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Carla: convidados sem graça |
Vou direto ao ponto: Carla Visi
estragou a obra deixada por Clara Nunes. Guerreira de Minas Gerais, Clara (1942
/ 1983) deixou um legado e tanto para a posteridade, com grandes músicas e
sambas cadenciados pelos melhores compositores de seu tempo e que se
transformou em algo quase intocável e motivo de inspiração para muitas cantoras
boas que surgiriam ao longo desses anos. Mariene de Castro, Fabiana Cozza e
Virgínia Rosa são as cantoras que mais se inspiram na beleza no canto de Clara
Nunes, assim como Mariana Aydar, Vanessa da Mata e Marisa Monte, que já
deixaram claro e evidente em entrevistas que foram inspiradas pela Guerreira.
Neste ano realiza os 30 anos de morte dessa grande cantora e homenagens foram
pontuadas de canto a canto do país, deixando ainda mais um rastro de saudades e
encantamento por Clara. Mas enquanto algumas homenagens são ditas boas, outras
são capengas e mediocres a ponto de entrar para a história musical como o pior
volume discogrÁfico dos últimos tempos.
Carla
Visi é uma boa cantora, tem carisma, voz, mas seu canto não passa do insulto
musical que embalou o Brasil com suas músicas baianas de baixo calão e duplo
sentido oriundo. Feito às pressas e com
um acabamento horrendo, Carla homenageou Clara na pior das homenagens e fez do
tributo algo comercial demais, horrível demais e sofrível demais. Talvez o que
diferencie este trabalho de outros lançamentos, sejam as músicas praticamente
esquecidas que Clara gravou no início de carreira e que hoje em dia quase
ninguém reconhece. O fã mais ardoroso com certeza se sentirá privilegiado ao
ouvir canções como Dia de Esperança,
lançado em 1966 e que aqui é cantado em dueto com a neo-sertanejinha Paula
Fernandes. Ou então sentir orgulho em ouvir Tributo
aos Orixás, música competente e com lirismo puro, cujo quase não é tocado
por outro músico e que foi gravado em 1972. De 1969 veio Foi Ele, composta por Carlos Imperial e que praticamente Visi a
retirou do baú. Mas é só.
Sinto
vergonha em poder ouvir Carla cantando sucessos de Clara ao lado de Paula
Fernandes, Péricles ou Thiaguinho, músicos que talvez nem conheçam ou tenham
intimidade com a obra maravilhosa de Clara. Ser diferente de outras grandes
interpretes para fazer um disco em tributo é tudo o que uma cantora quer na
vida, mas fazer estardalhaço com a obra da homenageada é outro patamar. Clara
merecia tratamento melhor, assim como fizeram Virgínia Rosa no show que vem
realizando desde o ano passado, o belissímo e emocionante Virgínia Rosa canta
Clara ou da premiadissíma Fabiana Cozza, que vem emocionando
corações com seu canto forte em Canto Sagrado, cujo foi
realizado recentemente um DVD sobre o espetáculo.
Homenagem
é homenagem, mas precisa ser muito bem feito, caprichado e ainda mais por se
tratar de uma das maiores cantoras do Brasil. Cantores como Daniela Mercury, Péricles,
Paula Fernandes e Thiaguinho dividem o microfone com a baiana em algumas das
longas 17 faixas do álbum. Com Daniela, por exemplo, ela canta Morena de Angola e já em O Canto das Três Raças, a ex-vocalista da
banda Cheiro de Amor faz dueto com Péricles.
Aí eu pergunto: qual a ligação dessas vozes com a obra de Clara? Paula
Fernandes, rainha do sertanejo empobrecido cantando os sambas de Clara? Tem
algo errado neste samba.
Carla Visi Pura Claridade (2013 / Sony Music / 29,99) é um
dos piores momentos da música popular brasileira. Sem beleza, sem samba no pé,
sem malemolência, Carla deixa a peteca cair a cada faixa embalada por seu
canto, que não entusiasma em momento algum. O que poderia ser um verdadeiro
caminho para o sucesso (como o caso de Mariene de Castro, Fabiana Cozza e
Virgínia Rosa com seus shows abarrotados de pessoas ávidas por ouvirem as
músicas de Clara), Carla deixou de mão o carinho, o afeto e a respeitabilidade
oferecida para cair em um nicho cheio de pólvora incapaz de ser lembrado.
Carla
Visi continua linda demais, cantando bem demais, mas errou e muito ao se
apressar para fazer este disco como forma de tributo. Errou na capa, errou na
escolha dos convidados e continuará errando quando não estudar o que se quer
apresentar. Ser leiga no assunto requer estudos, requer profissionalismo,
requer qualidade e Carla não soube aproveitar este momento tão importante que
seria para a sua vida musical, tendo em vista que a cantora amargura vez por
outra ostracismos longos.
Carla Visi estraga os clássicos de Clara Nunes em tributo
Nota 1
Marcelo Teixeira