Ótimo disco em releituras e vozes |
A voz de Seu Jorge consente a ele
cantar o que ambicionar. Do estrondo do trovão ao sussurro, passando por
diversos matizes timbrísticos, tudo cabe na voz de Seu Jorge. Do mesmo modo,
mimeografando o passado e imprimindo futuros, os músicos da Nação Zumbi
aprofundam a pesquisa de uma brasilidade braseira. Aconteceu o projeto que
estava há anos engavetado e que saiu no finalzinho de 2009. Seu Jorge e Almaz. Sem mais. Sem
palavras. O melhor de Seu Jorge sem o poder das grandes canções comerciais e
indo mais fundo, mais profundo, mais adentro de músicas mais elaboradas, mais
sofisticadas, mais elitizadas, mas ainda assim sem perder o preceito de uma
música comercial. Para o projeto Seu
Jorge e Almaz (EMI / 2010 / 29,99), o cantor acoplou sua energia vocal à
tonelada rítmica de dois componentes do grupo Nação Zumbi - Pupillo e Lucio
Maia -, além do conhecimento em trilhas sonoras de Antonio Pinto. O resultado é
um disco forte: com sonoridades mestiças, volteios agradáveis e surpresas. Boas.
Reciclando
canções diversas - de Tim Maia a Rodney Temperton, passando por Jorge Ben e
Dorival Caymmi -, o quarteto compôs um conjunto sonoro autoral: um som livre de
fixações universais e misturados. A poética Juízo
final, de Nelson Cavaquinho e Élcio Soares, sem perder o cavaquinho, ganhou
uma moldura melódica atômica, biônica e eletron-sansônica irradiando a mensagem
do amor que será eterno novamente.
Aqui,
longe da destruição apocalíptica, o juízo final traz a esperança do sol que
brilhará. A produção do grupo Almaz investe em uma tempestade de sons
eletronicamente modificados para adensar o canto do desejo do sujeito à espera
de mudança.
A
performance vocal preguiçosa de Seu Jorge parece contrastar com o desejo do
sujeito exposto. Porém, tal dicção pode ser lida como a tematização dos
angonismos presentes na letra. Aliás, em Seu Jorge e Almaz o cantor investiu a mais
não poder na sua dicção malandra, desleixada e, por isso, única. Em ritmo
crônico, o sujeito da canção caminha rumor a além do horizonte, onde tropa de
todos os baques existentes comporão com sons psicodélicos a luz do dia
seguinte.
Recriar
Baden Powell e Vinicius de Moraes com sofisticação, reconstruir Martinho da
Vila com solidez, descaracterizar Dorival Caymmi com elegância e refazer Jorge
Ben com sagaz complacência só poderia ser feito com a tenra desenvoltura de um
cantor à altura de Seu Jorge, com sua voz de trovão e seu canto endiabrado.
Salve,
Seu Jorge!
Seu
Jorge e Almaz
Nota
10
Marcelo
Teixeira
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