terça-feira, 13 de novembro de 2012

Na Ponta da Língua, de Leila Pinheiro (1998): ótimo paladar


Ótimo disco de Leila Pinheiro
Em 1998, Leila Pinheiro nos presenteou com um disco a sua altura, com canções que marcaram um tempo e com novidades extraordinárias que perpetuam até hoje em meus ouvidos. O disco em questão é Na Ponta da Língua e trás uma capa tão singela e ulterior e sagaz e impiedosa e original e maliciosa, que este álbum talvez seja o melhor de toda a sua carreira. Com aberturas e fechaduras de vinhetas que somente Walter Franco consegue compor, o disco é todo marcado por facetas múltiplas de uma Leila Pinheiro que conseguiu se desvencilhar de ser rotulada, até então, de bossanovista e enveredar pelo campo da música popular. Regravando grandes sucessos de Roberto e Erasmo Carlos (Sentado à Beira do Caminho) e Legião Urbana (Vento no Litoral), o disco é pautado pela sensibilidade de uma grande artista, que é reverenciada por grandes nomes da MPB, como Ivan Lins e Chico Buarque e que foi a queridinha de Tom Jobim em seus últimos anos de vida.

Abril, composição mais que charmosa de Adriana Calcanhotto, é a melhor música do álbum e transmite uma emoção plena de escolhas sem arrependimentos e recomeços de um novo ciclo. Assim como o samba encorpado de Sérgio Santos e Alvin L., Pra Dizer a Verdade, que tem uma letra deliciosamente linda, Na Ponta da Língua tem de tudo um pouco: além de sambas, tem a esmagadora Mais Uma Boca, composta com requinte pela fabulosa Fátima Guedes, que consegue exprimir, através da interpretação forte de Leila, uma letra inquietante e bela ao mesmo tempo. Destaque ímpar para a excelente música Por Favor, de Ivan Lins e Aldir Blanc, em que a língua bebe a estranheza (frase que mais gosto de todo o disco) e que ao mesmo tempo nos leva ao gosto de maçã, flor da nova Eva, com seus antecipamentos e suas incertezas.

 

Sinto o abraço do tempo apertar

E redesenhar minhas escolhas

Logo eu, que queria mudar tudo

Me vejo cumprindo ciclos

Gostar mais de hoje e gostar disso

 

Trecho da música Abril, de Adriana Calcanhotto

 

 

Seguindo sua influência regional de seu estado natal, Pará, Leila canta brilhantemente o forró quase universitário Influência de Jackson, composta pelos mestres Guinga e Aldir Blanc e Leila canta numa desenvoltura que somente ela consegue fazer e emocionar. Vale lembrar que a música é difícil de interpretar, mas Leila dá um banho de sensualidade e musicalidade. Indo para o lado sentimental do disco, Sorriso de Luz trás a leveza e a pureza do amor, com seus primeiros olhares e suas primeiras imaginações, fazendo da canção de Gilson Peranzzetta e Nelson Wellington um dos achados para a transmutação de Leila.

Setembro, de Alvin L., é uma canção amargurada e doce sobre os desencontros e armadilhas do amor que um dia fora belo e romântico. Leila é capaz de se desfazer de desmantelos ruborizados pela crítica e recria com magnitude a impactante Amor, Perigoso Amor, de Frejat e Dulce Quental, já imortalizada na grande voz firme e forte de Ângela Ro Ro. É nesta canção que Leila se despe e se mostra valente e única para poder recriar ao seu gosto as canções que fizeram parte musicalmente de outra voz.

Na Ponta da Língua demonstra o quanto a musicalidade de Leila Pinheiro é importante para cenário musical brasileiro e ter a certeza de que sua voz é única e saber não ser rotulada, é a forma mais pura e inocente de dizer que ela é uma cantora genuinamente brasileira. Na Ponta da Língua é simplesmente ótimo. Recomendo.

 

Na Ponta da Língua / Leila Pinheiro

Nota 10

Marcelo Teixeira

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