Experimentos químicos de Lenine |
Lenine é um tipo raro de cantor que
conseguiu sair da atmosfera popular para adentrar, definitivamente, no âmbito
da intelectualidade e a prova maior disso são suas músicas, cada vez mais
rebuscadas e refinadas, não deixando margem para que a população sem cérebro
possa compartilhar o que é belo e universalmente para poucos. Seu último
trabalho, Chão (2011) foi uma experiência
causada entre o efeito da solidão do cantor e a fase de aceitação do público,
que estranhou de início o novo formato de se fazer música do cantor e
compositor pernambucano, mas que aos poucos essa magia e esse encanto tomaram
partido alto e maior dentro do universo leniniano. Quase no mesmo caminho que o
álbum anterior, Carbono (2015 / Universal
Music / 29,99) é um disco atemporal, fugindo de modismos e tropicalismos
regionais que o consagraram e sendo ele mesmo: Lenine, um cantor pernambucano
que tenta encontrar a cada verso uma explicação para o inexplicável, um ato, um
hiato, uma sonoridade diferente e ampla, um significado para suas canções e
para o desejo de se fazer canções. Carbono
nasceu dessa necessidade conjunta de exemplificações: uma corrente entre as
músicas para tentar decifrar os anseios da química e o elo entre Chão, com suas sonoridades ambivalentes e subsequentes
da eloquência distinta. Há lirismo temperado com loucura e um certo desespero
de Lenine na preocupação geral sobre o ambiente e a Terra, tópicos contestados
em músicas que ministram água, carbono, pó, terra entre outros argumentos da
natureza. Lenine está mais denso, mais calmo e até mesmo mais confortável para
fazer de Carbono seu
porto seguro de ilusões maniqueístas e está em um momento em que sua música
pede passagem para o que realmente pede a música popular brasileira num todo: a
qualidade musical. O cantor vem há um certo tempo se mostrando presente no
lendário sistema de qualificação profissional, lançando discos mais distantes
da plateia assimétrica de caráter duvidoso para figurar entre o intelecto e a
formação de massa cerebral. Em Carbono
percebe-se o instinto do saber voluntário do cantor, atestado em canções que
vão da sofisticação ao regional sem precisar ser caricato ou descer um patamar
de popular. O disco tem uma limpeza sonora incrível e o erro de Lenine, talvez,
tenha sido esse: já que o cantor queria experimentar o lado minimalista dos
ruídos em Chão, ele
poderia usufruir para que esse novo trabalho tivesse sons que realmente atendem
ao título. Há um distanciamento e uma proximidade muito larga entre um projeto
e outro, mas Carbono consegue
ser mais poético, mais autoral, mais visível e mais compreendido que os discos
introspectivos do cantor lançados outrora. Mesmo sendo um disco particular,
monossilábico (o álbum cai por vezes numa tristeza profunda), anti-tropicalista
e pós MPB, Lenine nos mostra um álbum recheado de perguntas sobre o mundo da
engenharia química, tentando nos transportar para o mundo daqui há alguns anos.
Sua música, nesse quesito, pode explicar muitas coisas.
Carbono
(2015) / Lenine
Nota
8
Marcelo
Teixeira
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