Olhos de Farol são os olhos de Ney |
Ney
Matogrosso é sensível e sua sensibilidade está associada aos seus discos que,
com sua sapiência e elegância, nos concede discos realmente deliciosos de serem
ouvidos e que entram sempre para a galeria dos grandes discos do alto escalão
da MPB. Olhos de Farol é um disco lindo, onde mais uma vez Ney
Matogrosso traz vários autores distintos para seu garimpado repertório. O disco
conta com muitos músicos da melhor estirpe, só pra citar alguns (fora os
citados abaixo): Marcos Suzano, Leandro Braga, Zé Nogueira, Marcio Montarroyos,
Arthur Maia, Serginho Trombone.
Miséria
no Japão já tinha aparecido no disco do Pedro Luís e a Parede, mas
vale o bis numa voz de verdade, mesmo eu considerando o Pedro Luís e A Parede muito
legal, mas faltava um cantor de verdade para expressar a verdadeira emoção que
a música quer transpassar. Com uma letra primorosa, refletindo sobre a percepção
sobre riqueza e pobreza, Miséria no Japão reflete sobre tudo aquilo que o
Brasil quer gritar, mas está sempre sufocado e Ney brilha com esta canção,
demonstrando toda a sua versatilidade, mais uma vez, como um dos mais
brilhantes artistas deste País.
Quem te disse que
miséria é só aqui?
Quem foi que disse que
a miséria não ri?
Quem tá pensando que
não se chora miséria no Japão?
Quem tá falando que não
existem tesouros na favela?
A vida é bela
Tá tudo estranho
É tudo caro
Mundo é tamanho
Trecho
de
Miséria
no Japão, de Pedro Luís e A
Parede
Na seqüência, uma do
Paulinho Moska, Gotas de tempo puro,
mais uma bela letra numa primorosa e redondinha sobre o amor. Vira latas de raça é uma boa surpresa
por seus autores (Rita Lee e Beto Lee), além de ser mais uma boa canção com um
pezinho na latinidade a la Santana pelo Ricardo Silveira (que também é
responsável por vários arranjos), com letra citando o tropicalismo.
Novamente (do
conterrâneo niteroiense Fred Martins e de Alexandre Lemos) é das mais bonitas
do disco, uma sonoridade delicada e etérea, com uma percussão suave. Chance de Aladim (Luli) é suave, lenta,
cheia de espaços. Uma das melhores letras do disco, vá ouvir e preste atenção! Poema tem uma origem curiosa, com a
letra de Cazuza (parece que feita para a sua avó por ocasião de seu
falecimento) musicada postumamente pelo Frejat (que também toca e programa
loops por aqui!). Linda música sobre pequenas mortes cotidianas, internas e
externas.
Chegamos a mais um dos
pontos altos, Olhos de farol (Ronaldo
Bastos e Flávio Henrique), sendo que esta poderia estar no disco anterior Cair
da tarde, com seus arranjos quase eruditos e voz baixa. Mais uma linda. Depois melhora (Luiz Tatit) é
tranquila e triste, poucos instrumentos, com delicadeza e o disco vai
caminhando assim: não tem músicas ruins, nem pontos baixos!
Mais
além
(Lenine, Bráulio Tavares, Lula Queiroga, Ivan Santos) é sensacional! Cordas
majestosas, dinâmica inteligente, letra viajante, piano belo, muitas coisas
boas numa canção ótima. O som do mundo
(Samuel Rosa e Chico Amaral) é popzinho agradável reggae, talvez umas das menos
boas. Fazê o quê (mais uma do Pedro
Luís) tem cara de sertanejo, viola e voz meio repente, mais uma boa surpresa.
E estamos chegando ao fim. Bomba H (Alzira Espíndola e Itamar
Assumpção) não deixa a qualidade diminuir e é neste exato momento que sentimos
uma falta danada de um grande homem, de um grande músico, de um grande e
inesquecível cantor: Itamar. A cara do
Brasil (Celso Viáfora, Vicente Barreto) determina pela letra que, entre
outras coisas que definem o Brasil, aborda o futebol. Meio circense e divertida,
apesar de séria.
A gente é torto igual
Garrincha e Aleijadinho
Ninguém precisa
consertar
Se não der certo a
gente se virar sozinho
Decerto então nunca vai
dar
(...)
Brasil Mauro Silva,
Dunga e Zinho
Que é o Brasil zero a
zero e campeão
Ou o Brasil que parou
pelo caminho:
Zico, Sócrates, Júnior
e Falcão
Trecho
de
A
Cara do Brasil, de Celso Viáfora
e Vicente Barreto
E aí, qual é o seu Brasil?
Olhos
de Farol / Ney Matogrosso
Nota
10
Marcelo
Teixeira
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