Justa homenagem a Clara Nunes |
Se viva estivesse, Clara Nunes já
estaria com 70 anos, cabelos menos volumosos, talvez mais escuros, pele mais
enrugada e nos brindando com seu sorriso encantador. Clara Nunes partiu cedo e
deixou um rastro de saudade que não foi preenchido até hoje, mais de trinta
anos de sua morte. A lacuna que a cantora deixou jamais será completada e suas
músicas jamais terão o mesmo brilho de sua primeira interprete. Clara Nunes não
morreu: partiu desta para uma melhor e está viva, eternamente viva, nos nossos
corações, mentes e poros. Muitas cantoras se espelharam na beleza no canto da
grande Guerreira, assim como muitos cantores também o fizeram, mas negam este
destino. Já se foi o tempo em que Roberto Ribeiro, Gonzaguinha, Martinho da
Vila ou João Nogueira falavam abertamente que eram apaixonados pela amiga Clara
Nunes e que fizeram um samba especialmente à ela. Hoje os cantores mais
moderninhos que cantam samba, insistem em dizer ou citar nomes como Dona Yvone
Lara, Beth Carvalho, Alcione, mas esquecem da grande dama do samba, a rainha do
império, a mestiça cabocla que evoluiu o segmento e que culminou
definitivamente o nosso samba aos países aonde jamais imaginiriam que um dia
chegaria. Exceto o cantor e compositor Diogo Nogueira, que acaba de lançar um
disco inteiramente dedicado às mulheres e que na contracapa fez uma homenagem
as mulheres que lhe tornaram um homem completo. Lá tem o nome da Clara, vindo
acompanhado das citadas acima e de Clementina de Jesus. Algumas boas cantoras –
e outras nem tanto assim – também fizeram neste ano de 2013 homenagens póstumas
a cantora, umas com maestria, outras por pura pretensão. Casos como o da
cantora Mariene de Castro, que lançou um disco maravilhosamente competente e
contemporâneo e que fez desta homenagem uma forma de agradecer ao seu próprio
público por esta abertura, tendo em vista que Mariene é uma discípula de Clara.
Carla Visi, a cantora baiana que vem do axé fresco e atemporal, resolveu entrar
na onda da maré cheia de Clara Nunes para lançar um disco horrendo e feito às
pressas, bem característico desta cantora. Com uma capa horripilante e
insensível, Carla Visi acabou por completo com as músicas que Clara eternizou,
convidando cantores (?) que nada tinham a ver com a obra da homenageada,
fazendo disso um dos piores lançamentos do ano. Mas ainda a competência e
sensiblidade de uma grande cantora como Fabiana Cozza, vem nos enriquecer com
sua potente voz lantente, que adentra em nossos tímpanos sensíveis e oriundos e
nos brinda com uma capa deslumbrante, com um festival de músicas maravilhosas e
com categoria digna de uma grande estrela da música brasileira. Fabiana Cozza
consegue, já na primeira faixa, nos emocionar, nos dirigindo ao cancioneira da
cantora mineira, a ponto de nos apaixonar, de nos arrepiar, de nos enaltecer.
Fabiana Cozza surge como quem nada quer, nos trazendo um disco magnifico,
sentimental e alegre, festivo, bem ao estilo Clara Nunes de ser. Este momento é
mágico, porque Fabiana Cozza também é uma adepta do estilo de viver que Clara
adotou, fazendo de sua voz e de seu estar, um motivo maior para brindar os fãs
e sua própria carreira. Canto Sagrado (2013 / 29,99)
é um disco que vem acompado de um DVD e as melhores músicas de Clara estão
aqui. Peço atenção para a versão de Fabiana para Portela na Avenida, que ficou
sublime, encantadora, arrebatadora. Um fiel trabalho de uma grande artista
representando uma diva da música popular brasileira para fechar o ano com chave
de ouro. Fabiana soube, milimetricamente, utilizar seus artificios para nos
brindar com um disco a altura de seu talento. Voz primorosa, harmonia ginasial,
músicas de embelezamento mútuo faz deste disco um presente de luz, um presente
divino, um presente saboroso. Que este belo trabalho não seja menosprezado e
que muitos possam ouvir, apreciar, comentar, admirar, respirar o ambiente
deixado por Clara, sendo agora transpassado por Fabiana Cozza. Um digno e fiel
respaldo de Canto Sagrado faz deste trabalho a maior dentre as honrarias feitas
para Clara, sem diminuir aqui o trabalho (fiel, sedutor, carimbado, festivo) de
Mariene de Castro. Clara Nunes, no meio deste mundaréu de céu e brancas nuvens,
está sentindo o povo aqui embaixo celebrando seus 70 anos de vida e ela nos
agradece sorrindo, respirando o nosso ar. Viva ela está. No nosso coração e no coração
de quem a homenageia diariamente. Viva Fabiana Cozza! Viva o Canto Sagrado de Clara Nunes!
Canto Sagrado /
Fabiana Cozza
Nota 10
Marcelo Teixeira
2 comentários:
Assino em baixo. Na minha opinião Fabiana já faz parte da história da música brasileira. Uma das melhores de todos os tempos.
Já ouvi dezenas de cantoras de samba contemporaneas. Posso afirmar com certeza que Fabiana Cozza é a melhor cantora de Samba da Atualidade. Melhor que algumas cantoras da geração anterior e das que ouvi a que chega mais perto da Guerreira a quem ela lindamente Homenageira, Clara Nunes!
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