quarta-feira, 3 de julho de 2013

Um estrangeiro chamado Caetano Veloso (1989)


A obra-prima de 1989
Um dia, Gilberto Gil disse que não acreditava em deuses nem em Deus e que preferia crer no ser humano, no homem e não em quem criou o homem. Para tanto, apostou todas as suas fichas em um cabeludo baiano (assim como ele) e depositou todas as suas esperanças nele, pois ele trazia a musicalidade dentro de seu corpo. Sendo assim, Gilberto Gil passou a crer apenas em Caetano Veloso. Caetano Veloso é tido como dos maiores gênios da MPB. Isso se dá, em larga medida, pelo que produziu entre Transa (1972) e Estrangeiro (1989). Durante esses quase trinta anos e meio, o compositor baiano apresentou ao público uma música de altíssima qualidade. Curiosamente, as duas pontas desse ciclo trazem o melhor do melhor. Se Transa é maravilhoso em sua simplicidade e tristeza no exílio londrino, Estrangeiro é sofisticado, colorido e aponta para o futuro da música brasileira, mesclando tecnologia e influências diversas. É desse último disco que falo agora. Produzido por Peter Sherer e Arto Lindsay (esse último trabalharia, anos depois, com Marisa Monte e também com David Byrne), Estrangeiro começa chamando a atenção pela capa - a reprodução de uma pintura de Hélio Eichbauer para o cenário da peça de Oswald de Andrade, O rei da vela em montagem do Teatro Oficina, no ano de 1967. Ecos do tropicalismo, referência constante na obra de Caetano.

A faixa de abertura é O Estrangeiro, o grande momento do disco. Com a participação dos produtores Sherer e Lindsay e também com Naná Vasconcelos na percussão e voz, a música é fenomenal e cheia de nomes próprios. Um piano acompanhado de bateria eletrônica e algumas distorções de fundo seguem Caetano, que recita os primeiros versos. E por aí segue, em sua letra quilométrica e recheada de citações. Mais de seis minutos de uma bela produção, que conta ainda com um interessante solo de guitarra. Sem dúvida, um dos maiores momentos da MPB em todos os tempos, apesar da discordância de alguns.

Na sequência, aparecem Rei das cores, Branquinha e Os outros românticos, três momentos fortes e extremamente bem conduzidos. Fica claro o peso da mão de Lindsay, que influenciava muito o compositor baiano à época das gravações. O disco traz ainda uma parceria em inglês do trio Caetano-Sherer-Lindsay, Jasper, e as medianas (quando comparadas com as demais) Este amor, Outro retrato e Etc. Assim como em outros trabalhos, Caetano dedica muitas dessas canções a antigos e eternos amores e amigos (a ex-Dedé Veloso, Paulinha Lavigne e Jorge Mautner).

A última canção é a mais alegre e colorida da obra. Meia-lua inteira, do até então desconhecido Carlinhos Brown (Carlinhos por parte de mãe, Brown do mundo, diz o genro de Chico Buarque), foi o grande hit do disco e chegou a fazer parte da trilha sonora de uma novela global. Com o próprio Brown na percussão e uma levada de guitarra deliciosa, fecha Estrangeiro em elevadíssimo astral.

Estrangeiro, de todo modo, redime o baiano dessas críticas. Um disco para ser escutado e escutado e escutado, sempre.

 

Brilhantemente brilhante.

 

Estrangeiro / Caetano Veloso

 

Nota 10

 

Marcelo Teixeira

 

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