Vilela e um disco morto |
Considerada por dez entre dez
pessoas como sendo a cantora do ano de 2017 e por três entre dez pelos críticos
de música como uma cantora nonsense no cenário popular brasileiro, a cantora e compositora
Ana Vilela surgiu do mundo da mídia esporádica (aquela que te levanta a moral,
mas logo te trás para o planeta Terra) e foi alçada ao mundo do showbizz da
mesma forma como uma Elis Regina ou Gal Costa surgiram na década de 1960 com
seus estilos competentes e dotes artísticos. Mas há uma diferença gritante e
relevante nessa minha comparação pífia: Elis e Gal batalharam para serem
reconhecidas como cantoras profissionais e utilizaram a voz para mostrar algum
talento (coisa que até hoje, no século 21, ambas conseguem ter), enquanto que
Ana precisou das mídias para se autopromover. Há algo de errado nisso?
Obviamente que não, mas se levarmos em conta que Elis e Gal não eram
compositoras e que ralaram muito para provar algum talento, disso ninguém pode
duvidar. O mundo de hoje é formado por bestas digitais (Umberto Eco poderia nos
explicar isso melhor) e com tantas coisas correndo contra o relógio, eis que as
gravadoras não estão mais se importando com aquilo que é vindo da internet.
Algumas poucas cantoras surgiram dali e dali estão voltando para o
esquecimento, enquanto outras, verdadeiramente genuínos no seu perfil de
cantoras e cantores, batalharam por uma gravadora que lhes dessem suporte artísticos
para poder mostrar um pouco de suas músicas e qualidades. Ainda que algumas
cantoras surgissem de gravadoras, como os casos de Ana Carolina, Maria Gadú ou
Maria Rita, as mesmas se encontram sumidas da grande mídia, sem discos lançados
ou, quando lançados, quase ninguém presta atenção. Ana Vilela está nesse nicho
chamado famosidades instantâneas, que
logo voltará de onde saiu: a internet. Se sua música Trem-Bala foi uma apoteose no ano passado, com participação até de
Luan Santana, seu disco passou desapercebido pelo grande público, mesmo com a
famosa música O Leãozinho, composta
por Caetano Veloso para o disco Bicho (1977).
Muitos sequer sabiam que ela tinha lançado um álbum com treze faixas. Outros
nem sabiam que Ana Vilela era a detentora da canção Trem-Bala. O disco nasceu morto, ficou morto e morreu sem enterrar,
porque assim é a mídia do caos, como
diz na canção do cantor mineiro Luiz Marques (2009) e que acaba sendo um
manifesto contra a mídia especializada em notícias ruins e nas pessoas que
insistem em ficar atentas, antenadas, sublinhadas neste caos chamado internet,
mídia digital e afins. A música de Luiz Marques se iguala com a música Senhas, de Adriana Calcanhotto (1992) em
que diz eu não gosto do bom gosto. Ana
fez muitas pessoas chorarem pelos cantos do país, mas e o resto do disco, por
que ninguém comenta suas outras canções? Por que a mesma mídia que a elencou
não mostra as outras faixas? A resposta é simples: não há o que escutar. Trem-Bala (2017 / 22,99) já é o suficiente para que Ana
Vilela nos sufoque com suas músicas de uma única estação. Mas há uma boa
notícia nisso tudo: Ana Vilela fala de amor e de igualdade em suas músicas e
mesmo que Trem-Bala seja uma falácia contra o moralismo radicalizado nas
pessoas, a canção passa um ar de mentira, de ilusão, de sonhos inexistentes ao
mundo atual e, com isso, retornemos à Mídia
do Caos de Luiz Marques e as Senhas,
de Adriana Calcanhotto, que são mais verdadeiras que a música blasé de Ana
Vilela.
Discos
para esquecer: Ana Vilela e seu Trem-Bala
Por
Marcelo Teixeira
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