A obra de Dolores por Nina: perfeição |
Não é fácil dedicar um disco
inteiramente a um artista, seja lá qual for este artista homenageado. Ainda
mais nos dias de hoje, em que a música popular brasileira se renova a cada dia,
passando por transformações mútuas e com passaportes distintos. Cantar Dolores
Duran em pleno século vinte e um não é uma dessas tarefas fáceis e mesmo assim,
a excelente cantora Nina Becker desafiou a tudo e a todos para fazer um disco
para homenagear uma das cantoras menos comentadas da MPB, mas que tem uma
participação fundamental na construção e estrutura de um ritmo que deveria ser
mais respeitado. Dolores Duran nasceu em 1930 e morreu jovem e no auge de sua
plenitude artística: aos 29 anos já era uma das cantoras e compositoras mais
respeitadas de seu tempo. Minhas Dolores
(2014 / Joia Moderna / 22,99) é um desses raros discos que nos
norteiam pelo conjunto da obra: desde a brilhante capa com a brilhante ideia do
título, quanto pela leveza e riqueza de sua voz, assim como a magistral herança
musical de Dolores. Tudo em Minhas Dolores
soa como inédito, até mesmo porque Nina é uma das cantoras menos conhecidas do
grande público e ao mesmo tempo uma das melhores novidades da MPB: voz limpa e
suave, muito afinada e excelente interprete. Talvez sendo seu trabalho mais
expressivo, Nina faz com que todo o álbum seja rechaçado a puro lirismo com sua
personalidade e sua beleza exuberante. Com uma pincelada de refinamento
particular, Nina conseguiu extrair o melhor de seu talento para dar vida a obra
de Dolores e esse refinamento particular se deveu muito aos tópicos de leveza e
a quase percepção inédita que a cantora transpassa através de sua voz. Alguns
samba-canções viraram verdadeiras obras-primas na voz de Nina, que vem embalada
com violão de sete cordas e bandolim, acopladas de forma enxuta para relembrar
momentos e sentimentos de uma cantora marcada pela dor e pelo sofrimento do
amor. Este é o melhor momento para que a juventude que não conheceu uma cantora
tão autoral e visceral como Dolores, possa (re)conhecer seu talento precoce na
presença onipresente de Nina Becker, que soube como ninguém reinterpretar
canções maravilhosas de um tempo áureo, sem perder a magnitude de sua criadora,
muito menos inventar modinhas para que seja algo comercial. Merecidamente
Becker, temos que aplaudir sua rebeldia e coragem ao lançar no mercado um disco
de altíssimo nível com capacidade nada egocêntrica, de uma elegância primordial
e sútil, marcando de vez seu nome na MPB, com a benção de Dolores Duran.
Minhas Dolores /
Nina Becker
Nota 10
Marcelo Teixeira
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