Ótimo disco, ótima cantora |
O nome do
disco e a homenagem a Clementina de Jesus logo na faixa de abertura dão as
primeiras pistas da brasilidade de iaiá, CD da cantora paulista Mônica Salmaso. Nele, o timbre
docemente grave e cheio de personalidade da intérprete assinala musicalmente
uma identidade brasileira sem deixar de ser universal. Essa busca se confirma
no interesse de Mônica pelas pessoas de seu país, cantando a religiosidade e o
humor, a poesia e a sobrevivência e isso acontece desde o CD Trampolim, que a persegue no seu
jeito de falar do Brasil. Mônica Salmaso volta a ter como grande companhia de
seu trabalho a liberdade musica em iaiá. E a canção em si
já dimensiona o aspecto universal do CD, que marca a sua estréia na gravadora
Biscoito Fino em grande estilo. As reflexões tornam ainda mais compreensíveis o
encontro entre o simples e o complexo no conteúdo de iaiá, que dialoga com variadas vertentes da MPB, do samba de
gafieira Cidade lagoa (Sebastião
Fonseca/Cícero Nunes) às experimentações de Tom Zé em Menina amanhã de manhã (parceria com Perna). O resultado desta
última, no olhar do crítico entusiasmado que vos escreve da intérprete, ficou
cheio de alegrias, de saudades e de Brasis.
Do embalo puxado para o maxixe de
Doce na feira (Jair do
Cavaquinho/Altair Costa) ao samba choro Cabrochinha
(Paulo César Pinheiro/Maurício Carrilho), iaiá (2004 / Biscoito
Fino / 26,99) tem consistência, sofisticação e espontaneidade. Boa parte da
sonoridade do CD é fruto dos quatro anos em que Mônica Salmaso ficou sem
gravar, caindo na estrada e fazendo shows com músicos de linguagens e universos
bem diferentes. As faixas têm estrutura melódica e harmônica simples - como Estrela
de Oxum (Rodolfo Stroeter e Joyce) e Moro na Roça (Xangô da
Mangueira e Zagaia, tema folclórico popularizado por Clementina de Jesus) -
e, ao mesmo tempo, experimenta canções mais complexas em sua estrutura. Dentre
elas, a delicada Assum Branco (José Miguel Wisnik) e uma pérola de Chico
Buarque chamada Sinhazinha (da trilha sonora do filme Para Viver um
Grande Amor).
A riqueza
do versátil time de compositores também chama atenção em iaiá, conciliando obras
de diversos estilos e épocas, sem que o resultado se perca numa colcha de
retalhos. Esse, aliás, foi o maior desafio para Mônica Salmaso e Rodolfo
Stroeter, produtor e co-diretor musical do disco. Um clima de final de tarde,
de depois da chuva, ambienta sua interpretação para a faixa Onde Ir,
composta por Vanessa da Mata. E após ter selado a paixão pela obra de Dorival
Caymmi nos discos Trampolim
(1998) e Voadeira (1999), Mônica canta,
desta vez, É Doce Morrer no Mar, clássico do compositor baiano. Reafirma
também a sua admiração por Tom Jobim e Vinicius de Moraes (Por Toda a Minha
Vida). A saudação a Sílvio Caldas fecha o disco com chave de ouro no ótimo
partido alto Na Aldeia (gravado por Sílvio na década de 30), com
participação especial de Teresa Cristina.
Vale a
pena conferir.
Iaiá / Mônica Salmaso
Nota 10
Marcelo Teixeira
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