Mesmo
eu tendo criado a lista dos 10 Melhores Cantores dos Últimos 10 Anos e as 20
Melhores Cantoras dos Últimos 10 Anos para o Mais Cultura!, destacando
nomes da nova seara musical, como Lucas Santtana, Edu Krieguer, Leo Cavalcanti,
Luísa Maita, Barbara Eugenia e Márcia Tauil, o panorama musical brasileiro vem
se notabilizando nos últimos anos por uma característica insofismável: a falta
de renovação da MPB, a denominada Música Popular Brasileira - que caminha à
extinção. Os grande nomes são os mesmos da década de 60 do século passado,
todos na casa dos 70 anos de idade: Chico Buarque, Paulo Cesar Pinheiro,
Caetano Veloso, Gilberto Gil, Paulinho da Viola, Edu Lobo, Francis Hime e mais
alguns menos votados. Das grandes cantoras restaram apenas Maria Bethânia e Gal
Costa, tendo em vista que as duas maiores estrelas, Elis Regina e Clara Nunes partiram
precocemente. Quando se olha os compositores e cantores de MPB mais novos
percebe-se muito pouca coisa: com boa vontade Lenine, Chico César, Zeca
Baleiro, Mariana Aydar, Roberta Sá, Zélia Duncan, Vanessa da Mata e... só. É
muito, muito pouco.
A que se deve tal fenômeno?
Acredito que haja várias causas, mas irei me concentrar naquela que para mim é
uma das principais: a mudança do perfil da chamada cultura de massa brasileira e em especial sua veiculação nos órgãos
de longo alcance - basicamente televisão aberta e rádios FMs. Até a década de
90, mais ou menos, coexistiam diversas formas de música na televisão aberta e
nas rádios FMs - estas mais segmentadas. Desde a MPB típica até músicas
internacionais, passando por um lado mais popularesco. Até mesmo a música
clássica tinha seu espaço, ainda que nas manhãs de domingo. Haviam festivais de
música e posteriormente programas como o Chico e Caetano, na década de 80 na
Globo. Volta meia programas como o Som Brasil e Fausto Silva abrem espaço para
esta música.
Entretanto, estamos
assistindo a uma crescente homogeneização da chamada cultura de massa, de grande veiculação, baseada em música
popularesca, descartável e de consumo imediato. São os Luans Santanas, os
Telós, os Jorge e Mateus e os Alexandres Pires da vida que martelam nossos
ouvidos dia após dia na televisão e no rádio. Outras manifestações musicais
tornaram-se guetos, na prática - talvez com a exceção que confirma a regra do
samba, mas sobre isto falarei depois.
Historicamente a demanda por
este tipo de produto sempre coexistiu com outras manifestações, mas por que se
tornaram dominantes? A meu ver esta demanda foi criada pelo interesse da
indústria cultural como um todo em estabelecer uma espécie de linha de produção
musical: música descartável, de mais fácil elaboração, mais rápida produção e calcada
em elementos visuais e em marketing agressivo. Paralelamente, por fatores que
não discorrerei aqui este tipo de música tornou-se monopolista nos veículos de
massa, especialmente na televisão aberta.
O que temos? Música
descartável, muitas vezes diluições de gêneros originais, com letras paupérrimas
e ritmo acelerado - para contagiar o público. Então temos gêneros como o
pseudo-sertanejo, o sertanejo e o forró universitário, o pagode romântico (que
de samba e pagode não tem absolutamente nada) e este pop indefinível de Luans
Santanas e Telós como monopolizadores dos grandes espaços de divulgação.
Para a indústria é algo
confortável, porque é uma música de elaboração mais rápida e que tira do
artista a grife e o domínio da arte. Hoje a indústria fonográfica e a televisão
não precisam esperar a inspiração de um Chico Buarque ou de um Paulinho da
Viola, por exemplo: basta acelerar o ritmo, rimar amor com dor, dizer que vamos
pular no tcheretetê e que vai rolar a festa, com um rostinho bonito - que
muitas vezes sequer canta - e aguardar o tilintar das moedas na caixa
registradora.
Na prática é uma linha de
montagem sem perenidade: daqui a dez anos ninguém vai se lembrar de Luan
Santana, por exemplo - embora aos 20 anos ele já tenha um patrimônio de 50
milhões de reais, o que é espantoso. Este tipo de música descartável sempre
existiu, mas tendo o monopólio atual da grande mídia está caminhando para em
duas ou três décadas ser o único tipo de expressão musical brasileira. É um
modelo que interessa especialmente à indústria por tirar a propriedade
intelectual do artista e transferi-la para ela mesma.
E a demanda por este tipo de
música acabou sendo criada através do monopólio dos meios de comunicação. O
leitor pode pensar que a falta de cultura média do brasileiro também contribui,
mas lembro que a escolaridade aumentou nas últimas décadas, não diminuiu. Por
outro lado, como se pode gostar de algo que não se conhece, ainda mais quando o
acesso à TV a cabo ainda não alcança sequer a metade da população brasileira?
E o público médio aprendeu a
gostar deste tipo de música por não ter outra opção em grande escala, de modo
que hoje já há uma retroalimentação: o grande público pede e consome cada vez
mais este tipo de produto. Outras manifestações musicais, hoje, se restringem a
guetos a termos nacionais, restritos à televisão a cabo e a rádios bastante
segmentadas e até em espaços que deveriam ter o seu público segmentado esta
música descartável está penetrando.
O caso do samba de raiz é
uma exceção que confirma a regra: o gênero está se renovando e se reinventando
a partir dos mais velhos, bebendo na fonte deles e gerando um produto que é
moderno justamente por ser tradicional. Não alcança o grande público de massa a
não ser marginalmente, mas encontrou seu público e, na medida do possível, vai
bem, obrigado. Contudo precisou o gênero ser praticamente extinto na década de
90 para que houvesse esta renovação baseada, ironicamente, nesta volta às
origens. De certa forma o samba de enredo - que passou por um processo de
mediocrização semelhante nos últimos 15 anos - começa a trilhar timidamente o
mesmo caminho: renovar-se bebendo em sua origem.
A MPB, porém, caminha para
sua extinção ao menos da forma como a conhecemos. Como expliquei acima a música
popularesca, mais que dominante, está se tornando monopolista.
A indústria agradece. E
nossos ouvidos sofrem.
Marcelo
Teixeira
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