![]() |
A cantora Maria Bethânia |
Entre
os quatro baianos tropicalistas mais próximos (isto é, estou excluindo o Tom
Zé), Maria Bethânia é sem dúvida a artista mais diferente. Talvez por isso até hoje
ela seja menos popular que os outros três, e seja tão difícil encontrar um fã
ardoroso seu. Tanto Caetano, quanto Gil e Gal já gravaram discos cafonas ou
músicas bregas, mas o campeão ainda é o irmão da Bethânia, mas mesmo assim,
nenhum dos três são pejorativos na sua arte. Com direção musical do violonista
Jaime Alem, que se encarrega das cordas no disco, Pirata é um disco
dedicado às águas, mais precisamente do mar e dos rios. Como de costume,
Bethânia intercala poemas e/ou trechos de poemas com canções que evocam estes
temas. História pra Sinhozinho de
Dorival Caymmi é a primeira canção do disco, seguida por O Tempo e o Rio de Edu Lobo e Capinam. Nas duas a ênfase é na voz e
interpretação de Bethânia, com o arranjo mínimo, acompanhada só ao violão. Todo cais é uma saudade de pedra,
declama a cantora antes de cantar os Argonautas
do irmão Caetano. Apesar de regravação, a canção é obrigatória devido à
temática do disco: Navegar é preciso /
Viver não é preciso. Se preciso
aqui vem do verbo precisar indicando necessidade ou do substantivo precisão que
denotada certeza, talvez já tenha sido até esclarecido pelo autor, mas a dúvida
torna a canção ainda mais bela. O arranjo com violão, baixo acústico e bandolim
dá um belíssimo ar de fado, música típica de Portugal.
Bethânia declama Perto de muita água tudo é feliz antes de
Santo Amaro, samba em homenagem à terra natal. Aqui fica claro o cuidado na
produção do disco, essas quatro músicas em sequência dão um crescente de ritmo,
de pique no disco. Depois vem a minha favorita, De Papo pro Ar. Clássico da música caipira (caipira mesmo!)
acompanhada na viola por Jaime Alem, conta a vida boa do caipira que vive do
rio da caridade alheia e não se incomoda com nada. Ou melhor, quase nada: Quando no terreiro faz noite de luar / E
vem a saudade me atormentar / Eu me vingo dela, tocando viola de papo pro ar.

Segue o samba com batida de
candomblé Memória das Águas e depois
com Águas de Cachoeira de Jovelina
Pérola Negra, samba de terreiro com cavaquinho e acompanhamento de palmas.
Jaime Alem agrega várias Cantigas
Populares, na faixa que leva o mesmo nome. Ainda que misture melodias
distintas nos versos tirados de diferentes cantigas, a música apresenta uma
unidade surpreendente. Bethânia declama Antônio Vieira e termina com A Coroa: voz solo, acompanhada no
finalzinho por tambores e coral, tudo agregado com se fosse uma só canção. Onde
Eu Nasci Passa Um Rio é outra da safra antiga de Caetano e essa
aqui é a interpretação definitiva de uma canção pouco conhecida da obra do
baiano. O arranjo, mais uma vez se destaca, só violão, voz e cello, conferindo
a esta bela canção o tratamento que ela merece. O verso o rio da minha terra deságua em meu coração é de arrepiar. Francisco, Francisco é uma bela canção
em homenagem ao velho Chico, e o disco termina de maneira bastante pessoal com Meu Divino São José.
Pirata
/ Maria Bethânia
Nota 10
Marcelo
Teixeira
Nenhum comentário:
Postar um comentário