sexta-feira, 28 de novembro de 2014

As Dolores de Nina Becker


A obra de Dolores por Nina: perfeição
Não é fácil dedicar um disco inteiramente a um artista, seja lá qual for este artista homenageado. Ainda mais nos dias de hoje, em que a música popular brasileira se renova a cada dia, passando por transformações mútuas e com passaportes distintos. Cantar Dolores Duran em pleno século vinte e um não é uma dessas tarefas fáceis e mesmo assim, a excelente cantora Nina Becker desafiou a tudo e a todos para fazer um disco para homenagear uma das cantoras menos comentadas da MPB, mas que tem uma participação fundamental na construção e estrutura de um ritmo que deveria ser mais respeitado. Dolores Duran nasceu em 1930 e morreu jovem e no auge de sua plenitude artística: aos 29 anos já era uma das cantoras e compositoras mais respeitadas de seu tempo. Minhas Dolores (2014 / Joia Moderna / 22,99) é um desses raros discos que nos norteiam pelo conjunto da obra: desde a brilhante capa com a brilhante ideia do título, quanto pela leveza e riqueza de sua voz, assim como a magistral herança musical de Dolores. Tudo em Minhas Dolores soa como inédito, até mesmo porque Nina é uma das cantoras menos conhecidas do grande público e ao mesmo tempo uma das melhores novidades da MPB: voz limpa e suave, muito afinada e excelente interprete. Talvez sendo seu trabalho mais expressivo, Nina faz com que todo o álbum seja rechaçado a puro lirismo com sua personalidade e sua beleza exuberante. Com uma pincelada de refinamento particular, Nina conseguiu extrair o melhor de seu talento para dar vida a obra de Dolores e esse refinamento particular se deveu muito aos tópicos de leveza e a quase percepção inédita que a cantora transpassa através de sua voz. Alguns samba-canções viraram verdadeiras obras-primas na voz de Nina, que vem embalada com violão de sete cordas e bandolim, acopladas de forma enxuta para relembrar momentos e sentimentos de uma cantora marcada pela dor e pelo sofrimento do amor. Este é o melhor momento para que a juventude que não conheceu uma cantora tão autoral e visceral como Dolores, possa (re)conhecer seu talento precoce na presença onipresente de Nina Becker, que soube como ninguém reinterpretar canções maravilhosas de um tempo áureo, sem perder a magnitude de sua criadora, muito menos inventar modinhas para que seja algo comercial. Merecidamente Becker, temos que aplaudir sua rebeldia e coragem ao lançar no mercado um disco de altíssimo nível com capacidade nada egocêntrica, de uma elegância primordial e sútil, marcando de vez seu nome na MPB, com a benção de Dolores Duran.

 

Minhas Dolores / Nina Becker
Nota 10
Marcelo Teixeira

 

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