sábado, 30 de maio de 2015

A orquestra de Max de Castro (2002)


Max e sua boa música
Assim como a grande mídia não dá o devido valor aos seus grandes compositores ou cantores dentro de seu próprio país de origem, alguns desses cantores tentam burlar essa autonomia flagelada para tentarem mostrar seus trabalhos com digno respeito de estrelas da música nacional. Muitas vezes, esses cantores acabam sendo esquecidos pelo público, que acabam descobrindo outros interpretes ou outras sonoridades e, com isso, muitos cantores ditos bons acabam sendo desvalorizados. Esse é o caso do cantor, compositor, guitarrista, instrumentista, inquieto e filho de Wilson Simonal, o super talentoso Max de Castro, irmão de Wilson Simoninha. Em 2002, o Brasil pôde conhecer melhor seu lado cantor, quando o mesmo lançou o sensacional Orchestra Klaxon (2002 / Trama / 28,99), em que mistura jazz, MPB, samba e até romantismo. Com participação de Paula Lima e letras de Marcelo Yuka, Erasmo Carlos e Nelson Motta, o CD é um dos mais belos de toda a história da música do século XXI, por ser emblemático, audacioso e inteligente. Max não poupou críticas ao mundo racial (O Nego do Cabelo Bom), ao mundo do carnaval (A História da Morena Nua que Abalou as Estruturas do Esplendor do Carnaval) e nem ao mundo da música vanguarda (O Futuro Pertence à Jovem Vanguarda) e tudo isso tem um apreço muito significativo tanto na carreira musical do cantor, como na vida pública e pessoal das pessoas. Antes de mais nada, Orchestra Klaxon é um CD de jazz, indiscutivelmente abrasileirado, bem aos moldes americanos e com uma privilegiada sonoridade, rica em detalhes, instrumentos e homenagens. O CD foi incorporado para prestar uma justa rebuscada busca na própria carreira pessoal do cantor, que conviveu com os maiores mentores da música popular brasileira, como Nara Leão, Tom Jobim, Milton Santos, João Donato, Dick Farney e artistas do naipe de Tarsila do Amaral, Mário de Andrade e Eumir Deodato, sem falar do pai, um dos mais prestigiados cantores de todos os tempos. Podemos classificar o CD de Max de Castro como uma experiência musical que deu certo dentro um segmento que ele talvez nem tenha imaginado que daria certo. O disco quando foi lançado causou um certo furor, pois era um disco caro de ser produzido, difícil de ser interpretado, difícil de ser degustado e que se tornou alvo fácil dos amantes da música. Max de Castro arrebatou milhares de pessoas com Orchestra Klaxon. E entrou para a história da música popular brasileira de uma vez por todas sendo ele mesmo. Sendo Max de Castro.

 

Orchestra Klaxon (2002) / Max de Castro
Nota 10
Marcelo Teixeira

sábado, 23 de maio de 2015

Luan Santana surpreende em Acústico (2015)


Luan: mais maduro
Quem me conhece ou me acompanha nos artigos deste blog sabe perfeitamente a minha antipatia para com o cantor Luan Santana, pelo simples fato dele não ser um dos melhores cantores da atualidade e fazer do sertanejo universitário um dos ritmos mais emblemáticos da música brasileira. Já o ignorei profundamente em artigos pesados, já o critiquei com muita severidade, já o interpelei em conversas com amigos sobre a sua postura musical e posso garantir que ainda mantenho minha palavra sobre tudo o que já disse a seu respeito. Mas Luan cresceu e apareceu e suas músicas evoluíram um pouco (um pouco, apenas) para que sua imagem não ficasse tão desgastada a ponto de ser mais um cantor das adolescentes inquietas que afloram os quatro cantos do Brasil. Confesso que seu último disco está melhor que o primeiro grude musical e garanto que está melhor que o último disco lançado, que não mereceu destaque algum por não conter destaque algum. Luan Santana deixou de lado os modismos, aperfeiçoou na timidez, encontrou-se nas roupas de grife seu modelo ideal de cantor romântico e mantém agora um estilo mais maduro, autoral, modesto e, por incrível que possa parecer, mais verdadeiro. Continua cantando com os trejeitos de sempre, mas isso passa desapercebido perto daquilo que canta hoje em dia: sua música nova de trabalho, Escreve Aí, é uma das melhores faixas de seu Acústico (2015 / 29,99) e promete ser um dos hits mais cantados deste ano. Bela sacada genial dos autores desta música que resolveram incrementar no refrão com o estalar de dedos para denotar algo. Ainda cantarolando alguns versos desta música, pude perceber que Luan está melhorando seu estilo e deixando de ser brega para, quem sabe, tornar-se um mediano cantor. Por hora, seu CD é um dos pontos altos de vendagens e isso explica o meteoro que o consagrou: Luan soube conduzir sua carreira entre hits, trejeitos e vida social discretamente fora do círculo jornalístico. Sim, Luan Santana é um recordista de vendas e isso explica um pouco sobre o que é a música popular no Brasil: um misto de cultura enraizada no sertanista e um misto de manifesto entre aqueles que não apóiam sua música. Acústico tem em sua grande maioria os grandes sucessos do cantor e Escreve Aí pode ser considerada uma música boa, dessas que grudam na cabeça, sem ser apelativa, mesmo com um apelo popular generalizado e, em contra partida, faz com que Luan seja um pouco mais respeitado dentro de seu universo: a do sertanejo universitário.

 

Acústico Luan Santana (2015) / Luan Santana
Nota 7
Marcelo Teixeira

sexta-feira, 15 de maio de 2015

O samba mínimo de Juliana Amaral


Juliana e seu samba
Há um samba no mínimo extraordinário rondando a música brasileira com um certo requinte e com uma voz sublime. Juliana Amaral é a grande sambista da vez ao lançar no mercado o excelente disco Samba Mínimo (2012 / Circus / Sescsp / 20,00), que traz uma compilação de grandes bambas do universo do samba revigorados com uma sonoridade ímpar ao seu talento. Juntando num mesmo disco bambas de Itamar Assumpção, Paulo Vanzolini e Wilson Baptista aos novatos Kiko Dinnucci, Rodrigo Campos e a poesia de Paulo Lewinski, Juliana nos brinda com um disco sensacional, caprichado e com uma capa perfeita.  Dona de uma das melhores vozes femininas do Brasil, a cantora e compositora destila um punhado de canções que vão desde os antepassados até os mais novatos na música, que traz uma levada humanística e real em cima de suas composições, sempre com uma pitada de ironia fina e rebuscada. Samba Mínimo é um disco de samba, em que Juliana canta, encanta e afaga com seus trejeitos os rumores de que o antigo pode se juntar ao novo. Um disco caprichado, sensato, rico em sua tese, que não deixa sombras de dúvidas quanto a sua originalidade. Um disco baseado na pesquisa incansável de Juliana pelo mote e profundidade do samba, que consegue conciliar música e literatura em seu pleno terreno, com muito ritmo, muita emoção, muito sentimento, muita voz e muita harmonia. Um disco galgado na riqueza de detalhes, no extra luxo do samba, na popularidade simplória de composições marcadas pelo refinamento, que faz deste álbum um rico e poderoso arsenal contra as mazelas que nos rodeiam hoje em dia. A arte cênica de Juliana Amaral está representada em praticamente todas as faixas do disco: você há de perceber nas batidas e na voz da cantora um extremo entre realismo e lirismo e há de sentir na pele a emoção quando a cantora canta vinhetas ou se inspira para declamar uma poesia oral. Por todo o conjunto da obra, Juliana Amaral, cantora urbana, contemporânea e delicada, consegue expor e exprimir tudo ao mesmo tempo neste disco que merece destaque em sua discografia, por abordar temas tão relevantes como o amor, o desamor, a traição, a alegria do samba, a tristeza humana, a morte, a solidão repentina e, em sua magnitude maior, o samba. Juliana Amaral mostra toda a sua versatilidade em um disco lindo, luxuoso e simplesmente belo.

 

Samba Mínimo (2012) / Juliana Amaral
Nota 10
Marcelo Teixeira

sexta-feira, 8 de maio de 2015

Entrevista com Tito Marcelo


Tito Marcelo: o entrevistado
Tito Marcelo é de Recife, mas é em Brasília, a capital federal do Brasil, que o cantor e compositor aspira e respira música, sempre transbordando sua verve poética, sensível e autoral. Com dois CDs lançados, Tito é um cantor de excelente gabarito, de uma simpatia extrema e de um talento incrível. Cedendo seu precioso tempo entre uma viagem e outra, o cantor me concedeu uma entrevista exclusiva em que conta um pouco de sua musicalidade, de sua terra natal, de seus planos, da vontade que tem de dividir vocais com Elba Ramalho e que a maior voz do Brasil é a de Mallu Magalhães.

 

Mais Cultura Brasileira: Tito Marcelo, o que é música para você?
 
Tito Marcelo: Nunca pensei em definir música, assim com um significado específico, mas eu imagino que música seja a emoção, o sentimento que há nos sons. Acho que música é a tristeza, a felicidade, a raiva, a surpresa, o medo, etc., que sentimos quando ouvimos algo.

MCB: Você é um dos melhores cantores surgidos nos últimos anos, com qualificações e prêmios dentro da música popular brasileira, mas por que sua música ainda não chegou aos grandes centros musicais, inclusive aqui em São Paulo ou no Rio de Janeiro?

Tito Marcelo: Nossa! Estou muito, muito longe de ser um dos melhores cantores surgidos ultimamente. Na verdade, eu nem busco isso. Nunca busquei. A música me faz muito bem, e se eu puder continuar me divertindo com ela, como tem acontecido, vou estar mais do que feliz e satisfeito. E ainda imaginar que a música que eu faço faz com que outras pessoas se sintam bem também, esse sim, pra mim, é o maior prêmio de todos. Bom, não sei responder como, quando e até onde minha música vai chegar. Tenho até buscado algumas maneiras para divulgar mais meu trabalho, mas o que penso, e até gosto dessa ideia, é que minha música vai chegar onde as pessoas a levarem, especialmente as pessoas que a curtem. É isso que tem acontecido até agora.

MCB: Você canta MPB com pegada POP, o que deixa a sua música com uma boa levada. Você tem medo de rótulos sobre o seu trabalho?

Tito Marcelo: Eu não gosto dos rótulos, acho que eles limitam muito um trabalho, especialmente se for um trabalho artístico. Mas também não tenho medo deles. Acho que algumas pessoas têm a necessidade de classificar as coisas para se sentirem mais a vontade com elas. Eu entendo isso e acabo não ligando se definem minha música como POP, MPB... Faço música. Apenas música mesmo. E se as pessoas se divertem e se emocionam com minha música, fico muito feliz com isso, pouco importa o estilo na qual elas a inserem ou a rotulam.

MCB: Qual sua maior inspiração para compor?

Tito Marcelo: Acho que as pessoas e suas histórias. Fico viajando nas histórias que me são contadas, sejam pelas próprias pessoas que as viveram, sejam por aqueles que apenas as relatam, sejam essas histórias observadas ou vividas por mim mesmo no dia a dia. Livros, filmes, de ficção ou verídicos, quase tudo que é contado é sobre histórias de pessoas. Acho que essa é minha maior inspiração pra compor. A partir dessas histórias, tento usar a maneira que vejo, entendo e imagino o universo, a natureza, o cotidiano urbano e as próprias pessoas pra brincar com a poesia que tudo isso me proporciona e me permite viajar mais ainda quando escrevo.

MCB: Um cantor e uma cantora.

Tito Marcelo: Ed Sheeran e Elba Ramalho. Atualmente são os dois artistas que mais tenho ouvido.

MCB: Você dividiu os vocais com as cantoras Barbara Mendes, Perdido Pra Lua (Frágil Verde, 2011) e Gabriela Doti, Adonde El Viento Vá (Pra Ficar no Sol, 2014). Gostaria de dividir os vocais com qual cantor(a)?

Tito Marcelo: A Barbara e a Gabi são duas cantoras fantásticas. Eu já gravei também com a Zizi Villa-Lobos que é uma rapper muito talentosa de Brasília. Pra mim, foi uma honra ter gravado com elas. Sou muito fã da Elba, e como disse antes, eu tenho ouvido muito o trabalho dela. Eu ficaria muito feliz se um dia pudéssemos gravar juntos.

MCB: Em seu CD Frágil Verde, Força de Quebrar (2011), o lado ecológico leva todo o conceito de sua música, desde a capa, passando por composições e até no elemento físico. Você é um tipo de cantor que pensa também na ecologia do planeta? Foi difícil abordar um tema tão complexo como esse nos dias de hoje em letra e música?

Tito Marcelo: Quando eu fiz as músicas do Frágil Verde, Força de Quebrar eu nem estava pensando em gravar um disco. Eu estava compondo despretensiosamente, e as músicas surgiam de maneira muito natural, orgânica, sem um tema central, sem um conceito único que as relacionassem. O fato de as músicas escolhidas para o disco falarem, de alguma maneira, da natureza foi mais um reflexo de minha inspiração no momento de fazê-las, do que de uma intenção, propriamente dita, de escrevê-las sobre esse tema específico. Foi um conceito muito mais descoberto do que desenvolvido para o disco. Mesmo assim, acho que as canções por si sós também acabam indicando minha relação com a natureza e com a maneira que tento preservar e cuidar melhor do lugar onde vivemos. Eu sempre penso nisso sim.

 
MCB: Você é um cantor recifense e na música Bem Maior (Frágil Verde, Força de Quebrar, 2011) você relata os problemas sociais do Nordeste. Essa música é um pouco da sua vida, retratando alguma passagem, com fundo biográfico?

Tito Marcelo: Não. Essa música não retrata uma experiência pessoal, vivida por mim. Eu sou nascido e fui criado num ambiente urbano, numa cidade do litoral. Apesar disso, conheço alguns lugares e tenho amigos do sertão, o que me faz ter um pouco da ideia do é a vida por lá. Mas essa música, especificamente, eu fiz quando estava assistindo a um noticiário que mostrava duas cidades do sertão que sofriam com os castigos e estragos, uma da seca e a outra das chuvas. Fiquei pensando nos extremos do clima e da natureza em que vivem as pessoas do sertão. Acho que a música acabou ficando uma reflexão, uma pequena homenagem à força e à fé do sertanejo, pessoas que admiro e por quem tenho muito respeito.

Mas veja, eu não gosto muito de explicar minhas músicas, não. Primeiro porque muito das coisas que escrevo, eu mesmo nem entendo. E, segundo, prefiro que as pessoas entendam as músicas da maneira que elas as sentem. E falo isso com carinho. Não é arrogância, de jeito nenhum. É só a minha maneira de achar que não importa o que o autor quer dizer quando faz uma música. O que importa mesmo é o que cada pessoa vai sentir quando ouvir essa música.

MCB: Pra Ficar no Sol (2014) teve maior aceitação do público e trouxe mais o seu nome para o cenário musical. Todo o disco foi de composição sua, autoral, e através desta sua postura, posso dizer que o disco ficou do jeito que você queria?

Tito Marcelo: Acho que foi o processo de criação e produção do disco que fez com que ele tenha ficado do jeito que eu queria. Quando eu faço uma música, eu nunca me prendo à ideia de como ela tem que ficar exatamente quando gravada. Depois de composta, eu acho que uma música pode tomar vários caminhos, especialmente por conta do arranjo que vai ser pensado pra ela. Com as músicas do Pra Ficar no Sol foi assim. À medida que Renatinho (*) criava os arranjos, e nós íamos discutindo as ideias, as músicas iam naturalmente se transformando, sem que perdessem suas essências. E eu curto muito essa maneira de trabalhar, de produzir. Eu gosto de ver as músicas que faço sendo transformadas pelas ideias de quem as arranja. E Renatinho é muito talentoso. Um cara cheio de ideias, extremamente virtuoso e que entende perfeitamente a minha música. É muito bom trabalhar com ele.

(*) Renato Fonseca, arranjador e produtor do disco Pra Ficar no Sol.

 
MCB: Pensa em fazer shows fora de Brasília?

Tito Marcelo: Claro que sim! Já fizemos alguns shows fora de Brasília e estamos agendando outros.

MCB: Pra você, Tito, qual o segredo de ser um músico com as qualidades que você tem?

Tito Marcelo: Penso que qualidade seja um conceito muito relativo, principalmente quando se trata de um músico ou um artista. Eu até me sinto bem à vontade quando estou compondo, mas eu não sou um músico virtuoso, nem me sinto um cantor talentoso. Pelo contrário, cantar, pra mim, é uma coisa até difícil, meio tensa. O que tento fazer é passar para a música que estou cantando e tocando, acima de qualquer outra coisa, a emoção que sinto.

MCB: O que há no canto de Tito Marcelo?

Tito Marcelo: Verdade.

MCB: Qual a maior voz do Brasil?

Tito Marcelo: Poxa, não tenho nem competência para responder essa pergunta, porque não conheço sequer a metade das vozes desse nosso país, repleto de excelentes cantores e cantoras. Mesmo assim, não costumo pensar em melhor ou pior, ou até mesmo bom ou ruim nos meus critérios. Na verdade, eu tento me apegar principalmente às diferenças entre as vozes, entre as interpretações. Acho que assim eu consigo perceber o que cada cantor ou cantora tem de único, de especial. Mas para a pergunta não ficar assim tão sem resposta, eu curto muito ouvir a Mallu Magalhães cantando. Acho bem original e muito espontâneo o jeito como ela canta, especialmente quando ela canta as músicas dela.

MCB: Pra Ficar no Sol (2014) marca muito o seu lado com o regionalismo pernambucano, com instrumentos e sons de xote e forró e isso fica evidente na música Perto do Final. Esse é um jeito de manter vivas as suas raízes?

Tito Marcelo: Na verdade, esse é um jeito de minhas raízes me manterem vivo. Não o contrário. Eu que preciso de minhas raízes, porque elas fazem parte de quem eu sou, da minha história e da minha identidade. Pra mim é muito natural que minha música tenha nela o nordeste, Pernambuco e Recife.

MCB: Pra ficar no sol é...?

Tito Marcelo: Pra ficar no sol é consequência. É continuar a aventura, ainda que de maneira despretensiosa. É também claridade. É enxergar melhor, entender mais. Pra ficar no Sol é música. Apenas música.

MCB: Para encerrar, Tito, como seria a vida sem a música?

Tito Marcelo: Eu costumo dizer que não vivo de música, eu vivo para a música. De tudo que eu faço hoje, acho que a música é o que mais me move. Se não houvesse a música na minha vida, eu teria que achar outra coisa pela qual valesse a pena, digamos assim, me jogar.
 
 

 

Entrevista com Tito Marcelo
Por Marcelo Teixeira