Dorival
Caymmi costumava dizer que seu sonho era que suas músicas caíssem na boca do
povo de tal forma que, no futuro, ninguém mais soubesse quem as havia composto
ou de onde surgiram, como uma Ciranda
cirandinha. Não é um status fácil de ser alcançado. O impressionante é que
Caymmi viveu para ver algumas de suas músicas chegarem a esse ponto, embora
elas só venham a cair oficialmente em domínio público em 2078. Milhares de
pessoas acham que canções como O que é
que a baiana tem?, João Valentão, Maracangalha, Peguei um Ita no Norte, Samba
da minha terra (Quem não gosta de
samba / Bom sujeito não é / É ruim da cabeça / Ou doente do pé) e Retirantes (aquele lerê-lerê que foi tema da novela Escrava Isaura) sempre
estiveram por aí, sem autor conhecido. Algum dia, o mesmo deverá acontecer a Doralice, A lenda do Abaeté, É doce morrer
no mar, Modinha de Gabriela, Rosa morena, Saudade da Bahia, Saudade de Itapoã,
Só louco, Você já foi à Bahia? e outras maravilhas que ele nos deixou.
Foram apenas 113 músicas, pouco para uma carreira tão longa, mas é uma obra que
ajudou a construir a cultura e a identidade de um povo. A identidade do povo
baiano.
Pouco antes de morrer, os
três filhos ilustres do grande baiano resolveram homenagear o pai com um dos
discos mais sublimes feito por um trio familiar. Coisa rara e inédita em dar
certo, Nana, Dori e Danilo fizeram das tripas coração e conseguiram fazer um
disco com inúmeros sucessos do pai cantados pelo mesmo e por artistas
consagrados na música popular brasileira. O disco tem um brilho peculiar com
afinidade única entre os três irmãos e a cada faixa parece que nos mostra o que
a Bahia de fato tem, a riqueza de um Estado, a demonstração de afeto, o sol,
calor, mulheres decididas e homens fortes e valentes.
Se um dia Dorival pensou em
ser tão popular a ponto de não reconhecer suas próprias canções ou as fazendo
cair num gosto popular diferenciado, talvez ele tenha quase acertado em algumas
boas músicas, mas confesso que ainda será difícil de aceitarmos a questão. A Bahia
de Dorival Caymmi é única. Assim como Dorival Caymmi é único.
Para
Caymmi / Nanã, Dori e Danilo
Nota
10
Marcelo
Teixeira
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