Repercussão boa com este disco |
Quando
eu era criança, o disco que mais se ouvia na minha casa era os de Clara Nunes,
pois minha mãe era (e ainda é) fã condicional desta que foi a maior cantora de
todos os tempos. Cresci ouvindo suas músicas, suas canções, sem me dar conta de
que Clara já estava morta e que eu não entendia bulhufas do que ela estava
cantando, mas aquela voz, aquele canto, aquelas músicas me agradavam de um
jeito, que acabei crescendo e virando crítico musical devido à sua
musicalidade. Devo muito à Clara Nunes por eu gostar de boa música. Hoje trago
mais uma homenagem à grande Guerreira e tenho dois motivos para trazer este
disco em especial para a coluna de hoje: Claridade, de 1975, por um lado,
conta com um repertório de primeira, aliado ainda ao sensacional bandolim de Joel
Nascimento e excelentes arranjos; enquanto, por outro lado, me faz retornar à
minha infância quando escutava essas canções na vitrola da minha mãe no nosso
antigo casarão, aqui em São Paulo.
Demonstrando sua predileção
por compositores da Portela, Claridade abre em grande estilo com O Mar Serenou, de Candeia. Trata-se de
uma interpretação magnífica de uma canção que marcou um estilo, canção até hoje
relembrada nas melhores rodas de samba. O
mar serenou, quando ela pisou na areia... Quem samba na beira do mar, é
sereia... Com seu vestido branco, Clara Nunes certamente é a melhor imagem
dessa canção.
O
Sofrimento de quem Ama, de Alberto Lonato, e Tudo é ilusão, de Éden Silva e Raul
Moreno, (5ª canção do disco) demonstram que além de grande intérprete, Clara
Nunes é rainha na arte de transmitir alegria e esperança com temas tristes. Sua
influência com temas afros (esteve várias vezes na África) atinge o apogeu em Deusa dos Orixás, de Romildo e Toninho,
uma maravilhosa canção em que se misturam elementos do samba e do candomblé.
Vai, amor
Pra toda vida
Não olhes para trás
Na hora da partida
Não me mandes lembranças
Nem carta amorosa
Vivias num perfeito mar de rosas
Trecho
de Vai Amor (Monarco / W. Rosa)
Pausa para respirar: com
toda garra e afinação, Clara Nunes dá ao clássico da música brasileira Juízo Final, de Nelson Cavaquinho e
Élcio Soares, a sua interpretação definitiva. É o juízo final, a história do bem e do mal...quero ter olhos pra ver a
maldade desaparecer... Música para arrepiar! Se o lado A do vinil fecha em
ritmo mais lento e triste com Valsa de
Realejo, o lado B compensa abrindo com um samba de primeira de João
Nogueira e Paulo César Pinheiro (seu marido a partir dessa época). Para de beber, compadre...Meu compadre deixa
disso...Larga essa mulher de lado...Lembra do teu compromisso.
Candeia volta a ser cantado
em O Último Bloco: E hoje volto
cantando...me abraço ao violão...e marco o compasso junto do coração. Outra
joia rara desse disco. Depois de outro samba em alto astral com Ninguém tem que achar ruim, de Ismael
Silva, Clara Nunes diminui o ritmo para lembrar que Às Vezes Faz Bem Chorar, de Ivor Lancelotti, e antecipa o clima de
despedida com Vai Amor
(Monarco/W.Rosa). E para fechar no maior estilo e sem espaço para rancor, Clara
emenda Que Seja Bem Feliz de Cartola:
Que seja bem feliz / E leve-me na mente /
Que cresçam suas glórias / E as minhas lágrimas contentes.
Nem sempre a qualidade
combina com vendagem, mas até nisso esse disco surpreendeu, ultrapassando a
marca de 600 mil cópias vendidas, numa clara demonstração de que tem muita
gente de bom gosto. Foi o primeiro disco de uma cantora – mulher – que
ultrapassou essa marca, logo depois disso veio Maria Bethânia com Álibi.
Com este disco, Clara Nunes
se firma como uma das maiores e melhores cantoras de todos os tempos. Felizmente
deixou obras como esse disco para que a voz dela continue ecoando nos nossos
corações.
Claridade
/ Clara Nunes
Nota
10
Marcelo
Teixeira
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