sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Zeca Baleiro revive Zé Ramalho em CD duvidoso


Um disco comum
2015 foi o ano das homenagens feitas de cantores da nova safra por cantores de outras gerações. Depois de Adriana Calcanhotto lançar álbum homenageando Lupicínio Rodrigues, agora é a vez de Zeca Baleiro dedicar uma justa adequação em forma de música para o cantor Zé Ramalho, que nunca recebera homenagens em discos completos. Não chega a ser o grande lançamento do ano, muito menos fará deste disco ser o melhor da carreira emblemática de Zeca, mas vale a pena ouvir as já manjadas canções do cantor paraibano cantadas aqui pelo cantor e compositor maranhense. Algumas regravações ficaram boas, casos de Chão de Giz e Eternas Ondas, mas outras, como o mega sucesso Avohai e Táxi Boy, ficaram suspensas no ar, com aquele clima de consternação musical. A capa do álbum é simples, negra e com a imagem de Zeca ao lado, mas a atmosfera do disco não atrai muito e, quando se trata em homenagens (ainda mais quando o homenageado está vivo!), o resultado deveria sair melhor que o esperado. Neste caso, esperamos muito de Zeca para pouco resultado, porque as canções cantadas por ele não soam com a mesma empatia e elegância que o dono das canções nos transpassam. Zeca uniu um repertório já manjado em que todas as letras são muito conhecidas do grande público, mas infelizmente não teve o preparo de fazer um grande disco. Mesmo assim, fica registrado um trabalho que merece respeito pelo fato de que todos os cantores reverenciam a obra e a pessoa de Zé Ramalho, mas ninguém ousou em dedicar um trabalho inteiro sobre ele. Em seu décimo quinto álbum, Zeca parece se equilibrar entre aquilo que quer lançar e aquilo que acha que vai dar certo, tanto que o cantor deixou de ser ponto forte nas composições que cria para dar ênfase total a composições de outros cantores (isso já vem ocorrendo com certa frequência na carreira do cantor). Meio rock pesado com som leve, misturado a guitarras, violão, banjo e acordeom, Chão de Giz (2015 / Som Livre / 24,99) é um disco que merece atenção mais pela ousadia que pela voz de quem o canta. Calma! Não estou aqui denegrindo a imagem de Zeca Baleiro, mas acontece que o disco é mediano, pouco convincente e muito comercial. O fã de Zeca poderá se assustar com o resultado, mas o fã de primeira viagem poderá adorar o resultado. No meu caso, que estou acostumado com o Zeca dos tempos de vacas secas de início de carreira, prefiro me contentar em acreditar que ele voltará a ser um dia tão musical quanto popularesco.
 

 
Chão de Giz (2015) / Zeca Baleiro
Nota 8
Marcelo Teixeira

domingo, 23 de agosto de 2015

1980 foi o ano de Rita Lee?

Rita é Lee
1980 foi o ano de Rita Lee, mesmo tendo como concorrente grandes cantoras da categoria de Maria Bethânia, Gal Costa, Alcione, Clara Nunes, Elis Regina. Detentora única do rock brasileiro, Rita Lee já demonstrava que seus discos seguintes seriam pautados dentro de um segmento voltado para a ironia fina de um humor rebuscado, colocando em prática toda a sua sagacidade espontânea que a consagrou como artista. Rita Lee lançou um disco longe de ser intelectualizado demais, correto demais ou puritano demais: esse é um dos melhores e mais preciosos discos de toda a carreira da já considerada Rainha do Rock Nacional. Desfilando um enxoval de sucessos, como Baila Comigo, Nem Luxo Nem Lixo, Caso Sério, o disco, que vem como título o nome e sobrenome da cantora, também é popularmente conhecido como Lança Perfume, música que abre o álbum. Cantando maravilhosamente bem, o álbum Rita Lee (1980 / Som Livre / 29,99) alçou a carreira da cantora para a Europa e a América do Norte, fazendo com que a cantora adentrasse definitivamente no showbizz como uma das compositoras mais influentes daquele ano. Mas é correto eu afirmar que o ano de 1980 fora realmente de Rita Lee? Óbvio que esse questionamento é errado em ser afirmado por qualquer crítico de música, mas vale lembrar que Rita lançou um disco que não continha apenas um ou outro sucesso, mas sim, todas as faixas foram cantadas e recantadas por todas as faixas etárias, sendo uma epopeia de musicalidade de boa categoria de uma expoente do rock. Se em 1978 Rita veio com Babilônia, disco que trouxe poucas melodias ditas ótimas, Rita Lee trouxe um desfiladeiro de eternas canções, que ainda hoje, mais de trinta anos depois de seu lançamento oficial, continuam na boca do povo com um ar de saudosismo. Aquele ano de 1980 estava revolto: Elis não tinha lançado um bom disco, Clara Nunes estava em festa com seu álbum, Gal Costa brilhava com sua voz cristalina, Maria Bethânia lotava os teatros nacionais, João Figueiredo era o Presidente do Brasil, Chico Buarque enlouquecia a todos com a Geni e o Zepelin, o cantor Raimundo Fagner conseguira se desligar do Ceará e ganhar o Brasil por inteiro e Rita Lee lançava o disco que revolucionaria seu mundo e o mundo de muita gente.  A turnê Lança Perfume lotou as casas de shows do Brasil e sua música ficara mais rica e mais autoral. Sendo assim, Rita passou a ser pertencente a um grupo em que a boa música pediria passagem e entraria definitivamente para o rol das grandes artistas nacionais. Todos os anos são os anos de Rita, mas 1980 foi o seu ano, com um disco sensacional e que não pode ficar fora da coleção de qualquer colecionador ou amante da MPB e do Rock Brasileiro. E é por esse motivo que Rita é Lee.
Rita Lee (1980) / Rita Lee
Nota 10
Marcelo Teixeira

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Gal é Estratosférica (2015)

Gal é Gal
Se Recanto  (2013) trouxe a sonoridade estranha, barulhenta e deliciosa de Caetano Veloso como forma de trazer à tona toda a magnitude e potência exuberante de Gal Costa, seu mais recente álbum vem com uma carga experimental acompanhada de jovialidade e bossa novista que deu certo. Estratosférica (2015 / Sony Music / 27,00) não remete a Recanto, assim como não remete a nenhum outro disco que Gal veio a lançar, mas em se tratando de ousadia, podemos dizer que Gal acertou em cheio ao fazer este belo álbum. A começar pela capa em que seus cabelos estão esvoaçantes e cada vez mais negros e seu sorriso demonstrando toda a sua felicidade (e sua marca registrada), o disco tem um regozijo que não se encontram em seus discos anteriores e nem lembra o ar pesado e político e sombrio de Recanto. O tropicalismo de Junio Barreto em Jabitacá faz com que Gal reinvente um jeito novo de soletrar as palavras e fazer desta canção uma linda história de cruzamento entre seu início de carreira e e seu tempo real. Sem Medo Nem Esperança (Antônio Cícero / Arthur Nogueira) remete perfeitamente ao mundo tropicalista, com suas instrumentações intimistas e cheia de parafernália que nos tende a crer que Gal não está de brincadeira e que no alto de seus mais de 70 anos, ainda pode nos mostrar coisas maravilhosas. O que Gal fez foi juntar uma boa galera atual e antiga para dar o ar da graça nesse disco. Assim como Ney Matogrosso fizera em seus discos desde o início dos anos 2000, Gal chamou os melhores artistas da atualidade para lhe darem canções novas e harmonias refinadas. O que se vê em Estratosférica é um disco bem acabado, muito bem cantado e muito bem produzido. Mas chama a minha atenção para que todos esses adjetivos acima soassem como algo que valem a pena uma reflexão. Todos os compositores que lhe entregaram as músicas parecem que a fizeram como se eles mesmos estivessem cantando. Explico: a música Estratosférica (Pupillo / Junio Barreto / Céu), está muito perto de do disco Caravana Sereia Bloom (2012), lançada por Céu. Assim como Quando Você Olha Pra Ela (Mallu Magalhães), sinto que mais parece ter saído do álbum Pitanga (2009), de Mallu. Se percebermos mais atentamente, Por Baixo (Tom Zé) é uma continuação de e Amor Se Acalme, de Arnaldo Antunes, Marisa Monte e Cezar Mendes, é uma continuação de Aquela, lançada por Marisa no CD Infinito Particular (2006). Ainda colhendo os bons frutos do disco anterior e tentando arriscar as guitarras elétricas, Caetano surge com seu filho Zeca na composição de Você me Deu, que soaria bem em Recanto. Thalma de Freitas se junta a João Donato para comporem a romântica e sensacional Ecstasy e Criolo aparece com Dez Anjos, juntamente com Milton Nascimento, sendo talvez a grande parceria inédita do disco, demonstrando toda a força dramática de ambos os compositores para narrarem suas histórias Espelho d’água (Marcelo Camello / Thiago Camello) é uma baladinha sentimental que nos lembra e muito o bom tempo de Los Hermanos. Ilusão à Toa fecha com chave de ouro o disco, fazendo com que Johnny Alf seja relembrado com muita saudade. Mesmo sendo uma faixa que não estava prevista no álbum (e sim encomendada para ser trilha de novela global), Gal conseguiu passar uma enorme emoção com essa canção de 1961. Estratosférica veio para ficar e ser o disco do ano, tendo em vista que muitos críticos de música assim o elegeram e eu mesmo sou suspeito para dizer o contrário. Gal conseguiu reunir um timaço de estrelas contemporâneas para darem o ar de suas graças no cenário da música popular e conseguiu, mais uma vez, ser a estrela maior da nossa música. Mesmo deixando Chico Buarque (que não anda tendo inspirações coerentes) e Gilberto Gil (que não compõe há um tempo algo inédito) de lado, o novo disco de Gal é resultado de um trabalho satisfatório, energizante, cristalino e doce. Cantando cada vez melhor, tendo uma subordinação total de sua voz, Gal consegue nos hipnotizar, chegando a fazer deste disco um tropicalismo sem igual, adentrando em nossas almas assim como em nossas bocas, peles, mentes e casas. E é por isso que Gal é Gal.
 

Gal é Estratosférica (2015)
Nota 9
Marcelo Teixeira

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

O Guelã de Maria Gadú


Guelã: Audacioso e atemporal
Maria Gadú e aquele tipo de cantora que você ouve agora, mas descarta já em seguida. Ela não é única nesse segmento expressivo de música de momento, mas para não fugir do foco, ficarei apenas em Maria Gadú. Tudo soa como estranho em Guelã (2015 / 25,99 / Slap), mais recente trabalho da cantora, que aposta no sincronismo da música de qualidade e intelectualizada (isso aconteceu com Lenine em seu recente disco Carbono) e ao mesmo tempo aposta na sonoridade diferenciada daquilo que tanto Maria Gadú já fizera como com o som que rola ultimamente por ai. Diferentemente de seus trabalhos anteriores, Maria Gadú tenta se expressar através da música como sendo uma detentora daquilo que acredita ser seu mantra: a música que adentra em nossos poros e fixa-se em nossas mentes. Se em Maria Gadú (2009) havia um lado muito biográfico da cantora e Mais uma Palavra (2011) estivesse mais próximo da virada musical da cantora e apostando já na qualidade de seu som, Guelã é adverso a tudo aquilo que Gadú já fizera, desde composições e harmonias. Não é, definitivamente, o melhor CD da cantora e esse está longe de ser uma obra-prima, mas é um grande avanço de Gadú dentro da MPB, com uma sonoridade exclusiva de uma cantora que experimenta sons hibridamente conscientes e nada simplórios. Mas nem todas as faixas são boas: Guelã precisa ser ouvido várias vezes para se chegar a um determinado comum de aprovação ou satisfação completa e ainda assim sentimos que falta algo para ser de fato um grande disco. Maria Gadú não tem uma grande voz, não tem uma presença de palco marcante e até arrisco a dizer que ela não encanta quando canta, pois está mais interessada em interpretar o não entendido do que se banhar das canções, mas não posso negar que sua participação dentro da música popular brasileira ainda é uma qualificação imprescindível. Guelã não será um disco que muitos vão parar para ouvir, comentar ou dar de presente. Será um disco passageiro, remoto, quieto, calmo, denso e atemporal na carreira de Maria Gadú. Nem todas as faixas são importantes para a complementação deste álbum: Trovoa é uma música arrastada, inquieta e que cansa demais, mas se você a ouvir outras vezes com calma, talvez tente entender a mensagem da cantora (o que para mim transpassa um lado biográfico que o compositor Mauricio Pereira talvez a tenha imaginado para ela). Destaques mesmo são as músicas Obloco e Tecnopapiro, magnífica e ambas de sua autoria, que transmitem uma atmosfera de puro êxtase vindo de sua alma lírica. Com uma facilidade incrível em inventar palavras (talvez tenha aprendido com Caetano Veloso, seu ídolo maior), Gadú colocou tudo o que queria nesse disco, fazendo com que o público se distancie de seu trabalho para se aventurar em outras searas. A começar pelo dificílimo título do álbum, Guelã, que já faz com que o trabalho seja diferente, ousado, mas ao mesmo tempo incompreensível, difuso, estranho. E em todas as faixas pode-se encontrar sons ou visões ou retratos imaginados dentro daquilo que soa como estranheza para nossos ouvidos. Retifico: o ouvinte mais atento pode se deliciar com Guelã, mas aquele que não tem paciência ou não tem parcimônia ou até mesmo não se identificar com as novidades aqui encontradas, pode simplesmente evocar seu santo e desaparecer para o sempre. Maria Gadú bebe do próprio veneno ao lançar no mercado um disco tão complexo e audacioso, tão voraz e acalentador, tão atroz e contemporâneo. A música nos dias de hoje requer um distanciamento entre o tudo e o nada, ou seja, entre o presente e o futuro e o que se busca aqui é a perfeição da imperfeição. Se você ouvir detalhadamente Guelã como quem estivesse conversando com o seu eu interior, poderá saber que Guelã é um disco delicioso, difícil, sentimental, puro e com uma energia positiva de Gadú para tentar explicar algo que existe dentro dela mesma.

Guelã (2015) / Maria Gadu
Nota 9
Marcelo Teixeira

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

60 anos sem Carmen Miranda

Carmen: um mito
Não houve, indiscutivelmente, uma cantora igual à Carmen Miranda. Precursora de um estilo de cantar único e intrasferível, a cantora conseguiu ser uma rara exceção entre as cantoras de todos os tempos e marcou definitivamente sua entrada na música brasileira, dando inclusive marcas de sua presença de palco em países como Argentina, Estados Unidos e Cuba. Graças à Carmen o Brasil é conhecido através de nossas canções, pois a cantora levou todo o seu gingado para países até então que desconheciam o nosso território. Mas o que é que a baiana tem? Como já disse Dorival Caymmi em sua lendária canção, tem torso de seda, brinco de ouro, saia engomada e sandália enfeitada, tudo aquilo que realmente representava (e ainda representa a verdadeira baiana). Portuguesa de nascença, a cantora nasceu no dia 9 de fevereiro de 1909 e morreu nos Estados Unidos no dia 05 de agosto de 1955, fazendo o mundo cala-se num choro embutido como nunca antes visto. Cantora e atriz luso-brasilera, a carreira artística de Carmen ocorreu no Brasil e nos Estados Unidos entre as décadas de 1930 e 1950, trabalhando no rádio, no teatro de revista, no cinema e na televisão. Seu salário era o maior até então pago para uma mulher nos EUA! Seu estilo eclético faz com que seja considerada precursora do tropicalismo de Caetano Veloso e Gilberto Gil, movimento cultural brasileiro surgido no final da década de 1960. No início de agosto de 1955, Carmen gravou uma participação especial no programa televisivo do comediante Jimmy Durante. Em um número de dança, sofreu um ligeiro desmaio, desequilibrou-se e foi amparada por Durante. Recuperou-se e terminou o número. Na mesma noite, recebeu amigos em sua residência em Beverly Hills, à Bedford Drive, 616. Por volta das duas da manhã, após beber e cantar algumas canções para os amigos presentes, Carmen subiu para seu quarto para dormir. Acendeu um cigarro, vestiu um robe, retirou a maquiagem e caminhou em direção à cama com um pequeno espelho à mão. Um colapso cardíaco fulminante a derrubou morta sobre o chão no dia 5 de agosto. Seu corpo foi encontrado pela mãe no dia seguinte, às 10h30 da manhã. A causa-mortis acima consta em seu atestado de óbito. Estamos sem Carmen há 60 anos! E o Brasil ainda precisa descobrir o significado de sua perda!
 

60 anos sem Carmen Miranda
Marcelo Teixeira