Thiago Miranda: empoderamento feminino |
Sempre digo que há a falta de bons
cantores no cenário musical brasileiro e que de uns tempos para cá, muitas
cantoras (boas, medianas e ótimas), passaram a reinar em diversos estilos
musicais com categoria ímpar de inspirações diversas. Não que não tenhamos
cantores no Brasil, mas o nicho de qualidade musical está tão aquém, que
raramente surge um bom ou ótimo cantor para nos brindar com a felicidade extra
de ouvirmos uma boa música. Eis que de todo o vendaval que estamos passando
atualmente, surge um dos melhores e mais capacitados cantores e compositores
dos últimos anos e que tem na bagagem nada mais do que excelentes canções,
excelente timbre vocal e perfeitas melodias. Thiago Miranda é uma das grandes
novidades do mundo do samba e não há que ter uma comparação aqui: ele é único,
autoral, completo e atemporal. Essa atemporalidade dentro de seu universo faz
com que ele seja ainda mais moderno em seu habitat, pois o que ouvimos em seu
recente lançamento é um apanhado de sambas com toques e batidas que nos remetem
a um mundo em que o desejo era outro, os sonhos eram outros e a sensação de paz
eram outros. Thiago Miranda nos transporta a um mundo decente, digno, capaz de
nos divertir e de nos fazer refletir com tudo aquilo que nos cerceia, nos
rodeia e nos catalisa. E é justamente aqui onde mora o diferencial de Thiago:
sua simplicidade nas letras nos transportam a um devaneio de sensações híbridas
e carregadas de sentimentos aflorados e sambas perfeitos. Samba pra Elas (2017 / Funalfa / 24,99) é um disco dedicado às
mulheres e aos morros, às comunidades, às sambistas, às melodias carregadas de
poder ponderado e centrado no semblante do outro que carrega nas costas o
trabalho digno, a única roupa que usa, o pouco dinheiro na carteira, mas que
são, acima de tudo, felizes. Samba pra
Elas é o retrato fiel de que o respeito mútuo se faz presente em canções
como Maria do Socorro (Edu Krieger),
cantada magistralmente por Maria Rita (2007) e que aqui o cantor entoa uma nova
alegoria de humanização. No disco podemos encontrar também as diversas outras
marias espalhadas pelo Brasil afora juntamente com as giocondas, marias do mar,
giseles, julianas, carolas, jandiras. E esse é o verdadeiro significado do
disco: homenagear a singeleza da mulher brasileira em toda a sua esfera, em
toda a sua dimensão e propriedade; seja ela de qualquer canto deste país ou dos
quatro cantos do mundo. Uma sacada e tanto do cantor, que trouxe para esse
universo do samba a redundância da mulher brasileira e de sua importância dentre
tantas lutas e guerras geradas por anos a fio até a sua boniteza de sempre.
Além do destaque autoral de Thiago para com as mulheres, o cantor presta uma
homenagem a Gilberto Gil, remodelando a canção Super-homem, a canção (1979), que fala da fragilidade masculina
perante a epopeia feminina dentro de um empoderamento de redoma ulterior e
benigna. Encerrando o disco, Todas elas
juntas num só ser (Lenine / Carlos Rennó) nos remete às nuances femininas
em sua totalidade: a melodia traz aquela sensação de que há que ter um respeito
gigantesco pela figura da mulher e ser humano que transmuta entre a menina e a
mulher em sua maior predominância. Sendo muito bem representadas, o samba e a mulher são cantadas por um
homem, capacitado para tal, para honrar a beleza de duas almas líricas importantíssimas
para os dias atuais: a mulher e o samba. Thiago Miranda merece ser ouvido pelo
conjunto da obra, pela simplicidade ao descrever situações cotidianas e pelo
seu cantar trivial. Um cantor a altura de sua mais alta patente musical, de sua
categoria perfeita e magistral e de sua competência artística. Com tantos
arroubos musicais da atualidade, em que o que é desprezível acaba sendo
degustado ou jorrado em nossa goela abaixo, ouvir e desfrutar as músicas de
Thiago Miranda acaba sendo um alívio para nossos sensatos e imponentes ouvidos.
Samba
pra Elas (2017) / Thiago Miranda
Nota
10
Por
Marcelo Teixeira