Aqui, Elis recebe carinho e tratamento especial, com uma capa geniosa demonstrando sua face de cantora de protesto numa bela pintura e com estrelas norteando sua presença. As músicas retratam várias passagens da cantora, como O Fino da Bossa, época de grande prestígio tanto para Elis como para Jair Rodrigues, o grande amigo da cantora.

De João Bosco a Renato Teixeira, passando por Milton Nascimento e Ivan Lins, Fascinação tem de tudo um pouco e nos por vezes me faz acreditar que ela é a maior cantora do Brasil. Não desmerecendo a tragetória de Elis, que nos brindou com algumas das melhores músicas da MPB, aqui destacadas nesta coleção. Para gostar de Elis é preciso um disco assim, com os melhores sucessos de sua carreira e não um disco qualquer de um ano qualquer. Assim o ouvinte de primeira viagem poderá perder a vontade de conhecer toda a sua obra ou ao menos vasculhá-la.

Elis não tem as melhores músicas, mas gravou um punhado de canção legal, que futuramente, com algumas cantoras, como Zizi Possi ou Daniela Mercury soaram até melhor e menos agressivas. Elis era Elis e ainda continua sendo Elis, mas não foi a cantora suficientemente boa e pensante para fazer discos futuros para que pudessêmos ficar horas e horas ouvindo. Por vezes, cansa. Por dias a esquecemos. Mas vira e mexe estamos lá ouvindo ao menos uma canção sua. E Fascinação é uma boa pedida nesses momentos.

 

Fascinação – Elis Regina

Nota 10

Marcelo Teixeira

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Lulu Santos emociona cantando Roberto e Erasmo

O novo disco de Lulu: ótimo

Já chamei Lulu Santos de vovô do rock e não gostava de suas aparições nas TVs ou programas de auditório. Achava suas músicas mais sincronizadas e românticas nas vozes de outras cantoras que conseguiam fazer com que sua música soasse mais intelectual e pessoal e criticava quando Nelson Motta o elogiava em esquetes rápidos em programas musicais. O fato é que ele voltou com força total em um disco homenageando os reis da música popular brasileira, Roberto e Erasmo e prova que regravar canções de ídolos pode ser algo realmente inovador.  Lulu Santos está com um novo disco na praça intitulado Lulu canta e toca Roberto e Erasmo e volta a uma era pré-Jovem Guarda, fazendo uma leitura retrô sobre composições do Rei Roberto Carlos e Erasmo Carlos. Em seu primeiro trabalho exclusivo como intérprete, Lulu Santos busca um caldo especial para as canções de dois monstros sagrados da MPB.

Lulu Santos não é mais aquele jovem guitarreiro que subiu no palco do Rock in Rio de 1985 usando calça apertada e joelheiras. Hoje ele é um senhor de cabelos brancos (orgulhosamente assumidos desde a década de 1990 e que lhe fez muito bem, obrigado), barba volumosa e trajando colete e gravata. O velho roqueiro completou 60 anos. Mas para comemorar, o carioca se deu de presente um disco especial. Relembrar sucessos da dupla, que vão da Jovem Guarda, passam pelas incursões black e hippie, e chegam à atualidade romântica, foi uma de forma de Lulu resgatar a essência e a fonte da sua canção.

Egresso da geração roqueira dos Anos 80, Lulu Santos soube difundir bem por muitas praias. Rock, blues, pop, eletrônico, samba, funk são algumas coisas que sempre estiveram presentes na sua música. Mas, ele nunca deixou de se assumir um eterno romântico. E nesses assuntos de coração, ninguém fez melhor no Brasil do que Erasmo e Roberto. É verdade que, nem eles são os primeiros, nem Lulu é o último romântico. Mas em assunto de amor, os três sabem como poucos extrair melodias e histórias inesquecíveis.

O disco que vem com 13 músicas dos repertórios dos artistas e selecionadas por Lulu para o seu 24.º álbum gravado em fevereiro teve as gravações autorizadas pelos compositores que comandaram a Jovem Guarda. A direção musical e os arranjos ficaram a cargo do próprio Lulu Santos, que mesclou as canções um toque de blues bem perceptíveis como em Minha fama de mau (Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1965), Sou uma criança, não entendo nada (Erasmo Carlos e Ghiaroni, 1974) e Festa de arromba (Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1965), ainda foram gravadas canções como Quando (Roberto Carlos, 1967), As curvas da estrada de Santos (Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1969), Se você pensa (Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1968), Sentado à beira do caminho (Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1969) Eu te darei o céu (Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1966), Como é grande o meu amor por você (Roberto Carlos, 1967), É preciso saber viver (Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1968) e Emoções (Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1981).

Vale a pena conferir!

Lulu Canta & Toca Roberto e Erasmo – Lulu Santos

Nota 10

Marcelo Teixeira

sexta-feira, 14 de junho de 2013

O canto forte de Clara Nunes em O Canto das Três Raças


Clara: músicas fortes no disco de 1976

Clara Nunes se foi em 1983 e já se foram 30 anos de sua morte, mas seus discos ainda ecoam e transforma o mundo da música em algo surpreendente e inovador. O Canto das Três Raças (1976 / EMI / 29,99) é um disco que pulsou nos poros das pessoas, da elite, da sociedade, dos políticos, do mundo e mostrou o quanto a África está em nossas veias, assim como a figura de Clara demonstra o Brasil em suas variantes e formas. O disco agitou as carcaças dos mais brasileiros dos ritmos, cravando para sempre o nome de Clara Nunes na história de nossa música. Cantando forte, bonito e audacioso, o disco lançado em 1976 trouxe inovação e determinação de uma das cantoras que bradavam a brasilidade na época. Clara Nunes foi eleita a melhor cantora de seu tempo por vários anos e até hoje seu nome inspira e aspira novas cantoras a seguirem seu estilo, adotarem seus cabelos e seus adornos e a cantarem em uníssono praticamente todas as faixas deste disco.

Lançado até mesmo no Japão, que se renderam – e ainda se rendem – aos nossos grandes artistas, O Canto das Três Raças merece todos os destaques possíveis pela magia, pelo encantamento, pelo ritmo, pela voz, pela cantora, pelos compositores e pelo conjunto da obra. Clara era estrela e fez deste disco uma das melhores maravilhas de seu tempo. Ontem e hoje se confraternizam e já se completam 37 anos do lançamento desta obra-prima intelectual e perfeita do cancioneiro de Clara. A cantora, que não gostava de rótulos e nem de ser chamada de sambista, gostava de ser popular, mas mal sabia ela que o seu popular agradava a multidões que a seguiam e a idolatravam. O blog Clara Nunes Deusa dos Orixás (www.claranunesdeusadosorixas.blogspot.com) é uma prova disso: desde o seu lançamento, vem mostrando o quanto a cantora ainda é lembrada e a força descomunal de sua presidente, Aninha Vieira, é favorável para o crescimento dos novos fãs.

O Canto das Três Raças deveria ser um hino à todos e cantado em praça pública antes mesmo de iniciar a partida de futebol ou quando morresse algum político. Para a Copa do Mundo, que iniciará suas partidas já no ano que vem, a música que trata de um mundo pobre, triste, arcaico e laico, seria uma boa pedida para que nosso canto ecoasse cada vez mais alto, bradando assim uma legião de brasileiros ao confinamento mútuo de várias gerações.

De Vinicius de Moraes surge Ai Quem me Dera, um hino deprimido, melacólico e sutil sobre a esperança do amanhã, do belo e do novo acontecimento e é marcado por belas palavras que nos remete a lembranças tristes de quem partiu ou de quem podemos esperar ouvir chamar nosso nome um dia. A esperança era a melhor palavra de Clara, que já deu nome a um de seus discos e era repetida várias vezes por ela. Aqui em O Canto das Três Raças, praticamente todas as músicas retratam a fé e a esperança de que algo novo possa acontecer ou renascer.

Basta Um Dia, de Chico Buarque, ficou tão marcante e presente em sua voz, que até mesmo o compositor carioca ficou maravilhado com tamanha dramaticidade. A música tem um certo lirismo que conseguimos captar através da voz de Clara e que penetra em nossa alma com afinco e sutileza tenra. Meu Sofrer, de Marçal e Bide, traz toda a efervescência de uma luta contra o amor, o pecado e a lastima. Risos e Lágrimas, de Nelson do Cavaquinho, José Ribeiro e Rubem Brandão se entrelaça com Tenha Paciência, também de Cavaquinho com Guilherme de Brito e fazem uma justa causa para com a fé e o afeto.

O forró e a alegria pedem passagem em Alvoroço no Sertão e Fuzuê, fazendo da voz de Clara um grito contra a impunidade nordestina. Lama foi um sucesso seguido de perto pela faixa título e até hoje seu verso repercute em debates. Creio eu que, para noventa por cento da população brasileira, a canção título é o máximo de informação que se tem sobre O Canto das Três Raças, sendo música de batuque pra negro escravo fazer festa, mesmo sendo um eco triste.

O Canto das Três Raças começa com uma introdução em toque simples de atabaque, característico de terreiro de umbanda, não de candomblé, secundado pela entrada de um violão anunciando a harmonia musical, para a entrada da voz da Clara que canta, acompanhada somente por esses dois instrumentos, a primeira estrofe. Já na segunda, quando outra raça entra em cena, o negro, um Agogô entra junto e se une aos dois instrumentos, permanecendo assim até a quarta, a do refrão, cantado só pela Clara, quando surge o som de um surdão com batida sem resposta (tummmm……..tummm), exatamente como era o samba em suas raízes. Depois de um tempo é que veio a batida com resposta (tum-tu….tum-tu) imitando o coração, acelerando o andamento musical e se mantendo até hoje nas escolas de samba.

Esse trio de instrumentos se mantém com a Clara até o final da primeira execução da composição, que finda no segundo refrão, agora cantado por um coro de vozes masculinas, imitando os escravos. Na entrada da segunda execução, aquele atabaque único se transforma em tres (Run, Rumpí e Lé), comuns ao candomblé, o surdão ganha batida com resposta, o Agogô começa a improvisar e, junto com eles, entra todo o instrumental de uma escola de samba cantando um enredo na avenida. 

Acho que quando ouvimos a música, não só essa, mas todas de um mesmo nível, sentimos toda essa preocupação do compositor no ato da composição através da emoção que ela nos transmite; esse destrinçar da canção exige, além de informação cultural, um entuito de se observar, pois quando ouvimos a canção pela primeira vez, sentimos uma coisa, qualquer coisa, um arrepio ou um suor frio, por não saber definir o que foi aquele sentimento. Uma das grandes sacadas geniais feitas em disco está aqui, em O Canto das Três Raças, cantada pela brasileira Clara Nunes em um ano difícil como o de 1976, produzido Paulo César Pinheiro. Um disco que merece ser um Hino Nacional Brasileiro.


O Canto das Três Raças – Clara Nunes

Nota 10

Marcelo Teixeira

quinta-feira, 13 de junho de 2013

O eco da pernambucana Gerlane Lops

Gerlane: grande força nordestina
É impossível não ficarmos embasbacados com tamanha voz. Quando a gente acha que capturou a essência da criatura, ela nos dá um golpe e nos presenteia com mais uma canção. Esconde-se atrás de seu ego que é impossível de se mensurar, criando um universo novo a cada música investida. Nos mostra como somos vários em um, como São Paulo ou Rio de Janeiro está antenado com Pernambuco e que é possível se reinventar a cada frase citada em suas belas músicas, criando um novo universo em cada verso cantado. Assim é Gerlane Lops, cantora pernambucana que aprecio bastante e que canta maravilhosamente, dedicando cada palavra com eterno sabor e extrema qualidade.  Gerlane poderia ter sido pintora, atriz ou dona de casa, mas o ofício de cantar falou mais alto e ela traz na ponta do pé o gingado de sua música e o carisma de sua terra. Poderia ter se consolidado como uma artista menor, com músicas pouco conhecidas ou com um disco inferior, mas Gerlane é ilustre e talentosa e jamais desistiu da fama de melhor cantora de sua região.

Tanta inteligência e talento fazem de Gerlane Lops ser uma cantora de prestígio. O importante para Gerlane é sua arte, sua música, sua matéria-prima e o seu disco Da Branca denota tudo aquilo que a cantora pernambucana traduz. Inesquecível ouvir releituras sensacionais de Chico Buarque ou as eternizadas por Clara Nunes, mas aqui Gerlane dá o seu recado, seu tom, seu talento. A música influencia na vida das pessoas de uma forma única e ouvir Gerlane Lops é a coisa mais agradável possível. Ela consegue melhorar o cotidiano, fazer com que lembranças venham à tona e até mesmo despertar emoções naqueles que as ouvem. Gerlane consegue despertar emoções e consegue, acima de tudo, nos fazer bem com sua música.

A música, em todas as suas roupagens e regravações, é a grande obsessão de Gerlane Lops, seja isso em sua maneira de abordar uma canção ou de enriquecer sua própria vida. De Pernambuco a cantora consegue se mostrar ao Brasil depois de seu elogiado disco Da Branca, lançado em 2008, em que a escolha do repertório era determinada pelo franqueza de sua voz, pela sonoridade de sua música, pelo samba cadenciado que pode existir no Nordeste, misturando-se aos frevos e axés.

O disco é feito de belas músicas. Gerlane conseguiu captar toda a atmosfera que necessitava para a música popular brasileira para fazer seu belo disco. Nada como ouvir uma intérprete que sabe o que quer cantar, que não adere a modismos, porque tem personalidade musical de sobra. Da Branca é um dos mais completos e belos discos feito por uma cantora nordestina e Gerlane Lops precisa ser rapidamente descoberta, aplaudida e ouvida. Ainda aposto na música popular brasileira, ainda aposto em seus valores e ainda aposto nas cantoras que surgem aqui ou ali, carregando musicalidade de categoria na bagagem e nos brindando com o mais puro e cristalino que há na MPB. Gerlane Lops é uma dessas cantoras que aprecio, ouço, gosto e não canso de ouvir.


O eco da pernambucana Gerlane Lops

Marcelo Teixeira

quarta-feira, 12 de junho de 2013

A grande dama dos palcos: Sandra Duailibe



A dama Sandra Duailibe

O cenário musical da MPB está cheio de ótimas cantoras com influências das mais diversas possíveis, que vão do chorinho a bossa nova, passando pelo rock e até o folk. De nomes como Emília Monteiro e Olívia Gênesi surgem vozes que tem ganhado cada vez mais espaço e importância na música nacional. Outras, como Karina Buhr e Bárbara Eugênia, se destacam já no álbum de estreia sendo grandes promessas. Mas, como as novidades nesse meio não param, surgem surpresas muito boas e que merecem toda a nossa atenção, como é o caso da cantora Sandra Duailibe, que já está na estrada há um tempo e que me surpreende toda a vez em que a ouço cantar. Sandra é uma dessas cantoras que nos agarram logo no primeiro minuto e mesmo sem ter que cantar, sua fisionomia é impactante, nos hipnotiza e nos acalma de uma tamanha forma, que fica impossível não se apaixonar por ela. E Brasília, a capital do país, tem me deixado muito realizado e feliz com as cantoras lá residentes, como já venho retratando aqui no Mais Cultura Brasileira! com nomes como Cely Curado, Nathália Lima e Márcia Tauil.
A música de Sandra Duailibe foi feita para cantar o amor e todos os seus adjetivos — que de certo não existia ainda quando os primeiros homens cantaram. A envolvente voz dessa cantora nos remete a lembrarmos do quanto a vida é única e bela e do quanto a música popular brasileira é viva, real e sublime. Sandra canta com a necessidade de celebrar magnificamente os deuses e a natureza, e de conservarmos na memória, pela sedução de seu cantar, as leis da felicidade. A poesia estende-se sempre por um fio condutor, e tenderá constantemente a aproximarmos, nos conceitos mais puros, mais belos e mais concisos, as ideias que estão nos interessando e nos conduzindo ao ouvir sua voz.  Acessando o site da cantora (www.sandraduailibe.com.br), você terá todas as informações sobre shows, lançamentos de discos e outras coisas boas.
A dimensão de Sandra Duailibe não se traduz apenas pela doçura da sua voz, mas também pela intensidade com que vive cada uma das músicas que interpreta e que representam não só a sua forma de ser e de estar, mas que mostram a realidade do povo brasileiro, amantes da boa música popular brasileira. Mulher de grandes viagens, Sandra já cantou de Chico Buarque a Lenine com a maestria digna das grandes damas dos palcos e deixando as melodias ainda mais deliciosas.
A receita do sucesso não tem mistério nenhum: uma produção bem caprichada, no estilo banquinho, voz e violão fazem parte de quase todos os seus discos. Sandra apresenta algumas canções da forma como elas foram criadas, mas na maioria das vezes, a desconstrução das melodias fazem toda a diferença, como o caso de Tatuagem, de Chico Buarque e Ruy Guerra, gravada no disco Voz e Piano (2011), cantada com sutileza de detalhes acompanhada do piano de Leandro Braga ou no caso de Morro de Saudade, de Gonzaguinha, canção quase esquecida do filho do Gonzagão, gravada no disco Do Princípio ao Sem-Fim (2006).
É com essa liberdade que Sandra Duailibe transita por diversos estilos musicais. Nascida em São Luís, no Maranhão, a cantora hoje reside em Brasília e é uma das cantoras que conseguem administrar bem sua carreira, traçando sua própria musicalidade com um trato íntimo com a harmonia. Sandra canta bem e é sempre um convite para ouvi-la mais e mais. Quatro discos lançados, sendo o último em homenagem à Roberto Menescal, chamado Elas Cantam Menescal (2012), um dos patronos da Bossa Nova, Sandra tem um repertório variado que vale a pena escolher, permitir, sem faltar espaço para esquecê-la, tampouco desanimar. O importante é deixar a música penetrar em seus poros e ouvidos e descobrir cada nova sensação a cada música ouvida. Seja qual for o jeito escolhido, ouvir Sandra Duailibe se conjuga com todas as formas variantes de se ouvir uma boa música.
Pautada na leveza de sua melodia, a cantora já flutua alto e faz shows em Paris, Brasília e aonde sua música a levar. Sandra Duailibe fala com um mundo inteiro como quem traça mesmo um plano para ser ouvida. Mas não faz de sua carreira como esses matemáticos e calculados, com pressa ou com medos. Sem restrição nenhuma, a cantora optou pelo amor para contar, em cada uma das músicas, as histórias que gosta de pensar.

A grande dama dos palcos: Sandra Duailibe
Marcelo Teixeira

terça-feira, 11 de junho de 2013

A beleza de Vanessa da Mata em seu disco de estreia

O melhor disco de Vanessa
A primeira imagem que vem é de Marisa Monte. Para quem não está habituado com a sonoridade do primeiro disco de Vanessa da Mata, estranhará a sua voz logo no primeiro som. Vanessa da Mata não esconde em seu CD de estreia os vários pontos de semelhança com a colega mais velha. Parte dos mesmos princípios de Marisa, da compositora razoável/boa cantora/artista decidida. Para dar o salto próprio, chega em parte contaminada, como também acontecera com Marisa no final dos anos 80. Parece já haver gente à beça a seu redor. Levada pela multidão, ela já chegou ultrapassando as origens próprias, que poderiam colocá-la entre a aguda timidez mato-grossense de Tetê Espíndola e a audácia pop cosmopolita de Marisa Monte. Cercada de novas influências, viaja também ao suingue de Jorge Ben (em Não Me Deixe Só e Viagem), ao samba estilizado em pop (Alegria, de Assis Valente), às orquestrações caetânicas de Jaques Morelenbaum.

Interiorana cosmopolita, abriga esse furacão de referências nos caracóis dos enormes cabelos revoltos. Mirando talvez alvos populares, vem embalada em uma capa deliciosa de disco, que faz pensar em Clara Nunes, cantora que a própria Vanessa adora e se inspira. Mas o que ela é? Quem é Vanessa da Mata para uma época em que não havia cantoras com tanta determinação e ousadia e, por que não, diferenciada? Ainda não era possível saber, não no primeiro disco lançado em 2002,  pois a neblina era intensa. Mas em Vanessa da Mata (hoje disco raro) já vem a primeiro plano um esforço pautado pela palavra que a moça mais repete ao longo das canções: delicadeza. Sua voz, sempre afinada, é frágil, chegando a permitir que seu primeiro grito de guerra (Não Me Deixe Só) seja uma doce confissão de insegurança e ousadia.
O ano de 2002 era da Vanessa da Mata. Tem gente que, além de esforço pessoal, tem uma baita estrela que a acompanha. Mesmo assim, tem trajetória maior e melhor que muita gente que tem mais de um trabalho registrado em disco. Maria Bethânia já gravou música sua A força que nunca seca, dela e Chico César e para ganhar ainda mais prestígio, virou nome de CD da cantora baiana. Vanessa também cantou ao lado de Bethânia e de Caetano Veloso e Milton Nascimento a conheceu num jantar em São Paulo. Ouviu suas músicas e, na primeira oportunidade, quando apresentava o show Crooner na capital paulista, convidou-a para uma participação ao seu lado. Tem mais: Vanessa já se apresentou com Baden Powell e Daniela Mercury, que também gravou música sua. Tem parcerias com Lokua Kanza e Ana Carolina, além de Chico César.
Confessar-se frágil torna-se elemento constituinte de sua crença na delicadeza. E daí nasceria (será?), a força que nunca seca que revela e conduzira Vanessa para um todo além do horizonte. Na voz quente, não há insegurança. Por trás do pandemônio, há personalidade. Vanessa conseguiu, já ao fim do disco, após ouvir com exatidão, voar de vez para longe das comparações com Marisa Monte e se tornou uma das maiores cantoras do Brasil, alcançando, inclusive, o 2º lugar na categoria das 30 Maiores Cantoras do Brasil de todos os tempos.

Vanessa da Mata – Vanessa da Mata
Nota 10
Marcelo Teixeira

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Joelma aposenta a banda Calypso


Joelma: infâme
Se for por vontade de alguma divindade ou por São Brás, protetor dos cantores, Joelma, a cantora que mais grita na música popular brasileira, anuncia que vai aposentar a banda que um dia a revelou, para se tornar cantora evangélica. Após as polêmicas de suas frases de efeito constrangedor, a cantora estaria disposta a enveredar por caminhos cristãos e vai deixar de lado o Calypso para formar o Calypso de Deus. Mas será que Deus aceitaria? Aceitando ou não, o fato é que a cantora está fadada a ser mais uma marionete das próprias palavras e, para tentar se esconder das quedas de vendagens de seus discos, resolveu camuflar seus dons artísticos sobre os domínios de Deus. Vale lembrar que muitos cantores foram para o mesmo caminho após sentirem o ostracismo por perto, casos como os das cantoras Baby do Brasil, Rosanah Fienngo, Sula Miranda, Mara Maravilha (ex apresentora de programas infantis), Nelson Ned, Lindomar Castilho, entre muitos outros.
Se a música evangélica é tão forte assim, por que não foram antes mesmo de lançarem tanta porcaria no mercado fonográfico? Que Joelma é um lixo sem tamanhos proporcionais, disso não há dúvidas.  Espero apenas que o seu deus a aceite com seus trejeitos e que tape seus ouvidos ao ouvir seus cantos e louvores. E que São Brás, tão pouco comentado e lembrado, tenha paciência por todos os seus pecados.
Joelma se apresentou com a banda Calypso em São João da Capitá, em Recife, na noite sábado (8). A cantora surpreendeu os fãs ao anunciar durante o show que vai se dedicar à carreira gospel em breve. O assunto ganhou destaque nas redes sociais com comentários dos admiradores da banda, pedindo à cantora que seja feita a sua vontade. E a vontade de Joelma é ser a maior cantora gospel do Brasil, superando a maior estrela deste estilo, a queridinha (sem nenhum trocadilho) Aline Barros. Impossível, né, São Brás?
Joelma realmente fez este anúncio, mas nada vai acabar agora, para a nossa tristeza, embora a banda tenha saído da mídia após a polêmica entre gays e religião no primeiro semestre deste ano. A previsão é que só termine em 2014. Depois disso, Joelma realmente quer algo focado na música gospel e pensa em iniciar a Calypso de Deus. E se isso acontecer, Joelma poderá ficar fadada a ter um público menor, pois a sua grande maioria ela perdeu há um certo tempo.

Joelma aposenta a banda Calypso para formar o Calypso de Deus
Marcelo Teixeira

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Shirle de Moraes tenta ser Elis Regina em disco de estreia


Shirle não vingou como cantora
Shirle de Moraes saiu desses programas de realitys que procuram novas candidatas a posto de estrela da MPB e não conseguiu projetar sua carreira até hoje. Diferentemente do que aconteceu com a cantora Roberta Sá, que estivera no mesmo programa e que está com discos sensacionais na praça, Shirle de Moraes tentou, tentou e ainda continua tentando um lugar ao sol. Mas o fato é que ela canta até que razoavelmente bem, mas não ao ponto de estar entre as melhores. Na cola e nos rastros de Elis (gaúcha como Shirle), a cantora surgiu com um disco recalcado e pautado principalmente nas regravações, o que já foi um erro mortal, pois mexeu com o repertório de Elis Regina. Poucas cantoras conseguem fazê-lo com maestria e mesmo Shirle sendo uma novata, o resultado é mais ou menos. Não dá para ouvir todo o disco e mesmo inspirado, não consegui ir até o final. E olha que o disco foi lançado lá pelos anos de 2005.
Shirle poderia ser melhor. Mas não é. Tenta ter uma carreira igual ao de Elis e para isso, faz trejeitos, grita histriônicamente e faz malabarismos pueris para tentar se parecer com a maior cantora do Brasil. Não por acaso, seu disco de estreia carrega o nome da música de Milton Nascimento, Nada Será Como Antes, que Elis adorava.  O repertório da cantora é ousado e, aos vinte e sete anos, Shirle foi contratada pela Sony para lançar seu primeiro disco.
Nada menos do que oito das doze faixas do discos é calcado no cancioneiro da Pimentinha gravados nos anos de 1970 e 1980. O que chama a minha atenção é que Shirle de Moraes (que por vezes pensamos se tratar de uma família do poeta Vinicius de Moraes) não só persegue, como também copia todos os passos que Elis dera em vida, como cortes de cabelos, roupas e maquilagens.
No dia em que Shirle de Moraes assumir uma identidade própria e não se ofuscar na imagem de uma grande artista, sua carreira poderá deslanchar sem medo de encarar um público ansioso por novas vozes. Shirle tem capacidade e potencial para ser ela mesma, uma cantora jovem e que pode ter um repertório a sua altura. Por enquanto, Shirle é apenas uma imitação imperfeita de uma das maiores cantoras do Brasil.

Nada Será Como Antes - Shirle de Moraes
Nota 3
Marcelo Teixeira