terça-feira, 14 de agosto de 2012

Claridade (1975), um dos melhores discos de Clara Nunes


Repercussão boa com este disco
Quando eu era criança, o disco que mais se ouvia na minha casa era os de Clara Nunes, pois minha mãe era (e ainda é) fã condicional desta que foi a maior cantora de todos os tempos. Cresci ouvindo suas músicas, suas canções, sem me dar conta de que Clara já estava morta e que eu não entendia bulhufas do que ela estava cantando, mas aquela voz, aquele canto, aquelas músicas me agradavam de um jeito, que acabei crescendo e virando crítico musical devido à sua musicalidade. Devo muito à Clara Nunes por eu gostar de boa música. Hoje trago mais uma homenagem à grande Guerreira e tenho dois motivos para trazer este disco em especial para a coluna de hoje: Claridade, de 1975, por um lado, conta com um repertório de primeira, aliado ainda ao sensacional bandolim de Joel Nascimento e excelentes arranjos; enquanto, por outro lado, me faz retornar à minha infância quando escutava essas canções na vitrola da minha mãe no nosso antigo casarão, aqui em São Paulo.

Demonstrando sua predileção por compositores da Portela, Claridade abre em grande estilo com O Mar Serenou, de Candeia. Trata-se de uma interpretação magnífica de uma canção que marcou um estilo, canção até hoje relembrada nas melhores rodas de samba. O mar serenou, quando ela pisou na areia... Quem samba na beira do mar, é sereia... Com seu vestido branco, Clara Nunes certamente é a melhor imagem dessa canção.

O Sofrimento de quem Ama, de Alberto Lonato, e Tudo é ilusão, de Éden Silva e Raul Moreno, (5ª canção do disco) demonstram que além de grande intérprete, Clara Nunes é rainha na arte de transmitir alegria e esperança com temas tristes. Sua influência com temas afros (esteve várias vezes na África) atinge o apogeu em Deusa dos Orixás, de Romildo e Toninho, uma maravilhosa canção em que se misturam elementos do samba e do candomblé.



Vai, amor

Pra toda vida

Não olhes para trás

Na hora da partida

Não me mandes lembranças

Nem carta amorosa

Vivias num perfeito mar de rosas



Trecho de Vai Amor (Monarco / W. Rosa)



Pausa para respirar: com toda garra e afinação, Clara Nunes dá ao clássico da música brasileira Juízo Final, de Nelson Cavaquinho e Élcio Soares, a sua interpretação definitiva. É o juízo final, a história do bem e do mal...quero ter olhos pra ver a maldade desaparecer... Música para arrepiar! Se o lado A do vinil fecha em ritmo mais lento e triste com Valsa de Realejo, o lado B compensa abrindo com um samba de primeira de João Nogueira e Paulo César Pinheiro (seu marido a partir dessa época). Para de beber, compadre...Meu compadre deixa disso...Larga essa mulher de lado...Lembra do teu compromisso.

Candeia volta a ser cantado em O Último Bloco: E hoje volto cantando...me abraço ao violão...e marco o compasso junto do coração. Outra joia rara desse disco. Depois de outro samba em alto astral com Ninguém tem que achar ruim, de Ismael Silva, Clara Nunes diminui o ritmo para lembrar que Às Vezes Faz Bem Chorar, de Ivor Lancelotti, e antecipa o clima de despedida com Vai Amor (Monarco/W.Rosa). E para fechar no maior estilo e sem espaço para rancor, Clara emenda Que Seja Bem Feliz de Cartola: Que seja bem feliz / E leve-me na mente / Que cresçam suas glórias / E as minhas lágrimas contentes.

Nem sempre a qualidade combina com vendagem, mas até nisso esse disco surpreendeu, ultrapassando a marca de 600 mil cópias vendidas, numa clara demonstração de que tem muita gente de bom gosto. Foi o primeiro disco de uma cantora – mulher – que ultrapassou essa marca, logo depois disso veio Maria Bethânia com Álibi.

Com este disco, Clara Nunes se firma como uma das maiores e melhores cantoras de todos os tempos. Felizmente deixou obras como esse disco para que a voz dela continue ecoando nos nossos corações.



Claridade / Clara Nunes

Nota 10

Marcelo Teixeira

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