sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Entrevista com Emília Monteiro


Emília: cantora do Amapá foi revelação de 2013
Entre um contratempo e outro, uma viagem à Macapá e shows ao lado de Dona Onete, Emília Monteiro reservou um tempinho para dar uma entrevista para fechar o Mais Cultura! com chave de ouro. A cantora amapaense, que foi considerada pelo blog como sendo a maior (e melhor) revelação do ano de 2013, é digna de uma elegância sofisticada, de uma cultura sem igual, de um carisma arrebatador, de uma meiguice profunda e de uma delicadeza incomum, que faz deste critico musical ficar ainda mais apaixonado por sua música. Dona de uma voz poderosa e detentora dos cantos amazônicos, Emília Monteiro nos revela sua musicalidade, desvendando segredos, revelações, novidades e mais suingues para o próximo ano e revela que ‘Cheia de Graça vale como benção de Nossa Senhora quanto à analogia com o bom humor e a irreverência’ e diz que ‘as maiores vozes do Brasil são Elis Regina e Clara Nunes’.


Marcelo Teixeira: Por que seu disco recebeu o saboroso título Cheia de Graça?

Emília Monteiro: Marcelo, esta é uma pergunta interessante, porque foi simplesmente o acaso... Ângela Brandão, uma excelente compositora mineira, radicada em Brasília, me mostrou a letra que levava o nome Cheia de Graça e eu além de amar a poesia e todo o significado daquela letra, identifiquei que Cheia de Graça tanto vale como bênção de Nossa Senhora, quanto também à analogia com o bom humor e a irreverência e nos dois casos achei pertinente colocar o nome no CD, assim ele já estaria abençoado e bem humorado ao mesmo tempo...

M.T: Hoje você é uma cantora reconhecida em todo o território nortista e aos poucos está desbravando o Brasil inteiro. Se sente realizada com este sucesso já no disco de estreia?
E.M: Me sinto feliz, percebendo que, por ter feito um disco que não se enquadra numa MPB dita tradicional, consegui ter os bons olhos de blogs especializados em música, assim como de críticos de música e principalmente do público... É claro que era algo que eu gostaria mesmo que acontecesse, mas me surpreendi por estar sendo dessa maneira... Ainda não me considero realizada porque o trabalho acabou de começar, mas estou muito satisfeita, principalmente por ser o primeiro Cd.
 
M.T: Dona Onete é uma figura tarimbada no Norte do País, uma cantora e compositora valorizada no Amapá  e de onde você extraiu algumas de suas canções para gravar Cheia de Graça, inclusive com participação dela. Conte-nos um pouco sobre a amizade de vocês.
E.M: Dona Onete é uma pessoa iluminada, uma força da natureza, uma entidade... A conheci pelo youtube e logo me apaixonei e entrei em contato com ela para gravar uma música, dizendo que estava apaixonada pelo Moreno Morenado dela e que queria gravar eu disse: ‘Dona Onete, eu quero este moreno pra mim!’ Ela riu e falou que esse moreno já tinha dona, que era ela, mas que faria um pra mim... E fez !!! Eu Quero Este Moreno Pra Mim foi uma música feita pra mim por ela... Ela nem me conhecia pessoalmente quando a fez, então a nossa empatia foi instantânea, desde o primeiro momento, quando nos conhecemos pessoalmente, na oportunidade da gravação da participação dela, era como se já a conhecesse de longa data, ela hoje é parte da família, todos nós a amamos. Quando fiz o lançamento do Cd no Clube do Choro dia 30 de julho ela estava lá comigo, me abençoando... É difícil descrever, eu sou super fã dela como artista e como ser humano, um verdadeiro presente da vida !

M.T: Quais foram suas influências musicais?
E.M: Foram várias, minha casa sempre foi uma casa musical, meu pai era cantor em Macapá e deixou de lado o sonho para fazer carreira no Banco do Brasil, ele sempre ouviu de tudo e fez questão de nos passar todas as suas influências musicais, então eu já nasci escutando música, jazz, MPB, Bossa, Jovem Guarda, Tropicalismo, Chorinho, mas principalmente as vozes femininas de cantoras que tocaram a minha alma como Elis Regina, Clara Nunes, Alcione, Zizi Possi, Elza Soares, Ângela Maria, Rita Lee, Fafá de Belém... todas fazem parte da minha formação musical. Nossos fins de semana sempre foram regados de boa comida e muita música, minha mãe sempre disse que casa sem música é uma casa triste, eu concordo com ela ! rsrsrs

M.T: Gostaria de dividir uma música com qual cantor ou cantora em um disco futuro?
E.M: Nossa, que difícil essa pergunta, mas adoraria cantar com todas essas que mencionei acima, algumas infelizmente já se foram, ter cantado com a Dona Onete já é uma realização de sonho, mas minha primeira ‘ídola’ foi a Rita Lee, porque aos 8 anos eu não escutava Balão Mágico, escutava Rita Lee, cantava sentindo Shangrilá como se fosse uma pessoa muito vivida...rsrsrs Quem sabe, né ? rsrsrs

M.T: Seu disco de estreia teve muitos sons do Norte, como carimbó, marabaixo e lundu. Aqui em São Paulo praticamente não se ouve esses sons, que é de uma riqueza profunda. Pensa em algum dia vir a fazer um show pelo Sudeste?
E.M: Claro!! Estamos com planos e projetos de em breve, provavelmente no próximo ano, levar esse som pra Rio, Sampa e Belo Horizonte, são os meus próximos planos, já que o lançamento do Cheia de Graça também já aconteceu em Macapá e já está agendada para o primeiro trimestre em Belém.

M.T: Você sonhava em ser cantora ou tinha outra profissão em mente?
E.M: Eu amava cantar, sozinha, pra amigos ou pra uma platéia grande... Mas não tinha maiores pretensões com a música, não havia pensado seriamente na música como fonte de sobrevivência, era um hobby que me realizava, mas eu acho que a arte não é opção na vida da gente, é missão mesmo. A minha consciência a respeito disso agora é diferente, o Cheia de Graça foi um divisor de águas na minha vida, não me vejo mais sem cantar, então, virou um sonho real.

M.T: Como foi o processo de criação do disco?
E.M: Foi uma delícia!! A idéia começou em 1998 quando gravei a canção Mal de Amor, que é um marabaixo lá em Macapá. A partir daí passei a incluí-la no meu repertório aqui em Brasília, com uma grande curiosidade e aceitação do público... Aí eu já sabia que se algum dia gravasse um CD, ele teria como missão trazer à tona ritmos amazônicos justamente porque as pessoas desconheciam e ainda desconhecem essa riqueza brasileira, fruto da nossa linda miscigenação de 3 raças, a branca, indígena e negra que nesse caso se traduz musicalmente, mas que vai muito além da cultura, passa pela religião, gastronomia, comportamento e sabedoria. Como filha amapaense, não posso deixar de me orgulhar disso tudo e de fazer a minha parte divulgando os compositores e esses ritmos maravilhosos.

M.T: De Ellen Oléria a Zeca Baleiro, passando por Dona Onete, Márcia Tauil, Simone Guimarães e Suely Mesquita, sem falar do experiente Celso Viáfora, completam um time de competentes compositores. Você deixou algum compositor  de fora deste disco?

E.M: Mas é claro!!! Vários!!! Compositores do Amapá, Pará, Brasília, Rondônia, Acre, Sampa e Rio estão na minha mira para o próximo trabalho. Me sinto muito privilegiada de ter podido contar com estes maravilhosos compositores no meu disco de estréia.

M.T: Emília, você foi eleita pelo Mais Cultura! como  cantora revelação este ano. Como se sente sabendo deste título?
E.M: Uau!!! Me sinto feliz e muito grata por estar recebendo esse título, mais feliz ainda porque esse título traz à reboque a certeza de que estou no caminho certo intuitivamente...

M.T: O ex-Titã Charles Gavin e  Zé Vaz, do blog Som do Norte, elogiaram assiduamente seu disco. Logo em seguida veio o blog Eu Ouvo com uma crítica apaixonante. O Mais Cultura! saiu na frente e, em abril deste ano (2012), fez um longo artigo sobre seu lançamento (o mais aguardado de todo o Norte / Nordeste), antes mesmo de estar no mercado fonográfico. Essas críticas em relação ao seu disco aumenta a responsabilidade para o próximo trabalho?
E.M: Com certeza! Tive também a alegria de ter o meu Cd resenhado poeticamente por Aquiles Reis (do MPB4), por Mauro Ferreira (do Blog Notas Musicais), o próprio Zeca Baleiro fez um comentário lindo sobre ele. Sei que a expectativa para um próximo trabalho é natural. O que eu posso dizer é que nesse primeiro trabalho, eu só gravei músicas que traduzem a minha verdade, tenho certeza de que é por isso que as pessoas que gostam é porque conseguiram identificar isso. Não será diferente num próximo trabalho, assim como diz Milton Nascimento em Certas Canções : Certas canções que ouço cabem tão dentro de mim, que perguntar carece: Como não fui eu que fiz?! Certa emoção me alcança Corta-me a alma sem dor Certas canções me chegam, Como se fosse o amor.

M.T: Sei que ainda é cedo, mas já está pensando em um novo disco?
E.M: Já estou sim, essa pesquisa de repertório nunca pára pra uma intérprete...

M.T: Na sua opinião, qual o critério para se fazer música no Brasil?
E.M: Eu não sei se eu diria critério, mas a característica principal de quem faz música no Brasil com certeza é a perseverança e a fé, porque ainda vivemos num país que não prioriza a cultura, infelizmente. O artista independente, que não conta com a mídia a seu favor é um herói por definição.

M.T: Qual a maior voz do Brasil na sua opinião?
E.M: Eu não conseguiria dizer uma única voz, mas Elis Regina e Clara Nunes são algumas das vozes que me fizeram querer cantar pra libertar a alma desde pequena.

M.T: Emília, se você se auto definir com uma música de seu disco, qual seria esta música e por que?
E.M: Esse é um disco essencialmente feminino, das 12 canções, 7 foram compostas por mulheres, então todas as músicas me traduzem com certeza, se é pra escolher uma, então eu escolho Cheia de Graça, porque foi por um momento pessoal de superação e mudança de paradigmas que eu decidi fazer o CD, e a canção fala do recomeço: ‘Limpei o pó das cortinas, pus alecrim na janela, vento que passar por ela vai mudar o horizonte... Varri o chão e a soleira, lavei com água de cheiro, passo que eu der aqui dentro vai ser de novo o primeiro... Se me fez chorar não tem de quê, é água que eu uso pra me benzer que eu sou Maria Cheia de Graça’!

Emília, gostaria de agradecer profundamente à você pela simpatia e pelo espaço dado ao Mais Cultura!, concebendo esta entrevista, fechando  com chave de ouro o ciclo de artigos para este ano de 2013.


Até 2014!!!


Entrevista com Emília Monteiro
Por Marcelo Teixeira

Um comentário:

Márcia disse...

A Emília Monteiro é uma força da natureza!! Parabéns demais pela beleza de sua arte!