sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Por que sou crítico? Uma reflexão sobre a minha arte de criticar


A minha arte de criticar música
A minha função como crítico de música é o de criticar, patrocinar a divulgação de um cantor e estar atento às novidades que os mesmos produzem, seja ele ruim ou excelente, canhestro ou bom, atemporal ou desanimador, estimulador ou inquieto, arrogante ou cristalino. Enquanto houver cantoras e sejam elas boas, medianas, ruins ou excelentes, meu papel aqui é o de criticar. Critico porque há a necessidade plural de uma sinceridade justa dentro de um contexto ideológico e que muitos precisam saber. Há a benevolência de uma magnitude singular que persiste estar antenado com o que há de novo e o que há de antigo, mesmo lembrando que o antigo muitas vezes é melhor aguçado que o novo e que o novo é sempre possível de mudanças ou reparações. Pensando por outro lado, temos que pensar no futuro da música, no futuro das cantoras e dos cantores, no futuro de um estilo que fale a nossa língua, a nossa ética, a nossa relevância, o nosso amanhã. Qual será o destino do CD físico? Ele vai sobreviver por muito tempo? Podemos dizer com toda a certeza que o estilo A não comporta com o estilo D, que, por sua vez, está interligado com o estilo de vida da classe B, mas que possui características físicas da classe dominante Z, que, por outro lado, tem formas e estilos formais da classe oriunda que perpetua o universo C? Óbvio que não! Mas podemos ter uma ideia ou percepção daquilo que está por vir, tendo em vista o cenário da música brasileira atual. Chico Buarque, grande compositor de excelentes clássicos nacionais, disse recentemente que o cenário da música atual reflete o Brasil atual. Ele está coberto de razão: os grandes barões da música financiam o grande capitalismo cultural, fazendo com que a massa não venha intervir em seus negócios. Quando será que nascerá de novo um Pixinguinha, um Paulinho da Viola, uma Elis, uma Clara, uma Gal ou até mesmo Caetanos, Miltons e Djavans? A música atual pede socorro e não mais passagem, porque ela adentra em nossa casa sem ao menos pedir licença. Apenas invade. Invade nosso espaço, invade nosso cérebro, invade nossa paz. E muitos críticos de música acabam caindo ou se rendendo ao sistema burocrático da verba ilícita para ajudar a patrocinar esses estilos difundidos pelos quatro cantos do país. Ser crítico é ser persistente na melhoria de algo e, no meu caso, insisto na melhoria da música brasileira por um todo. Precisa-se ter ética, postura. Precisamos descobrir mais cantoras, sem esquecer as do século passado e incluindo as atuais. Precisamos de mais cantores de qualidade exorbitante, pensando na junção destes atuais com os antigos e com os que virão. Ser crítico é saber respeitar o outro, saber distinguir que o que ele lançou hoje pode ser bom, mas que amanhã pode ser melhorado. Ser crítico é estarmos com o coração nas mãos a procura de uma nova voz para que possamos compartilhar. Ser crítico é ter olhar e sentimentos verdadeiros. E ser verdadeiro é ser crítico. Por que escrevo isso para vocês? Porque recebi uns e-mails recentemente de leitores e amigos que falam que escrevo com sinceridade e certeza. E para vocês eu respondo: não preciso agradar a ninguém para ser crítico. Portanto, o cantor precisa ter o termômetro de uma pessoa crítica, progressista e que lhe faça dizer: não estou aqui para passar-lhe a mão na cabeça, mas sim para ajudar na qualidade musical do Brasil. E é por isso que insisto em criticar a música.

 

Por que sou crítico?
Uma reflexão sobre a minha arte de criticar.
Por Marcelo Teixeira

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Virginia Rosa Canta Clara Nunes em bela homenagem


Virginia homenageia Clara Nunes
Não é qualquer cantora que pode se debruçar na obra intocável de Clara Nunes, uma das maiores e melhores cantoras da música popular brasileira de todos os tempos, porque Clara foi uma das percussoras do samba e uma das pioneiras que conseguiu ultrapassar os limites entre fronteiras com países bombardeados por guerra e preconceito. Várias foram as cantoras que tentaram fazer uma homenagem qualquer à Clara e várias delas morreram à mingua ou conseguiram um resultado satisfatório dentro de um parâmetro em que combinavam harmonia, singularidade e o melhor: musicalidade! É praticamente impossível invadir a obra imortalizada de Clara Nunes e são poucas as cantoras que conseguem fazer isso com maestria, dedicação e sofisticação. Essa cantora é Virgínia Rosa! Lançando o sexto CD de carreira, a cantora fez uma ampla pesquisa para poder ter um resultado (ultra) satisfatório para homenagear a grande dama do samba. Foram anos cantando Clara em shows para chegar a Virginia Rosa Canta Clara (2015 / Sesc SP / 24,99), em que a cantora paulistana faz um brilhante retrospecto sobre a música da mineira Clara. O resultado é envolvente e emocionante, ainda mais porque Virginia tem uma voz potente e que nos acaricia, nos embala e nos perpetua a sair sambando em qualquer lugar. Com uma capa sensacional, demostrando tanto a religião de Clara quanto as cores de sua escola de samba preferida, a Portela, Virginia Rosa nos saúda e nos brinda com o melhor da carreira de Clara, estando apta para ser ovacionada por quem não conhece seu trabalho e sendo a responsável por trazer a juventude atual os clássicos dessa grande artista. Em suma, são duas cantoras se completando sobre o trabalho da outra: Virginia, com seu brilhantismo e sua força musical, consegue sentir a presença onipresente de luz de Clara, nos dando a dimensão completa de uma emoção vocacionada pelo sentimento de vida, de música, de arte. Quem ouvir Virginia Rosa Canta Clara terá a certeza de que a música popular está a salva dos impropérios ouvidos hoje em dia e da enorme falta que ela nos faz. Não foi preciso um CD duplo para homenagear a grande Clara, muito menos reproduzir trechos emocionados de familiares, mas sim, cantar e encantar aquilo que ela fez em vida. Virginia conseguiu arrebatar não só os fãs de Clara, como soube valorizar cada respiração, cada momento emocionado, cada melodia, cada verso. Escolheu os melhores momentos de Clara em vida e pincelou as melhores canções. Era preciso um disco com essa magnitude nos dias de hoje, para que possamos ter a nítida certeza de que Clara ainda permanece viva e entre nós. Uma salva de palmas à Virginia Rosa que nos trouxe emoção, princípios e musicalidade com um disco a altura de seu talento.

 

Virginia Rosa Canta Clara (2015) / Virginia Rosa
Nota 10
Marcelo Teixeira

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

O mediano álbum Partir (2015), de Fabiana Cozza


Fabiana e seu disco novo: fraco
Fabiana Cozza é uma das cantoras mais respeitadas de todos os tempos dentro da música popular brasileira e nas rodas de samba de prestigio e categoria e seu nome hoje está associado às grandes damas da música nacional, estando ao lado de bambas como Clara Nunes, Alcione e Dona Ivone Lara. A cada disco lançado, Cozza tem uma inspiração nova, um motivo que a leve a cantar mais e melhor e com seu novo lançamento não fora diferente. A inspiração desta vez é a Bahia de todos os santos, solo por onde aportaram os primeiros navios negreiros no Brasil. Partir (2015 / Trattore / 29,00) não é o melhor disco de carreira de Fabiana, mas é o CD que mais se aproxima de sua religião, de sua encantadora fé e de sua respeitada vida. São ao todo 14 faixas embaladas por canções de todos os tipos de reza e oferenda e a voz de Cozza impera quase que triunfal por toda a atmosfera que o álbum exige. O álbum faz com que Fabiana transporte o ouvinte da África à Bahia num piscar de olhos, com suas danças, rodas e cantigas que ressalta a levada do Recôncavo Baiano até a nota mais importante de todo o lirismo saudosista que perpetua o disco. Mesmo com o aval de Maria Bethânia saudando o álbum como sendo um disco da maior competência de todos os tempos, tendo uma cantora com a voz lisa e clara, reconheço que há falhas redundantes neste, que poderia ser o melhor disco, de fato, da carreira de Fabiana Cozza (o melhor ainda é Quando o Céu Clarear, lançado em 2009). Buscando na evocação da ancestralidade africana o seu porto seguro (Clara Nunes sempre fizera isso em discos memoráveis), Cozza tentou rebuscar nas canções a sofisticação em um repertório simples para uma causa nobre: errou ao tentar fazer um disco surpreendente e fazendo deste momento um rechaçado canto superior de seu talento. Sem falar na capa, com um misto de tristeza fúnebre com um olhar perdido, olhando o nada, o vazio, o irreconhecível. Partir tem sons sutis, suaves, joviais e talvez esse seja o diferencial na carreira de Fabiana, que já vinha em outros discos explorando mais seu lado teatral com dosagem de uma grande voz. Mesmo não havendo lugares-comuns em algumas canções, Partir merece um pouco de atenção nas faixas Chicala (João Cavalcanti) e Entre o Mangue e o Mar (Alzira E. / Arruda), mas ressalvo: Partir não é o melhor disco de Fabiana Cozza, muito menos entrará na categoria de melhores discos do ano de 2015.


Partir (2015), o novo disco de Fabiana Cozza
Nota 7
Marcelo Teixeira